TRADUAÇÃO DO TEXTO (RESUMO) A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO SUBDESENVOLVIMENTO E O DISCURSO DO DESENVOLVIME NTO JOAN PICAS CONTRERAS Sobre o autor? Doutor em Geografia e História (Antropologia Cultural), Universidade de Barcelona. Resumo Geral O texto trata do papel de privilégio da experiência imperial moderna, a partir da idéia de que as formas de dominação não constituem um mero ato de acumulação ou submissão, mas que recebem apoio de formações ideológicas, de discursos que concluem que certos territórios e pessoas devem ser dominados e necessitam da intervenção, e que o desenvolvimento só pode chegar através da sua mediação, através da imposição do modelo ocidental. O texto tem o objetivo de esboçar os elos que sustentam o discurso do desenvolvimento a partir do ocidente, ou seja das instâncias encarregadas de planejar e impulsionar políticas de desenvolvimento no terceiro mundo e de como o mesmo (ocidente) concebe ajuda aos países do terceiro mundo. Também examina as conotações contidas nesse discurso. Tópicos O texto está estruturado em quatro momentos. Introdução 1-A construção social do subdesenvolvimento 2-A alteridade e a linguagem na pluralidade cultural 3-O discurso do desenvolvimento Introdução Com o início dos processos de descolonização do pós-guerra, emergiu como categoria política e social uma nova entidade denominada Terceiro Mundo. Junto com ela surgiu um novo discurso. Esse discurso considerava o Terceiro mundo como atrasado e subdesenvolvido, e que, portanto, este necessitaria de progresso e modernização. Desde então a idéia de desenvolvimento tem feito fortuna e está na boca de todo mundo, o que fez a consciência popular associá-lo à idéia de riqueza, bem estar e industrialização. Para Contreras, em nome do desenvolvimento tem se desenhado numerosas estratégias e intervenções de todo o tipo para modificar sociedades estrangeiras consideradas como anomalias históricas e que em rigor respondem as nossas concepções e percepções do que no ocidente cremos ser a globalização do mundo. Nesse sentido as teorias do desenvolvimento, tanto do ponto de vista da economia clássica, como do marxismo e das próprias teorias weberianas da modernização, fundamentam na mesma idéia de razão que se pretende universal. Na visão do autor essa razão universal reduz a especificidade em generalidade e que sem dúvida trazem conseqüências que determinam a nossa construção de alteridade, ou seja, como nós interpretamos o outro. Também a partir da idéia de razão se justificam qualquer forma de intervenção histórica, desde o colonialismo até as políticas de desenvolvimento implementadas ao longo dos anos. Situa a era do desenvolvimento como objetivo universal, de extensão planetária, em meio século de existência. Nesse período as desigualdades e as vitimas da fome e da pobreza aumentaram significativamente e o desenvolvimento proposto se transformou em formas que empobrecem e incapacitam dia-a-dia as pessoas em diversos lugares. “O desenvolvimento, para além de ser uma ferramenta, um meio que busca melhores níveis de vida, encaminhado para a realização de recursos adequados para uma existência digna, tornou-se um objetivo na prática política e social tomou a forma impositiva de determinados modelos sociais e culturais aplicadas a uma realidade estrangeira. Em outras palavras, tornou-se uma forma de dominação e submissão do terceiro mundo”. (p.26) O autor segue a linha de argumentação de Edward Said (1978), quando considera o orientalismo como um conjunto de saberes, ao mesmo tempo, que uma instituição, através do qual o ocidente constrói discursivamente o oriente, situando-o em um espaço imaginário e caracterizando-o de tal modo que legitima a adoção de uma posição de autoridade sobre ele. O autor apresenta as práticas específicas do desenvolvimento como formas paradigmáticas de um discurso: o discurso do desenvolvimento, que atuaria de uma maneira análoga de como atua o discurso orientalista de Said. Qual é o discurso sobre Orientalismo de Said que embasa o texto? Em 1978 Edward Said publicou a sua obra mais conhecida, Orientalismo, na qual analisa a visão ocidental do mundo "oriental", mais concretamente do mundo árabe. Segundo o autor, o Ocidente criou uma visão distorcida do Oriente como o "Outro", numa tentativa de diferenciação que servia os interesses do colonialismo. Na construção do argumento central do livro Said analisou uma série de discursos literários, políticos e culturais que iam desde textos das Cruzadas ou de Shakespeare, nos quais encontrou um denominador comum: a representação dos habitantes do mundo oriental como bárbaros. O discurso do desenvolvimento se manifesta como um conjunto de práticas que obedecem a certas regras definidas de acordo com um corpo de conhecimentos específicos, depositado em mãos de tecnocratas e experts, assim como governo e instituições, que se expressam na linguagem da economia e da racionalidade técno-científica através dos quais se exercem relações de poder. 1-A construção social do subdesenvolvimento Resumo do tópico O autor traz o debate sobre o conceito de cultura para explicar que as diversas correntes (científicas) que o defendem operam sempre na manifestação de relações de domínio. Esse domínio do mundo constitui-se como a ocidentalização e contribui para tratar as sociedades não ocidentais como objetos de dominação. Trata ainda da construção do discurso do Orientalismo como produção do ocidente para explicar a relação entre o discurso do desenvolvimento como produção do terceiro mundo e, conseqüentemente, reforçar os argumentos que explicam a construção social do subdesenvolvimento. Desenvolvimento do tópico Afirma que ao ser utilizado pela antropologia o conceito foi inventado para explicar as articulações coletivas da diversidade humana. Tanto os modelos evolucionistas como de entidades imprecisas e com um elevado grau de abstração como civilização ou raça, a idéia de cultura postulava a existência de unidades locais, funcionalmente integradas, dando pé ao relativismo. A partir do descobrimento da complexidade das tradições e das formas de vida nas sociedades denominadas primitivas os antropólogos, agora passam a ficar interessados no conhecimento e na tradição, pressupondo de algum modo uma autonomia das relações sociais e portanto uma idéia de sociedade cultural (Wolf 1982). Nasce o conceito de identidade cultural. A sociedade não é idêntica e homogênea, mas diversa. Existe uma multiplicidade de culturas que passam a conceber-se como “estilos de vida particulares, não transmissíveis, captáveis a partir de formas de produção concretas, mais que capacidades virtuais, e correspondentes a valores observados em lugar e verdades ou supostas verdades (LéviStrauss, 1983). O selvagem e primitivo passam a estar de igual maneira desvalorizados nessas concepções, mas agora não em função de argumentos da biologia, mas atendendo a situação hipotética que ocupariam na escala cultural. Mesmo que você tenha vindo a notar que há no final uma lógica comum que se constroem todas as estruturas, o fato é que ao longo dos anos, a abstração humana vem em grande parte dando lugar à diversidade cultural. Mas os problemas aparecem novamente quando o diálogo, inerente à diversidade cultura, é invocado em nome de uma diferença que exclui: os termos em que a identidade é definida reduzem o real ao idêntico. Sacrificam assim, a multiplicidade em favor de uma identidade explicativa, interpretadas de acordo com nossos paradigmas. O conceito de cultura, ligada à relação de poder que se entrecruzam serve de bandeira para a divisão da humanidade em entidades coletivas insuperáveis e irredutíveis. (FinkielKraut, 1987) A cultura por definição relacional é uma inscrição em processos comunicativos que existem entre sujeitos e relações de poder. A divisão entre nós/eles opera também no marco cultural e na manifestação de relações de domínio. Cultura como significação a partir dos signos: a noção de como outra cultura são estruturas cognitivas com uma significação mais ou menos independente do mundo que busca representar. As manifestações das relações de domínio coincidem com o domínio do signo, ou seja, o conteúdo da consciência. Assim do mesmo modo que se tem questionado os conjuntos narrativos da antropologia, citados anteriormente, mais recentemente as totalidades culturais como aponta Clifford (1988), também devem estar sujeitas a este tipo de experimentação. A partir disso o autor retoma sua argumentação inicial, baseada na obra de Said (1978) afirmando que o mesmo influenciou diversos estudos centrados na análise do papel da cultura na construção de identidades que tem servido como instrumento de dominação imperial. Traz a visão de Kiernan (1995), onde a experiência imperial tem de ser considerada em sua totalidade, e em dita totalidade a dimensão cultural tem contribuído decisivamente na formação da vida e da ordem social tanto dos não europeus como dos próprios europeus. Partindo de uma concepção de cultura a partir de Foucault – como um corpo de disciplinas que possuem força efetiva de conhecimento sistematicamente ligados ao poder - Said afirma que surge precisamente o papel desempenhado pelas construções culturais da experiência imperial. Afirma que a ocidentalização do mundo construiu socialmente o subdesenvolvimento. Para Contreas, a partir da visão de Said, a ocidentalização do mundo está hoje consumada. Ela foi possível mediante o domínio público por meio da difusão cultural. Essa apropriação do mundo constitui-se como a própria ocidentalização e contribui para o fato de que as sociedades não ocidentais são encaradas como objetos de um saber que está necessariamente dominado por categorias ocidentais hegemônicas. Explica que os instrumentos de interpretação das “outras” sociedades aparando-se de seu caráter analítico-científico levam a reduzir o mundo inteiro a uma objetividade medível e comparável. Afirma a partir da visão de diversos autores que os conhecimentos produzidos sobre outras culturas foram, por muito tempo, produzidos pelas mãos do colonialismo. Estuda com rigor o papel que exercem esse tipo de saberes que se autocapacitam não só para interpretar do exterior outras culturas, mas eles ainda têm o luxo de reinventá-las, ao mesmo tempo em que procuram como agir, também querem saber como eles estão organizados e o fio os movem. Said acredita que o impacto, influência e repercussão do termo orientalismo que examina se reflete no fato de que tem vindo a ser um conceito genérico - e um sentido amplo e que é relevante aqui tudo sobre o subdesenvolvimento do Terceiro Mundo - ou de um particular. “ (...) o orientalismo pode ser descrito e analisado como uma instituição coletiva que se relaciona com o oriente, relação esta que consiste em fazer declarações sobre ele, adotar posturas sobre, descrevê-lo, ensiná-lo, colonizá-lo e decidir sobre ele. Em resumo, o orientalismo é um sentido ocidental que pretende dominar, reestruturar e ter autoridade sobre o Oriente (...). O orientalismo deve ser examinado como discurso, para perceber como a cultura européia foi capaz de manipular e dirigir o oriente do ponto de vista político, sociológico, militar, ideológico, científico e imaginário. A apreciação adquirida do Oriente baseia-se no lugar particular que ocupam na história do Ocidente, tornando-se uma projeção dele. Usa Mitchell (1991), que se apropria de Heidgger, para afirmar que o eixo fundamental da idade moderna é a conquista do mundo como pintura. Desse modo, explica Said que o Oriente é situado no lugar de sua representação. As visões fragmentadas sobre o Oriente são dadas como corretas, onde a ordem da aparência se converte na ordem da verdade. (Derrida, 1970). O oriente aparece como uma criação intelectual do Ocidente, composta de imaginação e necessidade de compreensão e também necessidade de domínio. O desejo de poder é moldado por um discurso político e social, o conhecimento sobre o resto do planeta. Para Said os meios de comunicação e a visão científica criam boa medida da realidade determinando como observamos o resto do mundo que obtém seu significado a partir da visão destes. Ocidente, Europa, nós = aquilo que é familiar Oriente, Terceiro mundo, eles = aquilo que é estranho Num segundo momento do tópico, Contreas retoma a discussão do orientalismo que produz o oriente para explicar a relação com o discurso do desenvolvimento para produzir o terceiro mundo. Continuando com a argumentação de Said ele explica: Discurso do orientalismo produz o Oriente Analogia Discurso do desenvolvimento produz o Terceiro mundo Ambos os discursos explicam as instituições ocidentais, seus valores e interesses. A cultura ocidental gera conhecimento sobre o que se concebe como moderno e desenvolvido, enquanto que a mesma cultura constrói o que é velho, exótico e tradicional. O discurso orientalista (diferença entre oriente e ocidente) revelou os conceitos sobre “nós mesmos” Fanon (1961). Nossa identidade – a identidade civilizada adquire sua forma através da construção de uma nova identidade oposta (alteridade) Ocidente vem de um jogo de projeções e idealizações da alteridade. Oriente/terceiro mundo exerce contraste com Ocidente/primeiro mundo e vice-versa. O resultado gera as construções de nós mesmos e dos outros. Contreas finaliza afirmando que o propósito de Said é desmontar e desconstruir o discurso orientalista, com o propósito de apagar a fronteira entre o Oriente e Ocidente, uma fronteira traçada por categorizações que ocultam nossa humanidade comum e também escondem a diversidade real que existem entre todos aqueles que são etiquetados de orientais e aos que, com tal se supõe uma conduta e valores uniformes. 2. A alteridade e a linguagem da pluralidade cultural Resumo do tópico Trata do conceito de alteridade e linguagem da pluralidade cultural que podem reforçar o discurso do desenvolvimento, já que a partir da compreensão entre “eu e o outro” o pode-se perceber que a diferença cultural está sempre construída discursivamente. Desenvolvimento do tópico Traz o conceito da ontologia clássica, ciência do ser, ou ciência primeira que formulou que “o ser é”, e com isso, inevitavelmente aparecia a exterioridade daquilo que “o outro não era”. Quando a ontologia cartesiana formulava “eu sou”, dizia que o outro “não é como eu sou” e, portanto, tomava a aparência de “um outro” diferente de “mim”. A partir disso o autor explica o seu entendimento do conceito de alteridade. O outro historicamente sempre tem aparecido como uma presença incômoda, um acidente que nos está permitindo julgar e que, nos melhor dos casos passa a inscrever-se no âmbito da ética, dita que devemos ser bons como ele. A partir da compreensão entre “eu e o outro” o autor explicita que a diferença cultural está sempre construída discursivamente. Afirma que a globalização aumentou as desigualdades entre ricos e pobres e beneficiou o mundo com o artifício de aproximar povos diferentes, colocando assim um novo espaço de sociabilidade e de representação. Mas esse espaço serviu para o ocidente passar seus valores particulares através da definição destes como universais. Explicita ainda que a sensibilidade pós-moderna revelou as diferenças (multiculturalismo), mas também criou um espaço global de uma cultura cada vez mais segregada. Utilizando-se de Hobart (1995) afirma que o mundo pós-colonial, o global, tem proporcionado os significados para um novo imperialismo. A linguagem cultural que se associa a globalização tem sido progressivamente integrada no sistema de valores e da cultura ocidental, atuando no sistema de signos ligados ao consumo capitalista, para permitir que o capital transnacional possa implantar-se em localizações particulares. A cultura global não é unívoca, mas uma realidade interpretativa. Conclui que o reconhecimento da alteridade cultural, a democratização da diferença, localizada no âmbito que sustenta o mercado tem conduzido a um falseamento das linguagens e da cultura da diversidade, uma vez que estas linguagens ao serem internalizadas nos processos de expansão do Ocidente, foram alteradas em sua forma genuína. 3. O discurso do desenvolvimento Resumo do tópico Explica o significado do discurso do desenvolvimento a partir de 6 pontos principais. Desenvolvimento do tópico 1. O espaço representado é uma construção social, ou seja, uma representação, e não um retrato natural. Portanto, o significado que possui o espaço social do subdesenvolvimento proporciona sua natureza social que lhe outorga não só convicção e coerência interna, mas também presença ontológica. O sentido da eficácia do mapa, por exemplo, como uma tecnologia simbólica que é, não deriva das semelhanças a respeito da realidade que representa, mas de sua capacidade de produzir, isto é, de sua capacidade de formalizar o território, homogeneizar as diferenças e disseminar o semelhante, integrar o velho em uma rede e segregá-lo em uma taxonomia. O poder sobre e do espaço estaria implícito nas representações norte-sul, primeiro e terceiro mundo, centro e periferia, e, em outro nível, Ocidente-Oriente. Isso tudo é uma reflexão enquanto significado dessas relações de domínio. Também está implícito na lógica dualista do discurso do desenvolvimento, que faz um delineamento e divisão do território criando oposições binárias entre um mundo desenvolvido e um mundo subdesenvolvido. Na organização espaço-temporal signos e sinais constituem uma linguagem de localização que, não obstante, deslocaliza, ou seja, modifica o local. A idéia de subdesenvolvimento que configuramos em nosso imaginário não é mais que uma forma de perceber o mundo que se conforma a partir dos modos de relação. A própria etiqueta de terceiro mundo não é mais que uma categoria abstrata para classificar o mundo em zonas, em partes definidas, de maneira que seja plausível continuar dotando de arquétipos a alteridade. Das formas de representação que se estabelecem identidades discriminatórias, emanam regimes hegemônicos: construindo a nível representativo um mundo que se considera subdesenvolvido se está determinando também o que são suas carências e necessidades e, mais além, estabelecendo novos objetivos a alcançar. 2. O desenvolvimento é um termo que tem ganhado uma ampla notoriedade não só em nível divulgação, mas também no domínio da política e das ciências sociais em geral, principalmente a partir dos anos 50. A emergência do desenvolvimento coincide com o surgimento do Terceiro Mundo como categoria política e social, isto é, o subdesenvolvimento. Após o pós-guerra com a premissa da necessidade de conduzir as entidades ditas atrasadas frente a modernidade se disseminou o discurso político e social do desenvolvimento. A insdustrialização e urbanização passaram a ser vistas como os únicos caminhos possíveis para alcançar a modernização. O crescimento econômico também passa a ser perseguido por todos. Mas o sonho do progresso da humanidade vem se convertendo em pesadelo. O discurso e a estratégia do desenvolvimento e sua onipotência tem produzido efeitos opostos ao proposto: massivo subdesenvolvimento e pobreza. Apesar do fracasso dos resultados das políticas de desenvolvimento um fato é inegável: a idéia do desenvolvimento se consolidou como uma ferramenta básica das políticas de sujeição e submissão do sistema mundial tem atuado como legitimadora da estrutura sistêmica e atuado como instrumento de dominação do Terceiro Mundo. O desenvolvimento vem alcançando um status de certeza no imaginário social, o status de verdade que poucos se atrevem a duvidar de sua definitiva legitimidade. Apesar de existirem termos estritos para contrapor (desenvolvimento humano, desenvolvimento sustentável), a categorização do desenvolvimento, sua essência, em nenhum instante é questionada. 3. Entender o desenvolvimento como uma construção histórica também obriga ao mesmo tempo entender seus processos e mecanismos de institucionalização. A invenção do desenvolvimento necessariamente implicou na criação de um campo institucional desde qual os discursos são produzidos, registrados, estabilizados, modificados e postos em circulação. Está imbricado com os processos de profissionalização que constituem o aparato que organiza a produção das formas de conhecimento e o desenvolvimento das formas de poder, relacionando umas com as outras. A institucionalização se organiza através de um conjunto de técnicas, estratégias e práticas disciplinares, mediante as quais se geram, validam e difundem os saberes. A institucionalização do desenvolvimento e a profissionalização inclui que a vida social seja concebida como um problema técnico, como uma matéria que de decide e se resolve racionalmente. A ciência e a tecnologia desempenham um papel extraordinário e relevante na elaboração e legitimação do discurso do desenvolvimento. 4. Para que o discurso do desenvolvimento possa estender suas formas de atuação é requisito prévio a criação de um domínio que lhe confere legitimidade. A legitimidade do discurso do desenvolvimento é conferida a partir da categorização da pobreza e sua problematização. As práticas que emanam do discurso do desenvolvimento, que não são arbitrárias, mas que pretendem estar baseadas em um conhecimento operativo da gentes sobre as quais essas práticas desejam atuar. A partir das práticas se definem as categorias clientelistas (campesinos pobres, mulheres pobres, crianças pobres e desnutridas) e as problematizam como Foucault (1963 e 1975) destaca como a especialização da patologia conectados com o exercício do poder. As populações são conduzidas ao que se inscrevem como as tecnologias do desenvolvimeno e que as tratam com as concepções próprias de como devem ser a economia e o bem estar. Quando a realidade ainda mostra que a pobreza em massa e verdadeiro só aparece com o surgimento e disseminação da economia de mercado e a consequente ruptura dos laços comunitários. Quando de um lado se tem os marcos da linha da pobreza definidas pelo Banco Mundial, de outro as terceiras partes do mundo automaticamente são consideradas pobres e constitutivas de uma categoria problematizada e que necessita de intervenção das estratégias de desenvolvimento. Também aparece para legitimar o discurso do desenvolvimento, além da categorização da pobreza, o discurso do social. 5. O poder da dominação não é só violência, é consentimento. A eficácia da retórica do desenvolvimento está em conseqüência em sua coerência como forma de produção e constituição de saber e na convicção de seus exercícios de representação, que permitem construir identidades e linguagens que se convertem em hegemônicas, reconhecidas por uma maioria. O discurso do desenvolvimento não só tem proporcionado as chaves através do qual o Terceiro Mundo tem sido imaginado, mas também através das quais o Terceiro Mundo tem se auto imaginado. 6. O Terceiro Mundo é uma construção social. O que tem se chamado de Terceiro Mundo não é só o que se estabelece na ordem do discurso, mas também uma entidade (espaço e gente) que existem com independência das representações construídas, sobre a qual se planejam as relações de domínio implicadas na criação das desigualdades e onde as populações lutam dia a dia para levar a cabo seu projeto de vida e poder sobreviver. Atuando sobre este espaço e sobre as pessoas o desenvolvimento se tem constituído em um projeto histórica e culturalmente específico destinado a solucionar o que em sua opinião seriam seus déficits. O desenvolvimento em forma de conhecimento e prática social e tal como insistido um instrumento de poder e enquanto tal suas vitimas são as pessoas e as comunidades que são refeitas em seu nome. Final propositivo É preciso desconstruir o próprio discurso, decompor, desestruturar e deslocar as estruturas que sustentam sua arquitetura conceitual. Apesar do corpus do desenvolvimento se nutrir em exclusividade de um só sistema de conhecimento – o Ocidente – e apesar do seu caráter intencionalmente unívoco, existem e podem ser racionalidades alternativas para guiar a ação social. As estratégias para a construção de um discurso alternativo e para a reconstrução das sociedades do terceiro mundo, tem que passar necessariamente pela reconstrução de práticas alternativas, pela invenção de novas narrativas, de novos caminhos de pensar e atuar, pela configuração de novos regimes de configuração próprias. (Escobar, 1995) Desconstrução e reconstrução devem converter-se em processos simultâneos. Desconstruir o desenvolvimento e decompor os seus mecanismos de legitimidade deve significar o retorno das sociedades do Terceiro Mundo ao direito de visualizar seu próprio futuro.