L`enfer - Universidade da Madeira

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O financiamento do Ensino Superior – Pedro Telhado Pereira (Professor Catedrático da
Universidade da Madeira)
Muito se tem falado nos últimos tempos sobre o financiamento do Ensino Superior e,
em particular, sobre a possibilidade de haver um aumento das propinas… mas a questão
que ainda não vi discutida é das razões porque cidadãos contribuintes que não estão
directamente envolvidos com a educação devem ver parte dos seus impostos utilizados
no pagamento do Ensino Superior.
Recordando os primeiros ensinamentos da Teoria Económica, o Estado aparece com
três finalidades principiais: promover a eficiência, promover a equidade e promover o
crescimento económico e a estabilidade. Só com base num destes princípios me parece
justificável a intervenção do Estado utilizando parte dos impostos para pagamento da
Educação e, em particular, do Ensino Superior.
Comecemos pelo problema da eficiência, ou seja, as razões porque o mercado da
Educação não funciona de acordo com o paradigma ideal da Teoria Económica.
A Educação é um investimento feito pelo indivíduo. Este indivíduo irá, no futuro,
receber salários mais elevados do que os que receberia sem Educação. Este diferencial
de salários permitir-lhe-á pagar a Educação, e o paradigma estaria respeitado, não
fossem os seguintes problemas, entre outros:
- As despesas de Educação são feitas no momento actual e os salários só serão
recebidos no futuro, o que faz que os indivíduos tenham que se financiar
durante este período. Os Bancos não disponibilizam empréstimos para este
tipo de investimento, o que faz com que as famílias terão que arcar com estes
custos e muitas não o poderão fazer.
- A Educação desenvolve capacidades sociais no indivíduo que não são
valorizadas no salário, por isso, a sociedade tem interesse em pagar parte dos
custos da Educação.
- Parte do aumento de salário traduz-se em aumentos de impostos futuros e de
contribuições para a segurança social, por isso, o Estado aparece como
parceiro com o indivíduo neste investimento, tendo que participar também
em parte dos custos.
- Os aumentos de salários significam aumentos de produtividade, o que é
muito importante no sistema social em que nos encontramos (em que esta
geração de estudantes vai pagar as reformas dos trabalhadores actuais). Estes
aumentos de produtividade podem compensar, em parte, a diminuição
numérica das novas gerações e permitir que as reduções das reformas dos
trabalhadores actuais não sejam tão significativas. Este aspecto é importante
para os trabalhadores actuais e razão, a meu ver, suficiente para aceitarem
que parte dos seus impostos se destine ao financiamento do Ensino Superior.
- …
A segunda razão para intervenção é o problema da equidade que já aflorámos acima
quando falámos no acesso ao financiamento do investimento. O Estado deve garantir a
igualdade de oportunidade entre os indivíduos, ou seja, não poderá haver diferenciação
entre os indivíduos nas condições de acesso aos financiamentos, em particular, se o
sistema se basear em empréstimos. Não pode vir a acontecer que quem tem
propriedades tenha acesso a empréstimos a taxas mais favoráveis do que aqueles que
não têm, o que facilmente acontecerá se o Estado não intervier neste sistema.
Por último temos o problema do crescimento económico, o qual não será sustentado se
não houver um aumento constante do capital humano, o qual se adquire em grande parte
através da Educação. O Estado como garante do crescimento tem que apoiar a Educação
pois este objectivo ultrapassa os ganhos individuais.
Razões não me faltam para continuar a defender que o Estado deve pagar parte do custo
do Ensino Superior, fica por decidir quanto é que deve ser pago pelo Estado e quanto é
que deve ser pago pelos estudantes e suas famílias .
Actualmente o estudante e as suas famílias suportam o custo que é o dos salários que os
estudantes poderiam estar a receber e não recebem porque se dedicam ao estudo atempo
inteiro (este salário muitas vezes seria o mais elevado que iria entrar no agregado
familiar), mais as propinas, mais os livros, os transportes, os lares (dos estudantes
deslocados), entre outros. O Estado paga o que aparece no orçamento do Estado.
A minha opinião é que esta distribuição não tem levado a um excesso de procura de
Educação (Portugal ainda está muito deficitário), por isso, qualquer aumento da
participação das famílias (aumento das propinas) deve ser muito reflectido e precisamos
de tempo para discutirmos o assunto.
PS: A minha passagem como Pró- Reitor para a Acção Social na Universidade Nova de
Lisboa fez-me tomar conhecimento de situações que me levam a considerar alguns
alunos e suas famílias como verdadeiros heróis num sistema feito à medida de uma
realidade de elites que eram as que tradicionalmente chegavam a este grau de Ensino.
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