Adaptações escolares para crianças com HIPERATIVIDADE, déficit de atenção (DDA), transtorno obsessivo compulsivo (TOC), tiques e Síndrome de Tourette (ST). G ru p o d e A p o io S iT O C Adaptações escolares para crianças com hiperatividade, déficit de atenção, transtorno obsessivo compulsivo, tiques e Síndrome de Tourette Extraído dos trabalhos de José Carlos Ramos Castillo1 e Ana Regina G. Lage Castillo2 com autorização dos mesmos. “Um país se faz com homens e com livros” MONTEIRO LOBATO 1. Membro da Comissão de Bioética do Hospital das Clínicas e da FMUSP. Coordenador do Ambulatório de Tiques da Infância e Adolescência do Instituto de Psiquiatria do HCFMUSP. Membro do Tourette International Consortíum liderado pelo Prof. Roger Freeman, British Columbia University, Vancouver, Canadá. Pós-graduando em nível de Doutorado pelo Departamento de Psiquiatria da FMUSP. Colaborador do Projeto PROTOC _Hosp Clin São Paulo – USP. 2. Doutora em Medicina pelo Departamento de Psiquiatria da FMUSP. Coordenadora do Ambulatório de Tiques da Infância e Adolescência do Instituto de Psiquiatria do HCFMUSP. Membro do Tourette International Consortium liderado pelo Prof. Roger Freeman, British Columbia University, Vancouver, Canadá. "Cheguei a uma conclusão aterrorizante! Sou eu o elemento decisivo na sala de aula. É a minha abordagem pessoal que cria o clima. É meu estado de ânimo diário que dita o tempo. Como professor, possuo o tremendo poder de tornar a vida de uma criança miserável ou cheia de alegria. Posso ser um instrumento de martírio ou de inspiração divina. Posso humilhar ou alegrar, ferir ou cicatrizar. Em todas as situações, é a minha atitude que determinará se uma crise será bem ou mal conduzida, e, então, uma criança poderá ser humanizada ou marginalizada.” - HAIM GINOTT, professor canadense. Acervo Grupo de Apoio SiTOC – Santos Telefone: (13) 3273-2116 página 2 Dedicatória Dedicamos este texto a todos os maravilhosos educadores que com seu espírito aberto e generoso demonstraram ser possível acolher e educar em escolas comuns as crianças portadoras de transtornos psiquiátricos, entre eles, hiperatividade e déficit de atenção, Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Síndrome de Tourette, além de outras condições Do Brasil e do Exterior Ana Regina e José Carlos Castillo A abordagem psicossocial é crucial nos transtornos do neurodesenvolvimento, pois atingem o desempenho e a aceitação escolar dos pacientes, etapa crucial para a vida social dos portadores, ainda mais que, do ponto de vista farmacológico, estamos longe de um tratamento antitiques ideal, os psicofármacos úteis para o Transtorno ObsessivoCompulsivo são de fato eficazes em 60% dos casos e a psicofarmacologia do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade resolve diversos problemas, mas não todos. A experiência relatada pelas associações de pacientes, particularmente nos EUA e Canadá demonstram, nos últimos 30 anos, que adaptações escolares por vezes muito simples podem ter muita eficácia. Nestes países, o lobby dos pais de portadores conseguiu leis de proteção que impedem que suas crianças sejam expulsas ou punidas por conta de sintomas dos transtornos de desenvolvimento, o que motivou as escolas a encontrarem formas de lidarem com a situação, e houve muitos resultados positivos. Nos parágrafos seguintes, além de um apanhado desta experiência internacional , transcrevemos algo também da nossa própria, do ambulatório de tiques e distúrbios correlatos. A primeira parte da abordagem consiste na psicoeducação, que tem um poder que não se pode negligenciar. Há situações específicas em que esta intervenção se faz suficiente, sem necessidade de se recorrer a medicamentos, no que diz respeito aos tiques. Se houver necessidade de medicação, uma opção é o tratamento das comorbidades, que muitas vezes acaba por melhorar indiretamente os tiques também. O caráter flutuante dos sintomas, todavia, prejudica até a avaliação da melhora clínica, pois o advento da medicação pode coincidir com uma fase de melhora espontânea da doença e gerar uma impressão exagerada da melhora clínica, ou o contrário, iniciar-se a medicação justamente num período de piora espontânea e ficar a falsa impressão de ineficácia terapêutica. Acervo Grupo de Apoio SiTOC – Santos Telefone: (13) 3273-2116 página 3 Psicoeducação Deve-se iniciar uma abordagem de esclarecimento e apoio ao paciente, à família e à escola. Uma primeira etapa é eliminar a falsa noção de que os tiques e os transtornos associados, como o TOC e o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade são voluntários ou propositais. Explicar que há tiques complexos que mimetizam atos intencionais, de forma a se ampliar a tolerância em relação a eles, por parte de familiares e profissionais de educação. É importante que se compreenda o caráter flutuante da intensidade dos sintomas, seus ciclos de piora e melhora, e que este padrão persistirá, mesmo sob uso de medicação, que o paciente não piora "porque quer". Outro ponto que é fundamental que se compreenda é a limitada capacidade de supressão que alguns pacientes possuem. Quando se consegue inibir por um limitado período uma salva de tiques, o preço que se paga é alto; haverá mais tarde uma descarga irreprimível, provavelmente no lar, e é importante que os pais entendam que isso não é proposital. Outra informação importante é que a maioria dos pacientes com tiques ou transtorno de déficit de atenção e hiperatividade apresenta melhora expressiva do quadro clínico na idade adulta. A diminuição do stress familiar quando os familiares compreendem a natureza dos sintomas e se tornam tolerantes com o paciente contribui não só para a melhoria da qualidade de vida, como também para melhoria do quadro clínico em si. Há tiques desencadeados por estímulos sensoriais visuais, auditivos ou seqüências sensoriais - este conhecimento pode ser útil para evitar situações embaraçosas - alguns tiques copro (coprolalia ou copropraxia) são assim desencadeados e é fundamental que sempre se enfatize os pontos fortes ou as qualidades do paciente, como seu talento musical ou esportivo, sua autenticidade ou qualquer resiliência. Manter boa higiene de sono é algo inespecífico, mas que de fato ajuda a diminuir vulnerabilidade à irritação que acomete parcela considerável dos pacientes. Orientação aos professores e educadores é fundamental. Entender o distúrbio evita "demonização" do aluno, desestimula que os colegas façam troça deste. Medidas pedagógicas muito simples podem dar excelentes resultados e evitar conflitos. Por exemplo, uma maleabilidade no sentido de permitir que a criança se ausente da classe um pouco para se aliviar de uma salva de tiques. EM sala de aula (Dicas): Tratando-se de crianças hiperativas, é importante: • ao ajudá-la a não se dispersar, abordá-la com tom de voz calmo, olhando nos olhos, não expondo-a aos colegas e, imediatamente! (pois, se Acervo Grupo de Apoio SiTOC – Santos Telefone: (13) 3273-2116 página 4 demorarmos, o aluno nem se recordará de que o professor está falando, pois os estímulos passam muito rápido em sua mente); • quando houver necessidade de repreensão, a pior política é fazê-la em público, em voz alta, com forte carga emocional; funciona melhor fazer em particular, logo em seguida à transgressão e de uma forma breve, sem carga emocional; • os hiperativos atendem melhor aos comandos simples e diretos, do que à sugestões; • supervisionar logo em seguida ao comando, tipo “marcar homem a homem, quadra inteira”, como se faz no basquetebol. Pela natureza de seu distúrbio, o estudante viola regras, mesmo sem ter esta intenção - tolerância zero, por conseguinte, não se aplica a transtornos com base neurológica. Vale a pena no entanto: Usar linguagem positiva para dar ordens: • em vez de "pare de bater na carteira", dizer "por favor, deixe suas mãos na carteira"; • isto deve ser dito num tom de voz que não sugira que o aluno responda, para evitar opositividade; (evitar dizer, por exemplo: “você não pode parar de bater na carteira ?”, pois dito assim, você pode gerar uma resposta opositiva.) • é uma técnica que requer paciência e treino, mas diminui a chance de desafios. E quando houver desafios pelo aluno? • fique calmo - se você conseguir manter a calma, isto ajuda o aluno a tornar-se calmo; • não tome como ataque pessoal alguma observação inoportuna - isto ajuda a evitar uma disputa de poder, diminui o seu stress e o do aluno; • mantenha o controle - você é o adulto encarregado... Seja um modelo de comportamento a ser seguido. Acervo Grupo de Apoio SiTOC – Santos Telefone: (13) 3273-2116 página 5 Sugestões práticas para apresentação didática: • Dividir uma matéria longa em segmentos de tarefas mais curtas; • Introduzir um conceito de cada vez e checar verbalmente com o aluno as instruções; • Tarefas a longo prazo devem ser subdivididas em tarefas menores com passos seqüenciais e deve-se monitorizar o avanço a cada dia; • Sempre que se abordar pontos cruciais, alertar "isto é importante, preste bastante atenção agora!"; • Permitir o uso de recursos como computador, calculadora e gravador, pois na maior parte dos casos, os portadores têm letra quase ilegível, até por eles mesmos; • Nos livros, iluminar (canetas para “iluminar”) os conceitos importantes; • Não exigir que reescreva um trabalho manuscrito devido à letra, deve-se valorizar o conteúdo e não a grafia; • Permitir respostas orais em vez de escritas, nos casos mais intensos de comprometimento da escrita; • Devido à distraibilidade, deve haver uma maior tolerância de tempo; • Da mesma forma, nos casos de dificuldades de escrita, maior tolerância de tempo, ou permitir o uso de computador, ou, por vezes, recorrer-se à avaliação oral; • Quando se nota que o erro foi pura falha de atenção, dar uma segunda chance. • Incentivar o início e o término das tarefas; • O professor deve verificar se a lição de casa foi anotada completa e corretamente na agenda ou diário do aluno todos os dias. • Fornecer roteiro ou tópicos da aula para os alunos com dificuldade de escrita ou dificuldades atencionais; Acervo Grupo de Apoio SiTOC – Santos Telefone: (13) 3273-2116 página 6 Nos casos de Tourette e TOC, se os tiques vocálicos atrapalham durante as provas, deve-se permitir, caso assim solicite, que o aluno faça sua avaliação em uma sala separada. • Se os tiques ou obsessões impedem que o aluno escreva rápido, pode-se fazer provas orais, ou escrita sem limite de tempo, ou com microcomputador, conforme o mais adequado à situação e sempre com bom senso; • Várias condições podem comprometer a letra cursiva, sua legibilidade ou a rapidez da escrita; • Pode ser útil digitação no computador ou em outro dispositivo; • Fornecer roteiro ou tópicos da aula para os alunos com dificuldade de escrita ou dificuldades atencionais; • Não exigir que reescreva um trabalho manuscrito devido à letra, deve-se valorizar o conteúdo e não a grafia; • Permitir respostas orais em vez de escritas, nos casos mais intensos de comprometimento da escrita; • Devido à distraibilidade, deve haver uma maior tolerância de tempo; • Da mesma forma, nos casos de dificuldades de escrita, maior tolerância de tempo, ou permitir o uso de computador, ou, por vezes, recorrer-se à avaliação oral; • Quando se nota que o erro foi pura falha de atenção, dar uma segunda chance. No que diz respeito ao comportamento, o que pode-se fazer? • Modificar regulamentos e regras que NÃO SE podem aplicar a crianças portadoras de distúrbio de base neurológica e cuja aplicação INTRANSIGENTE pode na verdade tornar-se instrumento de exclusão preconceituosa; • Relevar comportamentos que não sejam extremos; Acervo Grupo de Apoio SiTOC – Santos Telefone: (13) 3273-2116 página 7 •Código de alerta, que o aluno combina com o professor, para sair da sala de aula para se aliviar de tiques ou de momentos de extrema tensão - por exemplo, dizer algo como "posso beber água?"; •Fazer o aluno "Sair de Cena" em eventuais momentos de tensão; •Desenvolver estratégias para lidar com situações que são perturbadoras, porém não deliberadas; •Orientação à equipe pedagógica, aos funcionários e colegas de classe. E para encerrar, achamos interessante fazer uma transcrição da fita de vídeo “Saúde Brasil” sobre TDAH, patrocínio Laboratório Novartis do Brasil: “O GRANDE DESAFIO DA ESCOLA BRASILEIRA”: “A escola está sendo desafiada como talvez nunca tenha sido! Não no método que ela está ensinando, não no projeto pedagógico que ela está desenvolvendo... Ela está sendo desafiada a INCLUIR o diferente! Ela está tendo que sair do padrão do igual, aonde todos eram avaliados de uma forma igualitária na sua condição de aprendizagem (e que muitas vezes não era aprendizagem, era retenção de informação), da soberania de um conteúdo, para um olhar sobre o aprender! E o aprender implica numa diversidade porquanto os indivíduos (o objeto da aprendizagem) são diferentes! Como uma pessoa aprende? Que rota ela adota para aprender? Que tipo de estimulação pode-se adotar para que essa aprendizagem ocorra? Saber isso, abre espaço com certeza, para o diferente, para o diverso, para a diversidade!” Ana Sílvia Figueiral: Psicopedagoga Do Projeto Prodah- Instituto de Psiquiatria da Fac. Medicina da USP e Pedagogia USP Acervo Grupo de Apoio SiTOC – Santos Telefone: (13) 3273-2116 página 8