A desigualdade é a menor em 25 anos

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A desigualdade é a menor em 25 anos
O Bolsa Família deu mais poder às donas de casa e aqueceu a economia de pequenas
cidades. O dinheiro também é usado para comprar eletrodomésticos
Por Martha Mendonça
"O Bolsa Família vai aonde os projetos sociais anteriores não iam”, diz o economista
Ricardo Paes de Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ele se
refere ao número de beneficiados: 11 milhões de famílias. Já nos primeiros anos de
existência, o programa suavizou o nível de pobreza do país – algo que não acontecia
havia três décadas. O impacto, segundo pesquisadores, teria sido três vezes maior que o
de aumentos do salário mínimo.
Segundo pesquisa do Ipea, de 2003 a 2006 o Bolsa Família reduziu 26% da pobreza e
41% da extrema pobreza. A desigualdade social hoje é a menor em 25 anos. Estima-se
que, sem o programa de transferência de renda, essa queda teria sido 20% menor. O
trunfo do Bolsa Família é a cobertura, diz a economista do Instituto de Estudos do
Trabalho e Sociedade (Iets) Sônia Rocha. O que só é possível graças à existência do
Cadastro Único. “Quando se sabe onde estão os pobres, é mais fácil agir. Além de tudo
é barato, porque custa apenas 0,8% do PIB brasileiro”, diz Sônia.
Menos pobres, mais bem alimentados. De 2004 a 2006 foi registrada uma redução de
27,3% no número de famílias com insegurança alimentar grave ou vulnerabilidade à
fome, de acordo com pesquisa da Unicamp, com base em dados do IBGE. A pesquisa
mostrou que, nos últimos dez anos, as políticas sociais reduziram em mais de 50% a
desnutrição de crianças menores de 5 anos. A professora do Departamento de Medicina
Preventiva e Social da Unicamp Ana Segall defende o foco do Bolsa Família. “O
programa está dirigido a uma população de extrema vulnerabilidade e tem sido eficaz”,
afirma.
As famílias beneficiárias não querem só comida. Querem comida, roupas,
eletrodomésticos, material escolar (leia a tabela na próxima página). Responsável por
estudo do Ibase em 229 municípios brasileiros, a pesquisadora Mariana Santarelli
defende a diversificação. “Não há regra que determine onde gastar, e o beneficiário
conhece suas necessidades melhor do que ninguém. O Estado não deve tutelá-lo”,
afirma. O Ibase chegou a famílias que usaram o dinheiro para comprar geladeira, cama e
fogão. “Não creio que tais bens possam ser considerados supérfluos”, diz Mariana.
O Bolsa Família aqueceu a economia em pequenas cidades, em especial do Norte e do
Nordeste, onde mais da metade dos benefícios é paga. Alagoas é um exemplo: tem 3
milhões de habitantes e 1,4 milhão deles recebem recursos do Bolsa Família. Professor
da Universidade Federal de Alagoas, o economista Cícero Péricles de Carvalho
publicou um estudo chamado Economia Popular – Uma Via de Modernização para
Alagoas. Foi citado na revista inglesa The Economist em fevereiro deste ano, em
reportagem elogiosa sobre o Bolsa Família. Faz uma conta simples: “Cerca de 1,4
milhão de alagoanos recebem, por ano, R$ 380 milhões do Bolsa Família. O que
representa para a economia de Alagoas? Muito. Basta comparar com o corte da cana.
Neste ano, haverá uma safra de 30 milhões de toneladas de cana-de-açúcar. Cada
tonelada de cana cortada paga R$ 3 ao trabalhador, um total de R$ 90 milhões. Toda a
massa salarial gerada no corte da cana representa menos de uma quarta parte do Bolsa
Família”.
Para o chefe do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo, Joaquim
Guilhoto, o Bolsa Família fez pelo Nordeste algo inédito. “Por décadas, a Sudene
(Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) subsidiou projetos para a região.
Mas nenhuma ação foi tão boa quanto a transferência direta de recursos”.
As mulheres dominam o programa. O controle desses recursos deu a elas um novo
papel. Além de cuidar do lar, de alguma forma também o gerenciam financeiramente.
Em 2006, a antropóloga Mireya Suárez, da Universidade Federal de Brasília, foi a dez
municípios e entrevistou 145 beneficiárias do Bolsa Família. O discurso era parecido: a
vida da família melhorou e a condição delas como mulheres também. “Como são
responsáveis pelo dia-a-dia da casa e dos filhos, ter em mãos uma soma fixa lhes
outorgou maior autoridade”, diz Mireya.
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