Ao mudar o meio ambiente estamos alterando nosso genoma Ninguém duvida que a tecnologia protege o homem e torna a vida no planeta Terra menos sofrida. Casacos nos abrigam do frio, antibióticos combatem o ataque de bactérias, e partos feitos através de cesáreas evitam a morte de mães e filhos. Muitas pessoas acreditem que o desenvolvimento tecnológico tornou o ser humano imune ao processo de seleção natural. Mas como sempre, a realidade é mais complexa. Estudos recentes demonstram que a adoção de novas tecnologias modifica o ambiente em que vivemos, estas alterações são incorporadas pelo processo de seleção natural, e acabam alterando nossos genes. O processo de seleção natural, descoberto por Darwin, é fácil de entender. Quando o ambiente ocupado por um ser vivo se altera os indivíduos menos capazes de sobreviver nas novas condições deixam menos descendentes. Apos algumas gerações os descendentes dos mais bem adaptados vão constituir a maioria da população. É o que ocorreu com as mariposas brancas e pretas na Inglaterra. Antes da revolução industrial as cascas das árvores eram claras. Uma mariposa branca pousada em uma casca de árvore clara não era notada, escapando de virar alimento de passarinho. As poucas mariposas pretas só podiam se camuflar nas árvores de casca escura. No auge da revolução industrial, com a fuligem gerada pelas fábricas, as cascas das árvores ficaram mais escura. As mariposas claras passaram a ser facilmente identificadas e devoradas. Já as escuras, mais adaptadas ao novo ambiente, eram menos atacadas e aos poucos foram ocupando o lugar das mariposas claras. É a seleção natural em ação. O que muitos acreditavam até recentemente é que o homem estava ficando imune a este processo. Se a temperatura esfriava, desenvolvíamos casacos, se aparecia um novo predador (como o vírus H1N1) lançávamos mão de uma nova vacina. Desta maneira ao invés de sobreviverem seres humanos portadores de genes que os tornavam mais resistentes ao frio ou ao novo vírus, sobreviveriam os humanos com acesso às tecnologias (casaco e vacina). Mas a realidade é mais complexa. O que foi descoberto é que muitas das tecnologias desenvolvidas pelo homem alteram o meio ambiente em que vivemos, e que este novo meio ambiente favorece a sobrevivência de pessoas portadoras de genes compatíveis com a nova realidade O exemplo mais bem estudado é o da domesticação de animais leiteiros. Faz aproximadamente 10.000 anos que domesticamos estes amimais. Uma das vantagens desta tecnologia é a possibilidade de nos alimentarmos de seu leite. Nosso meio ambiente, que antes disponibilizava frutas, raízes e carne, agora disponibiliza um novo alimento, o leite. O que os geneticistas descobriram agora é que nas populações em estes animais não foram domesticados, e o leite não foi incorporado na dieta (por exemplo os índios americanos), a intolerância a lactose (uma açúcar presente no leite) é muito freqüente. Estas pessoas quando bebem leite têm problemas de digestão e diarréia. Por outro lado, em todas as populações que desenvolveram a tecnologia de criar vacas e carneiros, foi selecionado um novo gene que permite a digestão da lactose. O que os geneticistas acreditam é que ao longo dos últimos 10.000 anos a vantagem reprodutiva das pessoas capazes de se alimentar de leite fez com eles deixassem mais descendentes que as pessoas incapazes de digerir lactose. Aos poucos a freqüência destas pessoas foi aumentado e hoje elas são maioria nas culturas que dominam a tecnologia de criar animais leiteiros. Portanto, se você tolera lactose provavelmente seus ancestrais criavam cabras ou vacas leiteiras. A tolerância a lactose é um exemplo, mas nos últimos anos foram descobertas dezenas de características genéticas presentes no ser humano moderno que provavelmente foram selecionadas porque nos tornam mais adaptados à mudanças no ambiente causadas por tecnologia que nós mesmo desenvolvemos. Em outras palavras o que parece estar ocorrendo é que ao desenvolvermos novas tecnologias, provocamos mudanças em nosso meio ambiente, que acabam alterando o genoma de nossa espécie. Mais informações: How culture shaped the human genome: bringing genetics and the human sciences together. Nature Reviews Genetics vol. 11 pag 137 2010 Fernando Reinach ([email protected])