Flaviane Romani Fernandes RA 981196 Introdução à Sintaxe LL013 Resenha da tese de doutorado Para uma sintaxe da inversão sujeito-verbo em Português1 0. Introdução A tese de Âmbar (1992) tem como objetivo o estudo das estruturas de Inversão Sujeito Verbo em Português Europeu (doravante PE) no quadro atual da Gramática Gerativa – “Government and Binding Theory”. Essa tese está dividida em três grandes partes: Parte I – Questões Preliminares, Parte II – Os contextos de Inversão Sujeito Verbo e Parte III – Inversão sujeito Verbo na Teoria da Regência e da Ligação. Nesta presente resenha trataremos de cada uma dessas partes de modo sucinto, elencando como pontos principais os seguintes tópicos: 1. Caracterização preliminar do fenômeno Inversão Sujeito Verbo em PE; 2. A ‘ordem básica’ não marcada em PE; 3. Inversão Sujeito Verbo obrigatória versus Inversão Sujeito Verbo facultativa; 4. Os contextos de ocorrência de inversão Sujeito Verbo e inversão Sujeito Verbo Auxiliar em PE e 5. O fenômeno Inversão Sujeito Verbo na Teoria de Regência e de Ligação. 1. Caracterização preliminar do fenômeno Inversão Sujeito Verbo em PE Conforme a definição de Âmbar (1992:5), a Inversão Sujeito Verbo (doravante ISV) pode ser caracterizada como a alteração da ordem de constituintes resultante de uma operação de movimento que desloca da sua posição de base ou o sujeito ou o verbo de uma estrutura frásica, convertendo a ordem básica de uma língua SVO (sujeito-verbo-objeto), numa ordem em que o verbo precede o sujeito, i.e., numa ordem VSO (verbo-sujeitoobjeto), VOS (verbo-objeto-sujeito) ou OVS (objeto-verbo-sujeito). Assumindo como ordem básica do PE a ordem SVO, a autora propõe duas hipóteses possíveis para o fenômeno ISV: ou o sujeito se desloca para a direita do verbo ou o verbo se desloca para a esquerda do sujeito. Consideremos as frases2 (1), (2), (3) e (4) bem como 1 Âmbar, M. M. (1992) Para uma sintaxe da inversão sujeito-verbo em Português. In: Coleção Estudos Lingüísticos. Edições Colibri, Lisboa. 2 Todas as frases utilizadas como exemplos nesta resenha foram extraídas do trabalho de Âmbar (1992). As frases utilizadas por Âmbar (1992) não constam de nenhum corpus previamente definido, mas são o resultado de uma introspecção lingüística legitimada pela intuição de alguns falantes do PE que, de forma idealizada, a autora assume corresponder a uma competência gramatical do PE no que respeita a seu objeto de estudo. suas respectivas análises, ambas (frases e análises) apresentadas por Âmbar (1992:5), como ilustração do exposto: (1) Que comprou o Pedro? (2) Colheu os morangos, o Diogo. (3) O Diogo colheu os morangos. (4) Colheu o Diogo os morangos. Segundo a análise de Âmbar (1992), levando em conta a ordem SVO assumida para PE, para a frase (1), as duas hipóteses acima relacionadas poderiam ser admitidas, já para as demais frases, a autora considera (3) como estrutura subjacente de (2) e (4) e estas sendo derivadas de (3) respectivamente pelos processos de posposição do sujeito e anteposição do verbo (tratar-se-á mais detalhadamente destas questões na seção 5 da presente resenha). A autora ainda acrescenta que, tendo em conta o caráter [+ obrigatório/ - obrigatório] da inversão, constata-se que a frase (1) se distingue das frases (2) e (4): naquela, mas não nestas, a inversão é obrigatória. Levando em conta as considerações acima feitas, o trabalho de Âmbar (1992) é guiado pelas seguintes questões postas pela mesma autora: (i) (ii) (iii) (iv) (v) (vi) (vii) Será o Português uma língua SVO? Da resposta depende naturalmente a pertinência de considerar ou não que, numa estrutura em que o sujeito segue o verbo, houve ISV; Será ISV sempre igualmente possível? Ou será nalguns casos facultativa, noutros obrigatória e noutros impossível? Quais os contextos de ocorrência de ISV? Quais os processos sintáticos envolvidos em ISV – anteposição do verbo ou posposição do sujeito? Que ordens derivadas são possíveis? Qual a tipologia de ISV em Português, de acordo com os parâmetros referidos em (i) – (v)? Por que existem inversões nas línguas naturais? Por que são elas obrigatórias, facultativas ou impossíveis em umas línguas e não em outras? 2. A ‘ordem básica’ não marcada em PE Tomando o PE como língua objeto, verificam-se seis ordens possíveis resultantes das diferentes combinações dos termos sujeito (S), verbo (V) e objeto (O): SVO, SOV, VSO, OSV, OVS e VOS. Respectivamente: (53) 3 3 a. A Joana comeu a sopa. (SVO) b. A Joana, a sopa, comeu. (SOV) Nas frases extraídas do trabalho de Âmbar (1992), as vírgulas representam pausas prosódicas, enquanto as palavras em letras maiúsculas são palavras nas quais recai o acento contrastivo. c. Ontem comeu a Joana a sopa. (VSO) d. A sopa, a JOANA comeu. (OVS) e. A sopa, comeu a Joana. (OVS) f. Comeu a sopa, a JOANA. (VOS) Conforme a autora, com exceção de (a), todas as frases acima relacionadas exigem que se verifiquem determinadas condições. (a) é a única frase que não requer pausa e/ou acento contrastivo num dos seus constituintes. Observa-se que em (c) surge, em posição inicial da frase, um constituinte “ontem” que não ocorre nas outras construções, mas que, do ponto de vista da legitimação da ordem VSO, desempenha na frase referida a mesma função que os elementos pausa e acento contrastivo desempenham nas demais construções de (53). De um ponto de vista empírico Âmbar (1992) admite, por convenção, que, como ponto de partida para o estudo das ordens derivadas, a ordem básica de uma língua é aquela que ocorre de forma menos marcada. Por ‘marcada’, entenda-se, segundo a mesma autora, a ordem que se encontra associada a uma condição (de caráter sintático, semântico, prosódico ou pragmático) específica (grifo meu). Nas frases de (53) a ordenação SVO em (a) não exige pausa, acento contrastivo, advérbio em posição inicial, elemento QU interrogativo ou qualquer outro requisito estrutural deste tipo, logo, SVO é a ordem básica de PE admitida pela autora. Âmbar (1992:45) ainda acrescenta que ordem não marcada é a ordem resultante da combinação nua dos elementos S, V e O, mas não é a ordem que pode sempre ocorrer – uma língua pode ter uma ordem básica SVO e não permitir essa ordem se determinados elementos estiverem presentes. Como exemplo cita o caso das interrogativas – QU em PE, nas quais a presença do elemento QU impede a produção da ordem básica SVO como ordem gramaticalmente aceita na estrutura superficial: (5) a. Que comprou a Maria? b. * Que a Maria comprou? (6) a. Onde foi a Maria? b. * Onde a Maria foi? 3. Conceitualização de Inversão Sujeito Verbo obrigatória versus Inversão Sujeito Verbo facultativa Âmbar (1992) define como inversão sujeito verbo obrigatória o processo sintático de alteração da ordem Sujeito verbo em Verbo Sujeito que, se não verificada, resulta em uma frase agramatical. Ex.: (3) a. * Que o Pedro fez? b. * Que o PEDRO fez? c. Que fez o Pedro? Voltemos nossa atenção agora para o exemplo (4): (4) a.* Em Paris, o Pedro esteve. b. Em Paris, o PEDRO esteve. c. Em Paris esteve o Pedro. Conforme a autora, a inversão de (4c) é facultativa na medida em que para a produção legítima da frase ela pode alternar com outro processo gramatical, como exemplo (4b), mesmo sendo este outro processo gramatical do âmbito de uma componente da gramática diferente da sintática (no exemplo 4b, a componente é a fonética). Acrescenta-se que no exemplo 3a, mesmo que se apliquem estratégias prosódicas, como o acento contrastivo, ainda é obtida uma frase agramatical como resultado (3b). Apenas a aplicação de processos sintáticos, como a ISV ou o uso da estrutura é que: (O) que É QUE o Pedro fez?, legitima a produção de frases deste tipo (cf. exemplo 3c). Portanto, segundo assunção de Âmbar (1992:57), inversões Sujeito Verbo obrigatórias seriam aquelas que só poderiam ser substituídas por processos sintáticos de licenciamento e inversões Sujeito Verbo facultativas seriam aquelas em que processos não sintáticos podem alternar com processos sintáticos para o licenciamento das frases. É necessário adicionarmos que a referida autora defende serem tanto as inversões obrigatórias como as inversões facultativas fenômenos gramaticais. Assim sendo, para Âmbar (1992), as inversões facultativas, assim como as inversões obrigatórias, são consideradas fenômenos gramaticais e não estilísticos. 4. Os contextos de ocorrência de inversão Sujeito Verbo (ISV) e inversão Sujeito Verbo Auxiliar (ISAux) em PE Nesta seção apresentaremos brevemente os contextos típicos4, determinados por Âmbar (1992), de ocorrência de ISV e ISAux em PE. 4.1. ISV e ISAux em interrogativas QU- diretas e indiretas: A inversão em interrogativas QU- diretas é obrigatória (6a) sempre que o constituinte interrogativo não integra um N foneticamente realizado; quando isso acontece (21), a inversão se torna facultativa. Neste caso, se ausente a inversão, deve, segundo a intuição lingüística de um grande número de falantes de PE, para uma maior aceitabilidade das frases, recair sobre o sujeito ou sobre o constituinte QU- um acento de intensidade (21b e 21b’). Exemplos: (6) a. (O) Que ofereceu o Pedro à Joana? b. * (O) Que o Pedro ofereceu à Joana? (21) a. ? Que disco o Pedro ofereceu à Joana? b. Que disco O PEDRO ofereceu à Joana? b'. QUE DISCO o Pedro ofereceu à Joana? Já a inversão em interrogativas indiretas é facultativa (28) integrando ou não, essas interrogativas, um N foneticamente realizado (36) – excetua-se o que acontece com os elementos QU- interrogativos que (26) e porque (31): (28) a. Não sei quem encontrou o João no cinema. b. Não sei quem o João encontrou no cinema. (26) a. Não sei que ofereceu o Pedro à Joana. b. * Não sei que o Pedro ofereceu à Joana. (31) a. Não sei porque saiu a Rita. b. ?* Não sei porque a Rita saiu. (36) a. Não sei que disco o Pedro ofereceu à Maria. b. Não sei que disco ofereceu o Pedro à Maria. Faz-se necessário notar que a ocorrência de é que tanto nas interrogativas diretas como nas indiretas permite em todos os casos a ordem S_V e, se coexistentes é que e inversão, as frases se tornam marcadas em termos de aceitabilidade. 4 Âmbar (1992:53) explicita que construções imperativas e exclamativas não farão parte de seu objeto de estudo no que concerne aos contextos em que ocorrem ISV e ISAux. Quanto à posição do sujeito nas estruturas de inversão em interrogativas diretas e indiretas, ele ocorre em posição pós-verbal (16a e 39b) ou no final da frase (16b, 16b’ e 39b). Tratando-se de um pronome, a posição final de frase é marginal (44b e 46c). Na presença de um verbo auxiliar e de uma inversão, o sujeito pode ocorrer em posição pósverbo auxiliar (44a e 46a), pós-verbo principal (46b) e em posição final de frase (44b e 46c), contudo, é menor a aceitabilidade nesta última posição do que nas outras. Exemplos: (16) a. (O) que ofereceu o Pedro à Joana? b. ? (O) que ofereceu à Joana o Pedro? b'. (O) que ofereceu à Joana O PEDRO? 5 (39) a. Não sei por que razão a Rita saiu. b. Não sei por que razão saiu a Rita. (44) a. Onde tem ele posto os livros? b. *? Onde tem posto os livros ele? (46) a. Não sei onde tem ele posto os livros. b. ? Não sei onde tem posto ele os livros. c. ?* Não sei onde tem posto os livros ele. 4.2. ISV em interrogativas totais e focalizadas em orações principais e em subordinadas No geral, as interrogativas totais ou focalizadas não são estruturas típicas de inversão: (48) a. A Joana come a sopa? b. ?? Come a Joana a sopa? Todavia, ISV pode ocorrer nestas construções quando está associada a elas uma modalidade de dúvida (70, 72 e 47’) 6 e não um pedido de informação. (70) a. Comprará a Joana o livro? b. ?? Comprará o livro a Joana? b'. ?? Comprará o livro A JOANA? (72) a. Terá o Pedro ido ao cinema? b. ? Terá ido o Pedro ao cinema? c. ?? Terá ido ao cinema o Pedro/ O PEDRO? (47’) a. ?? Achas que vai o Pedro ao cinema? b. ? Sabes se vai o Pedro ao cinema? 5 Note que embora as três frases sejam consideradas gramaticais, o exemplo 16b só se torna gramaticalmente tão aceitável quanto 16a se naquele recai um acento contrastivo no sujeito, resultando em 16b’. 6 Nestes casos, os tempos gramaticais requeridos são o Futuro ou o Condicional, tanto com verbos principais como com auxiliares, modais ou copulativos. Em relação à colocação do sujeito nessas estruturas de inversão, são observadas as mesmas normas referidas para o caso das interrogativas QU- diretas e indiretas, ou seja: (i) a posição preferencial é aquela em que o sujeito segue imediatamente o verbo ou o primeiro constituinte verbal auxiliar (70a, 72a e 47’) e (ii) o sujeito pode ocorrer depois do verbo principal em estruturas com auxiliar (72b) e em posição final (72c), se não se tratar de um pronome. 4.3. ISV e ISAux em pergunta-resposta e em parentéticas As duas estruturas pergunta-resposta ( ex. 78 e 88) e parentéticas (ex. 92) são agrupadas por Âmbar (1992) em uma mesma seção para o tratamento de contextos de ocorrência de ISV e ISAux, pois compartilham das mesmas propriedades: (i) presença de um elemento cognitivo novo – o foco (respectivamente nos exemplos abaixo: o Pedro, a Joana e o António); (ii) uma unidade discursiva anterior que é assumida como informação partilhada pelo emissor e pelo receptor – o tópico (respectivamente nos exemplos abaixo: O JOÃO foi ontem ao cinema?, Quem comeu o chocolate?, Que tens tu?) ; (iii) o elemento Foco é encontrado em posição pós-verbal e o elemento Tópico é encontrado em posição inicial. (78) O JOÃO foi ontem ao cinema? - Não, (o João não foi ontem ao cinema,) (ontem) (ao cinema) foi o Pedro. (88) – Quem comeu o chocolate? a. Comeu a Joana. a'. * A Joana comeu. a". ?* A JOANA comeu. (...) (92) a. – Que tens tu? – perguntou o António. b. * - Que tens tu? – o António perguntou. 4.3.1. ISV em respostas a interrogativas totais ou focalizadas As respostas possíveis a interrogativas totais seguem o padrão de ordem básica SVO do PE, quando a interrogativa não incide sobre um constituinte específico, mas sobre toda a proposição: (77) O João foi ontem ao cinema? - Foi (, o João foi ontem ao cinema). - Não (, não foi) (, o João não foi ontem ao cinema). Porém, se por outro lado, através de uma marca prosódica como o acento contrastivo, a interrogativa se restringe a um dos constituintes, surge ISV na resposta, sendo o constituinte interrogado o sujeito e sendo a informação veiculada pela resposta nova em relação ao elemento cognitivo já conhecido. Se a interrogação incidir sobre um constituinte diferente do sujeito, não se verifica a alteração da ordem básica SVO. Exemplos: (78) O JOÃO foi ontem ao cinema? - Não, (o João não foi ontem ao cinema,) (ontem) (ao cinema) foi o Pedro. (79) O João foi ONTEM ao cinema? - Não, (o João não foi ONTEM ao cinema) (ao cinema) (, o João) foi hoje. (80) O João foi ontem AO CINEMA? - Não, (o João não foi ontem ao cinema,) (ontem) (o João) foi ao teatro. 4.3.2. ISV em respostas a interrogativas QUAssim como nas respostas a interrogativas totais ou focalizadas, também nas respostas a interrogativas QU-, ISV só ocorre quando o constituinte instanciado pela pergunta é o sujeito (88a). Nota-se entretanto, que diferentemente do que ocorre nas respostas a interrogativas totais ou focalizadas, nas respostas a interrogativas QU-, a resposta é sempre um Foco, nunca é possível apenas afirmar ou negar a informação já contida na pergunta e, marginalmente, o foco pode ser legitimado por um acento de intensidade sobre o sujeito: (88) – Quem comeu o chocolate? c. Comeu a Joana. a'. * A Joana comeu. a". ?* A JOANA comeu. (...) 4.3.3. ISV em parentéticas Em parentéticas a inversão sujeito verbo é obrigatória: (91) a. Vou-me embora – anunciou o Gonçalo. b. * Vou-me embora – o Gonçalo anunciou. (92) a. – Que tens tu? – perguntou o António. b.* - Que tens tu? – o António perguntou. Como nas construções pergunta-resposta, a frase que antecede a parentética é, do ponto de vista informacional, um tópico enquanto o sujeito, um foco. Além dos pontos levantados no início da seção 4.3., outros pontos que devemos destacar de semelhantes entre as estruturas respostas a interrogativas totais ou focalizadas, respostas a perguntas QU- e parentéticas são os pontos relacionados ao fenômeno ISV: a) na presença de um operador Foco, a ISV é marginalmente dispensada; b) de forma marcada, o Foco pode ser legitimado por um acento de intensidade sobre o sujeito, em alternativa à ISV ou a outro processo sintático de legitimação de Foco (por operador). Porém, neste caso, a interpretação é [-definida] em oposição à interpretação [+definida] dada pela ISV. 4.4. ISV e ISAux no contexto de constituintes antepostos No contexto de anteposição de constituintes, as inversões são obrigatórias quando, depois da anteposição do constituinte, o verbo surge sem qualquer outro constituinte a sua direita e se caracteriza por ser um verbo semanticamente fraco. Cf. Âmbar (1992: 85), por verbo semanticamente fraco entenda-se o verbo que, uma vez localmente desprovido do constituinte que lhe servia de argumento (o constituinte anteposto), não tem incorporado um argumento implícito. Exemplo: (110) a. O Pedro mora em Lisboa. b. * Em Lisboa, o Pedro mora. c. * EM LISBOA, o Pedro mora. d. * Em Lisboa, O PEDRO mora. e. Em Lisboa mora o Pedro. A posição ocupada pelo sujeito nas ISV em contexto de constituintes antepostos, segue a norma das inversões descritas nas seções precedentes, ou seja: : (i) a posição preferencial é aquela em que o sujeito segue imediatamente o verbo ou o primeiro constituinte verbal auxiliar e (ii) o sujeito pode ocorrer depois do verbo principal em estruturas com auxiliar e em posição final, se não se tratar de um pronome. Também em relação às inversões já descritas, cabe acrescentar que as ISV em contextos de constituintes antepostos são paralelas às primeiras nos seguintes aspectos: a) quanto à estrutura textual (informacional), o sujeito que, como resultado de ISV, surge em posição pós-verbal tem a interpretação de Foco e o constituinte anteposto tem a interpretação de Tópico; b) em alternância à ISV, o Foco é legitimado por outras estratégias – sintática (operador de Foco: Em Lisboa, apenas o Pedro mora.) ou fonética (acento de intensidade: Em Lisboa, o Pedro MORA). 4.5. ISV em estruturas infinitivas Quanto às ISV no contexto de estruturas infinitivas, destacam-se os seguintes pontos: (i) em estruturas de infinitivo independentes, a forma menos marcada é aquela em que ocorre ISV, podendo, entretanto a ISV alternar com a ordem S_V: (160) a. Dizeres-me tu a verdade! b. TU dizeres-me a verdade! (ii) a inversão é obrigatória em estruturas infinitivas complementos de verbos epistêmicos e declarativos (174) e de verbos de “elevação” do tipo “parecer”. Entretanto, na presença de um operador de foco e de um auxiliar a ordem S_V pode ser mantida na subordinada infinitiva destes verbos(186’’); (174) a. “*Eu penso/afirmo os deputados terem trabalhado pouco.” b. “Eu penso/afirmo terem os deputados trabalhado pouco.” (Raposo, 1987:87 apud Âmbar, 1992:92 – grifo meu) (186’’) a.?? Penso só os deputados votarem a proposta. b. Penso só os deputados terem votado a proposta. (iii) infinitivos não flexionados complementos de verbos volitivos podem co-ocorrer com pronomes sujeito foneticamente realizados. Neste caso, ISV é obrigatória: (197) a. Os meninos querem fazer eles o trabalho. (grifo meu) (198) a. * Os meninos querem eles fazer o trabalho. (grifo meu) (199) a. * Os meninos querem fazer o trabalho eles. (grifo meu) Quanto a posição do sujeito neste tipo de estruturas de inversão, é atestado o que já foi dito nas seções anteriores. 4.6. ISV em estruturas de Conjuntivo Assim como já foi dito para os casos de estruturas infinitivas independentes, também no caso de conjuntivos independentes, as frases mais naturais são aquelas que apresentam ISV (208 e 208’): (208) a. “Chovam lírios e rosas no teu colo!” (Antero de Quental, SC, 35, apud Âmbar, 1992: 102) (208’) a. ? LÍRIOS E ROSAS chovam no teu colo! Também nas estruturas de conjuntivo subordinadas, são mais naturais as frases em que ocorre ISV (226a) e marginais as frases em que a ISV não ocorre (227a). Porém, na presença de complementador e de um verbo não ergativo, a inversão torna-se marginal (228’). Exemplos: (226a) Tivesse eu tempo e havias de ver como tudo corria bem. (227a) ? EU tivesse tempo e havias de ver como tudo corria bem (228’) ?* Se tivesse eu tempo, havias de ver como tudo corria bem. Acrescenta-se que a posição do sujeito nestas estruturas de inversão segue as mesmas normas observadas para a generalidade dos casos de inversão já referidos: posição pósverbo auxiliar, pós-verbo principal e final se não se tratar de um pronome. O constituinte em posição final surge normalmente associado a um acento de intensidade. Em relação à estrutura textual (informacional), pode-se dizer que em todos os casos, o constituinte em posição pós-verbo auxiliar, pós-verbo principal ou final recebe uma interpretação de Foco; esta mesma interpretação pode ser atribuída aos sujeitos que mediante um acento de intensidade podem manter a posição pré-verbal. 4.7. ISV em estruturas participiais Nas construções participiais são mais naturais as estruturas em que ISV está presente. A ordem S_V torna-se possível se há a co-ocorrência com uma expressão adverbial lexical de valor aspectual; na ausência desta expressão, a ordenação S_V, se não é impossível, é marginal. Como ilustração do que foi exposto, atentemo-nos ao exemplo (248): (248) a. Paga a conta, o Pedro ficou arruinado. b. ?? A conta paga, o Pedro ficou arruinado. c. Uma vez paga a conta, o Pedro ficou arruinado. d. ? Uma vez a conta paga, o Pedro ficou arruinado. Ao contrário do que acontece com as estruturas em que o predicado é um particípio, como em (248), em que a inversão melhora a aceitabilidade das frases, nas small clauses7 com predicados adjetivais, nominais ou preposicionais, a ocorrência da inversão torna as frases piores gramaticalmente: (249) b. *Uma vez apresentável a Rita, o Pedro abriu a porta aos amigos. (250) b. *Uma vez médica a Maria, os pais ficaram felizes. (251) b. *Uma vez na praia as crianças, a Ana vai descansar. 4.8. ISV em estruturas gerundivas Com exceção dos casos que têm um valor imperativo (Andando! - Saindo!) e que se comportam como as estruturas independentes de infinitivo não flexionado, as construções gerundivas surgem na sua forma não marcada em estruturas subordinadas adverbiais. No que diz respeito à ocorrência de ISV em estruturas gerundivas, pode-se dizer que com sujeitos disjuntos são melhores gramaticalmente as construções que exibem um auxiliar ou que são introduzidas por um elemento em. Na ausência deste elemento, a inversão sujeito verbo é obrigatória. Exemplos: (278) a. *? Comprando o João o livro, abandonamos a livraria. b. Tendo o João comprado o livro, abandonamos a livraria. (279) a. ? Em comprando o João o livro, saímos da livraria. b. Em o João comprando o livro, saímos da livraria. 4.9. ISV no contexto de ergativas e passivas Âmbar (1992) reúne ergativas e passivas em um mesmo item ao tratar dos contexto em que ISV está presente pelo fato de, cf. a autora, essas construções partilharem um conjunto de propriedades que definem a chamada hipótese inacusativa, na terminologia de Perlmutter (1978) ou ergativa, na terminologia de Burzio (1981) e de Chomsky (1981). Assim, nas palavras de Burzio (1981:45), são construções ergativas ou inacusativas aquelas cujos verbos, não sendo capazes de atribuir Caso aos seus complementos, fazem com que estes se desloquem para uma posição onde possam aceder a ele. Esses verbos aparecem em estrutura profunda com um objeto direto, e com um sujeito não-temático, i.e., 7 Por small clause entende-se, cf., entre outros, Williams (1975, 1980, 1983), Jackendoff (1977), Chomsky (1981) e, para o Português Marrafa (1985), a estrutura oracional que se caracteriza por ter um sujeito ao qual é atribuído o caso pelo verbo matriz e papel temático pelo seu predicado, podendo ser este da categorial adjetival, nominal, preposicional ou participial. Um exemplo clássico é constituído por frases do tipo: Considero [o João um gênio]. com um sujeito não referencial (geralmente vazio). Nesta perspectiva, frases passivas (Foram entregues as cartas. – Âmbar, 1992:123) e inacusativas propriamente ditas (Aconteceu no Rio, como acontecem tantas coisas. (grifo meu) – Carlos Drumond de Andrade, CB, 30, apud Âmbar, 1992) se enquadrariam em um mesmo conjunto: construções ergativas ou inacusativas. No que se refere especificamente a ISV, destacam-se, segundo Âmbar (1992:131132), os seguintes pontos: (i) em construções ergativas, o sujeito, independentemente do seu caráter [+/-definido], ocorre depois do verbo se se verificarem as seguintes condições: a) não ocorrer à direita do verbo nenhum outro constituinte por ele subcategorizado; b) ocorrer, no caso de não se verificar a condição a), um constituinte em posição inicial de frase; (292) c. Chegaram os delegados alemães. (295) a. Ontem chegaram os delegados alemães a Lisboa. (ii) os sujeitos indefinidos podem sempre ocorrer depois do verbo, abstração feita das condições de (i); (292) b. ?* Chegaram os delegados alemães ontem. (294) a. Chegaram delegados alemães ontem. (iii) (iv) a posição ocupada pelos sujeitos pós-verbais nas construções ergativas segue as normas estabelecidas para as mesmas posições noutros contextos; nas estruturas passivas a posição pós-auxiliar ser é bastante marginal para os sujeitos definidos e completamente excluída para os indefinidos; (315) a. *? Foram as cartas entregues aos prisioneiros. c. * Foram cartas entregues aos prisioneiros. (v) a situação descrita em (iv) altera-se se as frases forem integradas em contextos em que são introduzidas expressões adverbiais (frásicas ou não frásicas). A agramaticalidade dada pela posição pós-verbo auxiliar do sujeito nestas construções não é, no entanto, totalmente se se tratar de um SN definido: (316) a. Finalmente foram as cartas entregues (aos prisioneiros)! d. ? Finalmente foram cartas entregues (aos prisioneiros)! 5. O fenômeno Inversão Sujeito Verbo na Teoria de Regência e de Ligação Nesta seção faremos uma breve apresentação da Teoria de Regência e de Ligação e da interpretação dada por Âmbar (1992) ao fenômeno ISV em PE dentro desta teoria. 5.1. A Teoria de Regência e de Ligação Na Teoria de Regência e de Ligação (do inglês: Government and Binding Theory), apresentada em Chomsky (1981), o caráter altamente estruturado da Gramática Universal é atualizado num sistema com arquitetura modular consistindo em vários subsistemas em interação. Desses subsistemas podemos destacar dois subsistemas maiores: (i) o sistema de regras – com várias subcomponentes – e (ii) o sistema de princípios – com vários subsistemas de princípios, geralmente designados por teorias. Segundo a versão dada em Chomsky (1981) da teoria acima referida, o sistema de regras é constituído pelas seguintes subcomponentes: (i) léxico; (ii) sintaxe (a. componente categorial e b. componente transformacional); (iii) Forma Fonética (FF) (do inglês: Phonetic Form (PF)); (iv) Forma Lógica (FL) (do inglês: Logical Form (LF)). Essas subcomponentes aparecem assim organizadas, cf. Chomsky (1981): Léxico Estrutura-P Mova Estrutura-S / \ FF (iii) FL (iv) Por sua vez, o sistema de princípios, em interação com os diferentes níveis e componentes apresentados logo acima, inclui na Teoria de Regência e de Ligação (doravante TRL), como formulada em Chomsky (1981), os seguintes princípios: a. Teoria dos Nós-Fronteira (Bounding Theory), b. Teoria da Regência (Government Theory), c. Teoria Temática (-Theory), d. Teoria da Ligação (Binding Theory), e. Teoria do Caso (Case Theory) e f. Teoria do Controle (Control Theory). 5.2. A análise do fenômeno ISV em PE feita por Âmbar (1992) no âmbito da TRL