AÇÃO PENAL E AÇÃO CIVIL EX DELICTO Professor: Thiago Galindo Placheski CONCEITO • A maioria doutrinária define ação penal como “o direito público subjetivo de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo a um caso concreto”; (2014, p. 185). • Renato Brasileiro de Lima, entretanto, diferencia o direito de ação, que seria o direito de provocar o Estado, da própria Ação, que seria o ato por meio do qual o Estado é provocado a prestar tutela jurisdicional. PREVISÃO LEGAL • A ação penal é tratada tanto no Código Penal (artigos 100 a 106), quanto no Código de Processo Penal (artigos 24 a 62). • Na CF/88 também há previsão de ação penal (art. 129, I e art. 5°, LIX). CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DE AÇÃO PENAL • A) é um direito público (invoca a prestação de uma atividade jurisdicional de caráter público); • B) é um direito subjetivo (o titular do direito de ação pode exigir do Estado a prestação jurisdicional); • C) é um direito autônomo (não se confunde com o direito material tutelado); • D) é um direito abstrato (independe da procedência ou improcedência da pretensão acusatória); • E) é um direito determinado (é instrumentalmente conexo a um fato concreto); • F) é um direito específico (apresenta um conteúdo, o fato delituoso atribuído ao acusado) . CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL • De acordo com a Teoria da asserção, ou teoria “dela prospetazione”, a presença das condições da ação devem ser analisadas pelo juiz com base nos elementos fornecidos pelo autor na própria inicial acusatória, sem nenhum desenvolvimento cognitivo. • Havendo necessidade de uma cognição mais aprofundada, o juiz deve abster-se de analisar as condições da ação e enfrentar diretamente o mérito, com a consequente produção de coisa julgada material. • Assim, se o magistrado vislumbra a ausência de condição da ação antes do recebimento da denúncia e a rejeita, profere decisão que não faz coisa julgada material. Entretanto, se verifica falta de uma condição após a deflagração da ação, não deve julgar extinto o feito por falta dessa condição, mas sim, julgar o mérito, proferindo decisão passível de ser acobertada pela coisa julgada material. CLASSIFICAÇÃO DAS CONDIÇÕES • As condições de ação penal, também chamadas de condições de procedibilidade, podem ser divididas em duas categorias: • A) condições genéricas: aplicam-se a qualquer tipo de ação penal; • B) condições específicas: aplicam-se a determinados tipos de ação penal (exemplo: representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça). CONDIÇÕES DA AÇÃO • Há duas correntes doutrinárias a respeito das condições da ação penal do Direito brasileiro: • 1) majoritária: as condições da ação são as mesmas no processo penal e no processo civil: a) legitimidade de partes; b) possibilidade jurídica do pedido; c) interesse de agir e d) justa causa. • 2) minoritária: por estar em uma categoria jurídica distinta, o processo penal deve ter suas próprias condições da ação: prática de fato aparentemente criminoso, punibilidade concreta, legitimidade de parte e justa causa. CONDIÇÕES DE AÇÃO PENAL SEGUNDO A TEORIA GERAL DO PROCESSO (MAJORITÁRIA) • Possibilidade jurídica do pedido: diz respeito à necessidade de apresentação de um pedido admitido no ordenamento jurídico, ou seja, que encontre respaldo legal; • Legitimidade de partes: a previsão legal que autoriza o autor a propor a ação penal (ativa) e que permite que um sujeito ocupe o polo passivo da demanda; • Interesse de agir: está relacionado à utilidade da prestação jurisdicional (necessidade e adequação da providência jurisdicional pleiteada); • Justa causa: suporte probatório mínimo a embasar a deflagração da ação penal. CONDIÇÕES ESPECÍFICAS DA AÇÃO PENAL • Sua presença deve ser aferida em determinadas situações no juízo de admissibilidade da inicial acusatória (art. 395, II, CPP). Caso a ausência de uma dessas condições não seja detectada nesse momento, nada impede que o juiz, posteriormente, anule o processo ab initio com fundamento no artigo 564, III, “a”, do CPP, por analogia. • Exemplos de condições específicas: a) representação do ofendido, nos crimes de ação penal condicionada à representação; b) requisição do Ministro da Justiça nos crimes contra a honra do Presidente da República; c) apresentação de provas novas quando o inquérito tiver sido arquivado por falta de suporte probatório; d) apresentação de provas novas após a preclusão da decisão de impronúncia; e) apresentação de laudo pericial nos crimes contra a propriedade imaterial; f) autorização da Câmara do Deputados para instauração de ação penal contra Presidente, Vice-Presidente da República e Ministro de Estado. DIFERENCIAÇÕES • As condições de procedibilidade ou condições da ação não se confundem com: • Condições de prosseguibilidade (condição superveniente da ação) – condição necessária para o prosseguimento do processo que já está em curso. Exemplo: fim da insanidade superveniente do acusado, que gera crise de instância, para que o processo retome seu andamento; • Condições objetivas de punibilidade – referem-se ao direito penal, e não ao direito processual penal. Trata-se de fato externo ao tipo penal, que deve ocorrer para a formação de um injusto penal culpável punível que independem de dolo ou culpa do agente. Impede o exercício da persecução penal, porém, tendo sido proposta a ação, haverá decisão de mérito e coisa julgada material. Exemplo: decisão final no procedimento administrativo nos crimes materiais contra a ordem tributária; sentença que decreta a falência nos crimes falimentares (artigo 180 da Lei n. 11.101/05); • Escusas absolutórias – são condições de punibilidade negativamente formuladas, excluindo a punibilidade em relação a determinadas pessoas. Exemplos: a) artigo 181, incisos I e II e artigo 348, §2º, do Código Penal. CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS • A) Ação de conhecimento – a prestação jurisdicional consiste em decisão sobre situação jurídica disciplinada no Direito Penal. Pode ser: • Condenatória – visa a imposição de uma pena; • Constitutiva – visa criar, modificar ou extinguir uma situação jurídica. Exemplos: revisão criminal, homologação de sentença estrangeira. • Declaratória – visa a declaração de existência ou inexistência de uma relação jurídica. Ex.: habeas corpus objetivando a declaração de extinção da punibilidade (artigo 648, inciso VII, do CPP). OBSERVAÇÕES SOBRE A CLASSIFICAÇÃO • Entende-se que não há uma ação penal cautelar, eis que não há a previsão de uma ação autônoma, mas de medidas cautelares ao longo do processo.; • Considerando que, no processo penal, o cumprimento das medidas de segurança, das penas privativas de liberdade e das restritivas de direito pode ser iniciado de ofício, não se fala em uma verdadeira ação de execução nos moldes encontrados no Processo Civil. Entretanto, persiste a possibilidade de a Fazenda Pública ajuizar ação executiva para recebimento de pena de multa. CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS CONDENATÓRIAS PÚBLICAS • Ação penal pública incondicionada – a atuação do Ministério Público não depende da condição específica; • Ação penal pública condicionada – a atuação do Ministério Público depende de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça; • Ação penal pública subsidiária da pública – ocorre nas seguintes hipóteses: a) Diante da inércia do Procurador-Geral de Justiça em oferecer denúncia, é possível a provocação do Colégio de Procuradores nos crimes de responsabilidade de prefeitos e vereadores (artigo 2º, §2º, do Dec.-lei nº 201/67) ou PGR?; b) Nos crimes eleitorais, se o Promotor eleitoral não ofertar denúncia no prazo legal, o Procurador Regional Eleitoral designará outro órgão para oferecimento da denúncia; c) Nos incidentes de deslocamento de competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal previsto nos artigos 109, V-A, c/c 109, §5º, da Constituição Federal. CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS CONDENATÓRIAS PRIVADAS • Ação penal exclusivamente privada – não há, em regra, condição de procedibilidade específica para que o ofendido ou seu representante a proponha; • Ação penal privada personalíssima – a queixa só pode ser oferecida pelo próprio ofendido. Único exemplo na legislação: no crime de induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento (artigo 236 do CP), é incabível a sucessão processual; • Ação penal privada subsidiária da pública – admitida quando a ação penal pública não for intentada no prazo legal (artigo 5º, LIX, da CF). Observação: Prazo de ajuizamento interrompido pelo ajuizamento de ação perante juízo absolutamente incompetente – possibilidade para STJ e STF. POLÊMICAS QUANTO À INICIATIVA DAS AÇÕES • Ação penal em crime de dano praticado contra a Caixa Econômica Federal ou contra bens do Distrito Federal; • Dano qualificado, que enseja ação penal pública incondicionada, ocorre quando é praticado “contra o patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista” (Artigo 163, parágrafo único, inciso III, do CP). • Entendimento STJ RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DANO QUALIFICADO. CRIME PRATICADO CONTRA O PATRIMÔNIO DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO DAS EMPRESAS PÚBLICAS NO ROL DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 163 DO CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANALOGIA EM PREJUÍZO DO RÉU. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. PROVIMENTO DO RECLAMO. 1. O Direito Penal é regido pelo princípio da legalidade, não havendo crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal, nos termos do artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal, e do artigo 2º do Código Penal. 2. Em observância ao mencionado postulado, não se admite o recurso à analogia em matéria penal quando esta for utilizada de modo a prejudicar o réu. Doutrina. Precedentes. 3. No caso dos autos, o recorrente teria danificado patrimônio da Caixa Econômica Federal, empresa pública cujos bens não se encontram expressamente abrangidos nos previstos no inciso III do parágrafo único do artigo 163 do Código Penal. 4. Ainda que com a previsão da forma qualificada do dano o legislador tenha pretendido proteger o patrimônio público de forma geral, e mesmo que a destruição ou a inutilização de bens de empresas públicas seja tão prejudicial quanto as cometidas em face das demais pessoas jurídicas mencionadas na norma penal incriminadora em exame, o certo é que, como visto, não se admite analogia in malam partem no Direito Penal, de modo que não é possível incluir a Caixa Econômica Federal no rol constante do dispositivo em apreço. Precedente do STJ. 5. Recurso provido para desclassificar a conduta imputada ao recorrente para o crime previsto no caput do artigo 163 do Código Penal. (RHC 57.544/SP, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA, julgado em 06/08/2015, DJe 18/08/2015) AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, III, DO CP. CRIME DE DANO DE PATRIMÔNIO DO DISTRITO FEDERAL. BEM PÚBLICO. DANO SIMPLES. JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. COMPETÊNCIA. 1. Embora o Distrito Federal seja ente federativo, o inciso III do parágrafo único do art. 163 do Código Penal, ao qualificar o crime de dano, não faz menção a bens distritais. Ausente expressa disposição legal nesse sentido e vedada a interpretação analógica in malem partem, os prejuízos causados ao patrimônio público distrital configuram crime de dano simples, a ser punido com base no caput do art. 163 do Código Penal. 2. Tendo em vista o disposto no art. 61 da Lei n. 9.099/1995, verifica-se que se trata de infração penal de menor potencial ofensivo, razão pela qual adequada a fixação da competência em favor de um dos Juizados Especiais Criminais da circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF, observando-se em especial o termo de compromisso previsto no parágrafo único do art. 69 da Lei n. 9.099/1995. 3. A superveniente confirmação de decisum singular de relator pelo órgão colegiado supera eventual violação do art. 557 do Código de Processo Civil (arts. 3º do CPP e 34, XVIII, do RISTJ). 4. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1480502/DF, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 30/06/2015, DJe 04/08/2015) • Diante da hipótese de dano simples, possibilidade de aplicação de dois posicionamentos: • A) A ação é privada: PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DANO QUALIFICADO. CRIME COMETIDO CONTRA PATRIMÔNIO DO DISTRITO FEDERAL. CRIME DE AÇÃO PENAL PRIVADA. 1 A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, como o legislador não incluiu o Distrito Federal no rol taxativo do inc. III do parágrafo único do art. 163 do CP, o dano praticado contra bens públicos do citado ente federado não configura o crime de dano qualificado, uma vez que é vedada, no Direito Penal, a aplicação da analogia in malan partem. 2 Cuidando-se de crime de ação penal privada (art. 167 do CP), escorreita a decisão recorrida que, rejeitando a denúncia, definiu cuidar-se de crime de ação penal privada, pronunciando, em seguida, a decadência do direito de queixa do Distrito Federal. 3. Recurso conhecido e, no mérito, desprovido. (TJ-DF 20130910197939 0019322-56.2013.8.07.0009, Relator: MARIA IVATÔNIA, Data de Julgamento: 22/09/2016, 2ª TURMA CRIMINAL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 17/10/2016 . Pág.: 192/202) • B) A ação é pública incondicionada: pelo disposto no artigo 24, §2º, do CP: “§ 2o Seja qual for o crime, quando praticado em detrimento do patrimônio ou interesse da União, Estado e Município, a ação penal será pública. ” Como se trata de dispositivo de direito processual, poderia ser feita uma interpretação extensiva do conceito de Estado para incluir o DF ou de interesse da União para incluir bens da Caixa Econômica Federal. OUTRAS POLÊMICAS QUANTO À LEGITIMIDADE PARA PROPOSITURA DAS AÇÕES • Representação no crime de estupro (artigos 213 c/c 225 do Código Penal); • Representação pelo crime de lesões corporais leves contra mulher praticado no contexto de violência doméstica (artigo 41 da Lei n. 11.340/06 x artigo 88 da Lei n. 9.099/95) – Enunciado n. 542 da Súmula do STJ: “A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada” / STF ADI 4424; AÇÃO PENAL SECUNDÁRIA • Na ação penal secundária, determinadas circunstâncias podem alterar a modalidade de ação a ser proposta.Vejamos alguns exemplos. • Crimes contra o patrimônio – necessidade de representação com relação a determinadas vítimas (artigo 182), desde que o crime não seja cometido com violência ou grave ameaça e a vítima não tenha idade igual ou superior a 60 anos (Não se estende para o coautor ou partícipe que não tem parentesco com a vítima). • Dano em viatura e buraco cavado em cela – ação penal pública (artigo 163, IV, e 167 do CP). AÇÃO PENAL SECUNDÁRIA: CRIMES CONTRA A HONRA • Crimes contra a honra – regra: ação penal de iniciativa privada - artigo 145 do Código Penal; • Exceções: • A) Ação penal pública na injúria real, quando resultar lesão (artigo 140, §2º), conforme a natureza da lesão poderá ser condicionada ou incondicionada; • B) Crime contra a honra do Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro, ação pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça; • C) Crime contra a honra de funcionário público no exercício das funções – Enunciado n. 714 da Súmula do STF – legitimidade concorrente do ofendido para a ação penal privada e do Ministério Público para a ação penal pública condicionada à representação; • D) Injúria racial (artigo 140,§3º, CP) – ação penal pública condicionada à representação. Se o crime for de racismo (Lei n. 7.176/89), a ação será pública incondicionada. ATUAÇÃO DO MP NA AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA • A ação penal privada subsidiária da pública está prevista no artigo 5º, inciso LIX, da CF e será admitida, nos crimes de ação pública quando esta não for intentada no prazo legal; • Se o MP requereu o arquivamento, requereu diligências no inquérito ou suscitou conflito de competência, não cabe tal modalidade de ação, visto que nesse caso não está configurada inércia do parquet; • O MP atuará como interveniente adesivo obrigatório, intervindo em todos os termos do processo, sob pena de nulidade. Enquanto na ação penal privada pode aditar a queixa apenas para corrigir pequenos erros, na ação penal privada subsidiária da pública o MP poderá aditar a queixa-crime, inclusive para incluir novos delitos e autores; • Se o querelante permanecer inerte ou for negligente não há perempção nem extinção da punibilidade em virtude disso. O Ministério Público deve retomar o processo como parte principal (Ação penal indireta) – artigo 29 do CPP. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL • Princípio do ne procedat iudex ex officio – decorre da adoção do sistema acusatório. Segundo este princípio, o órgão da acusação deve ser distinto do órgão julgador; • Princípio do ne bis in idem – o acusado absolvido por sentença passada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos; • Princípio da intranscendência – a denúncia ou queixa só podem ser oferecidas contra o provável autor do fato delituoso, não podendo atingir familiares que não tiveram participação na infração penal; • Princípio da obrigatoriedade da ação penal pública – diante da notícia de uma infração penal, da mesma forma que as autoridades policiais têm o dever de apurar o fato, o Ministério Público tem o dever de oferecer denúncia caso verifique elementos de informação quanto à ocorrência do fato típico, ilícito e culpável e a presença das condições da ação. Exceções: transação penal, termo de ajustamento de conduta, parcelamento do débito tributário, acordo de leniência, colaboração premiada da Lei de Organizações Criminosas. • Princípio da oportunidade e conveniência da ação penal de iniciativa privada – cabe ao ofendido, ou a seu representante, decidir sobre a conveniência do oferecimento de queixa-crime; • Princípio da indisponibilidade da ação penal pública (ou princípio da indesistibilidade) – o Ministério Público não pode dispor do processo durante seu curso. Como desdobramento deste princípio, o artigo 576 do CPP determina a impossibilidade de o MP desistir de recurso interposto, embora não seja obrigado a recorrer. Exceção: suspensão condicional do processo. • Princípio da disponibilidade da ação penal de iniciativa privada – o querelante pode desistir de processo em curso de três formas: a) perdão da vítima; b) perempção; c) conciliação e termo de desistência da ação no procedimento dos crimes contra a honra de competência do juiz singular. • Princípio da indivisibilidade da ação penal privada – A queixa crime contra qualquer dos autores do crime, obrigará ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade (art. 48 do CPP). Há controvérsia quanto à aplicação deste princípio em relação à ação penal pública, pois, segundo parte da doutrina, o Ministério Público pode ofertar denúncia apenas contra parte dos coautores e participes em um primeiro momento, sem prejuízo do prosseguimento das investigações quanto aos demais. É possível sustentar, entretanto, o entendimento de que não há divisão, apenas é postergado o exercício do direito de ação contra os outros agentes. O STJ, entretanto, já se posicionou no sentido de que o princípio da indivisibilidade aplica-se somente à ação penal privada (STJ, 6ª Turma, Resp 388.473/PR, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 15/09/2003, p. 411). • Princípio da oficialidade – a legitimidade para a persecução penal é atribuição dos órgãos do Estado. No caso da ação penal privada, tal princípio vige somente na fase pré-processual, já que o particular não tem poderes para investigar, mas é responsável por dar impulso ao processo na fase judicial; • Princípio da oficiosidade – aplica-se à ação pena pública incondicionada. Os órgãos incumbidos da persecução penal devem agir de ofício, independente de provação do ofendido. ASPECTOS DA REPRESENTAÇÃO • No inquérito, o próprio início da investigação está condicionado à representação nos crimes que forem de ação penal pública condicionada; • A representação é instituto que permite à vítima manifestar sua vontade quanto ao início do processo, já que o escândalo do processo pelo ajuizamento da ação (strepitus iudicci) lhe pode parecer insuportável. • Pela aplicação do princípio da oportunidade e conveniência, não poderia ocorrer a renúncia à representação, para a qual não há previsão legal. Exceção: homologação de acordo de composição dos danos civis (art. 74 da Lei n. 9.099/96). • A representação é considerada condição específica da ação penal, e não necessita de formalidade para seu aperfeiçoamento, mas deve conter as informações que possam servir à apuração do fato delituoso e sua autoria (artigo 39, §2º, CPP). LEGITIMIDADE PARA OFERECIMENTO DA REPRESENTAÇÃO • Ofendido com menos de 18 anos de idade, mentalmente enfermo ou retardado mental – o direito de representação deverá ser exercido por representante legal, sejam avós, irmãos ou pessoa de quem depende economicamente; • Ofendido com menos de 18 anos de idade, mentalmente enfermo ou retardado mental que não tenha representante legal ou cujos interesses colidem com os de seu representante – o juiz deve nomear curador especial que, entretanto, não terá obrigação de ofertar representação. É hipótese de legitimação extraordinária ou substituição processual; • Pessoa jurídica – o direito de representação é exercido por pessoa designada em seus contratos ou estatutos, ou, no silêncio deles, por seus diretores ou sócios-gerentes; • Ofendido falecido – o direito de representação será exercido por cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, nessa ordem de preferência. Polêmica: possibilidade de exercício do direito por companheiro. PRAZO PARA OFERECIMENTO DA REPRESENTAÇÃO • Seis meses a partir da data em que o ofendido ou seu representante legal souberem quem é o autor do delito; • Há discussão a respeito da abertura de um novo prazo quando cessa a incapacidade do ofendido incapaz. NUCCI e CAPEZ, por exemplo, defende a tese de que se abriria novo prazo, sob alegação de que não há decadência de direito que não poderia ser exercido. Renato Brasileiro de Lima, entretanto, defende que o prazo é único. Enunciado n. 594 da Súmula do STF, prazos independentes para ofendido e representante. • Nos crimes de menor potencial ofensivo e de ação penal condicionada, caso o ofendido não compareça à audiência preliminar, o Ministério Público requer o arquivamento provisório dos autos até que termine o prazo decadencial de seis meses. • A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a nulidade de acórdão de turma recursal de juizado especial criminal que indeferira idêntica medida e mantivera decisão de juízo singular que determinara o desarquivamento de inquérito policial instaurado contra o paciente pela suposta prática de lesões corporais simples. No caso concreto, o Ministério Público requerera o arquivamento do inquérito, por falta de interesse processual, em face da não localização da vítima para realização de exame complementar de corpo de delito, o que fora acolhido pelo juízo. Posteriormente, em decorrência da manifestação da vítima informando a existência de erro no endereço constante do mandado de intimação, o mesmo órgão ministerial pedira o desarquivamento do feito, o que também fora deferido. Sustentava o impetrante que o desarquivamento se dera em afronta ao art. 10, XXXIII, da Lei Complementar 28/92, do Estado do Rio de Janeiro ("Cabe ao Procurador-Geral requisitar autos arquivados, promover seu desarquivamento e, se for o caso, oferecer denúncia ou designar outro órgão do Ministério Público para fazê-lo."), e, ainda, ao Enunciado 524 da Súmula do STF ("Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas."). Esclareceu-se, de início, que o art. 72 da Lei 9.099/95, ao exigir a presença da vítima para audiência preliminar, criou, implicitamente, na hipótese da mesma não ser localizada para tanto, nova modalidade de arquivamento das peças informativas diversa daquelas previstas no art. 18 do CPP, na Súmula 524 e na norma estadual invocada (Lei 9.099/95, art. 72: "Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade."; CPP, art. 18: "Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia."). Entendeuse que, sendo hipótese de crime condicionado à representação do ofendido, o arquivamento do feito somente seria considerado definitivo se a vítima, ciente deste, se mantivesse inerte, o que não ocorrera na espécie. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ por considerar que, em homenagem à segurança jurídica, a existência da premissa errônea não seria suficiente, por si só, para acatar o pedido de reconsideração do arquivamento. HC 84638/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 28.9.2004. (HC-84638) – INFORMATIVO N. 363 DE 2004 DO STF. OBSERVAÇÕES SOBRE A REPRESENTAÇÃO • Eficácia objetiva da representação (indivisibilidade) – a polícia pode investigar todos os autores; • Para alguns doutrinadores, entre eles Renato Brasileiro de Lima e Nucci, desde que não encerrado o prazo de seis meses, o ofendido poderá ofertar nova representação, ainda que tenha se retratado. Para Capez e Tourinho, é impossível a retratação da retratação. • Para Capez e Tourinho, a requisição do Ministro da Justiça não pode ser retratada. AÇÃO PENAL POPULAR • Segundo a doutrina, existem duas hipóteses de ação penal popular: • A) habeas corpus – pode ser impetrado por qualquer pessoa, não sendo exigida capacidade postulatória; • B) ação para apurar crime de responsabilidade – De acordo com a Lei n. 1.079/50 (artigos 14, 41 e 75), qualquer cidadão pode oferecer denúncia, por crime de responsabilidade, contra determinados agentes políticos, perante a Câmara dos Deputados (Presidente da República e Ministro de Estado), o Senado Federal (Ministros do STF e Procurador-Geral da República) ou a Assembleia Legislativa (Governador). AÇÃO PENAL DE PREVENÇÃO PENAL • É assim denominada a ação que visa a aplicação exclusivamente de medida de segurança ao inimputável. DENÚNCIA E QUEIXA-CRIME: REQUISITOS Requisitos legais: • Exposição do fato criminoso; • Qualificação do acusado; • Classificação do crime; • Rol de Testemunhas. Requisitos da doutrina: - Endereçamento; - Redação em vernáculo; - Subscrição da peça pelo Ministério Público ou pelo advogado do querelante. ELEMENTOS DA INICIAL • Elementos essenciais: necessários para identificar a conduta como fato típico, de modo a possibilitar a defesa. Em caso de crime culposo, por exemplo, é preciso identificar se houve negligência, imprudência ou imperícia em que ela consistiu. • Elementos acessórios: são também chamados de circunstâncias identificadoras ou individualizadoras; ligados às condições de tempo, espaço ou que revelem maiores detalhes sobre o modo de atuar do acusado. AÇÃO CIVIL EX DELICTO • No Brasil, com relação à ligação entre a ação penal e a ação civil ex delicto, impera o sistema da independência de instâncias, porém mitigado. Isso significa que, embora as ações para persecução penal e para a reparação do dano sejam propostas de maneira independente, a sentença penal condenatória poderá conferir à vítima título executivo judicial. Não há propriamente uma ação civil cumulada com uma ação penal no juízo criminal, apenas a fixação de um valor mínimo a título de indenização como efeito automático da condenação. • Surge assim, a possibilidade de duas ações, a ação de execução ex delicto, proposta com base no título executivo obtido na ação penal, e a ação civil ex delicto, proposta perante o juízo civil, concomitantemente ou independentemente da propositura da ação penal. EFEITOS CIVIS DA ABSOLVIÇÃO PENAL • A sentença absolutória não exerce qualquer influência sobre o processo cível, salvo quando reconhece, categoricamente, a inexistência do fato ou afasta peremptoriamente a autoria ou participação (absolvição com fundamento nos incisos I ou IV do artigo 386 do CPP). • A decisão que reconhece estar provada a existência de causa excludente da ilicitude real só fará coisa julgada no cível se o ofendido tiver dado causa à excludente. Se um terceiro deu causa à excludente, a vítima poderá ingressar com ação no juízo cível e o acusado, acionado pela vítima, poderá intentar ação regressiva contra o terceiro que deu causa à situação; NÃO IMPEDE A PROPOSITURA DE AÇÃO CIVIL EX DELICTO A SENTENÇA QUE: • Reconhecer excludente putativa e erro na execução, a menos que a repulsa resulte de agressão do ofendido; • Concluir pela falta de provas da infração penal; • Concluir que o fato não constitui infração penal; • Concluir que não existe prova de que o acusado concorreu para a infração penal; • Reconhecer provada causa excludente de culpabilidade; • Concluir pela existência de fundada dúvida a respeito de causa excludente de ilicitude ou culpabilidade; NÃO IMPEDE A PROPOSITURA DE AÇÃO CIVIL EX DELICTO A SENTENÇA QUE: • Concluir que não há provas o suficiente para a condenação; • Tendo sido proferida pelo Tribunal do Júri, absolver o acusado, já que não é possível aferir a causa da absolvição; • Arquivar o inquérito policial; • Homologar o acordo de transação penal; • Julgar extinta a punibilidade pela morte do agente; • Julgar extinta a punibilidade pela prescrição; • Conceder perdão judicial. • Além disso, a sentença penal condenatória transitada em julgado valerá como título executivo, ainda que ocorra abolitio criminis, ou seja concedida anistia, graça ou indulto. • Após o trânsito em julgado da sentença condenatória, a execução poderá ser promovida no juízo cível dentro do prazo prescricional de três anos, conforme disposto no artigo 206, 3º, V, do Código Civil, que disciplina a prestação de reparação civil; • No juízo cível, na execução desse título, não se pode mais questionar sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, pois estas questão já foram decididas no juízo criminal (art. 935 do Código Civil). FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO PARA A INDENIZAÇÃO DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA • A partir da reforma processual de 2008, passou a ser possível que, além do dever de indenização, que é efeito genérico da sentença condenatória, o juiz fixasse o quantum mínimo da indenização; • Tal previsão permite que o ofendido não seja mais obrigado a promover liquidação para fixar o valor da indenização. Não o impede, entretanto, de, caso queira, buscar a liquidação para obter valor maior que apure o dano efetivamente sofrido. • Para Renato Brasileiro de Lima, a fixação de quantum mínimo de indenização é requisito obrigatório da sentença penal condenatória sempre que a peça acusatória se referir a uma infração penal da qual tenha decorrido alguma espécie de prejuízo para o ofendido. Caso o magistrado não disponha de elementos para aferir esse valor, deverá expor na sentença os motivos pelos quais deixa de fixá-lo; • Encontra-se entretanto, julgados da 5ª e da 6ª Turma do STJ no sentido de que a fixação do valor mínimo de reparação depende de pedido explícito da acusação. • AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. REPARAÇÃO PELOS DANOS CAUSADOS À VÍTIMA. LEI N.º 11.719/2008. INCABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO E FORMAL. 1. A regra do art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal com redação dada pela Lei n.º 11.719/2008, que dispõe sobre a fixação, na sentença condenatória, de valor mínimo para reparação civil dos danos causados ao ofendido, requer pedido expresso e formal, de modo a oportunizar o devido contraditório. 2. Não se acolhe pretensão recursal fundada em precedentes já superados, que não refletem a atual jurisprudencial deste Superior Tribunal de Justiça. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1387172/TO, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 10/03/2015, DJe 16/03/2015) CONTATO • [email protected]