José Leão de Carvalho Jr

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REFLEXÕES CLÍNICAS
SOBRE A POSSIBILIDADE
DE IMPLANTAÇÃO DE
POLÍTICA PÚBLICA DE
REDUÇÃO DE DANOS NO
PARANÁ
A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
NO ENFRENTAMENTO À DROGADIÇÃO
José Leão de Carvalho Jr.
27 de fevereiro de 2014
Visão Geral
1
• Dependência química
2
• Comorbidades
3
• Redução de danos
4
• Proposta de
enfrentamento clínico
O que é dependência química?
Doença
não é porque ingere substância química (água...)
nem pela compulsão (respirar...)
muito menos porque o prazer está envolvido
Porque traz prejuízo, perda, dor, sofrimento... morte.
Idade Média: igreja católica aceita o uso de bebidas alcoólicas (por
que o sangue de Cristo é vinho e não suco de uva?), mas condenava
o uso de outras substâncias psicoativas como sendo feitiçaria —
inquisição.
1948: a OMS incorpora os “vícios” como doenças, passando a serem
pertinentes a tratamentos. Até então eram “desvios de caráter”.
1964: a OMS institui “dependência química” para substituir os
“vícios”.
Doença e preconceito
Parábola: Corrupção
Até hoje é vergonhoso, antiético, feio, imoral, crime passível de
penalização.
Descoberta que traz prejuízo, perda, dor, sofrimento... morte aos
corruptos.
Há evidências de herança genética.
Novas descobertas: há alterações de funcionamento cerebral; há
insuspeitadas relações entre corrupção e outras doenças físicas e mentais
(comorbidades).
OMS institui no CID-11: F67 Transtorno de Personalidade Corruptiva —
Corrupção ativa e passiva.
Haveria preconceitos contra a doença Corrupção?
Dependência química é
Doença Mental
o que provoca a compulsão são alterações de
funcionamento cerebrais (circuito do prazer
e recompensa).
Dependência química é uma doença mental
Doença Crônica
dimensão temporal, o oposto de doença aguda.
Doença Progressiva
a doença fica cada vez mais forte, o portador cada
vez mais fraco.
Doença Incurável
o que seria a cura da DQ? O uso esporádico, com
controle.
Doença Complexa
diversos fatores causais, diversas complicações
(cerebrais e não cerebrais) — comorbidades—,
diversas complicações familiares — e sociais.
Doença Fatal
se não for tratada ou controlada, o portador morre.
PRAZER
Não são todos os usuários de drogas que são doentes.
Existem usuários ocasionais.
A maioria dos usuários de álcool não se compõe de alcoolistas
— estima-se em 10% de doentes entre eles. Idem para
maconha.
O uso contínuo de qualquer substância psicoativa pode produzir
uma doença cerebral, que decorre do uso inicialmente voluntário.
O uso das SPA’s origina-se na busca do PRAZER.
A consequência é que, a partir do momento que a
pessoa
desenvolve
uma
DOENÇA
chamada
DEPENDÊNCIA, o uso passa a ser compulsivo e acaba
destruindo muitas de suas melhores qualidades,
contribuindo para a desestabilização da relação do
indivíduo com a sua família e com a sociedade.
O uso não é mais uma escolha.
Se não usar, há sofrimento, dor, DESPRAZER.
O QUE É PRECISO PARA O DIAGNÓSTICO?
A OMS, na CID-10,
orienta que são
necessários três ou
mais dos seguintes
aspectos em algum
momento durante os
últimos 12 meses:
CID-10, OMS
1 - Forte desejo ou senso de compulsão para consumir a substância.
2 - Dificuldades em controlar o comportamento de consumir a substância
em termos de seu início, término ou níveis de consumo.
3 - Um estado de abstinência fisiológico quando o uso da
substância cessou ou foi reduzido (síndrome de abstinência).
Desprazer se não usar.
4 – Tolerância: doses crescentes da substância são requeridas para
alcançar os efeitos originalmente produzidos (prazer).
5 - Abandono progressivo de prazeres ou interesses alternativos em favor do uso da substância,
aumento da quantidade de tempo para obter ou usar a substância ou para se recuperar de
seus efeitos. TUDO vai, progressivamente, ficando menos importante que o uso.
6 - Persistência no uso, a despeito de evidência clara de consequências
manifestamente nocivas.
MAIS CARACTERÍSTICAS
PRESENTES NA DEPENDÊNCIA
QUÍMICA
a - Estreitamento do repertório pessoal de comportamento.
b - Havendo um período de abstinência, ao recair no uso, o
padrão de consumo sobe rapidamente aos níveis anteriores.
Não há a possibilidade de um “uso social” da droga.
Cérebro do dependente tem alterações biológicas, alterações de vias
neurológicas, alterações nas sinapses.
INCIDÊNCIA DA DOENÇA NOS USUÁRIOS
Álcool, maconha, cocaína ≈ 10%
Tabaco, heroína, crack > 95%
COMORBIDADE
Doença que acompanha outra doença.
Comorbidades nos dependentes químicos de maconha e crack:
Decorrentes das agressões das vias respiratórias:
• Alta temperatura
• Partículas
• Substâncias tóxicas
Inflamações do aparelho respiratório, enfisema,
cânceres
Comorbidades nos dependentes químicos de maconha e crack:
Decorrentes das agressões provocadas pelas substâncias absorvidas e difundidas
por todo organismo pelo aparelho circulatório:
psiquiátricas
crack
cocaína
maconha
não psiquiátricas
Transtornos de ansiedade
Déficit de atenção
Transtornos de humor (DMD)
Psicoses
Demências
Alterações da personalidade
Arritmias cardíacas
Infarto do miocárdio
AVC
DST’s
Hepatite tóxica
Traumas
Disfunções sexuais
Cânceres
Transtornos de ansiedade
Déficit de atenção
Transtornos de humor (depressão)
Psicoses
Demências*
Alterações da personalidade
Arritmias cardíacas
Infarto do miocárdio
AVC
DST’s
Traumas
Disfunções sexuais
Cânceres
* Dependentes de maconha têm, em média 5 pontos a menos no QI do que aqueles que fizeram uso experimental.
REDUÇÃO DE
DANOS
Parte do princípio que o paciente vai
continuar doente.
Distribuir camisinhas no carnaval é RD?
Defende que, se não podemos eliminar as drogas, pelo menos podemos
diminuir os danos causados por elas.
Ex: seringas para dependentes químicos, “se beber não dirija”.
A reforma legal não é a prioridade dessa política, mas sua prática
concreta. Seus defensores pregam abertamente a tolerância com os
usuários de drogas, o que se caracteriza como uma
descriminalização de fato.
Não é tratamento.
Em relação ao tratamento, buscam-se todas as alternativas possíveis.
POLÍTICA DE
REDUÇÃO DE DANOS
NA INGLATERRA:
Prescrever heroína para os dependentes: além do uso regular da
heroína legal, os pacientes buscavam outra fonte ilegal.
Prescrever outra droga, teoricamente, menos nociva, a fim de
evitar a recaída para os dependentes: eficácia de apenas 4%.
Quando perceberam que milhões foram investidos com benefícios
tão pequenos para a sociedade, interromperam o método e, agora,
a abstinência é o foco do tratamento.
REDUÇÃO DE DANOS OU
PRODUÇÃO DE DANOS?
Tratar dependentes químicos significa
contribuir para sua abstinência.
Dependentes químicos que estão tentando manter sua
abstinência quando usam outra substância psicoativa (SPA)
quase invariavelmente recaem (mais cedo ou mais tarde) no
uso da SPA de sua “preferência”.
Oferecer SPA a dependentes químicos significa contribuir para sua
doença.
Antitratamento?
REDUÇÃO DE DANOS
ALGUNS DILEMAS
 Como medir a diminuição de um dano em
relação a outro?
 Será que não diminuímos determinados danos e criamos muitos
outros aumentando o número de usuários?
 Teremos menos crimes e mais usuários?
 Para diminuir os danos, por que não enfatizamos a diminuição do
consumo das drogas legais, que acarretaria maiores benefícios para
a sociedade?
REDUÇÃO DE DANOS
ALGUNS DILEMAS
 Se o profissional de saúde tem o conhecimento
de uma terapêutica, não aplicá-la e oferecer
alternativa lesiva à saúde de um paciente é
aceitável eticamente? Ex: benzodiazepínicos.
 E se a Política de Redução de Danos melhorar a vida dos dependentes
e piorar a vida de outros, como da família dos próprios usuários?
 Mesmo que haja uma diminuição de danos de um grande número de
usuários, se o uso de drogas pela população em geral for facilitado, o
número de usuários poderá aumentar, haverá um dano maior à
sociedade?
REDUÇÃO DE DANOS
ALGUNS DILEMAS
 Para o serviço público oferecer maconha aos
dependentes de crack, ele vai precisar adquiri-la:
comprando (de quem) ou plantando (onde, como)?
 Será criada uma Secretaria dentro do Ministério da Saúde para
administrar a aquisição (plantação) e distribuição da maconha?
 Como garantir que não haverá desvio da maconha legal
(oficial) para o mercado?
REDUÇÃO DE DANOS
ALGUNS DILEMAS
Além da aquisição (ou produção) da maconha, dos
mecanismos de administração e controle da maconha oficial,
as comorbidades vão aumentar e haverá persistência das
terapêuticas escolhidas.
 Os gastos com a saúde vão aumentar?
 Haverá um novo imposto?
Pelo elevado custo social seria um IEC - Impostos Especiais sobre
o Consumo: previstos no Código dos Impostos Especiais Sobre o
Consumo e atualmente incluem a tributação do álcool e bebidas
alcoólicas, do tabaco e dos produtos petrolíferos e energéticos.
Tratamento da
Dependência Química
Abstinência de todas as
substâncias psicoativas.
Prevenção de recaída.
Interromper as eventuais recaídas.
Tolerância zero com recaída =
recaiu, rever tratamento.
Proposta de Enfrentamento
Clínico
1º) Período curto de internação integral em
CLÍNICA:
Atendimento multiprofissional integrado (medicina,
psicologia, terapia ocupacional, serviço social, educação
física, musicoterapia, enfermagem, nutrição,
fisioterapia). Atendimentos familiares.
Tempo estimado: 45 dias.
Objetivo: o paciente sair com suas comorbidades
sob controle e consciente da necessidade de
tratamento delas e da sua dependência química.
Proposta de Enfrentamento
Clínico
2º) Tratamento em regime de clínica-dia
(ou CAPS-AD):
Atendimento multiprofissional integrado (medicina,
psicologia, terapia ocupacional, serviço social, educação
física, musicoterapia, nutrição, fisioterapia). Grupo de
voluntariado. Atendimentos familiares.
Grupos de surfe e de corrida/caminhada.
Tempo estimado: 6 a 24 meses.
Objetivo: manutenção da abstinência.
Reinserção familiar e social.
Prazer sem as substâncias psicoativas.
Proposta de Enfrentamento
Clínico
3º) Atendimento ambulatorial
Médico (psiquiatra e especialidades das
comorbidades) e psicológico (psicoterapia
individual e orientação familiar).
Desde a alta da internação integral, por tempo indeterminado.
Objetivo: manutenção da abstinência.
Controle das comorbidades.
Prazer sem as substâncias psicoativas.
MANUTENÇÃO DA
ABSTINÊNCIA EM
DEPENDENTES QUÍMICOS
E MODALIDADE DE
TRATAMENTO
Trabalho realizado com dados de pacientes
internados no ano de 2011 na Clínica de
Reabilitação Nova Esperança, em Curitiba, PR.
O OBJETIVO DO TRABALHO É AVALIAR A RELEVÂNCIA DO
TIPO DE TRATAMENTO NA OCORRÊNCIA OU NÃO DE
RECAÍDA DE DEPENDENTES QUÍMICOS.
COMO TODOS OS PACIENTES PASSARAM POR
INTERNAÇÃO INTEGRAL, ENTENDE-SE O TIPO DE
TRATAMENTO:





SE A INTERNAÇÃO FOI VOLUNTÁRIA OU INVOLUNTÁRIA
O TEMPO DE INTERNAÇÃO
O TIPO DE ALTA
SE HOUVE OU NÃO ACOMPANHAMENTO EM CLÍNICA-DIA
SE HOUVE OU NÃO ACOMPANHAMENTO AMBULATORIAL
(PSICOTERÁPICO OU PSIQUIÁTRICO).
Foram considerados os pacientes que receberam alta da
internação integral durante o ano de 2011 (até 31/12/2011),
com seguimento até 31/12/2012.
O tempo mínimo de acompanhamento foi de 12 meses e o
máximo de 24 meses
A população estudada (n) foi de 112 pacientes, todos com o
diagnóstico de dependência química (F10 a F19).
Não foi levado em consideração se havia ou não
comorbidades psiquiátricas
VISÃO GERAL
Do total (112) de pacientes acompanhados, 71 recaíram e 41
mantiveram a abstinência até o final do período.
TIPO DE INTERNAÇÃO E
MANUTENÇÃO DA ABSTINÊNCIA
TIPO DE INTERNAÇÃO
70%
60%
50%
40%
voluntária
involuntária
30%
20%
10%
0%
recaídos
abstinentes
TIPO DE ALTA
RECAÍDAS X TIPO DE ALTA
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
percentual de recaída
CLÍNICA-DIA
PARTICIPAÇÃO EM CLÍNICA-DIA
recaíram
abstinentes
24%
83%
76%
17%
sim
não
TRATAMENTO AMBULATORIAL
Participação em
tratamentos ambulatoriais
recaíram
abstinentes
18%
63%
82%
37%
sim
não
TEMPO MÉDIO DE ABSTINÊNCIA
EM MESES
16.3
18
16
12.3
14
12
8.5
10
8
3.7
6
4
2
0
geral
com clínica-dia
total
que recaíram
NECESSIDADE
DE REFORMULAR A
POLÍTICA PÚBLICA DE ATENDIMENTO A
DEPENDENTES QUÍMICOS.
Quais os resultados efetivos do atual atendimento
(comunidades terapêuticas, CAPS-AD)?
Quais os custos?
Quais os custos da proposta CLÍNICA,
CLÍNICA-DIA ou CAPS-AD,
ATENDIMENTOS AMBULATORIAIS?
E O VALOR?
Quanto vale a manutenção da abstinência de
um dependente químico?
Quanto vale a recuperação da saúde física,
mental e restituição da dignidade dos
dependentes químicos?
Não tem preço,
O VALOR É INESTIMÁVEL.
CONTATOS
www.clinicanovaesperanca.com.br
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