: ACIDOSE TUBULAR RENAL Lílian Cristina Negri Nicácio (R1) Hospital Regional da Asa Sul (HRAS)/SES/DF www.paulomargotto.com.br 10/7/2009 ID: CJC, 8 anos e 7 meses, natural de Côcos BA, procedente de Barreiras BA. QP: ‘Inapetência e dor nas mãos’ há 6 meses. HMA: Pai refere que há cerca de seis meses criança iniciou com quadro de hiporexia e vômitos associados a dor intensa e contratura de ambas as mãos e pés que cessava após alguns minutos. Há 2 meses evoluiu com piora do quadro, apresentando oligúria e edema generalizado, procurou o Hospital de BarreirasBA, onde chegou desnutrido, com hipopotassemia, acidose metabólica e desconforto respiratório. Foi admitido na UTI pediátrica colocado em ventilação com máscara de Venturi, iniciado dobutamina e reposiçao de bicarbonato. Evoluiu com melhora do quadro clínico e foi transferido para a enfermaria mas permaneceu com acidose metabólica refratária e hipopotassemia controlada com reposição contínua de bicarbonato de sódio e KCl. Durante esta internação teve um episódio de tetania remitido com gluconato de cálcio em bolus. Em 09/05/2009 foi transferido para o HRAS pela necessidade de centro de referência em nefropediatria. A criança chegou ao HRAS em BEG, desnutrida, hipocorada (2+/4+), hidratada, anictérica, acianótica, afebril, ativa e reativa. ACV: RCR 2 tempos BNF, sem sopros. FC: 100 bpm AR: MVF sem ruídos adventícios. FR: 32 irpm. ABD: escavado, sem VMG, flácido e indolor a palpação. EXT: boa perfusão, sem edemas. Evolução Parecer para nefrologia do HBDF. Novo episódio de tetania. Sinal de Trousseau + Na 143; K 2,3; Ca 7,0; Mg 1,2; P 1,3 Prescrito gluconato de cálcio 10% ( 0,7 ml/Kg e bolus) e sulfato de magnésio (0,125 ml/Kg) ECG Rítmo sinusal, eixo QRS zero graus, r=s em v6 sobrecarga ventricular direita(?). PR, QRS, QT sem alterações. US de rins e vias urinárias Rins tópicos de contornos lisos Rim direito: 92-39-45 mm, Rim esquerdo: 91-43-39 mm. Com evidência de perda da diferenciação córtico-medular. Ausência de cálculos. Bexiga normal. RX de ossos longos Fina linha de esclerose nas extremidades das metáfises distais das ulnas e dos rádios e fêmures e nas metáfises proximais das tíbias. Alargamento das metáfises, com deformidade côncava ou em xícara. RX de ossos longos Alargamento das metáfises distais do fêmur e menos evidente da tíbia. Alargamento das linhas epifisárias (placas de crescimento). Osteoporose. Aspecto radiográfico compatível com raquitismo em fase recalcificação. Evolução Exames laboratoriais: Uréia: 22 – 42 Creatinina: 0,4 – 1,0 Hipocalcemia corrigida. Potássio: 2,2 – 2,7 Magnésio: 1,0 – 1,3 ( 43,4 mg/urina 24h) Fósforo: 1,3 – 2,2 ( 173,6 mg/urina 24h) Acidose metabólica EAS glicosúria Evolução Reposição de eletrólitos. 8% KCl em acesso central Cálcio via oral e EV KCl xarope Rocaltrol Bicarbonato de sódio EV e VO Sulfato de Magnésio IM. Dieta por SNG com alfarré Evolução Criança evoluiu com respiração acidótica, perfusão lentificada e MV rude bilateralmente. O2 sob máscara Iniciada droga vasoativa e cefepime Mantida reposição de eletrólitos Intubação orotraqueal PCR revertida com 3 doses de adrenalina 20 minutos após evoluiu para bradicardia e nova PCR com manobras de reanimação sem sucesso. óbito por edema pulmonar devido a choque séptico e acidose tubular renal. Acidose Tubular renal (ATR) • Caracterizam –se por acidose metabólica secundária a um defeito na reabsorção tubular renal de bicarbonato e / ou na excreção de H+ com função glomerular normal ou minimanente afetada. • Classificação: – ATR distal ou tipo I – ATR proximal ou tipo II – ATR hipercloremica ou tipo IV – ATR mista ou tipo III ATR - I Distal • Inabilidade dos túbulos distal e coletor de promover uma adequada acidificação urinária, resultando numa urina com pH elevado mesmo com acidose metabólica. • Retenção progressiva de H+ e desenvolvimento de acidose metabólica. • Clínica: déficit de crescimento, poliúria, hipercalciúria, nefrocalcinose (IRC) e litíase. ATR - IV hipercalêmica Tipo de ATR mais diagnosticado. Acidose metabólica hiperclorêmica, hipercalêmica, com função renal normal ou discretamente diminuída, com urina alcalina e excreção renal de potássio diminuída Deficiência de aldosterona ou falta de resposta tubular. Defeito na secreção de potássio e hidrogênio e perda urinária excessiva de Na. ATR - II proximal • Defeito na reabsorção tubular proximal de bicarbonato. • Acidose metabólica acentuada de difícil controle. • Hiperclorêmica: reabsorção de cloro é estimulada pela diminuição do volume extracelular. ATR - II proximal O bicarbonato filtrado é 85% a 90% reabsorvido no túbulo proximal (TP) e cerca de 10% no túbulo distal. Em condições normais quase nenhum bicarbonato é eliminado na urina. ATR - II proximal • O papel do túbulo proximal na acidificação urinária consiste na secreção de H+ através da troca Na+/H+ e transporte de bicarbonato através do co –transportador Na+HCO3-. Ambos com a participação da anidrase carbônica que é mais estimulada na acidose metabólica crônica. ATR – II etiologia • ATR proximal pode ser: • Defeito generalizado do transporte no TP caracterizando a Síndrome de Fanconi • Isolada sem associação com outras doenças e/ ou anomalias do TP. • Transitória por imaturidade da função de trocadores NHE-3, exposição a alguns medicamentos (ifosfamida e tetraciclina) • Persistente são mais raras e compreendem traços autossômicos dominantes e recessivos com alterações oculares. • Um tipo de mutação autossômica recessiva do gene ACII que está presente no TP e TD leva a ATR III ou mista ATR – 2 diagnóstico • Acidose metabólica hiperclorêmica com normo ou hipopotassemia e ânion gap urinário negativo. • Diagnóstico precoce observa um pH urinário alcalino por causa da perda de bicarbonato. • Bicarbonato sérico diminui de tal forma que o TD consegue reabsorver o bicarbonato e ocorre um acidificação da urina normal. Mas o bicarbonato sérico estará em torno de 15 a 18 mEq/L. ATR - II proximal Teste do bicarbonato: Infusão lenta de bicarbonato de sódio até a normalização de bicarbonato, pH e pCO2 séricos eleva o pH urinário rapidamente por ultrapassar a capacidade de reabsorção do TD. ATR – 2 Tratamento • Repor alcalis sob forma de bicarbonato ou citrato. – Criança: bicarbonato de sódio 10 a 20 mEq/Kg/ dia. • Forma autossômica dominante e recessiva: usam o bicarbonato por toda a vida retomam seu crescimento mas dificilmente atingem a estatura normal. • Forma esporádica por serem transitórias podem descontinuar o tratamento após alguns anos. - Potássio pode ser necessário por causa da caliurése induzida pela alta concentração de bicarbonato que chegam ao TD. Déficit de transporte do bicarbonato isoladamente no TP : ATR tipo II Déficit em todos os mecanismos de transporte do TP produzindo deficiência na reabsorção de glicose, aminoácidos, fosfato e também de bicarbonato: Síndrome de Fanconi Síndrome de Fanconi Descrita na década de 1930 por Toni, Debré e Fanconi. Disfunção tubular proximal com alteração no mecanismo de reabsorção dos elementos normalmente reabsorvidos nesta porção. Glicose Aminoácidos Bicarbonato de sódio NaCl e água na porção final Síndrome de Fanconi Forma Primária: Hereditária esporádica Síndrome de Fanconi • Forma Adquirida: – Pós transplante renal por sequela de necrose tubular aguda, rejeição, uso de drogas nefrotóxicas ou hiperparatireiodismo residual. – Exposição acidental a toxinas e metais pesados • Cádmio, chumbo e mercúrio – Toxicidade de drogas • Cisplatina, acido valpróico, azatioprina , tetraciclina vencida, gentamicina. • Mais comum é a forma idiopática. Clínica • Os sintomas são inespecíficos por isso o diagnóstico é tardio e quando a criança tem baixa estatura, deformidades ósseas e depuração de creatinina inferior a 80 ml/min/1,73m2 • Os achados clínicos e laboratoriais são decorrentes da perda de solutos. Clínica Acidose metabólica: Perda proximal de bicarbonato, hiperclorêmica, hipocalêmica com ânion gap plasmático normal. pH urinário: Ácido quando tem uma acidose metabólica importante pela diminuição da carga de bicarbonato filtrada. Clínica Glicosúria Com normoglicemia Diferencial de DM Desidratação Diurese osmótica por excreção de solutos Poliúria, polidipsia e febre Confundir com DM Clínica • Raquitismo • pode resultar da combinação entre acidose metabólica e hipofosfatemia ou da hipofosfatemia isolada – Fosfatúria é acentuada – Fosfato sérico diminuído assim como sua reabsorção proximal. – A resistência a ação da vitamina D deve-se à diminuição da conversão da vitamina D em sua forma metabólicamente ativa (1,25(OH)2D3) pelas células do TP em presença de acidose metabólica. Clínica Nitrogênio α - amínico urinário Avalia aumento dos níveis de aminiácido na urina. Microalbuminúria Em pacientes com função renal normal a microalbuminúria é resultante da diminuição da reabsorção da albumina filtrada no TP. Usada no seguimento para detectar precocemente disfunção glomerular. Clínica Hipersecreção de ácido úrico e hipercalciúria. Sem tendência a calculose por excretar também inibidores da cristalização como bicarbonato e citrato. Proteinúria de baixo peso molecular β2Mur RBPur Carnitina com reabsorção tubular diminuida resulta em hipodesenvolvimento muscular. Tratamento A expressão clínica e bioquímica varia para cada paciente não tendo um tratamento universal. Forma secundária Tratar a causa de base Tratamento • Forma primária: – Reposição eletrolítica pode restabelecer o balanço mineral e de eletrólitos. • • • Bicarbonato: 5 a 10mEq/Kg/dia pode chegar a 20 mEq/Kg/dia. NaCl: 1 a 2 g/dia KCl: 2 a 3 mEq/ Kg/ dia – Raquitismo pode ser corrigido mas o crescimento normal raramente é atingido. • 1,25(OH)2D3 (Rocaltrol) em altas doses. • Repor fosfato Nota do Editor do site:www.paulomargotto.com.br, Dr. Paulo R. Margotto Consultem: Acidose Tubular Renal por Nefrocalcinose Camila de O. Machado, Gustavo Gomes de Sá, Joanna Cecília Silva Ribeiro, Mariana R. Jansen, Paulo R. Margotto OBRIGADA!