Formação básica na fé: Jesus Cristo: ontem, hoje e sempre Escola de Dirigentes Centro Pastoral Paulo VI «Meu Senhor e meu Deus!» Jo 20, 28 Formação básica na fé: Jesus Cristo: ontem, hoje e sempre Sumário: I – Jesus de Nazaré, vida e obra II – O Mistério Pascal: paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo III – Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem IV – Quem é Jesus? Bibliografia recomendada I – Jesus de Nazaré: vida e obra «Jesus partiu com os discípulos para as aldeias de Cesareia de Filipe. No caminho, fez aos discípulos esta pergunta: «Quem dizem os homens que Eu sou?» Mc 8, 27 1. A investigação moderna acerca de Jesus de Nazaré 1.1. – Breve história da investigação sobre Jesus A CRISTOLOGIA explica a frase «Jesus é o Cristo» (Walter Kasper). A tensão que existe na Cristologia é unir o Jesus histórico com o Cristo da fé. A Cristologia passou por duas grandes fases: 1. Antes do Vaticano II, deixa-se excessivamente na penumbra a humanidade de Jesus (Cristologia dedutiva); 2. A Cristologia actual (genética), parte do Jesus histórico, percorrendo o caminho que os discípulos fizeram, até considerar Jesus como Filho de Deus. Ganha-se a consciência mais vincada do lado humano de Jesus, que teve uma história concreta, a qual pode e deve ser objecto de investigação pelas várias ciências e métodos. 1.1. – Breve história da investigação sobre Jesus A história da investigação sobre Jesus de Nazaré pode ser resumida em várias etapas: 1. ETAPA PRÉ-CRÍTICA. Durante muitos séculos (até ao século XVIII), Jesus, Filho de Deus, foi objecto de uma fé quase sem problemas; as coisas estavam claras: a verdade dos evangelhos identificava-se com a verdade histórica. 2. «OLD QUEST» («velha questão»). A Idade Moderna regista os maiores abalos à consciência cristã; quer pela negação da divindade de Jesus, quer até pela negação da Sua existência real. Começa-se a falar do Jesus histórico contraposto ao Cristo da fé, havendo entre ambos uma ruptura. Reimarus 1694-1769 A questão inicia-se com Reimarus, que leva ao extremo a questão, dizendo que os apóstolos eram apenas uns falsários, pois o Cristo da fé pregado pela Igreja é uma fraude, é uma construção dos discípulos; para ele, Jesus foi um Messias político que fracassou. Os seus escritos foram publicados por um discípulo seu, G.E. Lewssing que os publicou desde 1774 a 1778. 1.1. – Breve história da investigação sobre Jesus David Strauss 1808-1874 Whately Strauss escreve a Vida de Jesus (1837),expondo que os discípulos criaram um Cristo ideal e o mito é a ideia-chave para entender os evangelhos. Couchoud escreve o Mistério de Jesus, em 1924, dizendo que Jesus é o produto dos sonhos das primeiras comunidades cristãs. Face ao radicalismo da negação da existência de Jesus por alguns, Whately (futuro arcebispo anglicano de Dublin), escreve em 1819 um livro cheio de humor: «Dúvidas históricas sobre Napoleão Bonaparte»; o livro foi escrito mesmo antes da morte de Napoleão! Napoleão foi um mito e interpretou toda a sua história de forma simbólica: isto para aqueles que diziam que Jesus nunca existiu! 1.1. – Breve história da investigação sobre Jesus A exegese alemã, do séc. XIX, baseando-se nos progressos científicos e literários, chegou a audaciosas conclusões nascidas do racionalismo. Com a TEOLOGIA LIBERAL, pretendia-se escrever uma vida de Jesus a partir das fontes «historicamente puras» e restabelecer a unidade entre o Jesus da história e o Cristo da fé. A finalidade da escola liberal era despojar a imagem de Jesus dos retoques acrescentados pelos dogmas cristológicos e pelas interpretações da Igreja primitiva. Chegou-se à célebre formulação da teoria da fonte Q (quelle). Albert Scweitzer Em 1905 escreveu que o balanço dessa investigação tinha sido negativo, pois chamava a atenção para o facto de que o que se atribuía a Jesus não era mais que o reflexo das ideias de cada um dos autores. Desiludido como professor de NT, decidiu aprender medicina e foi para África tratar dos leprosos, como algo mais prático. A. Von Harnack Escreve o livro «Vita Iesu scribi nequit», ou seja não se pode escrever uma vida de Jesus, pois do ponto de vista histórico nada podemos saber d’Ele. 1.1. – Breve história da investigação sobre Jesus A TEOLOGIA EXISTENCIAL apoia-se na herança que recebeu da teologia liberal do ponto de vista histórico-crítico; o seu precursor é M. Kahler e o seu principal representante é Rudolf Bultmann (teólogo e exegeta luterano alemão). Para Bultmann o Jesus da história não pode ser realmente alcançado pela pesquisa; Bultmann aplica a Formgeschichte («história das formas») aos Evangelhos sinópticos e manifesta a originalidade do pensamento de São Paulo e de São João. Embora não se possa saber, não é preciso, pois o que importa é crer que Jesus de Nazaré o Cristo; a fé é algo que se joga no âmbito da própria existência. Com Bultmann termina a etapa da «Old quest»: assiste-se a uma trajectória desde Reimarus que considera o Cristo da fé como uma fraude até Bultmann que diz que o Cristo da fé é o principal e o Jesus histórico é relevante, embora pouco se possa saber acerca d’Ele. Rudolf Bultmann 1884-1976 1.1. – Breve história da investigação sobre Jesus 3. «NEW QUEST» («nova questão»). Esta fase postula que existe entre o Jesus histórico e o Cristo da fé uma continuidade / passagem e não uma ruptura, como fez a etapa anterior; a Páscoa não é uma cortina que impede o acesso ao Jesus pré-pascal. Os alunos de Bultmann acharam que o mestre tinha ido demasiado longe. De facto, a história de Jesus é relevante para a nossa fé, pois caso contrário a nossa fé seria um mito, uma fé inventada. Ernest Kasemann 1884-1976 Esta fase teve início com Ernest Kasemann (exegeta luterano alemão) numa conferência em 1954 («Problema do Jesus histórico»). Com ele dá-se início à TEOLOGIA POSTBULTMANIANA. O trabalho dos postbultmanianos, a entrada das exegeses católica e anglicana na questão, o melhor conhecimento da literatura judaica contemporânea de Jesus e da comunidade primitiva, assim como dos seus procedimentos exegéticos e literários, descobertas como as de Qumram, os estudos de sociologia do cristianismo primitivo, etc., levaram a esse resultado. 1.2. – A questão das fontes (testemunhos sobre Jesus) Jesus não escreveu, a não ser uma vez sobre a areia (Jo 8, 6-8); é necessário fazer o ponto da situação das diferentes fontes que nos permitem conhecer a sua história: fontes pagãs; fontes judaicas; fontes cristãs (retidas ou não no cânone); traços arqueológicos. O Credo diz-nos que «padeceu sob Pôncio Pilatos»: esta afirmação estabelece uma ligação entre a vida de Jesus e a história universal, situando com exactidão o tempo e o lugar de Jesus. As fontes de historiadores pagãos são escassas: de facto, um obscuro canto do Império Romano (a Palestina) era apenas uma zona marginal sem grande interesse! Dispomos de apenas três testemunhos pagãos que remontam ao início do séc. II: AS FONTES PAGÃS 1º Numa carta dirigida ao imperador Trajano, Plínio o Moço (ou Jovem) (legado desse Imperador na Bitínia), no ano 112: Plínio, o Jovem «Eles afirmam que a sua falta, ou o seu erro consiste apenas nisto: reúnem-se em data fixa antes do nascer do sol, e cantam entre eles hinos a Cristo como se de um Deus se tratasse; comprometem-se por um voto, não a qualquer crime, mas a não cometer nem roubo, nem lutas, nem adultério, a não faltar à palavra, a não negar prisão reclamada em justiça» (Cartas a Trajano, X, 96). Tácito 2º - O historiador Tácito, em 116 conta que Nero, para se libertar da acusação de ter incendiado Roma, «designou como culpados» desse crime os «cristãos» e condenou-os à morte: «Este nome vem de Cristo que, no tempo de Tibério, foi condenado ao suplício pelo procurador Pôncio Pilatos. Reprimida na altura, esta abominável superstição aparece de novo, não somente na Judeia, berço do mal, mas na própria Roma» (Anais, 15, 44). 3º - Suetónio, no ano 120, na sua obra Vida do imperador Cláudio, alude a distúrbios na colónia judaica de Roma: Suetónio «Como os Judeus se sublevavam continuamente pela instigação de um certo Chrestos, ele [Cláudio] expulsou-os de Roma» (25, 3). Chrestos é uma deformação de Christus (forma popular romana de se referir a Cristo). Este conjunto de textos, pobre, só nos permite concluir duas coisas: 1ª - Aquele que é chamado Cristo foi condenado à morte por Pôncio Pilatos, na Judeia; 2ª - Ele está na origem da «seita» dos cristãos a quem prestam culto. 1.2. – A questão das fontes (testemunhos sobre Jesus) AS FONTES JUDAICAS Flávio Josefo 1808-1874 AS FONTES CRISTÃS Testemunho de Flávio Josefo, historiador judaico do séc. I, que faz três alusões à história de Jesus. 1ª - Diz respeito ao próprio Jesus, mas comporta um certo número de afirmações, que se pensa terem sido uma adição posterior cristã: reconhece Jesus como Cristo e a sua ressurreição. 2ª Diz respeito a João Baptista; 3ª Diz respeito ao martírio de Tiago (Antiguidades Judaicas, 18, 63-64; 18, 116-119; 20, 200). A recolha de textos judaicos referentes a Jesus também é pobre. Há pesquisas recentes que põem em relevo a dimensão propriamente judaica do rabi Jesus. Alguns procuraram identificar alguma relação entre Jesus e os essénios, espécie de monges que viviam nas margens do Mar Morto como sendo o seu «Mestre de Justiça» ou até o fundador da comunidade; para isso concorre o facto de Jesus ter, no início do Seu ministério, passado pelo deserto: no entanto, Jesus foi sobretudo um pregador, que contrasta nitidamente com a orientação silenciosa e contemplativa da comunidade essénia. Literatura canónica: a mais importante para nós (os escritos do NT, especialmente os quatro evangelhos); do NT dispomos de uma grande quantidade de manuscritos em comparação com o conjunto de manuscritos dos autores gregos e latinos da época, remontando alguns ao ano 150. Ao acesso aos evangelhos pode ser feito sob três pontos de vista: como obra histórica (importante perceber as contradições, etc.); como obras literárias peças de literatura!); e como obras teológicas (o crente vê neles uma mensagem de fé para a sua vida). Literatura apócrifa: escritos que não fazem parte do cânone bíblico (considerados pouco históricos ou demasiado tardios, ou continham elementos estranhos e não fiéis ao ensinamento primitivo); são escritos dissimulados, falsos ou inautênticos. Exs: Evangelho de Tomé, Protoevangelho de Tiago, Evangelho de Pedro, etc. O facto de serem «apócrifos» não lhes tira a priori o seu valor histórico, embora no geral contenham interpretações especulativas das Escrituras, ou desenvolvimentos lendários, etc. Mas se forem utilizados com prudência podem dar indícios históricos ou comparações interessantes. 1.2. – A questão das fontes (testemunhos sobre Jesus) O CONTRIBUTO DA ARQUEOLOGIA Betsaida, a terra de Pedro, André e Filipe… A arqueologia permitiu, nalguns casos, ir até mesmo ao séc. I. Por exemplo, a Casa de Pedro, descoberta em Cafarnaum, cuja configuração corresponde bem à descrição feita da cura do paralítico, descido pelo telhado por uma enxerga. Trata-se sempre de testemunhos indirectos da existência de Jesus, é certo, mas com valor. OS CRITÉRIOS DE HISTORICIDADE É preciso utilizar o método adequado, além das fontes. A partir da apresentação que faz M. Quesnel, podemos resumir um determinado número de critérios aplicados aos ditos e acções de Jesus: Critério da dificuldade ou de contradição: se uma palavra ou gesto de Jesus contradiz a imagem que os primeiros cristãos faziam dele, a Igreja não o pode ter inventado; por exemplo, o baptismo de Jesus por João parece colocar Jesus em situação de inferioridade em relação ao Baptista; Critério de descontinuidade ou de dupla diferença: o que não pode vir nem do judaísmo antigo nem das Igrejas do século I, tem toda a possibilidade de remontar ao próprio Jesus; por exemplo, os discípulos abstinhamse de praticar o jejum, mas era prática corrente do judaísmo e retomado depois pelos cristãos. Critério de atestações múltiplas: acontecimentos ou palavras atestados em diversas fontes ou tradições (por exemplo, a pregação de Jesus sobre o Reino de Deus) têm maior garantia de conservar a história de Jesus; Critério de coerência ou de conformidade: palavras ou gestos que são coerentes com os já confirmados; por exemplo, a distância que Jesus toma a respeito de determinados preceitos legais está em coerência com a distância ao interdito sábado. Critério de condenação à morte ou rejeição; episódios da vida de Jesus que contribuíram para irritar as autoridades judaicas e romanas e que conduziram à condenação à morte de Jesus (por exemplo, as aclamações de realeza na altura dos ramos, o escândalo das mesas dos cambistas derrubadas no Templo). Estes critérios exigem grande prudência na sua utilização; a sua convergência é particularmente significativa. 2. A história de Jesus de Nazaré: algumas referências históricas 2.1. – Dados pessoais As fontes não permitem construir uma biografia de Jesus no sentido moderno do termo: faltam dados, como a sua vida entre os 12 e os 30 anos, o dia do nascimento, a data exacta da Sua morte, ou então a cor dos seus olhos, dos seus cabelos… Mas isso também acontece noutras personagens ilustres de há 2000 anos… Pelos Evangelhos podemos seguir alguns passos da sua vida; mas aos autores dos evangelhos não lhes interessava fazer uma biografia de Jesus; são prioridade à transmissão dos significados e, se necessitam de algum dado físico e histórico de Jesus, então, e apenas então, utilizam-no. Além disso, «Há ainda muitas outras coisas feitas por Jesus» (Jo 21, 25). 2.1. – Dados pessoais PRINCIPAIS PASSAGENS EVANGÉLICAS APRESENTAM ALGUM DADO CRONOLÓGICO: QUE Lc 1,5: «nos dias de Herodes, rei da Judeia»; Mt 2, 2: «vimos a Sua estrela no Oriente»; Lc 2, 1-7: édito de César Augusto, Quirino, governador da Síria, faz um recenseamento; Lc 3, 1-3: João começa a pregar no ano 15 de Tibério; Pôncio Pilatos, os tetrarcas, Anás, Caifás; Lc 3, 23: Jesus tinha cerca de trinta anos; Lc 23, 54: era o dia da Preparação e já amanhecia o Sábado… 2.1. – Dados pessoais O primeiro dado seguro acerca de Jesus é que Ele existiu! Não é uma personagem inventada, embora acerca dele se tenham dito coisas contrapostas (como as negações levantadas em meios anticlericais em França no início do séc. XX e nos actuais debates no meio Anglo Saxão). Actualmente, isto não é posto em causa por pessoas medianamente cultas e conhecedoras da história judaica e romana: Jesus viveu durante os três primeiros decénios da nossa era na Palestina. 2.1. – Dados pessoais JESUS – Do grego Jesus, derivado do hebraico Jesua, forma abreviada de Jehosua: «Jhwh é salvação». O menino nascido da Virgem Maria chama-se Jesus «pois vai salvar o Seu povo dos seus pecados» (Mt 1,21). CRISTO - Cristo deriva do grego christós, que traduz o hebraico mashiah (messias), que quer dizer «ungido», «consagrado». JESUS CRISTO é a mais breve e a mais profunda fórmula de fé; exprime simultaneamente que Jesus Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro homem; filho Unigénito do Pai; segunda Pessoa da trindade; no tempo estabelecido por Deus fez-Se homem para redimir toda a humanidade. 2.2. – Os primeiros anos de Jesus Rio Jordão Nazaré Mar da Galileia ONDE NASCEU JESUS? Nasceu na Palestina, na província da Judeia, em Belém, conforme nos diz as narrações de Mateus e de Lucas. O Evangelho de São João ignora o local de nascimento. Quando era adulto, todos O conheciam como «profeta de Nazaré», «O Nazareno». Mas os dados não coincidem: -Mateus diz que José e Maria viviam em Belém quando Jesus nasceu; Jesus nasce em casa e os Magos vão aí adorá-l’O; Jerusalém Belém Mar Morto -Lucas diz que viviam em Nazaré e deslocaram-se a Belém por causa de um recenseamento; nasce num curral de animais dos muitos que existiam nos arredores de Belém, aproveitando as grutas naturais da zona. O mais importante, para além do lugar, é afirmar-se que em Jesus se cumprem as promessas e profecias. O PAÍS DE JESUS SITUAÇÃO GEOGRÁFICA… O Grande Mar ISRAEL ISRAEL SITUA-SE NO «CRESCENTE FÉRTIL»: Berço geográfico das grandes EGIPTO civilizações; região de “meia-lua” que abrange a Mesopotâmia – mesos + potamos = no meio de rios (Tigre e Eufrates), a Terra Santa e parte do Egipto. Região fértil para a agricultura. Nas restantes zonas predomina montanhas e desertos, leva à concentração de população em vales e planícies. O PAÍS DE JESUS NOMES DA TERRA PROMETIDA: Na Bíblia: «Terra Santa» (Zac 2, 12; Act 7, 33); «Terra de Canaã» (Gn 12, 5; 13, 12; Act 13, 19); «Terra Prometida»; «Terra dos Hebreus» (Gn 40, 15); «Terra de Judá» (sul de Israel actual, referente à tribo de Judá. Rt 1, 7); «Terra de Israel» (Ez 11, 16-20; Mt 2, 20-21); etc. b) Outros: «Kinahhi», «Khuru», «Amurru», «Harus», «Retenu», «Palassthu» (Filisteia, de que deriva «Palestina», que não é um nome bíblico, mas dado por escritores gregos e latinos). MONTES DO LÍBANO E ANTILÍBANO MEDITERRÂNEO (GRANDE MAR) ISRAEL SITUA-SE NO «CRESCENTE FÉRTIL», como vimos. «Desde Dan a Berseba» (Jz 20, 1). DESERTO SÍRIO LIMITE COM O DESERTO DO SINAI LIMITES GEOGRÁFICOS +/- 80km Lago Hule Vale do Hule M. Carmelo 528m M. Tabor 588m ▲ Monte Hermón Mar da BASAN Galileia Rio Jarmuc do Jordão Montes de Efraim Montes de Judá Deserto de Judá Deserto do Negueb TRANSJORDÂNIA CISJORDÂNIA Vale Mar da Galileia GALAAD Rio Jaboc Rio Jordão Rio Jordão AMON Mar MOAB Morto A R A B Á O PAÍS DE JESUS Mar Morto EDOM ZONAS GEOGRÁFICAS: TRANSJORDÂNIA: montanhas desertas, pouco elevadas, com temperaturas extremas. 5 territórios independentes. CISJORDÂNIA Montanhas da Cisjordânia: é a parte onde se desenrolam os principais acontecimentos bíblicos. A zona costeira: zona de planície interrompida pelo Monte Carmelo. O VALE DO JORDÃO: divide a Transjordânia da Cisjordânia; o Rio Jordão nasce no Monte Hermon com 2224 m de altitude, e desagua no Mar Morto a 392m abaixo do nível do mar, mais baixo do globo, concentração de sal, 2.2. – Os primeiros anos de Jesus QUANDO A data é difícil de estabelecer, pela simples razão NASCEU que não se nasce «grande homem»! JESUS? No Império Romano, os anos contavam-se desde a fundação de Roma, que se fixou em 753 a.C. Foi o monge Dionísio, o Exíguo (ou o Pequeno), que no séc. VI, calculou, com os dados que possuía na época que Jesus teria nascido em 754 a.C. de Roma, que seria o ano 1 do nosso calendário. Mas a data real da fundação de Roma foi 748a.C. Há assim um engano de cerca de 6 anos. Hoje sabemos algo que ele desconhecia: Herodes I, o Grande, em cujo reinado Jesus nasceu, morreu no ano 4.a.C. (data garantida por fontes extra-bíblicas): é certo que Jesus nasceu antes do ano 4.a.C. Dionísio, o Exíguo A data exacta não é certa, pois até pelo recenseamento que fala Lc 2, 1-2 não há clarificação: realizaram-se vários na época (Flávio Josefo fala em 7a.C., Tertuliano diz que foi entre os anos 9a.C. e 6.a.C.; outros dizem que teria sido em 7 a.C.). Há também outros indícios, por exemplo, cálculos astronómicos demonstram que houve uma grande conjunção de Júpiter e Saturno na constelação Peixes, no ano 7.a.C., talvez correspondesse com a «estrela dos magos». As datas mais prováveis são entre 4.a.C. e 7.a.C. ENTÃO POR QUE É QUE O NATAL SE CELEBRA a 25 DE DEZEMBRO? Esta festa só se estabelece nos finais do reinado de Constantino II (a partir de 354 d.C.) e nada tem que ver com a data e o mês em que realmente aconteceu o nascimento; o dia 25 era a festa romana do «sol nascente e invencível», por ser o solstício do Inverno (o momento em que a força solar cresce de novo). O TEMPO DE JESUS I- POLITICAMENTE TERRA COBIÇADA (por muitos Impérios), DOMINADA na época do NT pelos romanos. Este facto era fonte de tumultos e perseguições: TERRA CONTURBADA… 63 a.C: Pompeu invade a Judeia… 1ª revolta judaica (66-70): Tito destrói o Templo, em 70. …e reinam «reis-fantoches»: Herodes, o grande (37-4a.C.) (político sagaz, grande construtor, mas cruel…), depois os filhos (Arquelau, Herodes Antipas e Herodes Filipos) e o neto Herodes Agripa. 2ª revolta judaica (132-135): em 135, proíbem os judeus de entrarem em Jerusalém e a cidade foi dedicada a Júpiter com o nome de Aelia Capitolina. É província romana até 637, ano em que os árabes tomam a a cidade. Em 1948, nasce o Estado de Israel e muitos judeus voltam lá. O TEMPO DE JESUS II- ECONOMICAMENTE TERRA QUE PAGAVA PESADOS IMPOSTOS: Roma deixava certa autonomia aos dominados, mas exigia pesados impostos; a situação económica do país e das pessoas agravava-se; TERRA QUE VIVIA DA «TERRA»: predominava a agricultura, a pesca, os pequenos artesãos… III- SOCIALMENTE TERRA COM DESIGUALDADES CRESCENTES: o fosso entre ricos e pobres aumentava; TERRA FRACCIONADA: os grupos sociais e religiosos eram inúmeros, os fariseus, saduceus, escribas, publicanos, sumosacerdote, levitas, zelotes, sicários, o povo da terra, os baptistas, os herodianos, etc. TERRA QUE MARGINALIZA: os pobres, estrangeiros, as crianças, as mulheres… O TEMPO DE JESUS IV- RELIGIOSAMENTE -TERRA «RELIGIOSA»: a religião era fundamental na sociedade e o cumprimento dos inúmeros ritos também; o Sábado, a Lei, o Templo, a Sinagoga, o Sinédrio eram instituições importantes; a Páscoa, o Pentecostes (festa do dom da Lei do Sinai), os Tabernáculos, o Yon Kipur (dia do perdão), o Hannoukah (dia da purificação), sortes, etc., eram festas religiosas importantes; -TERRA QUE ESCRAVIZA: as inúmeras leis e prescrições levavam a que não fossem cumpridas por todos, especialmente pelo povo da terra, que se sentia marginalizado; os leprosos, os pecadores públicos, as mulheres com menstruação, os guardadores de porcos, etc., eram os impuros; tocar nalgum deles era ficar impuro; havia uma série de ritos de purificação, que implicava também, muitas vezes, o pagamento de dinheiro, que alguns não possuíam… -TERRA QUE ESPERA: devido à pressão dos invasores, à exploração económica, à pressão religiosa, havia um sentimento de espera do Messias: o Messianismo; seria aquele que os libertaria dos romanos e tornaria Israel livre; o tipo de Messias era diverso: uns esperavam um rei, outros um sacerdote, outros um profeta...: ninguém esperava um Messias como Jesus! É neste ambiente que nasce JESUS CRISTO... JESUS CRISTO «Tendo Jesus nascido em Belém da Judeia, no tempo do rei Herodes…» (Mt 2, 1) A Palestina no tempo do nascimento de Jesus Cristo Herodes 37 a.C. – 4a.C. «Por aqueles dias, saiu um édito da parte de César Augusto para ser recenseada toda a terra» (Lc 2, 1-7) «No décimo quinto ano do reinado do imperador Tibério, quando Pôncio Pilatos era governador da Judeia, Herodes, tetrarca da Galileia, seu irmão Filipe, tetrarca da Itureia e da Traconítide, e Lisânias, tetrarca de Abilena, sob o pontificado de Anás e Caifás, a palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto». (Lc 3, 1-2) A Palestina no tempo do ministério e morte de Jesus Cristo Augusto 27 a.C. - 14 Tibério 14 - 37 2.3. – Jesus e João Baptista «Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo: arrependei-vos e acreditai no Evangelho.» Mc 1, 15 JESUS FOI DISCÍPULO DE JOÃO BAPTISTA… Provavelmente viveu um longo período de discipulado com João em torno a Qumram, ao Mar Morto e ao Rio Jordão. O facto de João baptizar Jesus, dá-nos a entender que este foi seu discípulo, porque o mestre baptiza dos discípulos. O Baptismo de Jesus é um SINAL do início da vida pública e como forma de nos dar o exemplo. Neste período de tempo com João, Jesus foi descobrindo a sua própria vocação. Jesus não sabia do Seu futuro mais do eu nós sabemos do nosso: se assim não fosse, não teria sido homem em tudo igual a nós, excepto no pecado (cf. Heb 4, 15). Jesus começa a descobrir e a responder à pergunta de qualquer vocação: quem sou eu? Que quer Deus de mim? Outro dado seguro é que Jesus foi discípulo de João Baptista: a ligação de Jesus com João baptista é historicamente certa; Jesus fez-Se baptizar por João Baptista, pois pertenceu ao grupo baptista de João, mas operou, no que respeito à espiritualidade uma mudança, uma ruptura; Jesus não é um asceta retirado no deserto e não pretende formar um grupo de «puros», mas vive no mundo, come e bebe (Mt 11, 19) e dirige a todos uma mensagem universal. É no momento de responde a estas perguntas que Jesus se vai separar de João; Jesus deixa de identificar-se com o seu Mestre, reage perante ele e acaba por se separar: Jesus não irá pregar o mesmo que João Baptista. Jesus respondeu aos discípulos de João: «Ide contar a João aquilo que vedes e ouvis. Os cegos vêem, os coxos andam, os que têm lepra são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e aos pobres é anunciada a Boa Nova» (Mt 11, 4-5) 2.4. – O Ministério público de Jesus Outro dado seguro é que Jesus pregou às multidões: «o Reino de Deus está próximo». Os nomes indicados em Lc 3, 1s coincidem todos com a data indicada: «o ano quinze do imperador Tibério»; daí deduz-se que no ano 28 João Baptista andava a pregar; talvez ainda no mesmo ano, Jesus começasse a Sua pregação, a «vida pública». A duração da pregação de Jesus seria de dois anos e meio, ou ainda menos (segundo o Evangelho de João, Jesus subiu três vezes a Jerusalém pela Páscoa; os sinópticos, menos fiáveis historicamente relatam apenas uma subida, o que leva a pensar que, segundo estes, a actividade de Jesus Se desenrola durante um ano). Em Lc 3, 23, diz-se que Jesus tinha «cerca de trinta anos» quando começou a pregar; este dado, tomado à letra, dar-nos-ia pistas para averiguar outras datas; mas o dado parece simbólico, não matemático; quando José começa a sua actividade no Egipto teria 30 anos (Gn 41, 46); quando David começa a reinar tem 30 anos (2 Sam 5, 4); quando Ezequiel recebe a sua vocação profética, tem 30 anos (Ez 1, 1). Tudo indica que «30 anos» deve ser traduzido como «a idade ideal para começar uma missão». O número de 33 atribuído à duração da Sua vida seria formado por 30 anos até começar a pregação que durou 3 anos; mas nenhum dos dados estará correcto. Não é possível estabelecer uma cronologia das suas principais deslocações e acontecimentos; Primeiro, deslocou-se à Galileia e sente-se ligado, sobretudo, a Nazaré e Cafarnaum, de seguida à Judeia, tomando os caminhos que conduzem ás diferentes localidades; rodeia-se de 12 Apóstolos; sobe regularmente a Jerusalém pela Páscoa, segundo São João. A confissão de Pedro, em Cesareia de Filipe, no norte da Palestina, inaugura a última subida de Jesus a Jerusalém antes da sua morte. Por vezes, afasta-se da Galileia e dirige-se para norte, até Tiro e Sídon, ou à Decápole, na Samaria, à região dos Gerasenos, a leste do lago de Tiberíades. 2.5. – Jesus e os discípulos Dos discípulos de Jesus, houve 12 escolhidos por Ele, «enviados» para a Missão: 12 Apóstolos. Pedro Tiago, o Maior (filho de Zebedeu; filhos do trovão) João (filho de Zebedeu; filhos do trovão) Simão Pedro respondeu: «Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo.»(Mt 16, 16) Vendo isto, os discípulos Tiago e João disseram: «Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma ?» (Lc 9, 54) Filipe Disse-lhe Filipe: «Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta!» (Jo 14, 8) Mateus ou Levi Partindo dali, Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado no posto de cobrança, e disse-lhe: «Segue-me!» E ele levantou-se e seguiu-o». (Mt 9, 9) Tiago, o Menor Tiago, filho de Alfeu, (Mt 10, 2) Bartolomeu ou Natanael Então disse-lhe Natanael: «De Nazaré pode vir alguma coisa boa?» (Jo 1, 46) Simão «Simão, o Cananeu»(Mc 3, 18) «Simão, o Zelota» (Mt 10, 4) Tomé Respondeu-lhe: «Meu Senhor e meu Deus!» (Jo 20, 28) Judas Tadeu Perguntou-lhe Judas, não o Iscariotes: «Porque te hás-de manifestar a nós e não te manifestarás ao mundo?» (Jo 14, 22) André (irmão de Pedro) Passando ao longo do mar da Galileia, viu Simão e André, seu irmão, que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores. 17E disse-lhes Jesus: «Vinde comigo e farei de vós pescadores de homens.» (Mc 1, 16) Judas Iscariotes Judas, o traidor, tomou a palavra e perguntou: «Porventura serei eu, Mestre?» «Tu o disseste» - respondeu Jesus. ((Mt 26, 25) 2.6. – A morte de Jesus Outro dado seguro é que Jesus morreu numa cruz, sob a autoridade de Pôncio Pilatos, fora dos muros de Jerusalém. MAS QUANDO MORREU JESUS? Os sinópticos afirmam que foi a 15 de Nisan; São João diz que foi a 14 de Nisan; através de cálculos astronómicos sabe-se que os anos 28, 29 e 32, não coincidiram nem com o 14, nem com o 15 de Nisan, pelo que a morte de Jesus não poderia ter sido nesses anos. Se seguirmos a tradição dos sinópticos (menos verosímil) a data seria 27 de Abril de 31; se seguirmos a tradição de João, a data mais provável é 7 de Abril do ano 30; uma data menos verosímil é 5 de Abril do ano 33. Mas o mais aceite é que Jesus morreu às 3 horas da tarde no dia 7 de Abril do ano 30. Todos os evangelistas coincidem que era sexta-feira, «dia da Preparação, véspera do sábado»; naquela época o dia contava-se de um pôr-de-sol ao seguinte, esta sexta-feira (desde as seis da tarde de quintafeira até ás seis da tarde da sexta), abrange todo o desenrolar dos acontecimentos: última ceia, julgamento, crucificação e enterro. Curiosamente, a Crucifixão de Jesus é uma «prova» da existência de Jesus, pois «se, portanto, os primitivos cristãos levam séculos a aceitar a ideia de que o seu Deus tenha morrido sobre uma cruz, como pensar que este modo de morrer seja inventado, no mito, pelos próprios cristãos?», (MESSORI, Vitorio – Hipóteses cobre Jesus). Quanto à Ressurreição ela ultrapassa, como é compreensível, o âmbito da história, pois situa-se para lá dela, isto é, escapa à verificação pelos meios que a história se serve na sua investigação. Mais à frente, iremos voltar ao tema do «Processo e Morte de Jesus». JESUS CRISTO Mar da Galileia Nazaré NASCIMENTO: Belém, por volta de 6 a.C. «Ao chegar a plenitude dos tempos, Deus enviou o Seu Filho, nascido de mulher, nascido sujeito à Lei, para resgatar os que se encontravam sob o jugo da Lei e para que recebêssemos a adopção de filhos» (Gal 4, 4-5). Rio Jordão INFÂNCIA/ADOLESCÊNCIA VIDA OCULTA: Nazaré, também no Egipto. Jerusalém Belém Mar Morto Egipto CRUCIFICAÇÃO, por volta de 7/04/30. BAPTISMO DE JESUS – início da VIDA PÚBLICA, ano 27/28, por João Baptista. ESCOLHA DOS 12 APÓSTOLOS- os «enviados»: Pedro, Tiago, o Maior, João, Filipe, Mateus ou Levi, Tiago, o Menor, Bartolomeu ou Natanael, Simão, Tomé, Judas Tadeu, André e Judas Iscariotes. A VIDA PÚBLICA - marcada pela pregação, apoiada na Sua palavra com autoridade e nos milagres. A Sua missão é anunciar a «Boa nova», prega as Bem-aventuranças e ao amor ao próximo: «Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei» (Jo 15, 12). Toma especial atenção aos excluídos da sociedade. 3. O Evangelho de Jesus Cristo 3.1. – Jesus de Nazaré: um Messias diferente do esperado O MESSIAS ESPERADO: todos esperavam o Messias (palavra hebraica semelhante à grega Christos, que significa o Ungido – escolhido por Deus), que acabasse com as injustiças e libertasse do domínio romano; seria da descendência de David. Esperavam-se vários tipos de Messias: 1. Messianismo profético: seria um profeta (como Elias, Isaías…); 2. Messianismo régio: seria um rei (como David…); 3. Messianismo sacerdotal: um sacerdote (como Aarão…); 4. Messianismo apocalíptico: um anjo enviado por Deus… Seria um Messias triunfante e espectacular, que pela força libertaria Israel… OS FALSOS MESSIAS: por isso, no tempo de Jesus, surgiam inúmeros falsos messias que levavam a lutas armadas… Os próprios evangelhos dão testemunho desse clima: João Baptista pergunta «És Tu o que há-de vir ou devemos esperar outro?» (Mt 11, 4). JESUS, UM MESSIAS DIFERENTE DO ESPERADO. Ninguém esperava um Messias humilde, nem uma presença real de Deus na história concreta dos homens. Jesus não incita à revolta armada, mas à “revolução do coração”, à conversão interior! 3.2. – A Mensagem de Jesus: o Reino de Deus O Jesus histórico não pregou sistematicamente sobre Si mesmo, mas a Sua mensagem centra-se no REINO DE DEUS («Reino dos céus»), que «está próximo»… Mas o que é o Reino de Deus? O REINO DE DEUS é o próprio DEUS: não é um Reino que pertence a Deus, mas é o próprio Deus! O REINO NÃO É UM TERRITÓRIO, O REINO EXCEDE O HISTÓRICO: não é um território, mas começa já (está entre nós) e ainda não está na sua forma plena (só na Vida Eterna); «O reino de Deus não vem de maneira ostensiva. Ninguém poderá afirmar: Ei-lo aqui ou ali, pois o reino de Deus está dentro de vós» (Lc 17, 20-21); não é só espiritual, mas afecta toda a realidade do homem; O REINO NÃO É UMA IMPOSIÇÃO, É «GRATUITO», é uma Boa Notícia, Boa Nova, proposta que leva a que cada um o acolha ou o rejeite… O REINO É SALVAÇÃO: não só para o outro mundo, mas começa já, com a alegria de se ser perdoado por Deus e saber que Ele é nosso Pai. Vem para todos e gratuitamente; resta que o homem o acolha. 3.2. – A Mensagem de Jesus: o Reino de Deus O Reino não se limita ao religioso: diz respeito a todas as dimensões da realidade da pessoa: social, política, etc. O Reino de Deus é uma nova ordem iniciada com Jesus: nela não haverá pobres nem oprimidos, nem pecado, todos serão irmãos… Jesus não quer «consertar» o mundo velho, propõe uma mudança de valores, de forma de pensar e de actuar: Não se pode deitar vinho novo em odres velhos. A realidade do reino anunciado por Jesus supõe uma denúncia do velho funcionamento do mundo, uma exigência de mudança; é preciso eliminar tudo o que se opõe a Deus e ao homem. Jesus muda a cosmologia, a forma de pensar globalmente o mundo dos seus contemporâneos: denuncia como injusto um sistema duplo, horizontal com os homens e vertical com Deus; Deus deve ser tudo e em todos, o religioso e o social são faces da mesma moeda. Jesus muda o conceito de Deus; não é o que exige ser adorado somente em Jerusalém, nem o controlador do comportamento humano até aos ínfimos pormenores; a relação com Deus não se apoia unicamente no Templo e na Lei, mas sobretudo no amor que imita o amor gratuito e desinteressado de Deus. A vida humana deve ser compreendida como um dom, como um presente que é dado e deve dar-se. E a essência da vida é ser capaz de aceitar este dom, viver tudo na perspectiva da dimensão do acolhimento. Fixa um novo critério para avaliar as leis: se tem em conta as necessidades humanas, se ajudam o homem a ser feliz, se tornam possível o amor, aceita-as; para Jesus, não é a Lei que dá a felicidade à pessoa, mas o amor; Jesus altera leis como a pena de morte para os adúlteros, a poligamia e a Lei da observância do sábado. O predomínio do interno sobre o externo, da sinceridade interior sobre as aparências. Propõe a solidariedade universal; os laços vão para além da família, grupo ou raça; Jesus relativiza o dinheiro; é necessário, mas denuncia o apego a ele; modifica o poder e denuncia o prestígio. A única forma de participar no Reino é tornarmo-nos crianças, prescindir das máscaras e actuar a partir do impulso interior que está estreitamente unido a a Deus. O homem novo é o homem das Bem-aventuranças (Mt 5-7). 3.2. – A Mensagem de Jesus: o Reino de Deus A SÍNTESE DAS BEMAVENTURANÇAS Sermão da Montanha (Mt 5,7): as Bemaventuranças. Não são um conjunto de leis, mas são como um Evangelho, o que salva não é a lei, mas o amor. É-se discípulo de Cristo quando cada um for testemunha viva do Ressuscitado e trabalhar pela felicidade das pessoas: o Reino de Deus só é possível se há conversão do coração e nova mentalidade. Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus. Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sereis quando vos insultarem, vos perseguirem e, mentindo, disserem toda a espécie de calúnias contra vós. Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus. O essencial da mensagem de Jesus Jesus anunciou o REINO DE DEUS: É um reino de Ao Reino todos podem pertencer. Cabe a cada um acolhê-lo ou recusá-lo. amor, de justiça, que está dentro do coração de cada um. É a presença do amor de Deus dentro de cada um. 3.3. – A experiência de Deus como Pai Jesus era uma pessoa acostumada à oração; todo o dia era passado na presença de Deus; rezava em todos os lugares, momentos, orava com todo o corpo, em todas as ocasiões, especialmente as que se revestiam de uma carácter importante na Sua missão (transfiguração, antes do Baptismo, antes da Sua prisão…). Na Sua oração descobre o rosto de Deus. 1º 2º 3º O Deus de Jesus não está longe dos seres humanos, não está no alto, mas sim comprometido com a história humana e com os humilhados da sociedade; não se pode chegar a deus abandonando o maltratado que está á beira do caminho (Lc 10, 31). O Deus de Jesus não é manipulável, Ele é o totalmente Outro, não se pode dizer que se pode «ter» ou «possuir» Deus se fizermos determinadas coisas; este foi um dos erros dos fariseus. O Deus de Jesus está próximo de nós; enquanto que para os contemporâneos de Jesus, Deus é Aquele que não pode ser sequer nomeado, para Jesus é alguém tão próximo como o pai da parábola do Filho Pródigo (Lc 15, 11-32). Ama os filhos por serem filhos. Deus é bondoso, não é o Juiz castigador que alguns diziam, mas também não é o «deixa-andar», mas é o Pai que ama os filhos e chama-os à atenção quando deve. «Rezai, pois, assim: 'Pai nosso, que estás no Céu, santificado seja o teu nome» (Mt 6, 9) E dizia: «Abbá, Pai, tudo te é possível; afasta de mim este cálice!» (Mc 14, 36) 3.4. – O seguimento A MISSÃO DOS SEGUIDORES. No antigo Israel era normal os mestres e pregadores rodearem-se de um grupo de seguidores mais próximos ou discípulos. Diferente de outros mestres, Jesus chama os discípulos; há um convite expresso, uma vocação. Jesus toma a iniciativa, convida-nos. Jesus chama-os para compartilhar a missão de proclamar a chegada do Reino de Deus. Jesus também se diferencia dos outros por admitir mulheres no discipulado O GRUPO DE DISCÍPULOS. Podem estabelecer-se três círculos concêntricos para descobrir os seguidores de Jesus. 1º - O grupo dos apóstolos, doze segundo a tradição; 2º - Formado pelos discípulos que em número indeterminado seguiam habitualmente Jesus; uma vez envia a 72 com missões especiais; 3º - Grandes multidões que em algum momento seguiam a Jesus. No grupo de discípulos havia homens e mulheres, casados e solteiros, pessoas de diferente nível de vida, de diferentes ideologia e de diversas procedências. O grupo era numeroso e plural, reagindo de forma diversa; são uma representação de todos os seguidores de Jesus de todas as épocas. Mais do que serem 12 apóstolos, o facto é que 12 é teologicamente simbólico: com ele, Jesus dá a entender que os novos tempos messiânicos começaram, a formação do novo Povo de Deus, da sua totalidade. Deus formava um novo povo, uma nova aliança, uma nova história. Jesus chamou para discípulos mais próximos: dois irmãos de Betsaida: Simão (chamado de Pedro) e André; o primeiro era casado e residia em Cafarnaum. Outros dois irmãos seriam os filhos de Zebedeu, «filhos do trovão», Tiago (o Maior) e João. Os quatro eram pescadores. O seguinte foi Mateus, cobrador de impostos, com banca em Cafarnaum. Depois juntaram-se: Filipe, Bartolomeu (ou Natanael), Tomé, Tiago, filho de Alfeu (o Menor), Judas Tadeu, Simão, o Cananeu ou o Zelote e Judas Isacriotes. Entre as mulheres que seguiam Jesus, os Evangelhos citam o nome de algumas: Maria de Magdala, Susana, Joana (mulher de Cusa, administrador de Herodes), a mãe dos Zebedeus e Maria (irmã de Marta). AS INSTRUÇÕES DE JESUS. Nelas pode perceber-se as linhas mestras que devem presidir a toda a comunidade de crentes cristãos: Radicalidade e renúncia: deixar tudo para o seguir, sabendo que não será um «mar de rosas»; Amor gratuito, incondicional e perdão a todos (inclusive com o inimigo); Iniciativa em fazer o bem: «Tudo o que quiserdes que os outros vos façam, fazei-o vós também», a regra de ouro; Se Deus é nosso Pai, somos todos irmãos; A oração deve alimentar a vida do discípulo; O verdadeiro discípulo preocupa-se em fazer a vontade de Deus. Não são leis, mas resposta de amor ao chamamento de amor feito por Deus; ser discípulo de Jesus é exigente e supõe renúncias. 4. Os milagres de Jesus 4. – Os milagres de Jesus 1 É um dos pontos que mais nervosismo, estranheza e sorrisos provoca no leitor actual dos evangelhos. Na Modernidade colocou-se em causa os textos do NT, sobretudo por causa dos milagres, considerados incompatíveis com a razão. Um sábio, por exemplo, perante um fenómeno que não pode explicar, dirá: «Este fenómeno é inexplicável com o conhecimento que possuo na minha ciência»; apenas com a fé, enquanto crente, poderá ver aí um milagre, uma intervenção salvadora de Deus na história. 2 CONCEITO ACTUAL DE MILAGRE: o homem actual costuma chamar «milagre» a um acontecimento extraordinário que não se pode explicar do ponto de vista das ciências (factos saem das leis naturais estabelecidas pela ciência) e é atribuído, pelo menos por alguns, a uma intervenção especial de Deus. 3 CONCEITO BÍBLICO DE MILAGRE: nos relatos da bíblia não se põe o problema de cumprimento ou não das leis da natureza, mas se «se vê» a ajuda salvadora de Deus; o crente interpreta determinado acontecimento surpreendente (mesmo que não contrário às leis naturais) como sinal da acção salvadora de Deus. Por exemplo, toda a ordem da natureza, nos seus processos mais incompreensíveis como o da germinação das plantas, participa do milagre: Deus é o autor dessa transformação. O conceito bíblico dá o valor ao divino (intervenção de Deus) e o conceito actual dá mais valor ao extraordinário. 4 TIPOS DE MILAGRES: constatam-se os seguintes: curas, exorcismos, milagres sobre a natureza (transformação da água em vinho, a multiplicação dos pães e dos peixes, a pesca milagrosa, Jesus a caminhar sobre as águas, a tempestade acalmada, a maldição da figueira, etc); «Ressurreições» (de três pessoas: filha de Jairo, Mt 9, 23-26; filho da viúva de Naim, Lc 7, 11-17; Lázaro, Jo 11, 1-44)); Concomitantes, isto é, aqueles que acompanham a vida de Jesus, mas que não são realizados por Ele noutra pessoa (exemplos: concepção virginal, vozes divinas no Seu baptismo, transfiguração, fenómenos no momento da Sua morte, ascensão, etc).Segundo o sujeito que os realiza há vários tipos: milagres que Deus faz directamente em Jesus (a concepção virginal, a transfiguração e a Ressurreição); milagres que Deus faz através de Jesus (as curas, exorcismos, ressurreições de mortos e de superação dos elementos); e milagres que fazem os apóstolos e a Igreja (por exemplo, a Eucaristia). Há nestes milagres uma progressão, em que deus age directamente na história, em que Deus opera milagres em Jesus Cristo e em que a Igreja também faz milagres. 4. – Os milagres de Jesus 5 UMA PALAVRA SOBRE AS «RESURREIÇÕES»: as «ressurreições» que Jesus operou são diferentes do grande milagre da Ressurreição de Jesus; naquelas é mais correcto falar de «revivificações», pois Lázaro, a filha de Jairo e o filho da viúva de Naim, voltaram à mesma vida que anteriormente tinham, acabando por morrer mais tarde; a Ressurreição de Jesus significa a passagem para a vida plena e definitiva 6 OS MILAGRES FORA DA BÍBLIA: relatam-se alguns milagres atribuídos pelas tradições a personagens célebres, como Zaratustra, Buda e Mamomé, a alguns imperadores romanos, etc. No tempo em que Jesus vivia os milagres não tinham todos a mesma reputação: podiam ser atribuídos à boa acção de um deus, ou à acção do demónio; tudo o que era fora do comum era milagre. 7 OS MILAGRES SÃO INSEPARÁVEIS DA MENSAGEM DE JESUS: por exemplo, há milagres realizados em dia de sábado para escândalo dos judeus (Mc 3, 1-16), Jesus purifica um leproso, privilégio dos sacerdotes (Mt 8, 2-4); por vezes são sinais de contradição, por exemplo, Jesus e acusado de expulsar os demónios pelo chefe dos demónios (Mc 3, 22), etc. 8 OS MILAGRES COMO SINAIS: Jesus faz milagres, mas a Sua preocupação fundamental não é curar ou fazer coisas surpreendentes, ou querer demonstrar que é Filho de Deus (na verdade, muitas vezes pede que não se divulgue o milagre que acabou de operar); Ele não é um curandeiro, nem os faz só para os outros verem: se assim fosse, teria feito milagres quando Herodes o pediu (cf. Lc 23, 8), quando O demónio o tentou no deserto (cf. Lc 4, 3-12), quando pedem que Ele desça da Crus e Se salve a Si próprio (cf. Mt 27, 42), etc. A finalidade dos milagres é proclamar que onde Deus exerce o Seu reinado o homem salva-se; são sinais reveladores da presença e acção de Deus, cuja finalidade é suscitar a Fé naquele que contempla o mesmo e suscitar a mudança e conversão. São SINAIS que devem ser entendidos e interpretados para que ganhem o seu significado autêntico: ninguém se converte por causa de um milagre, mas pelo que crê que esse milagre significa. Os milagres são SINAIS da presença do Reino. 5. Reacções perante Jesus e a Sua Mensagem 5. – Reacções Jesus inicialmente tem êxito; é seguido em virtude dos sinais, pela pregação da chegada iminente do Reino de Deus. Porém, a pregação de Jesus começa a provocar conflitos. 1º A chegada do Reino de Deus supõe o fim da estrutura religiosa sobre que se apoia Israel: a Lei e o Templo; isto não agrada ao judaísmo; 2º - O reino chega com Jesus; mas Jesus não conseguiu convencer as autoridades da legitimidade da sua missão, que o declararam um impostor; 3º - O Reino de Deus é oferecido a todos; cabe a cada um acolhê-lo. Jesus assume o conflito quando decide subir a Jerusalém; o Messias havia de se manifestar em Jerusalém. As autoridades condenamn’O. A atitude adoptada por Jesus a respeito da Lei, do templo, dos poderosos de todo o género e, em geral, de tudo o que escravizava o homem obscurecendo o rosto de Deus, conduziram-n’O a uma confrontação com os poderes de Israel. JESUS PERANTE A LEI E PERANTE A RELIGIÃO: Coloca em causa a observância das leis da pureza ritual: «Nada há fora do homem que, entrando nele, o possa tornar impuro. Mas o que sai do homem, isso é que o torna o homem impuro» (Mc 7, 11). Para o judeu, a Lei (Torá= ensino ou «instrução» contido no Pentateuco) era de extrema veneração: rodeada de inúmeras interpretações minuciosas (mandamentos chegam a 613), com casuística elevada; como sinais externos de apego à Lei, alguns usam filactérias, espécie de fitas e caixinhas onde escreviam frases da Lei, para dizerem que a tinham na fronte ou no coração; os fariseus eram o grupo que mais se distinguia por cumprir a lei de forma escrupulosa, o que levava a um ritualismo, formalismo, visão legalista, sendo o pecado uma transgressão à Lei. Acima da lei e da tradição oral, está o cumprimento da vontade de Deus e a atenção á pessoa; a Lei tem sentido na medida em que está ao serviço do homem: «O sábado foi feito por causa dos homens e não o homem por causa do sábado» (Mc 2, 27). Denuncia o ritualismo externo e o legalismo moral quando se tratava de cumprir a Lei: ficavam-se na letra sem ir ao encontro da Lei (para os fariseus, Deus era um contabilista que apontava todas as faltas em contacorrente!). A regra fundamental é a do amor ao próximo, inclusive aos inimigos, doutrina exclusiva de Jesus. O Deus de Jesus não é o dos fariseus: Deus não pode ser encerrado em leis, ritos, a religião ou ideologia. 5. – Reacções JESUS PERANTE O PODER POLÍTICO: JESUS PERANTE A SOCIEDADE: Jesus não se esforçou por agradar ao poder político, nem por suavizar as Suas palavras, sem medo e sem Se curvar perante ele. Contudo nunca pretendeu ser um Messias político. Jesus adopta uma posição face ao poder público que o assemelha aos zelotes: não aceita nenhuma autoridade superior à de Deus; «Dai a Deus o que é de Deus», isto é, Jesus não reconhece nenhum direito divino a César. Contudo, não proíbe explicitamente que se lhe pague o tributo, o que decepcionará os zelotes, mas critica o poder absolutista de César, pondo em perigo a Sua autoridade sobre a Palestina. Jesus não se detém perante as ameaças de Herodes Antipas, a sua autoridade civil, a quem classifica de raposa (Lc 13, 32); observa a Pilatos que a autoridade vem do alto (Jo 19, 11) e não receia criticar qualquer autoridade totalitária: «Os chefes das nações governam-nas como senhores absolutos e os grandes oprimem-nas com o seu poder. Não seja assim entre vós» (Mt 20, 25-26). A Sua posição tornava-se perigosa perante as autoridades e ao mesmo tempo decepcionava o movimento zelote. Jesus adopta um acento crítico contra a injustiça social reinante; ameaça os ricos e poderoso que comem e riem enquanto ao seu lado há pessoas que choram e passam fome (Lc 6, 24-25). «Não podeis servir a Deus e ao dinheiro» (Lc 16, 13). Não se expõe nenhum programa social, mas trata de transformar o coração das pessoas e de que estas se convertam. Não admira que o desenlace fosse fatal! 6. Processo e Morte de Jesus 6. – Processo e Morte de Jesus A morte de Jesus pode ser vista por dois pontos de vista: histórico ou teológico. Aqui vamos ver na perspectiva histórica: por que mataram Jesus? Como surgiram o julgamento e a morte de Jesus? A Sua morte violenta foi consequência da pretensão que tinha caracterizado a Sua vida e lhe tinha provocado uma oposição cada vez mais cerrada das autoridades judaicas; Jesus previa a Sua morte, mas não tinha a certeza absoluta dela; mas assumiu o seu fim; a morte violenta não foi imposta por um decreto divino, mas obra de homens concretos. A morte de Jesus foi procurada por Ele próprio; podia Jesus ter-Se livre da morte? Sim. Mas Jesus vai ao encontro da morte porque a Sua relação de fidelidade com o Pai a isso obriga; é consequência da Sua actuação: esta é tal que as estruturas do pecado do mundo não a pode suportar e teve de ser eliminado. Por que foi condenado Jesus? Por dois motivos, que se relacionam com as estruturas: condenado por blasfemo por apresentar um Deus diferente do pregado pela religião oficial; os poderes religiosos perceberam que Jesus pregava um Deus oposto ao Seu; as autoridades políticas romanas condenam-n’O como rebelde político. Temos o relato bem testemunhado nos evangelhos da EXPULSÃO DOS NEGOCIANTES DO TEMPLO; e temo-lo numa relação com a morte de Jesus, «desde então, queriam matá-lo». Temos testemunhado a união de três palavras: Jesus – templo – destruição (acusado de tentar destruir o Templo e reedificá-lo em três dias, «não ficará pedra sobre pedra», é como atacar Deus; para os judeus, Deus é só um e vive no Templo; destrui-lo é atacar uma verdade fundamental da religião judaica. Caifás está perante um dilema: Jesus é o Messias e com Ele chega o Reino messiânico ou não; se a palavra de Jesus diz é Palavra anunciada por Deus, Jesus é um profeta verdadeiro e o Reino messiânico chegou; caso contrário, Jesus é um falso profeta e deve morrer (cf. Dt 18, 18-20). Converter-se ao que Jesus dizia era muito difícil: assim Jesus teve de morrer! Perante Pilatos, este considera-O inocente, mas condena-o. Depois da condenação, Jesus é levado fora dos muros de Jerusalém para ser crucificado (dentro não se podia executar ninguém); é-lhe posto ao pescoço a causa da condenação (o «titulus», neste caso «rei dos judeus); depois carrega o tarvessão da cruz (patibulum) com peso de 50kgs, percorreu mais de 600 metros até ao Lugar do calvário; lá já estava o madeiro vertical ou «stipes»; seria pregado pelos pulsos ao travessão. 7. A personalidade de Jesus 7. – A personalidade de Jesus O inquérito histórico não termina nos dados cronológicos, geográficos e exteriores da existência de Jesus. A atitude de Jesus a respeito do Templo de Jerusalém e da Lei judaica é paradoxal: Por um lado, como bom judeu, respeita em grande número as prescrições; afirma que não veio revogar a Lei, mas levá-la à perfeição (Mt 5, 17); Por outro lado, toma estranhas liberdades, em particular no que concerne à observação do sábado; de modo radicalmente diferente, desenha a paisagem legal, relativiza determinadas práticas e coloca no centro da gravidade os mandamentos essenciais do amor de Deus e do próximo. Quando Jesus fala da Lei, não fala como um escriba ou rabino que propõe comentários; fala em pé de igualdade, com autoridade; reivindica até o direito de a corrigir, levando-a mais longe; por exemplo: «Ouvistes o que foi dito aos antigos…» e «Eu, porém, digovos…»: esta Sua PRETENSÃO é exorbitante porque a palavra de Moisés era considerada expressão privilegiada da própria Palavra de Deus. Jesus também pretende perdoar os pecados: uma vez ao paralítico da Cafarnaum e outra vez à pecadora em casa de Simão, o fariseu (Mt 9, 1-9 e Lc 5, 17-26); ora, só Deus pode perdoar os pecados; por isso Lhe disseram que blasfemava. Uma tal reacção garante-nos a autenticidade histórica da cena. Do mesmo modo Jesus convida a deixar tudo para O seguir: a atitude que se toma a Seu respeito é a mesma que se tem por ou contra Deus; esta pretensão só é legítima se provem do próprio Deus. Jesus reivindica uma relação única com Deus a quem chama de Seu Pai (Mt 11, 27), Abba (papá). Jesus nunca Se denominou Filho de Deus, mas o Seu comportamento e palavra revelam a reivindicação de uma autoridade inaudita. O critério de rejeição e de condenação á morte é aqui válido: a pretensão de Jesus é de tal modo contraditória com o ensino corrente do judaísmo que não podia ter sido inventada pelos redactores; além do mais, são mostrados os episódios «desfavoráveis» a Jesus, como comer com os publicanos, os sofrimentos da paixão, o morrer numa cruz como um criminoso, etc.