XII Domingo do Tempo Comum (Ano C) O texto – Lc 9,18-24 18 19 20 Aconteceu enquanto orava em particular; estavam com Ele os discípulos e perguntou-lhes: «QUEM DIZEM AS MULTIDÕES QUE EU SOU?». Respondendo, disseram: «João Baptista; outros, Elias; outros, um dos antigos profetas que ressuscitou» Disse-lhes: «E VÓS, QUEM DIZEIS QUE Respondendo, Pedro disse: 21 EU SOU?» O CRISTO DE DEUS». Ameaçando-os, ordenou-lhes que a ninguém dissessem ISTO, e dizendo: «É PRECISO que o FILHO DO HOMEM SOFRA MUITO, SEJA REJEITADO PELOS ANCIÃOS, 22 PELOS SUMOS-SACERDOTES E PELOS ESCRIBAS, SEJA MORTO E NO TERCEIRO DIA RESSUSCITE». 23 Disse a todos: 24 Breve comentário Se alguém quer vir após mim, renegue-se a si mesmo, tome a sua cruz, TODOS OS DIAS, e siga-me. Pois, quem quiser SALVAR a sua vida há-de perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim há-de SALVÁ-la. O texto de hoje, à primeira vista, apresenta-se como um paralelo de Mc 8,27-35. Porém, uma análise mais atenta permite-nos ver o retoque que Lucas dá ao texto, inserindo-o na sua teologia. Não nos é dito o lugar, como em Marcos, que coloca o episódio a caminho de Cesareia de Filipe. Simplesmente, Jesus está em oração, em particular, rodeado pelos discípulos. Lucas apresenta sempre Jesus a rezar antes dum momento importante (cf. Lc 5,16; 6,12; 9,28-29; 10,21; 11,1; 22,32.40-46; 23,34). É neste ambiente de intimidade com o Pai e os discípulos, e prestes a iniciar o seu «caminho» para Jerusalém, onde irá levar a termo a sua missão, que surge a pergunta: «Quem dizem as multidões que Eu sou?». Os discípulos dão-lhe conta do que tinham ouvido por aí: «João Baptista; outros, Elias; outros, um dos antigos profetas que ressuscitou». As multidões não descobriram a essência da pessoa de Jesus, não são capazes de abrir-se à novidade de Deus, limitando-se a esquemas do passado distante ou recente – Jesus é João Baptista (que já tinha morrido), Elias (na linha do profeta Malaquias) ou um dos antigos profetas que ressuscitou. As respostas não satisfazem. Desde a queda de Jerusalém em 587 a.C. que o povo judeu viveu sob o domínio estrangeiro, até que no ano 141 a.C. a luta dos Macabeus teve êxito e conseguiu a independência desejada. Porém, as lutas internas enfraqueceram o poder e terminam com a chegada dos romanos à região. O general Pompeu anexou a Judeia a Roma no ano 63 a.C.. Com o decorrer dos anos, o desejo da independência voltou a crescer e a desejar o Rei-Messias que restaurasse definitivamente o reino de Israel. Nesta esperança, parece que Jesus não apresentava as características dum chefe político e guerreiro. Não é entendido como o Messias, mas como um precursor do Reino, na linha profética. Seria o Elias, o profeta por excelência que, conforme o final do livro de Malaquias e a crença popular, viria antes do Messias. Depois de ter feito uma sondagem genérica, a pergunta é dirigida também ao grupo dos discípulos («E vós, quem dizeis que Eu sou?»). Não podem escapar, pois fizeram em conjunto com o Mestre um longo caminho e há coisas que viram nele e que aprenderam com ele. Mas só Pedro, como representante dos outros e da fé cristã, respondeu: «O Cristo (Messias) de Deus», o ungido que o povo de Israel esperava. Jesus aceita o título, mas está consciente da carga nacionalista e gloriosa que tal conceito tem na mentalidade judaica da época, e também para os seus discípulos, pelo que proíbe que isto seja divulgado. Jesus é o Cristo, mas quer esclarecer a sua missão e o caminho para chegar à glória, à vitória. Mais tarde irá perguntar aos discípulos de Emaús: «Não devia o Cristo sofrer tudo isso e entrar na sua glória?» (24,26). Por isso, esclarece: o projecto de Deus («é preciso») para o reino e a libertação dos homens passa pelo dom da sua vida entregue por amor, passa pela cruz («Este é o rei dos judeus»: 23,38) para chegar à vida pela ressurreição. Este caminho é uma escolha que se impõe «a todos» os que querem seguir Jesus, não apenas a alguns. Não existe um termo intermédio. E não se trata somente da aceitação das contrariedades da vida (a nossa cruz), mas da renúncia ao orgulho («renegar-se a si mesmo») e duma vida de doação, de amor e de entrega («a cruz de Jesus»), não de vez em quando, em circunstância especiais, mas «todos os dias». É nesta escolha fundamental por Jesus («por causa de mim») que se pode «salvar a vida». P. Franclim Pacheco Diocese de Aveiro