Estudo qualitativo das espécies de Eiphosoma Cresson, 1865 (Hymenoptera, Ichneumonidae, Cremastinae) em ecossistemas brasileiros. Ivy Frizo de Melo 1*, Angélica Maria Penteado-Dias 2 1 Programa de Pós- graduação em Ecologia e Recursos Naturais da Universidade Federal de São Carlos. Rodovia Washington Luís, km 235 - SP-310, São Carlos - São Paulo – CEP 13565-905, Brasil. [email protected] 2 Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da Universidade Federal de São Carlos. Rodovia Washington Luís, km 235 - SP-310, São Carlos - São Paulo – CEP 13565-905, Brasil. [email protected] * Autor para correspondência: [email protected] , +55 016 3306 9360. PALAVRAS-CHAVE: Hymenoptera parasitóide, taxonomia, biodiversidade. TÍTULO RESUMIDO: Estudo das espécies de Eiphosoma Cresson, 1865 no Brasil. ABSTRACT We conducted a comprehensive study on the gender Eiphosoma Cresson, 1865, in the Brazilian fauna, aiming to expand the taxonomic knowledge of geographical distribution, ecological interactions and the importance of gender in question. About 541 individuals were identified from different Brazilian ecosystems, from the collection DCBU (Department of Ecology and Evolutionary Biology, São Carlos, SP). Through the analysis of specimens, we were able to identify 13 different species, and concluded that the most widely distributed in Brazil are Eiphosoma laphygmae Costa Lima, 1953, Eiphosoma paraguaiense Cushman, 1931, and Eiphosoma travassosi, Costa Lima, 1953. The ecosystem in which we observed the greatest 1 diversity of species was the Atlântica forest. All species have their geographical distributions very extended, and find the first quote from Eiphosoma septentrionale Brues 1911, and Eiphosoma haitiense Brues, 1917 for Brazil. RESUMO Realizamos um amplo estudo a respeito do gênero Eiphosoma Cresson, 1865, presente na fauna brasileira, incluindo o aprendizado em técnicas de coleta, triagem, identificação e montagem de himenópteros parasitóides. Identificamos as espécies brasileiras de Eiphosoma, com objetivo de ampliar os conhecimentos taxonômicos, da distribuição geográfica, interações ecológicas e importância do gênero em questão. Sendo assim, foram identificados 473 exemplares, provenientes de diversos ecossistemas brasileiros (Mata Atlântica, Pantanal, Floresta Amazônica, Cerrado), pertencentes à coleção DCBU (Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva, São Carlos, SP). Com a análise dos exemplares e sua respectiva distribuição geográfica pudemos identificar 13 espécies diferentes, e concluímos que as mais amplamente distribuídas no Brasil são Eiphosoma laphygmae Costa Lima, 1953, Eiphosoma paraguaiense Cushman, 1931 e Eiphosoma travassosi, Costa Lima, 1953. O ecossistema onde foi observada a maior diversidade de espécies foi a mata mesófila semidecídua. Todas as espécies estudadas tiveram suas distribuições geográficas muito ampliadas, além de constatarmos a primeira citação de Eiphosoma septentrionale Brues 1911, e Eiphosoma haitiense Brues, 1917 para o Brasil. INTRODUÇÃO Os Hymenoptera parasitóides possuem grande importância devido à habilidade em regular populações de outros insetos. Além do efeito regulador, possuem 2 importância ecológica como as interações tróficas que o grupo representa em ecossistemas terrestres (LaSalle & Gauld , 1992). Estudos a respeito da composição faunística de himenópteros parasitóides na Região Neotropical são escassos, principalmente a despeito da diversidade, importância biológica, ecológica e econômica deste grupo de insetos (Perioto & Lara, 2003). Os Cremastinae são endoparasitóides coinobiontes solitários de Lepidópteros, e algumas famílias de Coleoptera (fitófagos), têm presença mais escassa em regiões de temperaturas baixas, entretanto são muito abundantes e variados em habitats tropicais e subtropicais; nos trópicos, muitas espécies são freqüentemente encontradas em florestas úmidas, mas diferentemente de outros Icheneumonidae, grande parte dos Cremastinae é mais abundante em habitats mais abertos ou secos, incluindo agroecossistemas (Gauld, 2000). Foram encontrados oito gêneros de Cremastinae para a Costa Rica, sendo Eiphosoma um deles, caracterizado por possuir um dente ventral no fêmur posterior, asa anterior com a nervura 2rs-m distinta e quase sempre com aréola completa. O gênero compreende 52 espécies neotropicais descritas, subdivididas em 9 grupos de espécies. Para o Brasil são citadas atualmente 17 espécies (Costa Lima, 1953; Yu & Horstmman, 1997; Gauld, 2000; Fernández-Triana & Ravelo, 2007). Alguns ecossistemas brasileiros foram fonte de coletas para a realização deste estudo, dentre eles: Cerrado, Pantanal, Floresta Amazônica, Caatinga e Floresta Atlântica. Os ecossistemas do Cerrado e Pantanal compõem-se de um mosaico vegetacional onde se intercalam formações savânicas, lenhosas e campestres, formações florestais e vegetação aquática (Eiten, 1972). Em partes do Pantanal, o clima se aproxima do Semi-árido, com precipitações de 700 a 1200 mm (INMET 2005), sendo o 3 regime de inundação o fator responsável pelas comunidades vegetais hidrófilas. A presença de fragmentos naturais de florestas estacionais semideciduais e deciduais incluindo até cactáceas em sua flora, tanto no bioma Cerrado como no Pantanal, vincula-se a solos mais férteis, estacionalidade acentuada e menores níveis de precipitação (Felfili, et al. 2005). Grande parte do Pantanal é coberta por vegetação savânica de cerrado (Dubbs, 1994), enquanto que as formações florestais são também bastante representativas em ambos os biomas (Pott & Pott, 2003), oferecendo uma ampla gama de habitats e paisagens. A Floresta Pluvial Atlântica, que faz parte do Domínio Florestal Tropical Atlântico, foi uma formação florestal praticamente contínua ao longo de grande parte da região litorânea, estendendo-se desde o nordeste (Ceará) até o estado de Santa Catarina. A Mata Atlântica é claramente a formação florestal mais antiga do Brasil (Leitão Filho, 1987). Em termos de diversidade florística, os poucos dados disponíveis indicam que a Mata Atlântica é bastante rica em espécies (Silva, 1982). A Amazônia como um todo, é composta por uma série contínua de formações vegetais que são, floristicamente bastante distintas. Pires (1972) aponta a ocorrência de nove tipos principais de vegetação na Amazônia, sendo que as chamadas Matas de Terra Firme ocupam cerca de 90% da área de toda a região, representando, de longe, o ecossistema mais conspícuo e o de maior interesse científico. A Floresta Amazônica de Terra Firme está implantada sobre solos bastante diversos, de fertilidade muito variável. No geral as árvores deste ecossistema são bastante elevadas, com copas sobrepostas, que determinam em sombreamento permanente do solo; a ciclagem da matéria orgânica e dos nutrientes é bem rápida e os processos de sucessão e regeneração da mata são fortemente influenciados pela capacidade das plantas se desenvolverem na sombra; o número de espécies por área é muito elevado e a dominância de determinadas 4 espécies por área não é, via de regra elevada, destacando-se um grande número de espécies raras (Pires, 1972). As caatingas, em geral, são caracterizadas como formações arbóreo-arbustivas, hierarquizadas em diversas tipologias, muitas das quais ainda são praticamente desconhecidas do ponto de vista ecológico. Numa tentativa de adaptar a classificação da vegetação brasileira a um sistema universal, a caatinga nordestina foi recentemente classificada como ‘savana estépica’ (Brasil, 1992). Constata-se, porém, que, devido à grande extensão territorial que ocupa ( região nordeste e partes do estado de Minas Gerais) e os diferentes ambientes em que pode ser encontrada, a caatinga encerra uma enorme variabilidade microclimática e de faciações fitogeográficas, principalmente, pelas diferenças fisionômicas, densidades e biodiversidade. (Sousa, 1979; Andrade-Lima, 1981; Rodal et al., 1992; Sampaio et al., 1993; Sampaio, 1995). Os insetos exercem grande impacto em ecossistemas terrestres (LaSalle & Gauld ,1992). Eles são importantes pelo seu papel no funcionamento de ecossistemas naturais atuando como predadores, parasitóides, fitófagos, saprófagos, polinizadores (Periotto & Lara, 2003). A grande diversidade dos insetos nas florestas tropicais úmidas impressiona há muito tempo os cientistas. Entretanto, a atual dimensão de sua diversidade é ainda incerta, assim como a compreensão dos processos pelos quais ela é gerada e mantida. Adicionalmente menos de 20% dos insetos tropicais foram descritos pelos entomólogos (Godfray et. al., 1999). METODOLOGIA O trabalho incluiu atividades que foram desenvolvidas para que o projeto proporcionasse um aprendizado amplo, atingindo todas as áreas de um estudo 5 taxonômico, desde a coleta, triagem, montagem, conservação, até o estudo morfológico mais aprofundado. Foram realizadas coletas na área de Cerrado do campus da UFSCar, em São Carlos, SP, que está situado na área rural deste município, nas coordenadas 2158` S e 47 51`W. As coletas foram realizadas quinzenalmente, durante um ano (de agosto de 2004 a julho de 2005) utilizando três diferentes metodologias, sendo elas: armadilhas Malaise, Moericke e “varredura” da vegetação. Os materiais coletados e triados foram montados em alfinetes entomológicos, utilizando as técnicas usuais. Para a rotulagem utilizou-se etiquetas de procedência e de identificação. Os exemplares assim preparados foram dispostos em caixas do tipo unit trays com fundo de espuma plástica e dispostas em gavetas de madeiras organizadas em armários deslizantes mantidos em ambiente desinfetado e desumidificado. Além do material proveniente das coletas realizadas na área de Cerrado da Universidade Federal de São Carlos, foram estudados exemplares obtidos em outros ecossistemas brasileiros presentes nas principais coleções brasileiras já concentradas na UFSCar: coleção DCBU (Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva, UFSCar), coleção DZUP (Departamento de Zoologia da UFPR), coleção IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Brasília, DF), coleção INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Manaus, AM), coleção DZUSP (Museu de Zoologia da USP, São Paulo, SP). A identificação do material foi realizada com auxílio de microscópio estereocópico, utilizando a bibliografia básica, já compilada. RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram estudados 473 exemplares pertencentes ao gênero Eiphosoma procedentes de várias regiões do país (Tabela 1), e suas respectivas distribuições geográficas (Tabela 2). 6 Tabela 1- Relação entre o local de coleta (cidade, estado), as espécies de Eiphosoma encontradas e o número de exemplares de cada espécie encontrada em cada localidade. Local da coleta Espécies de Eiphosoma N˚ de exemplares analisados Ubatuba, SP E. lopesi 1 E. minense 1 E. laphygmae 7 E. ribeiroi 1 Pantanal, MT E. laphygmae 17 Itumbiara, GO E. ribeiroi E. laphygmae 1 2 E. septentrionale 3 E. laphygmae 2 E. paraguaiense 1 E. paraguaiense 1 E. minense 1 Jaboticabal, SP E. laphygmae 2 Amazônas, AM E. nigrum 5 E. septentrionale 1 E. travassosi 10 E. laphygmae 10 E. paraguaiense 2 E. batatae 2 E. fluminense 3 Viamão, RS E. dentator 1 Brasília, DF E. dentator 3 E. minense 1 E. paraguaiense 4 Ponto III E. paraguaiense 3 Serra Norte, PR E. travassosi 7 E. batatae 2 E. laphygmae 6 E. paraguaiense 2 Marcelino Ramos, RS E. travassosi 1 Tucuruí, PR E. laphygmae 1 Luís Antônio, SP E. laphygmae 16 E. travassosi 20 Dionísio, MG Sete Lagoas, MG 7 E. haitiense 1 E. batatae 9 E. minense 1 E. fluminense 1 E. lopesi 1 E. paraguaiense 2 Dourado, SP E. laphygmae 1 Ilha de Maracá, RR E. paraguaiense 2 E. laphygmae 1 E. travassosi 2 E. fluminense 2 Jataí, SP E. travassosi 1 Igarapé Salabo, PR E. laphygmae 1 Santarem, PA E. laphygmae 2 E. lopesi 1 E. laphygmae 10 E. silvai 1 E. minense 1 E. paraguaiense 9 E. fluminense 1 E. travassosi 5 E. ribeiroi 1 E. dentator 3 E. laphygmae 4 E. minense 2 E. dentator 5 E. dentator 2 E. laphygmae 60 E. travassosi 21 E. paraguaiense 1 E. paraguaiense 17 E. travassosi 22 E. silvai 1 E. minense 2 E. batatae 2 E. ribeiroi 1 Matão, SP Itiquira, MT Araraquara, SP São Carlos, SP 8 Descalvado, SP E. septentrionale 1 E. dentator 2 E. laphygmae 17 E. dentator 97 E. travassosi 2 E. batatae 2 E. laphygmae 13 Tabela 2 - Distribuição geográfica das espécies de Eiphosoma identificadas no Brasil. Espécie Distribuição pelos Estados brasileiros segundo a literatura estudada Distribuição pelos Estados brasileiros constatados neste estudo E. laphygmae SP, MG, GO, RJ, PR SP, MG, GO,PR, MT, RR, AM, PA E. travasossi RJ AM, SP, RR, PA, RS E. septentrionale # ( E.U.A ) AM, GO E. paraguaiense RJ MG, RR, SP, AM, DF, PA E. nigrum MT, PR, AM AM E. haitiense # ( Haiti ) SP E. fluminense RJ SP, AM, RR E. ribeiroi MT, SP SP E. lopesi RJ SP, PA E. batatae RJ, BA, PA SP, AM, PA E. dentator RJ, SP SP, DF, RS, MT E. silvai RJ SP E. minense MG SP, DF, MT, MG □ - Estados que representam a expansão da distribuição geográfica desta espécie comparada às bibliografias consultadas. # - Não há citações de presença desta espécie de Eiphosoma no Brasil. 9 As 13 espécies de Eiphosoma encontradas nos ecossistemas brasileiros, através deste estudo, estão sendo citadas abaixo, juntamente com sua respectiva ilustração. Eiphosoma laphygmae Costa Lima, 1953 (Figura 1) Figura 1: Ilustração de Eiphosoma laphygmae Eiphosoma paraguaiense Cushman, 1931 (Figura 2) Figura 2: Ilustração de Eiphosoma paraguaiense Eiphosoma travassosi Costa Lima, 1953 (Figuras 3, 4) Figura 3: Eiphosoma travassosi (macho) Figura 4: Eiphosoma travassosi (fêmea) 10 Eiphosoma septentrionale Brues, 1911 (Figuras 5, 6) (fêmea) (macho) Figuras 5 e 6: Ilustrações de Eiphosoma septentrionale Brues, 1911 Eiphosoma nigrum (Szépligeti, 1906) Townes & Townes, 1966 (Figura 7) Figura 7: Ilustração de Eiphosoma nigrum (Szépligeti, 1906) Eiphosoma minense Costa Lima, 1953 (Figura 8) Figura 8: Eiphosoma minense (fêmea) 11 Eiphosoma fluminens Costa Lima, 1953 (Figura 9) Figura 9: Eiphosoma fluminense (fêmea) Eiphosoma lopesi Costa Lima, 1953 (Figura 10) Figura 10: Eiphosoma lopesi (macho) Eiphosoma ribeiroi Costa Lima, 1953 (Figura 11) Figura 11: Ephosoma ribeiroi Eiphosoma haitiense Brues, 1917 (Figura 12) 12 Figura 12: Eiphosoma haitiense Eiphosoma silvai Costa Lima, 1953 (Figura 13) Figura 13: Eiphosoma silvai (macho) Eiphosoma batatae Cushman, 1931 (Figura 14) Figura 14: Eiphosoma batatae (fêmea) Eiphosoma dentator Frabricius, 1804 (Figura 15,16) Figura 15: Detalhe do fêmur de E. dentator Figura 16: Eiphosoma dentator (fêmea) CONCLUSÕES Com a análise dos exemplares e suas respectivas distribuições geográficas, pudemos concluir que as espécies mais amplamente distribuídas no Brasil são 13 Eiphosoma laphygmae, Eiphosoma paraguaiense e Eiphosoma travassosi. O ecossistema onde foi observada a maior diversidade de espécies foi a mata mesófila semidecídua (Mata Atlântica), seguida pela floresta amazônica e cerrado, sendo que o ecossistema que apresentou o maior número de exemplares foi também a mata mesófila semidecídua. Todas as espécies estudadas tiveram suas distribuições geográficas muito ampliadas, além de constatarmos a primeira citação do Eiphosoma septentrionale (5 exemplares: 4 fêmeas e 1 macho) para o Brasil, já que antes esta espécie só havia sido encontrada nos Estados Unidos da América por Brues em 1911, constatamos também a primeira citação para o Eiphosoma haitiense (1 exemplar macho), que anteriormente tinha sido observado apenas no Haiti, também pelo pesquisador Brues em 1917. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Andrade-Lima D. 1981. The caatingas dominium. Revista Brasileira de Botânica 4 (2): 149-153. Brasil, Secretaria de Planejamento, Orçamento e Coordenação. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 1992. 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