II COLÓQUIO DE DIREITO AMBIENTAL UFRGS - 15/05/2012 DIREITO AMBIENTAL E OS (NOVOS) INSTRUMENTOS ECONÔMICOS Daniel Martini, Promotor de Justiça/RS. Master Direito Ambiental Internacional – CNR – ROMA/ITÁLIA -2008/2009; Doutorando em Direito Ambiental – Universidade de Roma3/ITÁLIA – 2008/2012 [email protected] 1 “CRISE AMBIENTAL” Sociedades antigas: perigos externos... Sociedade de riscos: decorre das próprias decisões e os riscos gerados pela sofisticação da tecnologia que, agora, não consegue reagir... (Ulrich BECK) Quem é (somos) o vilão? 2 SISTEMA DO DIREITO E SISTEMA ECONÔMICO Ferrajoli diz que o mercado é o lugar das liberdades individuais, refrattario al paradigma dello stato di diritto, mas é o direito que vai garantir as liberdades (Principia Iuris, 2007, vol. II, p. 253/4) Por que o mercado (globalizado) não aceita bem a interferência do direito? Falta de um organismo mundial de controle ambiental? Falimento do sistema puro de comandos e controles? 3 MEIO AMBIENTE E MERCADO “every economic action can have some effect on the environment, and every environmental change can have an impact on the economy..” (Hanley; Shogren & White – 1997) - Caso Portaria 36/2010 - FEPAM 4 DIREITO AMBIENTAL X SISTEMA ECONÔMICO • Comportam preocupação semelhante: melhoria do bem-estar (qualidade de vida física e espiritual) das pessoas e a estabilidade do processo produtivo (vida material). 5 Se objetivam a mesma coisa, qual é o problema? Equilíbrio competitivo não socialmente eficiente enquanto não leva em consideração os custos externos associados à poluição e então se limita a maximizar o benefício líquido privado e não o benefício líquido social da poluição. 6 Corrigir estas falhas é difícil: as dificuldades surgem porque o ar, a água etc são bens de “propriedade comum” e os direitos de propriedade não são bem definidos... 7 8 9 10 OS BENS DE USO COMUM • Problema: falta de definição da propriedade – bens de propriedade comum (difusa) são não-excludentes – tendem ao esgotamento. 11 A Tragédia dos Comuns (Garret Hardin – 1968) • As pessoas, ao utilizarem os recursos naturais, como o ar, a água, as florestas, os animais, que são de propriedade comum ou não têm uma propriedade bem definida para fins econômicos, comportam-se como se donos únicos fossem, sem, no entanto, preocuparam-se com a preservação destes recursos. • Ou seja, como se donos únicos fossem, esgotam-nos e após abandonam; no momento de chamar à ordem a responsabilização pela preservação ou até pela recuperação destes recursos, não há quem o faça, não há um sujeito responsável. 12 A Tragédia dos Comuns (Garret Hardin – 1968) • Quando algo não tem propriedade defina, ou não tem um dono que cobre pelo seu uso, não nos preocupamos em mantê-lo, já que não possui, para nós, um valor econômico. O proveito econômico destes bens comuns é muito superior para quem deles se utiliza até o esgotamento do que os custos que recebe, por serem rateados por todos; logo, como o custo da “matéria prima” será muito baixo, o agente o explorará até o limite da sua necessidade ou esgotamento, sem se preocupar em preservar. Ou seja, como o custo para o agente será muito baixo (pois rateado por toda a sociedade), explorará até o esgotamento. • Exemplo da camada de ozônio. Como não há quem cobre pelo seu uso (definição do direito de propriedade), eventual deterioração da camada de ozônio prejudicará a todos igualmente, independentemente de ter contribuído para a destruição. Assim, provavelmente quem fabrica geladeiras, sprays, isopor, ou outros produtos que contenham gases agressivos à camada de ozônio, não se importará com isto, pois estará lucrando com esta atividade e os prejuízos estarão sendo distribuídos a todos os indivíduos do planeta, de forma igual. • (COSTA, Simone S. Thomazi. Análise, v. 16., nº 2. Porto Alegre, ago/dez 2005, p. 301/323) 13 Comportamento free rider • Tendencialmente, os indivíduos ou agentes econômicos utilizar-se-ão dos recursos naturais na medida em que estes lhes estejam disponíveis gratuitamente. Quando, todavia, algum ônus lhe seja imposto, ou tenderão a reduzir ou a eliminar o seu uso. 14 Comportamento free rider Ex.: uma dada empresa lança poluentes (seus efluentes líquidos, por exemplo) não tratados e de forma clandestina em um rio. Como ela não tem custos com este comportamento, não se preocupará em adotar medidas de prevenção ou minimização dos impactos, com a construção de uma estação de tratamento de efluentes. Então, com este comportamento, ela estará “tomando carona” nos custos sociais de despoluição dos rios. Ou seja, a poluição produzida pela sua atividade industrial não é internalizada; ao contrário, todo o custo será do governo, que necessitará de investimentos e políticas públicas adequadas para a despoluição dos rios (Simone da Costa). 15 CORREÇÃO... • Ainda que a propriedade permaneça (comum), a decisão do uso deve ser de agente (governo), para garantir que superexplorado e estabeleça um preço utilização (internalização). de todos um único não seja pela sua 16 AS EXTERNALIDADES... São falhas no sistema de mercado (deseconomia) e ocorrem quando as atividades de produção e ou consumo geram custos ou benefícios que não são contabilizados pelo mercado. Exemplos: - externalidades negativas (custos sociais): poluição ou esgotamento dos recursos naturais. - ext. positiva: lucro imobiliário decorrente da construção de um parque – PSA??? 17 A INTERNALIZAÇÃO... • A internalização corrige um defeito do mercado (a externalidade) e estabelece uma situação “ótima” (Ótimo de Pareto) – não é possível melhorar a situação de alguém sem que se piore a situação de outrem. • Eficiência no uso dos recursos naturais • Quando o mercado não corrige estas imperfeições (normalmente não faz), o que fazer? 18 INTERNALIZAÇÃO • O E deve atuar para fazer com que o meio ambiente (e seus custos) seja incorporado ao mercado: – Arthur Pigou e a Correção do Mercado; – Ronald Coase e a Extensão do Mercado. 19 Arthur Pigou e a Correção do Mercado O Estado deve introduzir um sistema de imposto em caso de deseconomia externa (efeitos sociais negativos) e de subvenção ou incentivo em caso de economia externa (efeitos sociais positivos). 20 Ronald Coase e a Extensão do Mercado • Estado atribui direitos de propriedade e pressupõe acordo entre os sujeitos envolvidos para internalizar os efeitos externos. – Disposição a pagar: poluidor pode se dispor a pagar um preço para continuar poluindo, mas a “vítima” pode também pagar um preço para o poluidor diminuir a poluição (soluções de mercado). 21 ECONOMIA AMBIENTAL • A economia preocupa-se com o meio ambiente quanto sente a necessidade de controlar o mau uso dos bens ambientais (dec. 70) - ESCASSEZ • Inicialmente a ideia era a adoção de políticas de controle e posteriormente desenvolvimento tecnológico para corrigir a distorção e fazer o mercado internalizar os custos. 22 ECONOMIA ECOLÓGICA Não é suficiente apenas externalidades, mas sim ... internalizar as ...buscar a estabilidade das funções ecológicas, particularmente ... a capacidade do ambiente em oferecer os recursos naturais para o funcionamento do sistema econômico e absorver os rejeitos, delineando “os limites do crescimento”. (Maurício de Carvalho Amazonas) 23 Economia Ambiental x Economia Ecológica Ao contrário da economia clássica, os “economistas ecológicos” apontam não ser suficiente a internalização das externalidades. Será necessário encontrar uma “escala sustentável”, ou seja, qual o estoque de capital natural capaz de suportar as funções ecossistêmicas básicas, assim como o fornecimento de matériasprimas e a capacidade de absorção dos resíduos gerados. (Adam Smith vs. John Nash) 24 QUAL O PAPEL DO DIREITO? 25 ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO • A aplicação do instrumental analítico e empírico da Economia, em especial da microeconomia e da economia do bem-estar social, para se tentar compreender, explicar e prever as implicações fáticas, bem como a lógica (racionalidade) do próprio ordenamento jurídico. • AED é a utilização da abordagem econômica para tentar compreender o Direito no mundo e o mundo no Direito. 26 EXEMPLO DE APLICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS ECONÔMICOS “custo-efetividade” (Cânepa, 2010) • Rio dos Sinos: 86mil ton/ano de DBO5, originados na pecuária, resíduos sólidos e industriais. • Se decide/necessita abater 40% • Custo de abatimento de cada setor: – Indústria: U$ 23.400 ton/ano – Resíduos sólidos: U$ 11 ton/ano – Pecuária: U$ 4 ton/ano Define-se por regulação um preço (cotas transferíveis ou cobrança direta pelo lançamento): U$ 8 ton/ano Como se comportarão os diversos setores? - gastar menos ou - investir o mesmo valor mas obtendo maiores benefícios... 27 Etapas de políticas ambientais • Primeira fase, dos fins do séc. XIX até o período anterior à II Guerra: resolução de conflitos individuais – direito civil. • Segunda Fase, de 1950 em diante: Políticas de comandos e controles • Terceira Fase, hoje, nos países desenvolvidos: padrões progressivos e instrumentos econômicos. 28 INSTRUMENTOS DE POLÍTICA AMBIENTAL • Políticas de comandos e controles – determinações legais que não dão aos agentes econômicos outras opções para solucionar o problema. Resultado: burla da lei. • Incentivos de mercado – visam dar maior flexibilidade aos agentes envolvidos, sem comprometer a eficiência dos resultados ambientais esperados. 29 INSTRUMENTOS “DE MERCADO” (classificação de Carmen Augusta Varela - FGV) • DIRETOS: – – – – Taxas e tarifas; Cotas transferíveis; Subsíduos à produção menos poluente; Sistema de restituição de depósitos. • INDIRETOS – Impostos e subsídios a equipamentos, processos, produtos... – Subsídios a produtos similares nacionais. INSTRUMENTOS ECONÔMICOS • Reduzem a regulamentação (não excluem), • dão maior flexibilidade aos agentes envolvidos (alternativas), • reduzem os custos de controle de problemas ambientais e • estimulam tecnologias mais limpas. 31 COMO ADEQUAR A TEORIA DO DIREITO? • Teoria do Ordenamento (atos conformes e atos desviantes): •Ordenamento protetivo-repressivo (três modos de impedir uma ação não desejada): – Torná-la impossível, difícil ou desvantajosa. • Ordenamento promocional (como obter a ação desejada [direito-moral?]): – Torná-la necessária, fácil ou vantajosa. 32 TÉCNICA DO ENCORAJAMENTO • “...La tecnica dell’incoraggiamento mira non soltanto a tutelare ma anche a provocare l’esercizio degli atti conformi, spareggiando nel caso di atti permessi la possibilittà di fare con quella di non fare, rendendo particolarmente allettanti gli atti obbligatori e particolarmente ripugnanti quelli proibiti.” (BOBBIO, Norberto – Dalla Struttura alla Funzione – Nuovi Studi di Teoria del Diritto. Editori Bari: Editori Laterza - 2007). 33 COMO SE DÁ? • FACILITAÇÃO • SANÇÃO POSITIVA 34 SANÇÕES POSITIVAS • Bobbio aponta que o novo direito (promocional) não se limita a permitir ou proibir, mas promover. • Para tanto, a sanção (a quem realizar o preceito da norma) assume uma dimensão não mais de pena, mas positiva, sob a forma de incentivos e prêmios (recompensa). 35 CONCLUSÕES • Os instrumentos de comandos e controles não são totalmente favoráveis: não dão opção de soluções com menores custos e não estimulam a busca por tecnologia que reduza a poluição abaixo dos índices estipulados. • É possível usar o mercado como instrumento para atingir uma alocação eficiente dos recursos naturais se se consegue internalizar os custos (poluidor [consumidor/produtor] - pagador) – “ganha-ganha” • Um nível de poluição (como uso dos recursos naturais) que maximize o benefício líquido social (Pareto), mas que incorpore uma escala sustentável. • Necessidade da regulamentação para garantir a liberdade do mercado (antitruste, tutela do consumidor, etc.) – Keynes? • Ou seja, pacotes de políticas públicas que englobem soluções mistas (comandos e controles e instrumentos econômicos, notadamente com o uso de sanções positivas) e negociadas (Tac) • Deve-se buscar uma política realista, que seja eficiente em termos de custos e efetivos no sentido de atingir os objetivos SOCIAIS propostos (melhor qualidade ambiental e um menor custo social). 36