Bases epidemiológicas das doenças não transmissíveis Profª Anna Geny Batalha Kipel Perfil epidemiológico e demográfico brasileiro Nas últimas décadas o Brasil passou por importantes transformações no seu padrão de mortalidade principalmente nas seguintes condições: Redução da mortalidade precoce (doenças infecciosas e parasitárias) Aumento da expectativa de vida ao nascer Aumento de acidentes e violência, mudança do perfil epidemiológico de algumas doenças transmissíveis (decorrência da urbanização) Mudanças demográficas 1980: pirâmide populacional com base larga e ápice estreito 2000: redução da fecundidade e aumento da expectativa de vida – pirâmide populacional - estreitamento da base e ampliação do ápice. – nesse período a fecundidade reduziu de 4,4 para 2,3 filhos por mulher e a proporção de pessoas maiores de 60 anos cresceu de 6,1% para 8,6% (IBGE,2002) TMI 1940: 149 por 1.000 NV (SIMÕES, 1997) TMI 2000: 29,7 por 1.000 NV (IBGE, 2002) Essa redução decorre principalmente na mortalidade infantil pós neo-natal, fortemente associada com fatores relacionados ao ambiente (doenças infecciosas) Diferenças regionais importantes nas TMI Região sul, ano 2000 17,06/1.000 nv Nordeste, ano 2000 44,9/1.000 nv Risco de uma criança morrer antes de 1 ano de idade no estado de Alagoas é de 4,1 vezes maior do que no Rio Grande do Sul (IBGE, 2000) Diferenças no perfil epidemiológico nas TMI 1980 - 2000 TMI proporcional 1980 23,98% TMI proporcional 2000 7,2% Proporção de 48,44% óbito > 50 anos SwaroopUemura- 1980 Óbitos > 50 67,1% anos Swaroop- (RIPSA, 2001) Uemura - 2000 Expectativa de vida ao nascer 1940 – 44,9 anos (SIMÕES,1997) 2000- 68,55 anos (RIPSA,2001) Doenças Infecciosas e Parasitárias (DIP) 1930 – 45,6% do total de óbitos nas capitais brasileiras 2001 – 5,6% A redução da morbimortalidade foi obtida entre outros fatores pelo: desenvolvimento de novas tecnologias (vacinas, antibióticos) Ampliação do acesso aos serviços de saúde, medidas de prevenção e controle Saneamento básico Essa tendência foi particularmente verificada nas doenças imunopreveníveis: erradicação da varíola (década de1970), poliomielite, 1989 Doenças e Agravos Não Transmissíveis(DANT) • As Doenças não transmissíveis são todas as doenças que não são adquiridas por contato com pessoas infectadas com o agente causador da doença e ou vetores • Esse grande grupo incorpora uma miríadade de doenças que devido a sua prevalência são importantes na área da saúde pública Características das DANT Longo período de latência Longo curso assintomático Curso clínico em geral lento, prolongado e permanente Manifestações clínicas com períodos de remissão e exarcebação Lesões celulares irreversíveis, evolução para graus variados de incapacidade ou morte Doenças Crônicas Não Transmissíveis • A magnitude das DANTs na civilização humana é crescente e os custos econômicos e sociais delas decorrentes se avolumam e tornam-se um problema de saúde pública incapacidade em idade produtiva morte prematura Sobrecarga da demanda pelos serviços de saúde Aumento dos custos assistenciais Doenças Crônicas Não Transmissíveis Doenças cardíacas e cerebrovasculares Cânceres Diabetes Hipertensão Doenças auto-imunes Doenças crônicas do aparelho respiratório Doenças mentais Lesões por acidentes (DANT) Violência (DANT) RELATÓRIO DA OMS – 2000,2002 Total de óbitos em 1999: 55,965 milhões Desses: 59,8% seriam devidos a 31,1% seriam devidos a 9,1% a causas externas doenças não-transmissíveis doenças transmissíveis condições maternas e perinatais deficiências nutricionais Importância dos fatores de risco relacionados com as DANT Pressão sanguínea elevada – 7,1 milhões de mortes – 13% do total de mortes Nível elevado de colesterol – 18% das doenças cerebrovasculares, 56% das doenças isquêmicas do coração Índice de massa corporal superior a 21kg/m2 – 58% dos casos de diabete mellitus, 21% das doenças isquêmicas do coração, 8% a 42% de certos tipos de câncer Baixo consumo de frutas e vegetais – 19% das neoplasias gastrointestinais, 31% das doenças isquêmicas do coração, 11% dos AVC Inatividade física – 1,9milhão de mortes, 10% a 16% dos casos de câncer de mama, colon e reto, 22% das doenças isquêmicas do coração Tabagismo – 8,8% das mortes, 4,1% dos anos de vida perdidos ajustados por incapacidade, 12% das doenças vasculares, 66% das neoplasias de traquéia, brônquios e pulmão, 38% das doenças respiratórias crônicas Ingestão de álcool – 3,2% das mortes, 4% dos anos de vida perdidos ajustados por incapacidade, entre 20% e 30% dos casos de neoplasia do esôfago, fígado, cirrose hepática, de homicídios, epilepsia, acidentes com veículos Lesões por acidentes de trânsito – 2,3% das mortes (90% dessas mortes ocorreram em países de médio e baixo índice de desenvolvimento econômico) Doenças cardiovasculares 1930 11,8% do total de óbitos 2001 31,1% do total de óbitos Mortalidade em todo o país no ano 2001 DCV – 31,9% Neoplasias – 15,2% Causas Externas – 14,6% Organização Pan-americana de Saúde (OPAS,1997) Óbitos em 1990 foram devido a 9% causas externas 57,9% doenças não transmissíveis AVC 45% Neoplasias Malignas 19,7% Diabetes 4,9% Incapacidades decorrentes das DANT DANT + Causas externas representam 54,2% e 17,7% dos anos vividos com incapacitação Apesar dessa constatação há relativamente pouca informação sobre o perfil epidemiológico das DANT, o comportamento de risco e o impacto sobre os sistemas de saúde, capazes de subsidiar a adoção de políticas de promoção, prevenção e recuperação da saúde nesse campo. Nenhum estudo abrangente sobre custos das DANT na América Latina e Caribe foi publicado (OPAS,2002) Custo das doenças cardiovasculares EUA =2% do PIB Canadá = 21% de todos esses custos são atribuídos a doenças cardiovasculares, US$ 12 bilhões anuais Doença cardiovascular foi responsável pela maior proporção 32% de perda de renda devido à morte prematura (OPAS,2002) No Brasil em 2002 as DANT representaram 76,7% do total desses gastos, R$ 4,1bilhões Doença do Aparelho Circulatório R$ 1 bilhão para as 1,2 milhão de internações realizadas nesse ano Prevalência de diabetes = 7,6% da população entre 30 e 69 anos Detecção de casos suspeitos nas unidades básicas SUS com a realização de glicemia capilar > 40 anos= 2,9 milhões (14,66%) de suspeitos (MINISTÈRIO DA SAÙDE,2002) Vigilância epidemiológica das DANT FRAMINGHAN – EUA 1950 – estudos constituíram-se nas primeiras referências para implantação de ações de vigilância de fatores de risco (DCV) demonstrando ser possível fazer predição sobre incidência futura de eventos fatais e não-fatais a partir do mapeamento populacional dos principais fatores de risco: tabagismo, HA, aumento do colesterol no sangue, obesidade, diabetes (SYTKOWSLY,1990) Vigilância epidemiológica das DANT Para a VE das DANT não há interesse que sejam conhecidos casos individualizados pois a ação não está centralizada em único agente que produza a doença As etiologia das DANT são geralmente multicausais O foco central é estabelecer os níveis de exposição aos fatores de risco algumas vezes a diversas doenças ao mesmo tempo As relações estabelecidas nas DANT são de associações estatísticas significantes (fator e agravo) essa relação não pressupõe, necessariamente, seu surgimento Modelos epidemiológicos e Vigilância das DANT A abordagem para as ações de vigilância das DANT muda do modelo ecológico, aplicado nas Doenças Transmissíveis (tríade – hospedeiro, agente, meio ambiente) com a proposta de Laframboise, 1973. O novo modelo aborda o binômio saúde – doença denominado “campo da saúde” Sua característica central está no reconhecimento da multicausalidade para determinação da saúde ou doença Os estados saúde – doença decorrem de fatores relacionados aos seguintes elementos Biologia humana : constituição orgânica do indivíduo (herança genética, processo natural do envelhecimento, constituição do indivíduo, mecanismo de defesa, suscetibilidades, resistência. Ambiente : dimensão física (clima, acesso a água, radiação), exposição a agentes poluentes (pesticidas, gases), social (nível sócio econômico, renda, escolaridade, tipo de inserção no mercado de trabalho, riscos ocupacionais, novas tecnologias) - os fatores sociais ganha cada vez mais importância como elemento explicativo da determinação das DANT. Estilo de vida : decisões a respeito da saúde como lazer, hábitos alimentares, cultura determinado pelo ambiente social Organização da atenção a saúde : envolve a disponibilidade, a quantidade e a qualidade dos recursos destinados aos cuidados com a saúde Objetivos da Prevenção e Controle das DANT Reduzir a incidência e a prevalência Retardar as complicações incapacidades Aliviar a gravidade Prolongar a vida com qualidade e Objetivos da Prevenção e Controle das DANT Um importante objetivo estratégico para a prevenção das DANT é buscar a mudança na percepção social sobre esses agravos á saúde e suas complicações, removendo o sentimento de inevitabilidade, modificando o perfil epidemiológico por intervenções no setor saúde com políticas de promoção da saúde de caráter multisetorial (campo regulatório, intervenções com políticas públicas, educação, mobilização comunitária) Metodologias e Instrumentos para Vigilância de DANT Para realizar a abordagem metodológica e estruturar as ações de vigilância epidemiológicas das DANT são necessários disponibilidade de dados confiáveis e capacidade técnica para transformar os dados em informações. Uma abordagem passo a passo para implantar a vigilância das DANT deve prevê o monitoramento da mortalidade (em que se olha o passado), as doenças (em que se acompanha o presente da ocorrência) e a vigilância dos fatores de risco ( em que a capacidade de intervenção aumenta na medida em que se olha para o futuro em que ocorrerá o dano à saúde) (OMS, 2001) Monitoramento da Doenças e Agravos – morbidade, mortalidade Não existe um sistema que forneça informações primárias sobre a morbidade das doenças crônicas. Elas não são de notificação compulsória Existem alguns sistemas de informações disponíveis que possibilitam a realização de análises do comportamento dessas doenças na população, no entanto não são de cobertura universal (não incorpora informações da iniciativa privada). Sistema de Informação Ambulatorial do SUS (SAI-SUS) Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH-SUS) Sistema de Informação Ambulatorial do SUS (SIA-SUS) relacionados a exames e tratamentos de alta complexidade – insuficiência renal crônica, câncer... Sistema de Informações hospitalares do SUS (SIH-SUS) dispõe do registro de todas as internações tanto no sistema público como no privado Monitoramento dos fatores de risco O foco principal da prevenção e controle das DANT está centrado na redução da exposição das pessoas aos fatores de risco. Eles são agrupados em quatro categorias: Constitucionais sexo, idade, raça, hereditariedade Comportamentais tabagismo, dieta, sedentarismo, consumo de bebidas alcoólicas, anticoncepcionais Distúrbios Metabólicos HÁ, obesidade, hiperglicemias Características socioeconômico-culturais ocupação, renda, escolaridade, classe social, ambiente de trabalho Intervenção para prevenção de DANT e promoção a saúde As DANT constituem-se em um dos mais importantes problemas de saúde pública da atualidade, responsável por 59% do total de mortes ocorridas no mundo e por 43% da carga global de doenças (OMS, 2001) Prevenção Primária dirigida as pessoas suscetíveis, antes que elas desenvolvam a doença – recomendação para mudanças Nível Secundário de prevenção dirigido ao controle de doenças, ás pessoas assintomáticas pertencentes aos grupos de comportamento de risco, evitando que se tornem doentes Nível terciário ações dirigidas as pessoas que já se apresentam doentes com o objetivo de prevenir complicações e incapacidades Estratégias para a Implementação de Programas de Prevenção para as DANT Reorientar o Sistema de Saúde para alocar recursos humanos treinar e atualizar os profissionais em prevenção Desenvolver educação em saúde dentro e fora dos serviços de saúde Capacitar lideranças, voluntários, comunidade Aumentar o nível de informação na rede de ensino formal e informal Desenvolver programas de prevenção nos locais de trabalho Buscar a adesão de parceiros em múltiplos setores Monitorar os riscos e avaliar os resultados Fonte ROUQUAYROL, ALMEIDA FILHO, 2003