A Religião e o Idoso Jorge Amaro A Religião e o Idoso A Religião pode beneficiar ou prejudicar o idoso? Quando o idoso não tem religião nem acredita em Deus a iniciação religiosa poderá beneficia-lo ou prejudica-lo? Se o idoso tem religião devemos estimulala para o seu bem estar? Todas estas perguntas estão centradas em uma que é sobre a Saúde Mental e a Religião. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A História nos mostra que os termos Religião e Espiritualidade não eram separados e distinguidos entre si.Nestas últimas décadas inicia-se a separação dos termos.Religioso era o indivíduo espiritualizado e o não espiritualizado era religioso o indivíduo materialista.Neste antigo conceito só os religiosos promoviam a espiritualidade. A Religião trata os problemas e conflitos do homem por meio da catequese enquanto os profissionais da saúde o tratam por meio da ciência. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A catequese é uma instrução metódica onde as teorias transmitidas são oriundas da fé e da revelação.As idéias da catequese se originam nos dogmas que são inquestionáveis segundo a ortodoxia religiosa. A psicoterapia é uma postura metódica onde as teorias são questionáveis e modificáveis supervisionadas pelos métodos científicos. Afinal de contas o que é a Religião?A crença no sobrenatural?;A crença em Deus?;A crença no Divino?. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A Religião é uma das expressões mais antigas da espiritualidade do homem e portanto é fundamental o profissional da saúde estar consciente da profunda influência que ela tem no comportamento.Alguns autores criticam uma definição pois ora não são abrangentes ou são tão genéricas que mal explicam aquele homem religioso em particular.Assim definir a religião como o reconhecimento humano do poder sobrenatural,a crença em Deus,qualquer sistema de fé e culto são descrições genéricas que se tornam ineficazes.O termo religião é abrangente encerrando muitos conteúdos essenciais tornando-se mais pratico separar a Religião Institucionalizada Jorge Amaro A Religião e o Idoso Leonardo Boff é um dos autores que correlaciona o termo espiritualidade à proteção da vida e seu desenvolvimento,sem obrigatoriamente ser correlacionada ao Divino.Ele considera a espiritualidade uma função que põe homem em uma atitude de colocar a vida no centro,que defende e promove a vida,contra todos os mecanismos de morte,de diminuição e estancamento e nestas condições o oposto ao espírito não é o corpo mas sim a morte e tudo o que estiver ligado a ela,tomada em sentido amplo,de morte biológica,social,existencial ,no sentido de humilhação,fracasso e opressão. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Com esta forma de pensar espiritualidade é função construtiva e defensora da vida e do desenvolvimento do homem o qual poderá estar acoplado ou não à uma Religião. Um homem religioso pode ser pobre em espiritualidade e um homem não religioso poderá ser rico em espiritualidade.É evidente que tanto o religioso como o não religioso podem ser ricos em espiritualidade mas devemos entender que a Religião não é a única fonte que teoricamente promove a espiritualidade. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Muitos pesquisadores verificaram que o homem desde os tempos primitivos apresentavam o que conhecemos hoje como Pensamento Mágico.O pensamento mágico já existia no homem mesmo antes da fundação de religiões institucionalizadas.Mircea Eliade ,incansável pesquisador das origens deste pensamento mágico dividiu a forma do homem vivenciar sua existência na terra de duas maneiras:a profana(natural) e a sagrada(hierofania).Assim nos tempos primitivos árvores,fenômenos meteorológicos ,animais etc eram sagrados e como tal tinham poderes sobrenaturais. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Ele englobou com a idéia de sagrado uma complexidade estrutural com seus elementos como:mitos,ritos,símbolos,figuras divinas etc. A realidade profana revela o transcendente ao ser iluminada pelo símbolo. Em um nosso trabalho de pesquisa por nós publicado anteriormente verificamos que o homem desde os tempos primitivos até hoje possui a função de omnipotência (omnipotência, omniciência e omnipresença) dentre as demais funções de seu cérebro.Esta função é como uma categoria universal como é a noção de espaço e tempo. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Maiores pormenores poderão ser lidos neste trabalho anterior. A existência da omnipotência do pensamento e do sagrado,desde o início dos tempos,descrita e constatada por diferentes pesquisadores,nos sugerem que são duas funções inerentes ao homem. A Religião apresenta-se na sua essência como institucionalizante da função do sagrado e da omnipotência.Um profissional da saúde ,no caso um psicoterapeuta não tem o direito de validar ou invalidar os dogmas assumidos pelo paciente mas tão somente investigar o uso que ele faz destes dogmas. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Todo o homem possui forças de imanência e forças de transcendência.A imanência é tudo que aprisiona o homem as suas necessidades instintivas,materiais e objetivas.A transcendência é aquela energia que o propulsiona a superar limites,abrir novos caminhos e descobrimentos.Nem as forças da imanência nem as da transcendência são omnipotentes.Colocar a função de omnpotência na transcendência é adoecer de megalomania. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A omnipotência é função ligada a transcendência buscando mais e mais até o infinito porém é um estado em potencial e nunca cinético e atual.É um vir a ser sem nunca aprisionar a posse da omnipotência.O cinético,atual e real é somente o alargamento,por meio da transcendência,do conhecimento,dos limites,da vida e da espiritualidade. Sob o ponto de vista da ciência esta função em potencial e nunca real e atual pode ser concebida sociologicamente como um aprendizado do homem de querer mais e mais sem limites ou mesmo como querem os filósofos idealistas uma função inata no homem.O uso que o homem faz desta função irá definir sua conduta e seus valores. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Aquele que sente que possuir a omnipotência (omnipotência, omniciência e omnipresença) é fato impossível e irracional pode colocar esta função no infinito da matemática,no vir a ser da filosofia ,no parâmetro de idealização do homem.Seria uma realidade virtual e não real.Aqueles que colocam esta função em um Ente real existente no universo tornam-se religiosos podendo dar a este Ente inominável, do nome Deus. O que as Religiões fazem é sentir-se monopolizadoras e único caminho para o desenvolvimento da transcendência. Jorge Amaro A Religião e o Idoso O ser humano é um projeto infinito e sempre inacabado.Dentro de seu projeto infinito não há modelos que possam enquadra-lo. É importante que se observe que a mola propulsora da transcendência é alimentada pela função de omnipotência.Nestas condições o uso dessa omnipotência,que se recusa aos limites e que quer se expandir mais e mais pode ser um caminho construtivo ou destrutivo.Portanto o uso destrutivo desta omnipotência é um uso negativo que não leva a evolução do homem. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Como o homem não pode em sã consciência postar-se como o conhecedor da verdade total e final terá dois caminhos a seguir:ou ele usa o referencial religioso com os seus dogmas na direção da verdade total e final ou ele usa a ciência na aproximação desta verdade Total e Final. Como sabemos nem a Física tem uma teria sobre o planeta que explique tudo .A teoria do tudo.A teoria gravitacional e a teoria dos quanta tem aspectos que não se integram.Portanto a Ciência tem leis e parâmetros válidos porém questionáveis através dos tempos e da evolução do conhecimento. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Então Esta omnipotência(esta busca do total, do absoluto,da verdade acabada,da essência em si etc.. deve ser considerada como uma função de existência virtual e não real que leva o homem a transcendência.Como não pode ser possuída,pela concepção exposta,nem localizada(como é o caso do infinito da matemática)devemos ter uma verdade operacional,um conceito operacional para podermos nos movimentar frente ao conhecimento e a possível evolução. Admitindo-se então esta omnipotência como uma função virtual,não localizável,dada a sua infinitude, podendo ser nominal como por exemplo Bem absoluto,Verdade Absoluta,A essência em si etc. necessitamos de um meio intermediário para relacionar-se a Ela. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Este meio pode ser denominado de Bem Maior ,que é relativo e provisório na direção da busca deste Bem Absoluto.Em contrapartida a este Bem Maior encontra-se o Bem Menor que hierarquicamente será relegado à renúncia à favor do Bem Maior ,quando são incompatíveis de realização simultânea. Como este Bem Maior é relativo e é um conceito operacional na direção do Bem Absoluto e como este Bem Absoluto na sua infinitude não é localizável haverá sempre erros na determinação e distinção entre o Bem Maior e o Bem Menor na condução do homem. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Por isso ,nos inúmeros e diferentes momentos das encruzilhadas e atitudes na vida ,em que o Bem Maior e o Bem menor se nos apresentam,é necessária a intransigente filiação a fidelidade ao Bem Maior.Ao constatar o erro da escolha do então aparente Bem Maior,é necessária a intransigente fidelidade à Coragem de retroagir,assumindo a dor do tempo perdido,para novamente iniciar o caminho da busca do Bem Maior perdido e não estagnar a corrente da evolução. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Para isto o homem deve desenvolver a humildade pois não tem o conhecimento absoluto,pode até ter um conhecimento discretamente abrangente porém não tem o conhecimento univérsico.Além disto deverá manter a curiosidade da busca do aperfeiçoamente de novos conceitos mais abrangentes do limite de sua época e cultura. As religiões fornecem através dos dogmas este Bem Maior acabado,com valor absoluto e cuja direção é inquestionável ,segundo a ortodoxia,pois seria o único meio de atingir o Bem Absoluto,o bem Infinito ou seja o caminhão de Deus. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Como sabemos o homem apresenta sentimentos contraditórios dentro de si: arrogância e humildade; inveja e gratidão; intolerância a frustração e tolerância a frustração; vingança e perdão; egoísmo e generosidade; indiferença ou desprezo e compaixão; vivência de limites e vivência de ominipótência,etc. Jorge Amaro A Religião e o Idoso As forças de vida terão mais vida quanto mais puderem integrar os interesses comuns nas relações humanas e usarem os sentimentos construtivos como humildade, gratidão, tolerância, perdão, generosidade, compaixão, solidariedade, etc. O interesse comum requer renuncias de necessidades individuais. A sociologia e a política tentaram por meio de teorias sociológicas e políticas atingir o objetivo do interesse comum. Hoje em dia a promoção desse interesse comum está sendo expressada por meio dos direitos humanos, do eucumenismo religioso e da defesa ecológica do planeta. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A espiritualidade seria o poder que o homem tem de desenvolver estes aspectos construtivos de sua vida e ao mesmo tempo tentar neutralizar os seus aspectos destrutivos. As religiões constituem uma construção feita pelos seres humanos, onde o Divino, o Sagrado e o Espiritual são estruturados em um modelo acabado para dirigir o homem na busca do céu que seria o espaço da existência do Bem Absoluto. Nestas condições há um aprisionamento na transcendência do homem através de um modelo de uma religião que o dirige segundo dogmas ortodoxos. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Lembremo-nos da história: as Cruzadas Cristãs e suas guerras de expansão territorial; a Inquisição e a queima na fogueira, das bruxas; o suicídio coletivos nas Guianas; a morte pelo incêndio da comunidade adventista em Waco (USA); as perseguições religiosas; a condenação a morte de Salmon Rushdie pelos mulçumanos no Iran, pelo seu livro Versos Satânicos,etc. Portanto, a religião que se intitula como o melhor caminho para a espiritualidade, nem sempre consegue este objetivo. Jorge Amaro A Religião e o Idoso É evidente que o que confere este aspecto destrutivo do uso da religião é o fato de religiosos ortodoxos conferirem ipsis literis aos escritos dos Livros Sagrados a informação de verdades absolutas e inquestionáveis. Não se leva em consideração ao velho adágio de quem conta um conto aumenta um ponto; não leva em consideração os homem que escreveram a possível “revelação” vinda do Moisés, de Maomé ou de Jesus. Além disso, a tradução de idiomas e o sentido de uma palavra numa época tem sentido diferente em outra época. Porisso admito que os teólogos não ortodoxos e progressistas podem aprimorar, evoluir o sentido religioso de suas religiões, podendo auxiliar o desenvolvimento da espiritualidade sem omnipotência do conhecimento e sem a rigidez aprisionante. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Alguns teólogos modernos admitem que o assim chamado, pelas religiões de “o Reino de Deus” que é concebido como um espaço real (céu) onde iriam os justos seria um estado funcional de existir neste mundo, onde há uma intensa fidelidade em primeiro lugar a busca deste Bem Maior espiritual e universal. Assim como o inconsciente não precisa ser concebido como um local no cérebro, mas sim como um estado funcional da mente, então o Reino de Deus poderia ser concebido como a fidelidade intransigente na busca do Bem Maior e a intransigente coragem de sempre retroagir, assumindo a dor do tempo perdido (afinal somos imperfeitos na busca da perfeição) na busca de um novo Bem Maior que melhor coaduna na direção do Bem Absoluto Virtual. Jorge Amaro A Religião e o Idoso É uma presença ativa no sentido de uma fé inquebrantável da existência de um Bem Universal. Absoluto, não localizável, virtual, porém, centro maior e único de todos os bens, sendo que o Bem Maior operacional humano é apenas a tentativa de não perder a corrente de evolução na direção deste Bem Absoluto. Nestas condições a espiritualidade do homem só terá existência real se houver transformações e esforços no aperfeiçoamento deste Bem Maior, mais universal na direção de um Bem Absoluto, virtual. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A criança, na omnipotência e idealização de seu pensamento, cria, em sua mente, uma mãe omnipotentemente boa, poderosa e omnipresente. A realidade mostra que sua mãe não é nada disto e a criança a transforma; naquele momento de frustração, como omnipotentemente má. É o início da concepção da idéia do bom total e absoluto e do ruim total e absoluto, que mais tarde, pela cultura, poderá ser nominado de Deus e Diabo. Mas o que importa é que a criança, pela sua fragilidade física e pela percepção real do mundo ainda fragilmente e escassamente concebida, concebe a existência de um bem absoluto para servi-la ou mesmo querer possuir este bem absoluto (omnipotência do pensamento). Jorge Amaro A Religião e o Idoso O homem amadurecido sabe que as pessoas, incluindo os seus pais, tem capacidades relativas, não possuem o Bem Absoluto e portanto irá projetalo fora de si em uma entidade real ou em uma função virtual. Ao projetar em uma entidade real nominada Deus poderá, como a criança, em relação a sua mãe, desejar que este Deus esteja a serviço de suas necessidades pessoais. Poderá também usar a noção de Deus como parâmetro, não de suas necessidades pessoais, mas na busca deste Bem mais Universal como caminho da aproximação de Deus. São muitos os caminhos que o homem se utiliza para relacionar-se com a religião e a espiritualidade. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Ao nosso ver a espiritualidade tem a ver com a experiência de transformação n os caminhos supra descritos (com ou sem religião) e não apenas como obediência aos ritos, aos dogmas, que são caminhos institucionais que propõem a busca da espiritualidade, mas não são a espiritualidade em si. O profissional da saúde mental está acostumado a pesquisar seus pacientes sob o ponto de vista psicológico, médico, social e econômico, porém raramente se preocupa com a dimensão poderosa do aspecto espiritual. Os sintomas patológicos sociais, somáticos e psíquicos, muitas vezes trazem dentro de si um grito de comunicação de uma transcendência no campo espiritual, pedindo inconscientemente ajuda para ser desenvolvido. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Necessitamos reservar um espaço de nossa vida para meditação e reflexão de como estamos desenvolvendo e transformando a nossa dimensão espiritual. Esta transformação nos fornecerá um calor interior de vivência de ampliação do nosso lado humano, do nosso lado transcendente em desenvolvimento, que nos distancia do animal cuja imanência não é contraposta com a transcendência espiritual. O livro sagrado é a bússola dos religiosos no sentido de navegar na direção do caminho para Deus e para o Céu. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Encontramos posições e interpretações diferentes sobre os relatos da Bíblia conforme a corrente a que pertença o autor destas interpretações. Teólogos conservadores tendem a aceitar literalmente todas as passagens da Bíblia e admitem os relatos ali existentes como verdades válidas até hoje.Admitem por exemplo que a homosexualidade é odiada por Deus e é um comportamento culposo,considerado pervertido e modificável pela vontade. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Teólogos liberais tendem a questionar as traduções e os erros vindos das traduções dos originais Hebreu ou Grego e a posição preconceituosa e forjada de tradutores. Eles consideram muitas passagens escritas na Bíblia não tendo valor hoje em dia como,por exemplo,a escravidão e o tratamento das mulheres como inferiores.Eles diferenciam nas práticas homosexuais e heterosexuais dois grupos:um imoral onde incluem o estupro,prostituição e rituais sexuais nos templos ,etc e outro normal com relacionamento comprometido e fiel tanto para o homossexual como para o heterosexual.A homosexualidade seria uma orientação sexual considerada normal e não é um comportamento modificável e por escolha emocional Jorge Amaro A Religião e o Idoso Muitos artigos foram escritos no sentido de pesquisar o uso saudával e não saudável da religião( Salzman; Pruyser,etc.). Allport; Ross (1967) classificaram a experiência religiosa em “extrínseca” e “intrínseca” . A primeira sendo apenas um meio para atingir um determinado fim e a segunda uma estrutura que realmente atribui significado a vida de uma pessoa. Na religião intrínseca o indivíduo vive a sua religião como primeiro plano de vida, colocando as outras necessidades da vida, por mais fortes que sejam, num plano secundário e são, dentro do possível subordinadas a uma harmonia com as prescrições religiosas. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A religião extrínseca é a religião do conforto, da convenção social e de fins utilitários, subordinando a religião a interesses não religiosos. Batson e Ventis (1982) classificam o uso da religião em: religião do tipo meio, fim e busca. A religião do tipo meio é aquela utilizada para atingir finalidades como por exemplo: bons negócios na coletividade; status social mais elevado,etc. Os judeus convertidos ao cristianismo para escapar da inquisição espanhola foi um exemplo do uso da religião do tipo meio. Um outro exemplo é a conversão unicamente como meio para poder casarse com alguém de outra fé religiosa. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A religião do tipo fim envolve a verdadeira crença, onde os relatos descritos no livro sagrado representam a resposta e o caminho final ao ser humano. A religião do tipo busca é uma abordagem onde o indivíduo enfrenta as questões existenciais resistindo as respostas simples, concretas e ipsis litteris dos relatos dos livros sagrados. Se posiciona na situação da incompletude do conhecimento e na busca do aperfeiçoamento do mesmo.Sua mente está aberta e flexível e receptiva a informações novas. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Não coloca a verdade absoluta nos relatos ipsis litteris dos livros sagrados, mas sim, busca o aperfeiçoamento da tradução da mensagem divina expressa por meio dos mensageiros dos textos sagrados. Teólogos conservadores tendem aceitar literalmente todas as passagens da bíblia e admitem os relatos ali existentes como verdades válidas até hoje. Admitem , por exemplo, que a homossexualidade é odiada por Deus e é um comportamento culposo, considerado pervertido e modificável pela vontade. Teólogos liberais tendem questionar as traduções e os erros vindos das traduções dos originais Hebreu ou Grego e a posição preconceituosa e forjada pelos tradutores. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Consideram muitas passagens escritas na bíblia não tendo valor hoje em dia, como por exemplo a escravidão e o tratamento das mulheres como inferiores. Eles diferenciam nas práticas homossexuais e heterossexuais dois grupos: um destrutivo e imoral, onde incluem o estupro, a prostituição e rituais sexuais nos templos e outro construtivo e normal, como o relacionamento comprometido e fiel sexual tanto para o homossexual como para o heterossexual. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Os seguidores dos livros sagrados se dividem naqueles que promovem a crença que o livro sagrado deve ser entendido literalmente, sem “interpretações” e os que admitem que as palavras e as frases ali contidas nem sempre significam aquilo que dizem. Os do primeiro grupo são os fundamentalistas e os do segundo grupo são os que interpretam o livro sagrado através de uma leitura histórico-crítica se apoiando no estudo da história, da sociologia e da filologia. Assim por exemplo, certas expressões idiomáticas e certas palavras mudam totalmente de sentido num mesmo país, de época para época, e portanto, em países diferentes o sentido ipsis litteris será totalmente estranho. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Damos como exemplo: “jogo de cintura; cair a ficha; ele é um quadrado” , etc. Assim também certos termos usados na bíblia como: “abominação; efeminado; aquele que se deita com homem”,etc. Para os estudiosos pelo método histórico-crítico, certas palavras usadas pela versão do Grego ou do Hebraico foram traduzidas sem levar em consideração o real sentido do momento histórico e sociológico que aquelas palavras em hebraico ou em grego foram usadas. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Daniel A. Helminiak em seu livro “O que a Bíblia realmente diz sobre a homossexualidade” faz uma revisão da literatura do método histórico-crítico e tece considerações históricas, sociológicas, políticas e filológicas da época em que os relatos bíblicos foram escritos. Portanto, conforme a interpretação dada pelo pregador teremos um referencial do uso que ele faz da religião. A leitura Ipsis litteris da Bíblia Sagrada tem provocado através dos séculos atritos entre a Igreja e a Ciência.Quando surgiu a teoria heliocêntrica de Copérnico(1473-1543) combatendo a teoria de Ptolomeu foi criticada e atacada por religiosos. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Galileu(1564-1642) não só aceitava a teoria heliocêntrica de Copérnico como colaborou para sua comprovação.Isto lhe valeu a reprovação e a proibição pelo Santo Ofício de ensinar ou defender a doutrina de Copérnico. Darwin,C.(1809-1882) com suas publicações “A Origem das Espécies” e “A Descendência do Homem e a Seleção em relação ao Sexo,provocou acalorada polêmica principalmente entre os religiosos. Dezenas de artigos publicados sobre religião e saúde mental argumentam ora como a religião favorável a saúde mental, ora como prejudicial. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Schumaker (1992) relendo diferentes artigos sobre saúde mental e religião, aponta os principais argumentos destes autores no sentido da religião ser prejudicial ou favorável a saúde mental: Jorge Amaro A Religião e o Idoso Os que afirmam ser a religião prejudicial apontam: a. Gera níveis patológicos de culpa. b. Promove o auto-denegrir-se e diminui a auto-estima. c. Estabelece a base para a repressão da raiva. d. Cria ansiedade e medo, através de crenças punitivas (por exemplo: inferno, pecado original, etc). e. Impede a auto-determinação e a sensação de controle interno, sendo um obstáculo para o crescimento pessoal e funcionamento autônomo. f. Favorece a dependência, conformismo e sugestionabilidade, com o desenvolvimento da confiança em forças exteriores. g. Inibe a expressão de sensações sexuais e abre caminho para o desajuste sexual. h. Encoraja a visão de que o mundo é dividido entre “santos” e “pecadores”, o que aumenta a intolerância e a hostilidade. i. Cria paranóia com a idéia de que forças malévolas ameaçam a nossa integridade moral. j. Interfere com o pensamento racional e crítico. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Os que acham que a religião tem um impacto positivo sobre a saúde: Reduz a ansiedade existencial ao oferecer uma estrutura cognitiva que ordena e explica um mundo que parece caótico. b. Oferece esperança, sentido, significado e sensação de bem estar emocional. c. Ajuda as pessoas a enfrentarem melhor a dor e o sofrimento, através de um fatalismo reassegurador. d. Fornece soluções para uma grande variedade de conflitos emocionais e situacionais. e. Soluciona o problema perturbador da morte, através da crença na continuidade da vida. f. Da às pessoas uma sensação de poder e controle, através da associação com uma força omnipotente. g. Estabelece orientação moral que suprime práticas e estilos de vida autodestrutivos. h. Promove coesão social. i. Fornece identidade, satisfazendo a necessidade de pertencer a um grupo em torno de valores comuns. j. Fornece as bases para um ritual catártico coletivo a. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Todos esses artigos que se propuseram estudar Saúde Mental e Religião são suscetíveis de críticas nos meios acadêmicos, uma vez que muitas variáveis não foram ou não puderam ser controladas, prejudicando os resultados. Francisco Lotufo Neto (1997) em sua tese de Livre Docência junto ao Departamento de Psiquiatria da FMUSP, sob o título Psiquiatria e Religião - a prevalência de transtornos mentais entre ministros religiosos, fez um extenso levantamento bibliográfico sobre Saúde Mental e Religião. Nesta tese, Lotufo Neto mostra uma intensa divergência de opiniões e posições acadêmicas. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Suas conclusões em sua tese foram: a. A religião, uma variável que influencia a saúde mental, está sendo negligenciada pela Psiquiatria nos seus estudos e programas de tratamento e prevenção. b. É necessário que o Psiquiatra esteja familiarizado com a literatura sobre religião e conheça religiosidade de sua clientela, para saber como utiliza-la clinicamente. c. Nas pesquisas é necessário uma avaliação multidimencional, que a respeite em sua complexidade. d. A orientação religiosa intrínseca parece ser benéfica a Saúde Mental. e. Os ministros religiosos cristãos não católicos, residentes em São Paulo, da amostragem da pesquisa, apresentaram uma prevalência aumentada de transtornos afetivos e ansiosos e menor quanto ao abuso e dependência de álcool e drogas. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A irreligião no sentido de indiferença ou mesmo hostilidade a religião não foi suficientemente estudada em artigos científicos. Estes artigos são raros e não apresentam uma amostra significativa. Crawford e col. (1989) compararam 39 pessoas com níveis extremamente baixos de religiosidade e grupos de controle com níveis médios e altos de religiosidade e avaliaram a saúde mental. O grupo com baixa religiosidade apresentou duas vezes mais sintomas psicopatológicos que o grupo com alta religiosidade; entretanto o grupo de média religiosidade teve a mesma pontuação que o de baixa religiosidade. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Outros autores como Handal (1989) e Schumacher (1987) encontraram achados semelhantes. As correlações entre religião e saúde mental, pesquisadas pelos autores, apresentaram as associações as mais variadas, porém com a restrição de que muitas variáveis não puderam ser controladas. Alguns autores admitem que o estudo científico da religião e saúde mental, por meio da rígida metodologia acadêmica, torna-se uma tarefa muito difícil devido as características pessoais do investigado, bem como a variável educação, aspectos culturais,etc. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Aspectos psicopatológicos previamente existentes no indivíduo podem ao misturar-se com suas idéias religiosas, levando o investigador a apontar a religião como agente perturbador e não apenas problemas psicopatológicos previamente existentes, tais como histeria, obsessões, doenças bipolares, etc. Além disto, o método adotado ao se estudar a religião e saúde mental depende do parâmetro usado (método fenomenológico, positivista, introspectivo, etc). As principais críticas apontadas mostram, por exemplo, que médicos psiquiatras tendem a estudar amostras de pessoas que estão doentes e estabelecer falsas correlações entre saúde mental e religião. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A variável personalidade pregressa é uma variável não controlada. Apesar das dificuldades a variável religiosa é uma das variáveis sociais muito importantes e deverá ser estudada em relação a saúde mental. Em Abril de 2001 no 1st International Congress on Religion and Mental Health(Tehran-Iran) tivemos a oportunidade de apresentar um artigo “Psychology,Psychoanalisis and Religious Faith bem como ouvir e observar artigos sobre Religião e Saúde Mental . Muitos dos artigos dos colegas iranianos correlacionavam Saúde Mental e o seguimento dos ensinamentos do Alcorão. Jorge Amaro A Religião e o Idoso O referencial usado, na trilha da Saúde Mental, era o Alcorão.Outros autores,principalmente os estrangeiros apontaram a religião como fator de Saúde Mental porém sem correlacionar com um determinado livro sagrado. O que eu tentei transmitir aos colegas iranianos se resume em artigo que tenho escrito no Brasil:Psicologia,Psicoanálise e Fé Religiosa. Mas afinal perguntaria o leitor quais as respostas às perguntas do início deste capítulo:A religião pode beneficiar ou prejudicar o idoso?;quando o idoso não tem religião nem acredita em Deus a iniciação religiosa poderá beneficia-lo ou prejudica-lo?;se o idoso tem religião devemos estimula-la para o seu bem estar? Jorge Amaro A Religião e o Idoso Foi de propósito que não toquei ainda nestas perguntas tentando esclarecer conceitos,idéias e histórias sobre termos como Religião,Espiritualidade,Idoso etc.. Somente após uma revisão destes conceitos,de sua história e de artigos científicos atuais poderemos tentar responder a estas perguntas.Com o desenvolver deste capítulo o próprio leitor irá utilizar estes conhecimentos para formular sua própria resposta. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Como sabemos a transição da idade adulta para a terceira idade ocorre de modo gradual, bem como as alterações psicológicas e sociais. É evidente que é importante que o idoso possua um certo grau de maleabilidade para que possa lidar de forma satisfatória com as dificuldades que surgem no envelhecimento. O julgamento do indivíduo em relação a sua vida irá interferir para o ajustamento ou não ao seu envelhecimento. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Quanto maior for a rigidez das características de adaptação, mais severos serão os sintomas de andiedade e depressão na velhice. Traços de personalidade influenciam a avaliação subjetiva de satisfação com a vida. Em relação com a satisfação da vida depende de aspectos de personalidade e de humor (depressivo, maníaco e normal). Jorge Amaro A Religião e o Idoso O idoso é alguém que tem muitos mortos por trás de si. Cada luto reativa lutos anteriores, portanto a morte que é algo tão distante no homem jovem, começa a tornar-se alguma coisa muito próxima, portanto uma variável nova surge nesta fase da terceira idade, que é o contato mais real com a impermanência da vida, com a morte, com o fim e com o nunca mais. É evidente que a reflexão sobre a morte estimula reavaliações do sentido de vida. Como a sua vida foi estruturada, o que foi construído e o que foi destruído. Este balanço é muito estimulado quando há percepção deste fim (morte) inexorável. Há porém personalidades “maníacas” que inconscientemente estruturam a negação da morte e impede a percepção mais consciente desta realidade. Jorge Amaro A Religião e o Idoso O contato emocional (e não só intelectual) com a existência da morte provoca reações diferentes de acordo com as diferentes personalidades. Há aqueles que tomam atitudes piadistas para encobrir a angústia da morte; há aqueles que entram em um silêncio respeitoso; há aqueles que sentem uma angústia sem fim; há aqueles que ao conscientizar-se deste fato inexorável procuram aproveitar o máximo do tempo que lhe resta. Este aproveitamento máximo pode estar dirigido a fruir materialisticamente a vida; a desenvolver o máximo de sua transcendência espiritual; ambas as coisas ,etc. Jorge Amaro A Religião e o Idoso A religião trás um sentido de vida previamente construído que seria ir terminar, após a morte, no céu. Nestas condições a morte não é o “nunca mais”, há uma continuidade e para melhor. A negação desta continuidade pelos não crentes os levarão a ter que administrar a existência do nada, do nunca mais,após a morte do ser humano. O idoso que já era religioso poderá apegar-se a estas idéias da continuidade após a morte do reencontro com entes queridos e aceitar mais serenamente a morte; pois não há uma perda total, havendo esperança de uma continuidade futura. Jorge Amaro A Religião e o Idoso O idoso que nunca foi religioso, não acreditando em Deus depara-se com o contato da total ausência de continuidade de seu ser. Estes idosos, por sublimação e deslocamento, poderiam neutralizar o nada e o nunca mais pela continuidade de fatos e obras construtivas que ele deixaria após a morte. Sabemos que a forma como o indivíduo vivencia a morte depende muito de fatores culturais, os quais tingirão o tipo de colorido em que o contato com a morte será expressado. Philippe Ariès, em sua obra “O Homem diante da Morte” pesquisou a imagem da morte no período da idade média até a nossa era. Apontou várias transformações de conduta do homem frente a morte: a morte excluída; a morte aceita e previsível; a morte macabra; a morte romântica, etc. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Portanto, podemos agora, após uma revisão sumária de idéias sobre religião, espiritualidade, morte, terceira idade, responder algumas das perguntas inicialmente formuladas. Primeira: a religião pode beneficiar ou prejudicar o idoso? Dependendo do uso com que a religião é utilizada, poderá tanto beneficiar como prejudicar o idoso. Segunda: quando o idoso não tem religião, nem acredita em Deus, a iniciação religisosa poderá beneficia-lo ou prejudica-lo? Jorge Amaro A Religião e o Idoso Nenhum profissional de saúde, com exceção dos ministros religiosos,estão habilitados para a catequese religiosa que é campo doutrinário das direrentes religiões com seus diferentes ministros religiosos. O profissional da saúde, em particular o psicoterapêuta, poderá e deverá investigar a estrutura da personalidade daquele idoso em particular. Se ele for religioso, o profissional da saúde, respeitando a religião daquele indivíduo poderá ajuda-lo a usa-la de maneira mais construtiva, com menos omnipotência, com humildade na busca deste Bem Maior. Se ele não for religioso o profissional da saúde também poderá ajuda-lo no caminho do aperfeiçoamento da espiritualidade e do Bem Maior. Esta espiritualidade , como vimos, não depende de ter ou não religião. Jorge Amaro A Religião e o Idoso Terceira: se o idoso tem religião, devemos estimula-la para o seu bem estar? É evidente que o profissional da saúde não é um instrumento de catequese e portanto, não tem que estimular ou desestimular a religião e o idoso, mas sim, como já dissemos somente ajuda-lo a administrar construtivamente, espiritualizadamente (segundo o conceito acima já exposto) e com humildade a sua religião. Jorge Amaro