Texto de apoio ao curso de Especialização Atividade física adaptada e saúde Prof. Dr. Luzimar Teixeira AUTISMO 5. Concepção integrativa e atual Em síntese, no decorrer de mais de 50 anos, os estudos dos artigos de L. Kanner no final com seu colega L. Eisenberg, nos permite afirmar: a) - A descrição semiológica do Autismo Infantil Precoce não sofreu modificações ao longo dos anos; b) - A concepção do quadro enquanto síndrome passa de um etapa inicial psicopatológica à uma síndrome clínica; c) - A etiopatogenia do Autismo Infantil Precoce vai passar, no decorrer dos anos, de uma posição psicopatológica a uma posição biológica (genética e ou bioquímica), após percorrer uma etapa intermediária de posição funcional. d)- Suas especificações sobre inteligência, frieza afetiva mostraram falhas. Embora essas concepções parecem se excluir mutuamente elas estão contidas no artigo inicial (Kanner, l943). Ademais, a clínica, que é o fundamento exteriorizado do síndrome, foi se tornando independente das teorias etiopatogênicas subjacentes. 6. Enfoques Atuais de diagnóstico. Os enfoques atuais se prendem à idéia de desenvolvimento. O básico é compreender o porquê? Para que? (perguntas, ainda de dificil respostas), onde e quando, no desenvolvimento, ocorreram transtornos. As áreas de desenvolvimento podem paralisarse em bloco (Retardo Mental); podem sofrer transtornos específicos (transtorno da linguagem expressiva, como exemplo) e podem ser atingidas de modo diferenciado. São muitos os termos que tentam mostrar que a criança sofre modificações em todas as suas áreas de desenvolvimento, mas de formas e momentos diferentes além de 1 inconstantes. Contudo, vários são os termos em português que tentam traduzir com fidelidade o termo - Pervasive Developmental Disorder - da Associação Psiquiátrica Americana (APA) e Organização Mundial de Saúde (OMS). Estamos usando Transtomo Invasivo de Desenvolvimento por ser a (CID-10, 1993) nossa classificação oficial e constar, também da tradução do DSM-IV. 6.1. Enfoques Categóricos. Neste enfoque existem 03 áreas de perturbação: 6.1.1. Disfunção Social; 6.1.2. Desvio da comunicação; 6.1.3. Insistência na mesmice. Típicamente, acredita-se que os déficits sociais e de comunicação característicos são aberrantes em relação ao nível de desenvolvimento do indivíduo, embora faltem medições precisas para estabelecer como este desvio poderia ser operacionalmente compreendido (Volkmar e Cohen, 1988). Vários são os fatores que tem impedido o desenvolvimento de definições verdadeiramente operacionais (Volkmar, 1995): a - Questões de continuidade com outros transtornos, tais como a esquizofrenia; b - Ampla faixa de expressão da síndrome; c - Mudanças da expressão da síndrome com a idade; d - Frequência de sintomas tipo autistas em indivíduos com grave retardo mental; e - Infrequência relativa do transtorno. Eu acrescentaria um outro fator: f - Medidas que enfatizam a linguagem e o pensamento lógico-matemático. 6.2. Enfoques Dimensionais. Aqui as áreas de perturbação são estudadas a partir de: 2 6.2.1. Relatos de Pais e Professores; 6.2.2. Observação Direta; 6.3.3. Exames clínicos e complementares. A classificação ou amostragem dos comportamentos tipicamente desviantes veio criar dificuldades na estandartização e confiabilidade. Mudanças na expressão do síndrome ao longo do curso do desenvolvimento e a prevalência de comportamento tipo autista com retardo grave, representam problemas para a criação dos instrumentos de medida. Apesar das tentativas recentes de definir operacionalmente a disfunção social pelo uso de um enfoque de base evolutiva (Volkmar e Cophen, 1988), ainda não foi universalmente estabelecido qualquer sistema diagnóstico unitário. Embora seja necessário melhores definições das síndromes a validade do Autismo como um conceito diagnóstico foi bem estabelecida. A validade das definições propostas para os outros transtornos permanecem controvertidas. 6.3. Classificações Internacionais. Existe um enorme esforço sendo realizado para fornecer aos pesquisadores e, particularmente, aos clínicos formas claras de reunir sinais e sintomas em classificação universalizada e compreensível. Vamos enumerar algumas classificações, em Psiquiatria Infantil, que denominaram, explicitamente, os termos que estamos estudando. O resumo realizado por (Lippi, 1994) revela a seguinte cronologia: (Strecker e Ebaugh, 1931); (Henderseon e Gillespie, 1932); ( Brown; Pollock, Potter e Cohen, 1937); (Ackemm, 1953); ( Catneron, 1955); (Chess, 1959); (Jensen, 1959); (Selback, 1960); (Befier, 1962); (Ross, 1964). Gostaríamos de chamar atenção para uma classificação (Kanner, 1935), na qual o autor do tema objeto do nosso estudo não nomeia os termos hoje empregados, senão vejamos: Classificação dos Problemas Psicológicos de Crianças: a. Formas de reação anergásticas; b. Formas de reação disergásticas; c. Formas de reação oligergásticas; 3 d. Manifestações somáticas de distúrbios da personalidade; e. Dificuldades de personalidade tendo uma relação direta com doença fisica não neurológica e f. Dificuldade de personalidade tendo uma relação indireta com a doença fisica. Era grande a influência do pensamento psicodinâmico quando Kanner elaborou essa classificação. A "reação psicótica" está encoberta na terminologia usada. Como vemos existem esforços realizados de longo tempo tentando reunir os sintomas e os comportamentos da criança para padroniza-los compreensivelmente. Tentativas de universalização de uma linguagem vem sendo realizadas. A Associação Psiquiátrica Americana (APA) através dos DSM’s e a Organização Mundial de Saúde através dos CID’s, estão cada vez mais próximos de uma linguagem comum no que se refere ao nosso tema. É necessário fazer importante diferenciação: diagnóstico e classificação não são sinônimos. O diagnóstico é dinâmico e individual, cuidando portanto da pessoa. A classificação é relativamente estática e impessoal, reportando-se à doença. 6.3.1 Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais (DSM, APA). O DSM-1 apareceu pela primeira vez em 1952. Foi o primeiro manual oficial de dsitúrbios mentais a conter um glossário de descrições e categorias diagnosticas. Este manual usava o termo "reação" do começo ao fim da classificação. A Psiquiatria Americana sofria grande influência da psicanálise. O grande psicobiologista e psicanalista Adolph Meyer defendia a idéia de que os distúrbios mentais representavam reações da personalidade aos fatores, psicológicos, sociais e biológicos. Os outros manuais retiraram o termo reação e não adotaram termos que pudessem implicar uma estrutura teórica especifica. O autismo infantil e as psicoses da infância têm lugar tímido nas classificações anteriores. 6.3.1.1. DSM-III (l980). 4 Foi a partir de sua 3a. Edição que a APA colocou critérios mais claros para a compreensão do síndrome: déficits sociais difusos; amplos déficits no desenvolvimento da linguagem; padrões incomuns da fala (quando está presente); respostas bizarras ao ambiente e ausência de delírios ou alucinações típicos da esquizofrenia. Exigia, também, que o autismo se manifestasse até os 36 meses. 6.3.1.2. DSM-III-R (l987). O sistema DSM-III apresentou diversos tipos de problemas. Faltava a ele um foco evolutivo; os critérios eram demasiadamente restritos; dava-se grande ênfase aos problemas de linguagem e pouca aos de comunicação. Por isso foram necessárias importantes revisões. Distúrbios Globais do Desenvolvimento (Eixo ll) "Os distúrbios nesta sub-classe são caracterizados pelo comportamento qualitativo do desenvolvimento da interação social recíproca, do desenvolvimento das habilidades de comunicação verbal e não-verbal e da atividade imaginativa. Muitas vezes, há um repertório de atividades e interesses, marcadamente restritos, que frequentemente são estereotipados e repetitivos. A gravidade da expressão deste comprometimento varia grandemente de criança para criança". O DSM-III-R cataloga 16 critérios para o transtorno autista, agrupados em 03 categorias: a - Comprometimento da interação social; b - Comprometimento da comunicação; c - Repertório restrito de atividades. Para receber o diagnóstico de Transtomo Autista (299.00) o paciente deve reunir pelo menos 08 dos 16 critérios; dentro do número mínimo de critérios estabelecido para cada categoria. Um critério preciso referente à idade de início não é mais incluído, embora a idade de início (antes ou após 36 meses) possa ser especificada. Essa versão revisada é mais orientada para o desenvolvimento e tenta alcançar tanto a faixa de expressão da síndrome quanto as mudanças do transtorno com o progredir da idade. A tabela seguinte 5 mostra os critérios do (DSM-III-R, 1987), que sofreram modificações para a 4a. revisão e que serve de base para nosso estudo. DISTÚRBIO AUTISTA CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA 299.00 - DISTÚRBIO AUTISTA Ao menos oito dos dezesseis itens seguintes estão presentes; destes incluir pelo menos dois itens de A, um de B e um de C. Nota: Considerar um critério a ser preenchido somente se o comportamento for anormal, para o nível de desenvolvimento da pessoa. A. Incapacidade qualitativa na interação social recíproca manifestada pelo seguinte: (Os exemplos entre parênteses estão ordenados de modo que aqueles mencionados em primeiro lugar, são mais amplamente aplicados aos mais jovens ou mais deficientes, e os últimos, às pessoas mais velhas ou menos deficientes com este distúrbio). (1) Acentuada falta de alerta da existência ou sentimentos dos outros (por exemplo, trata uma pessoa como se ele ou ela fosse uma peça de mobília; não observa o sofrimento de uma outra pessoa; aparentemente não têm noção da necessidade de privacidade dos outros). (2) Ausência ou busca de conforto anormal por ocasião de sofrimento (por exemplo, não procura por conforto mesmo doente, ferido ou cansado; procura conforto de modo estereotipado, por exemplo, "sorri, sorri, sorri" quando ferido). (3) Imitação ausente ou comprometida (por exemplo, não acena " bye-bye"; não reproduz as atividades domésticas da mãe; imitação mecânica das ações dos outros fora do contexto.) (4) Jogo social anormal ou ausente (por exemplo, não participa em jogos simples; prefere atividades solitárias de jogo; envolve outras crianças no jogo somente como "ajuda mecânica"). Incapacidade nítida para fazer amizades com seus pares (por exemplo, desinteresse em formar par com amigos; apesar do interesse em fazer amigos, 6 demonstra falta de entendimento das convenções de interação social, por exemplo, lê lista telefonica para colega desinteressado). B. Incapacidade qualitativa na comunicação verbal e não-verbal e na atividade imaginativa, manifestada pelo seguinte: (Os itens numerados correspondem àqueles arrolados em primeiro lugar e são mais amplamente aplicados aos mais jovens ou mais deficientes e os últimos, às pessoas mais velhas ou menos deficientes com este distúrbio). (1) Ausência de modo de comunicação, como balbucio comunicativo, expressão fácil, gestos, mímica ou linguagem falada. (2) Comunicação não verbal acentuadamente anormal, como no uso de olhar fixo olho no olho, expressão facial, postura corporal, ou gestos para iniciar ou modular a interação social (por exemplo, não antecipar se segurado, enrijecer quando segurado, não olhar ou sorrir para a pessoa quando fazendo uma abordagem social, não cumprimentar pais ou visitantes, tem olhar fixo em situações). (3) Ausência de atividade imaginativa como representação de papéis de adultos, personagens de fantasia ou animais; falta de interesse em histórias sobre acontecimentos imaginários. (4) Anormalidades marcantes na produção do discurso, incluindo volume, entoação, stress, velocidade, ritmo e modulação (por exemplo, tom monótono, cantado ou alta entoação). (5) Anormalidades marcantes na forma ou conteúdo do discurso incluindo o uso estereotipado e repetitivo da fala (por exemplo, ecolalia imediata ou repetição mecânica de comercial de televisão); uso do "você" quando "eu" é o pretendido (por exemplo, usando "Você quer um biscoito?" para significar "Eu quero um biscoito"; uso idiossincrático de palavras ou frases (por exemplo, "Ir balançar na grama" para significar "Eu quero ir no balanço"); ou freqüentes apartes irrelevantes (por exemplo, começar falando sobre horários de trens durante uma conversa sobre esportes). 7 (6) Incapacidade marcante na habilidade para iniciar ou sustentar uma conversa com outros, apesar da fala adequada (por exemplo, abandonar-se a monólogos lentos sobre um assunto, indiferente às interjeições dos outros). C. Repertório de atividades e interesses acentuadamente restritos, manifestado pelo que se segue: (1) Movimentos corporais estereotipados, por exemplo, pancadinhas com as mãos ou rotação, movimentos de fiação, batimento da cabeça, movimentos complexos de todo o corpo. (2) Insistente preocupação com partes de objetos (por exemplo, farejar ou cheirar objetos, percepção repetitiva da textura de materiais, girar a roda de carrinhos) ou vinculação com objetos inusitados (por exemplo, insistência em levar para todo lado um pedaço de barbante). (3) Sofrimento acentuado com mundanças triviais no aspecto do ambiente, por exemplo, quando um vaso é retirado de sua posição usual. (4) Insistência sem motivo em seguir rotinas com detalhes precisos, por exemplo, insistência de seguir exatamente sempre o mesmo caminho para as compras. (5) Ambito de interesses marcadamente restritos e preocupação com um interesse limitado, por exemplo, interessado somente em enfileirar objetos, em acumular fatos sobre meteorologia ou em fingir ser um personagem de fantasia. D. Início na primeira infância ou infância. Especificar se o início na infância (após os 36 meses de vida). Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais - DSM-III-R (APA), Editora Manole Ltda, 1989. Este manual chama atenção para a evolução. As manifestações do distúrbio são, em quase todos os casos, por toda a vida, embora elas variem com a idade cronológica e a gravidade das deficiências. Algumas crianças experimentam uma melhora nas habilidades social de linguagem e outras até cerca de 5 anos de idade; em poucos casos isso pode ser muito marcante. 8 6.3.1.3. DSM-IV( 1995). Esta nova edição foi publicada pela APA em 1994 e a tradução Brasileira surgiu no ano seguinte. Muda o termo Global para Invasivo e altera os critérios diagnósticos. TRANSTORNOS INVASIVOS DO DESENVOLVIMENTO Transtornos Invasivos do Desenvolvimento caracterizam-se por prejuizo severo e invasivo em diversas áreas do desenvolvimento: habilidades da interação social recíproca, habilidades de comunicação, ou presença de comportamentos, interesses e atividades estereotipadas. Os prejuízos qualitativos que definem essas condições representam um desvio acentuado em relação ao nível de desenvolvimento ou idade mental do indivíduo. Esta seção abarca Transtorno Autista, Transtorno de Rett, Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtorno de Asperger e Transtorno Invasivo do Desenvolvimento sem outra especificação. Esses Transtornos em geral se manifestam nos primeiros anos de vida e frequentemente estão associados com algum grau de Retardo Mental que, se presente, deve ser codificado no eixo II. Os Transtornos Invasivos do Desenvolvimento são observados, por vezes, com um grupo de várias outras condições médicas gerais (ex. anormalidades cromossômicas, infecções congênitas, e anormalidades estruturais do sistema nervoso central). Caso essas condições estejam presentes elas devem ser codificadas no eixo. Embora termos como "psicose" e "esquizofrenia da infância" já tenham sido usados com referência a indivíduos com essas condições, evidências consideráveis sugerem que os Transtornos Invasivos do Desenvolvimento são distintos da Esquizofrenia (entretanto, um indivíduo com Transtorno Invasivo do Desenvolvimento ocasionalmente pode, mais tarde, desenvolver Esquizofrenia)" (DSM-IV, 1995). 9