Os antidepressivos e a depressão Dr. Alexandre Duarte Gigante Mestre e doutorando em psiquiatria pela USP Fellow do Mood Disorders Centre, UBC, Vancouver, Canadá. Pesquisador e colaborador do Programa de Transtorno Bipolar (PROMAN) do Instituto de Psiquiatria da USP Professor da Faculdade de Medicina da UNOESTE O impacto da depressão • Estimativas de prevalência na população em 12 meses é de 6,6% e na vida de 16,2%. • Afeta 340 milhões de pessoas em todo o mundo. • mulheres/ homens = 2:1 (diferença tem início na adolescência). • Início em qualquer idade, mas o período de maior incidência é dos 25 aos 30 anos e de prevalência dos 30 aos 44 anos. • 0,4 a 2,5% das crianças e adolescentes. Kessler et al., 2003 Prejuízo global acentuado 2004 Infecções respiratórias baixas Diarréias Depressão Doença cardíaca isquêmica HIV/AIDS Doenças cerebrovasculares Prematuridade e baixo peso ao nascer Asfixia e trauma ao nascer Acidentes de trânsito Infecções neonatais e outras 2030 1 2 3 Depressão 4 5 6 7 Doenças cerebrovasculares 8 Erros de refração 9 10 Doença cardíaca isquêmica Acidentes de trânsito DPOC Infecções respiratórias baixas Perda auditiva iniciada no adulto HIV/AIDS Diabetes mellitus OMS, 2004 Impacto econômico • No Reino Unido o custo direto com a depressão é maior que o custo com diabetes e hipertensão juntos. • Os custos indiretos são ainda maiores e correspondem a 62% dos custos totais (estes incluem perda da produtividade no trabalho, absenteísmo e desemprego). (Scot and Dickey, 2003; Greenberg et al., 2003) Atenção primária • Nos serviços de atenção primária a prevalência da depressão é de 10 a 30% entre todos pacientes. • Estes pacientes recebem tratamentos não psiquiátricos 2 a 4 vezes mais que aqueles sem depressão. (Simon e Katzelnick, 1997) Saúde mental na atenção básica • OMS tem incentivado o treinamento de médicos da atenção básica em saúde para o reconhecimento e tratamento dos transtornos mentais. • Esta medida tem a intenção de detectar e tratar um número maior de pessoas e também diminuir o estigma associado à doença mental. Programa QUALIS/UNOESTE (2002-2007) • Treinamento de equipes do PSF para atendimento em saúde mental. • Preceptorias presenciais, aulas teóricas, discussão de casos. • Treinamento para o reconhecimento e tratamento das doenças mentais leves e moderadas. • Orientação da equipe para o desenvolvimento de medidas de apoio psicossocial. Uso inadequado dos antidepressivos • Estudo investigou diagnóstico e uso de antidepressivos (n =20013) na população americana. • 9,5% haviam usado antidepressivo no último ano. • 26,3% desses indivíduos não tinham qualquer diagnóstico que pudesse justificar o uso do antidepressivo. – 61,0% por médicos de família, – 22,7% por outros profissionais de saúde, – 16,3% por psiquiatras Pagura et al, 2011 DIAGNÓSTICO DEPRESSÃO 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. - TRATAMENTO ANTIDEPRESSIVO 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. - Sintomas da depressão Sintomas típicos: 1. humor depressivo 2. perda de interesse ou prazer (anedonia) 3. energia reduzida, fadiga constante Outros sintomas comuns 1. atenção e concentração reduzidas 2. auto-confiança e auto-estima reduzidas 3. idéias de culpa e ruína 4. agitação ou retardo psicomotor 5. idéias ou atos contra si mesmo ou de suicídio 6. sono prejudicado 7. alteração do apetite. Gravidade da depressão Duração mínima de duas semanas. 1. leve (F32.0): pelo menos 2 sintomas típicos mais pelo menos dois outros sintomas comuns. Não causa disfunção psicossocial importante. 2. moderado (F32.1): pelo menos 2 sintomas típicos, mais pelo menos três outros sintomas comuns. Prejuízo claro no funcionamento psicossocial. 3. grave (F32.2): todos os 3 sintomas típicos, mais pelo menos 4 outros sintomas comuns. Em geral tem incapacidade psicosocial e ideação suicida. Classificação CID-10 Transtornos do Humor • F30 Episódio Maníaco • F31 Transtorno Afetivo Bipolar • F 32 Episódio Depressivo • F 33 Transtorno Depressivo Recorrente • F34 Transtornos Persistentes do Humor (inclui ciclotimia e distimia) • F38.0 Outros Transtornos do Humor (inclui episódio afetivo misto) Depressão x tristeza normal Depressão Mais intensa Mais duradoura Não reage aos estímulos positivos Prejuízo funcional Piora com o tempo Sem fator causal necessariamente Lentificação psicomotora Tristeza normal Menos intensa Menos duradoura Reage a estímulos positivos Prejuízo funcional limitado Melhora com o tempo Tem fator causal Sem lentificação psicomotora Avaliação inicial Depressão Primária Sem causa orgânica ou sem ligação direta com fator estressante Depressão Unipolar Bipolar Secundária ou Transtorno de ajustamento - Diretamente ligado a fator estressante - Doença física - Medicamentos Depressão secundária • Depressões podem ser secundárias a doenças clínicas ou medicamentos: – Hipotireoidismo, Cushing – Câncer de pâncreas – Doença de Parkinson – Doenças infecciosas como a hepatite C, HIV/AIDS – Lúpus eritematoso, artrite reumatóide – Corticóides – Anti-hipertensivos (propranolol, alfa-metil dopa). – Anticoncepcionais – Cimetidina Comorbidades TEPT 20% Fobia simples 24% Fobia Social 27% TAG 17% DEPRESSÃO Pânico 10% Agorafobia 16% Qualquer transtorno de ansiedade (ao longo da vida) 60% de comorbidade Kessler et al., 2003 Comorbidades Abuso de drogas (sem dependência) 7% Dependência de álcool 24% DEPRESSÃO Dependência de drogas 13% “Durante essas crises de absoluta falta de consciência, eu bebia - só Deus sabe o quanto. Naturalmente, meus inimigos atribuíam a loucura à bebida ao invés de atribuírem a bebida à loucura” (Edgar Allan Poe, 1848) Pesquisa de Transtorno Bipolar • Presença de mania ou hipomania: – Humor eufórico, otimimismo exagerado, expansividade, bem estar – Aumento da energia acentuado – Aceleração do pensamento – Grandiosidade – Distraibilidade – Insônia – Aumento acentuado das atividades – Aumento do discurso – Ações impulsivas Dificuldades com o diagnóstico de TAB Diagnosticado bipolar 20% Não foi diagnosticado bipolar ou depressão 49% 31% Diagnosticado depressão mas não bipolar 80% dos pacientes que foram triados positivamente para TAB não foram diagnosticados como TAB Hirschfeld RMA, et al. J Clin Psychiatry. 2003;64:53-59. MDQ Fatores agravantes na depressão • • • • • • Presença de psicose Ideação suicida Gravidade dos sintomas Cronicidade dos sintomas Presença de comorbidades Ausência de resposta a tratamentos prévios Melhor encaminhar ao psiquiatra! Tratamentos • Biológicos – Antidepressivos – ECT – Light therapy – Deep Brain Stimulation • Tratamentos psicossociais Evolução de tratamentos antidepressivos Agentes de amplo espectro (ações múltiplas) 1950s 1960s Imipramina (1957) Desipramina Clomipramina Amitriptilina Nortriptyiina Fenelzina Isocarboxazida Tranilcipramina Andrews JM. Am J Med. 1994;97(6A):24S-32S. Slattery DA et al. Fundam Clin Pharmacol. 2004;18(1):1-21. Novos agentes afetando múltiplos sistemas monoaminérgicos Agentes mais seletivos (ação única) 1970s 1980s Maprotilina Amoxapina Fluoxetina Sertralina Paroxetina Fluvoxamina Citalopram Bupropion 1990s Nefazodona 2000+ Escitalopram Duloxetina Mirtazapina Venlafaxina Desvenlafaxina Neuroquímica Hipótese monoaminérgica Neurotransmissores Monoaminérgicos, particularmente noradrenalina (NA) e serotonina (5-HT) (Shildkraut, 1965, Coopen 1967). Neuroquímica Hipótese Monoaminérgica • Baseava-se no mecanismo de ação das drogas Limitações: – Apesar da ação dos ADs nos receptores pós-sinápticos ser imediata, a resposta clínica só ocorre de 2 a 3 semanas depois. – Medidas de metabólitos de NA e 5-HT não mostravam padrão consistente – Tentativas de definir subgrupos falharam – Não é possível predizer com certeza a resposta ao tratamento Segundos mensageiros e expressão gênica CREB = fator de transcrição (Belmaker e Agam, 2008) Eixo Hipotálamo-Hipófise-Adrenal Níveis de cortisol estão aumentados em depressão grave e também o tamanho da hipófise anterior e do cortex da adrenal. STRESS HCR ACTH Níveis aumentados de HCR no líquor e da expresão gênica do HCR no sistema límbico Diminuição do hipocampo e do número de neurônios e glia, possivelmente devido à redução na neurogênese devido a níveis elevados de cortisol ou diminuição de BDNF (fator neurotrófico). Antideprssivos aumentam DNF CORTISOL HCR = Hormônio liberador da corticotropina (Belmaker e Agam, 2008) Antidepressivos - eficácia • Entre 30 e 50% dos pacientes depressivos têm uma resposta inadequada ao primeiro antidepressivo utilizado • Razões para falta de eficácia: – Dosagem muito baixa – Duração muito curta – Falta de aderência – Efeitos colaterais intoleráveis Antidepressivos - tempo de uso Riscos se não houver remissão sustentada • • • • • Maior risco de recaída e recorrência1-3 Episódios depressivos mais crônicos1 Deterioração contínua no trabalho e relacionamentos4 Aumento da associação com morbidade e mortalidade por AVC, complicações diabéticas, IAM, doenças cardiovasculares e HIV5 6 7,8 9 10 11 12 Risco de suicídio13 MI=myocardial infarction; CVD-cardiovascular disease; CHF=congestive heart failure; HIV=human immunodeficiency virus. 1. Judd LL, et al. Am J Psychiatry. 2000;157:1501-1504. 8. de Groot M, et al. Psychosom Med. 2001;63:619-630. 2. Paykel ES, et al. Psychol Med. 1995;25:1171-1180. 9. Frasure-Smith N, et al. JAMA. 1993;270:1819-1825. 3. Thase ME, et al. Am J Psychiatry. 1992;149:1046-1052. 10. Penninx BWJH, et al. Arch Gen Psychiatry. 2001;58:221-227. 4. Miller IW, et al. J Clin Psychiatry. 1998;59:608-619. 11. Vaccarino V, et al. J Am Coll Cardiol. 2001;38:199-205. 5. Murphy JM, et al. Arch Gen Psychiatry. 1987;44:473-480. 12. Ickovics JR, et al. JAMA. 2001;285:1466-1474. 6. Everson SA, et al. Arch Intern Med. 1998;158:1133-1138. 13. Judd LL, et al. J Affect Disord. 1997;45:5-18. 7. Lustman PJ, et al. Diabetes Care. 2000;23:934-942. Depressão - recorrência >50% Primeiro episódio1,2 ≈70% Segundo episódio2 80%-90% Terceiro episódio2,3 0 20 40 60 80 Risco de recorrência (%) após recuperação* *Pacientes seguidos de 3 a 15 anos após a recuperação de episódios prévios. 1. Judd LL, et al. Am J Psychiatry. 2000;157:1501-1504. 2. Mueller TI, et al. Am J Psychiatry. 1999;156:1000-1006. 3. Frank E, et al. Arch Gen Psychiatry. 1990;47:1093-1099. 100 Antidepressivos – qual escolher? • Eficácia Evidência clínica Resolução de sintomas emocionais e somáticos • • • • • • • Mecanismo de ação Tolerabilidade Segurança Facilidade de admnistração Custo (direto e indireto) História pessoal e familiar de tratamento Comorbidades Antidepressivos – dose e efeitos colaterais E se não houver resposta ao AD? Falta de resposta ou resposta parcial ao tratamento após 2 a 4 semanas com um antidepressivo em dose adequada Considere otimização do tratamento Combinar dois antidepressivos de classes diferentes Estratégia de potenciação 1° escolha: lítio Outras: T3 ou T4, buspirona, antipsicótico atípico Psicoterapia pode ser adicionada em qualquer fase do tratamento Trocar para um novo antidepressivo de uma classe diferente ou mesma classe Considere ECT nos casos graves sem resposta ao tratamento Bauer et al., 2007 Tratamento psicossocial • Psicoterapia • Relacionamento médico-paciente • Mudanças comportamentais – Controle do álcool – Exercícios físicos – Administrar o estresse – Convívio social DIAGNÓSTICO TRATAMENTO DEPRESSÃO ANTIDEPRESSIVO TRISTEZA NORMAL DEPRESSÃO SECUNDÁRIA TRANSTORNO DE AJUSTAMENTO DEPRESSÃO BIPOLAR PRESENÇA DE COMORBIDADES FATORES AGRAVANTES ESCOLHA DO ANTIDEPRESSIVO INÍCIO ADEQUADO DOSE ADEQUADA TEMPO ADEQUADO TRATAR SINTOMAS RESIDUAIS MANEJO DOS EFEITOS COLATERAIS OUTROS TRATAMENTOS [email protected]