MARCOS TEÓRICOS E CONCEITUAIS DA ABORDAGEM ALTERNATIVA NOS ESTUDOS DE USUÁRIOS novembro de 2007 1. A mudança de paradigma • Reivindicação de um conjunto alternativo de premissas e hipóteses - sete categorias • Informação objetiva x subjetiva • Usuários mecanicistas, passivos x construtivistas, ativos • Trans-situacionalidade x situacionalidade • Experiência atomística x holística • Comportamento externo x cognições internas • Individualidade caótica x sistemática • Pesquisa quantitativa x qualitativa • Paradigma tradicional: um modelo em que a informação é vista como objetiva e os usuários como processadores de informação; que procura por proposições transsituacionais sobre a natureza do uso de sistemas de informação; que faz isso enfocando as dimensões externamente observáveis do comportamento. Um estudo gerado dentro desse paradigma frequentemente pesquisa questões que começam com o sistema (...). Centra-se nas perguntas ‘o quê’ • Paradigma alternativo: vê a informação como algo construído por seres humanos, e os usuários como seres que estão constantemente construindo, como seres que são livres na criação de situações. Foca sua compreensão no uso da informação em situações particulares, centra-se no usuário, examinando o sistema somente como este é visto pelo usuário. (...) Pergunta mais questões ‘como’ Exemplos do conhecimento alternativo a) Inovações em pequena escala (Garvey, Wilson, Wood) b) Abordagem dos valores dos usuários (Taylor, Macmullin): usuários trazem percepções de utilidade e valor para os sistemas, a partir de classes de problemas - estabelecem os critérios para o julgamento da relevância da informação • A partir dos problemas, definição das características da informação (ex: quantitativa e qualitativa, soluções simples e complexas, etc) c) Abordagem da construção de significado (Dervin, Dewdney, Chen): necessidade de informação é uma situação em que o sentido interno esgota-se • Modelo de situação-lacuna-uso d) Abordagem do estado anômalo de conhecimento (Belkin, Oddy): ênfase nas pessoas com lacunas de conhecimento, natureza da inexatidão cognitiva que o usuário traz para os sistemas • Entrevistas semi-estruturadas e análise estatística das respostas pelo computador 2. Conceitos-chave da Etnometodologia • Movimento que começa com Garfinkel, desde a tese, em 1952, com Parsons • Rede na UCLA após 1954: Hymes, Cicourel, Sacks, Zimmermann, Castañeda, Sudnow • O livro fundador é publicado em 1967 • 16 teses entre 1969 e 1972 na UCLA • Expansão para resto dos EUA, Inglaterra, Alemanha • Na França, introduzidos no final da década de 1980 por Alain Coulon e Louis Quéré 2.1. Prática, realização • Etnomet: pesquisa empírica dos métodos que os indivíduos utilizam para dar sentido e as mesmo tempo realizar as ações corriqueiras • Os fenômenos cotidianos se deformam quando analisados pela “grade de descrição científica” • Não há um mundo de regras, normas e estruturas exterior e independente das interações (constância do objeto) • Idéia de processo: o ato dos sujeitos de continuamente atualizarem as regras e modelos 2.2. Indicialidade • A vida social se constitui pela linguagem • Todo termo é indicial, não tem significado completo no trans-situacional • Incompletude natural das palavras, ganham seu significado no contexto • O mesmo vale para os questionários da pesquisa social • É o conhecimento do contexto que permite atribuirlhes sentido 2.3. Reflexividade • Formulação reflexiva, o código não é exterior à ação - ex de Pablo • As pessoas refletem mas não têm consciência, não param para refletir todo o tempo • Práticas que ao mesmo tempo descrevem e constituem o quadro social - descrever uma situação é constituí-la • Equivalência entre descrever e produzir uma interação 2.4. Accountability • Prestabilidade de contas, explicabilidade • As atividades são relatáveis, descritíveis - o mundo não é dado de uma vez por todas, ele se realiza nos atos práticos • Exs: suicídio e caso Inês • Abordar os relatos do mundo como realização em situação (não como indícios da verdade) • Relatos permitem não descrever o mundo mas mostrar sua constituição, sua “fabricação” 2.5. Membro • Competência vulgar, aptidões para a produção constitutiva do fenômeno cotidiano • Risco de usar o termo (pedaço, indivíduo) • Não só a pessoa, mas a pessoa dotada de modos de agir, de saber-fazer, que exibe “naturalmente” a competência social • Concepção de indivíduo sem separá-lo da sociedade 3. A natureza do Interacionismo Simbólico • Movimento que começa na Univ. Chicago, décadas de 1920 e 1930 • Mead, obra de 1934: superação da dicotomia entre indivíduo e sociedade • Blumer cria a expressão em 1937 • Em 1969, obra de Blumer sistematiza a perspectiva e os métodos do Interacionismo Simbólico 3.1. Três premissas a) Os seres humanos agem no mundo em relação aos significados oferecidos • Constatação ignorada por grande parte da pesquisa social, que tende a ver o comportamento como produto de fatores que agem sobre o indivíduo • Fatores psicológicos (estímulos, motivos inconscientes, inputs) e sociológicos (posição social, necessidade de status) b) Os significados dos elementos são provenientes/provocados pelas interações • Maneiras tradicionais de explicar o significado: intrínseco aos elementos, inerente; apenas acréscimo psíquico, justaposição • Significado é produzido na interação, nasce para alguém pela maneira como outras pessoas agem em relação a si no tocante ao elemento c) Os significados são manipulados por um processo interpretativo • Erro de se pensar que o significado é apenas aplicação automática de um significado original já existente • Duas fases: determinação, para si, dos elementos com que se relaciona; e a manobra de significados de acordo com a situação, uso para orientar ações 3.2. Natureza da sociedade humana • Os grupos humanos existem em ação • Outras maneiras: cultura (costumes, tradições, regras) e estrutura social (status, papel, autoridade) são apenas derivações da ação • Vida social = processo contínuo de ajuste das atividades dos membros • É o complexo das atividades ininterruptas que determina a estrutura 3.3. Natureza da interação social • A vida em grupo depende da interação entre os membros • Nos estudos tradicionais, vêem-se os fatores causativos (psicológicos como motivos, complexos; ou sociológicos como normas, valores) e os comportamentos, sendo a interação mero fórum, pano de fundo • Interação é que forma o comportamento, pessoa age em função de outrem, adapta as linhas de ação aos atos dos outros 3.4. Natureza dos objetos • Os objetos são criações sociais, produto das interações, não têm significado inerente - ex: árvore • Três categorias: físicos, sociais, abstratos • O significado é gerado pela maneira como eles são definidos pelas outras pessoas com quem se interage (através das indicações de outrem) • Novo quadro do ambiente: cada pessoa vive em um “universo” de objetos diferente 3.5. O ser humano como agente • Homem não apenas reage a estímulos, ele também interpreta e dá indícios • Mead: o homem possui um “eu”, pode ser objeto para si mesmo, mas esse “eu” surge também da interação em que os outros me definem para mim mesmo • Ser humano interage consigo mesmo (se constitui) por meio de um processo social (é social por isso e não porque vive em contato com outros) 3.6. Natureza da ação humana • Homem defronta-se com um mundo que deve interpretar; situações em que deve especificar o significado das ações de outrem e planejar sua linha de ação após interpretar • Ação humana não pode ser atribuída a um fator causativo • Ação = despender atenção a vários elementos (recursos, objetivos, antecipação da ação de outrem), planejar linhas de conduta, colocar em prática algumas 3.7. Encadeamento de ações • Coexistência grupal humana: adaptação recíproca das linhas de ação dos membros • “Ação conjunta”: encadeamento dos atos isolados dos participantes • Casos de comportamento coletivo repetitivo e estável - erro de se pensar que a existência da sociedade é expressão de normas preestabelecidas; elas são sempre reelaboradas