A Produção Desigual do Espaço Urbano de Duque - NIMA PUC-Rio

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ALGUMAS REFLEXÕES PARA AJUDAR A ENTENDER A
PRODUÇÃO DESIGUAL DO ESPAÇO URBANO EM DUQUE DE
CAXIAS
Prof. Dr. Alvaro Ferreira
Acreditamos que relações sociais são sempre espaciais e existem a partir da
construção de certas espacialidades. Aqui, trataremos de considerar a espacialidade
efetivamente vivida e socialmente criada; ao mesmo tempo concreta e abstrata, sendo,
inclusive, o rebatimento das práticas sociais. Assim, a espacialidade dá conta do espaço
socialmente construído. Nesse contexto, ao debruçar-nos sobre as diferentes frações do
espaço urbano, estamos observando um espaço social associado a uma prática espacial
que se expressa através de sua forma de uso. Contudo, não nos podemos equivocar
acreditando que as formas espaciais expressam apenas transformações econômicas,
sociais, políticas e culturais, temos de ter em conta que uma forma espacial contribui,
também, para a redefinição dos processos sociais, políticos e culturais. É na
espacialidade que o percebido, o concebido e o vivido se reencontram e deixam
transparecer sua total imbricação. Dessa maneira, corroboramos com Lefebvre (1994)
quando de sua afirmação quanto a (re)produção do espaço, pois os fenômenos
socioespaciais são simultaneamente produtos e produtores.
Convém afirmarmos que o espaço como constructo social, ou seja, socialmente
produzido, refere-se à estrutura, que define as determinações do modo de produção, mas
refere-se também, simultaneamente, à ação dos agentes locais em associação com
grupos de ação, muitas vezes de âmbito global. Nesse sentido, o espaço produzido pode
contribuir mais para ocultar do que revelar. Isso porque, em geral, não desvela
imediatamente o processo de sua produção (tal qual a mercadoria). É necessário que
investiguemos as inúmeras codificações sobre as quais se assenta o espaço produzido e
como os agentes produtores colaboram, simultaneamente, para ocultar sua
decodificação.
Adverte-nos Lefebvre (1994, p. 32) que ao mesmo tempo em que o espaço
carrega consigo simbolismos explícitos ou clandestinos – representações das relações de
produção – próprios do cotidiano, do particular, do vivido, transmite, também, as
mensagens hegemônicas do poder e da dominação – representações das relações sociais
de produção –, expressões do geral, do concebido.
Seria seguro afirmar que o espaço contém as relações sociais, mas, além disso,
segundo Lefebvre (1994, p. 41), contém também certas representações dessas relações
sociais de (re)produção. Estaria o autor enaltecendo o fato de tais relações poderem ser
públicas, ou seja, declaradas ou, por outro lado, ocultas, clandestinas, reprimidas e, por
isso, capazes de conduzir a transgressões. Posto dessa forma é possível compreender o
motivo pelo qual Lefebvre (1994) afirma que as representações do espaço têm
considerável peso e influência na produção do espaço, principalmente levando em conta
corresponderem a um sistema de signos, símbolos e códigos de representação
dominantes em uma sociedade e que estão relacionados ao exercício do poder e à
conformação do espaço abstrato.
O que estamos tentando deixar claro é que vivenciamos um conflito entre
interesses engendrados em torno do espaço social – local dos valores sociais de uso e do
desdobramento de relações sociais no espaço – e em torno do espaço abstrato –
enquanto espaço de desenvolvimento imobiliário e administração governamental, por
exemplo. A tensão entre espaço abstrato e espaço social tem produzido efeitos de
fragmentação, criando guetos hierarquizados representando com sua espacialidade a
hierarquia econômica e social, setores dominantes e subordinados. Nesse sentido,
concordando com Gottdiener (1997, p. 131), a hegemonia da classe capitalista é
renovada através da segregação espacial e através dos efeitos da força normatizadora da
intervenção estatal no espaço.
O espaço além de ser um produto social, e como tal, criado para ser usado, para
ser consumido, é também um meio de produção; e como meio de produção não pode ser
separado das forças produtivas ou da divisão social do trabalho que lhe dá forma, ou do
Estado e das superestruturas da sociedade. Contudo, Lefebvre (1979, p. 52) avança ao
afirmar que mais que isso, o espaço deve ser considerado como uma das forças
produtivas. O domínio do espaço confere uma posição na estrutura econômica, por isso
afirma que “mesmo quando uma parte do espaço não tem conteúdo, seu controle pode
gerar poder econômico, porque pode ser preenchido com algo produtivo, ou porque
pode precisar ser atravessado por produtores”. Assim, afirmar que o espaço é uma força
produtiva implica dizer que é parte essencial do processo.
O capitalismo, como modo de produção, sobreviveu pela utilização do espaço
como reforçador das relações sociais necessárias a essa sobrevivência. Harvey (2003,
2000, 1981), influenciado por Lefebvre (1994), afirma que o capitalismo conseguiu
escapar das crises de sobreacumulação através da produção do espaço. Obviamente não
se referia apenas a “novos espaços”, já que a refuncionalização também tem que ser
considerada.
REFERÊNCIAS BIBLLIOGRÁFICAS
GOTTDIENER, Mark. A produção social do espaço urbano. 2. ed. São Paulo: Edusp,
1997. 310p.
HARVEY, David. The new Imperialism. New York: Oxford Press, 2003.
HARVEY, David. Spaces of Capital: towards a Critical Geography. New York:
Routledge, 2000.
HARVEY, David. O trabalho, o capital e o conflito de classes em torno do ambiente
construído nas sociedades capitalistas avançadas. Espaço & Debates, São Paulo, n. 06,
ano II, 1982, p. 06-35.
HARVEY, David. The spatial fix: Von Thünen and Marx. Antipode, 1981.
HARVEY, David. A justiça social e a cidade. São Paulo: Hucitec, 1980. 291p.
LEFEBVRE, Henri. The production of space. Oxford, UK: Blackwell, 1994. 454p.
LEFEBVRE, Henri. Space: social product and use value. In FREIBERG, J. (ed.)
Critical Sociology: European Perspective. New York: Irvington Publishers, 1979.
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