Bispos divididos? Culpa da (má) filosofia

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Bispos divididos? Culpa da (má) filosofia
de Stefano Fontana 17-10-2014
Muitos se terão perguntado como seja possível que, em matéria de tão grande
importância para a doutrina e a fé católica, os bispos e cardeais pensem em modo tão
diverso. Estes dias do sínodo, na verdade, o evidenciaram fortemente. Os
sacramentos, o pecado, a graça, o matrimônio… chama a atenção dos fieis constatar,
nos professores e mestres, opiniões tão diferentes sobre estas coisas de não pequena
importância.
Gostaria aqui de procurar uma explicação em um elemento que, até agora,
talvez não emergiu como importante nos debates em torno ao Sínodo. Me refiro às
filosofias de referência que cardeais e bispos se servem para afrontar as questões
teológicas. A Fides et Ratio de São João Paulo II diz que não se faz teologia sem uma
filosofia e que, se não se assume uma filosofia verdadeira e conforme à fé, se acaba
por assumir uma outra não verdadeira e desconforme à fé. Seja como for, uma
filosofia se assume.
Qual filosofia assumiram os cardeais e bispos que agora interviram sobre estes
problemas na sala do Sínodo e também fora? Quais filosofias estudaram e fizeram ao
longo de seus estudos e leituras? A filosofia é o instrumento do qual se serve a
teologia. Um instrumento que, contudo, não é neutro, visto que condiciona a teologia
em si, já que lhe determina o objeto, o método e a linguagem.
Não é o mesmo se Deus vem entendido como o “Esse Ipsum” [ Ser em si mesmo]
de São Tomás ou como um “Transcendental existencial” como faz Rahner. Não é o
mesmo admitir a dimensão ontológica da fé (a dimensão que faz da fé uma questão
relativa ao ser) ou então reconhecer nessa apenas uma dimensão fenomenológica
existencial. Dos esquemas filosóficos diversos detrás de si, os cardeais afrontarão os
problemas teológicos – incluso aqueles do sínodo – de modo diverso. Karl Rahner dizia
que o pluralismo filosófico e teológico, além de que fosse irreversível, também era
correto e desejável. A Fides et Ratio, ao contrário, dizia que não. Estou convencido que
a maior parte dos teólogos preferiram Rahner à Fides et Ratio. A confusão das línguas
nestes dias do Sínodo parece, entretanto, dar razão a esta última.
A dimensão católica da fé requer, a meu ver – mas penso que também ao modo
de ver da Fides et Ratio – a dimensão ontológica. Se a “nova criatura” que nasce do
batismo não pertence a um novo plano do ser, então é apenas um verniz existencial
ou sentimental. Se, casando-se, os dois cônjuges não dão vida a uma nova realidade –
no plano do ser – realidade que não é a soma de 1 + 1 (e de fato “serão uma só
carne”), então o matrimonio poderá ser existencialmente revisto, refeito, re-celebrado,
re-contratado. Se há uma realidade nova – repito: sobre o plano do ser – não se poderá
mais dissolver -se. A única coisa que se poderá fazer será asseverar se existe ou não,
mas se existe ninguém pode fazer mais nada. Para asseverar se existe se deverá fazer
uma apuração veritativa e não somente pastoral ou administrativa. Se, ao contrário, o
matrimônio tem somente caráter fenomenológico ou existencial, então não há
nenhuma realidade a ser apurada e tudo pode ser revisto e manipulado.
Pensando bem, toda a vida de fé – e não somente o sacramento do
matrimonio – tem um aspecto ontológico. A situação do pecado não é somente uma
questão existencial, mas é a morte espiritual do ser da nossa alma. Quem
voluntariamente vive em pecado mortal é espiritualmente – ou seja, ontologicamente
– morto. Se vemos as coisas desse modo como se poderá, nessa situação, aceder à
comunhão? O sacramento da comunhão nos insere realmente, ontologicamente na
vida divina. Este não é uma cerimônia de socialização, um rito sentimental-existencial.
O sacramento da confissão também possui natureza ontológica, porque sana a
alma ferida pelo pecado, a faz reviver. Não é uma sessão psicoterapêutica. As graças
que recebemos nos sacramentos são vida real, vida divina.
O ingresso na Igreja, pelo Batismo, não é a participação a uma associação,
mas o acesso a uma nova dimensão do ser, em que superamos nós mesmos e
participamos da vida da Trindade. Quando São Paulo diz “não sou mais eu quem vivo
mas é Cristo quem vive em mim” exprime esta novidade ontológica da “nova
criatura”.
Aquilo que alguns bispos disseram no interior da Sala Sinodal e aos
microfones dos jornalistas fora da Sala é consequência daquilo que é ensinado há
muito tempo em muitos seminários e estudos teológicos. Além do mais, também os
bispos não caem do céu, mas tiveram professores e foram educados em um certo
contexto de cultura filosófica. Ora, se estas filosofias que se ensinam não são
conformes ao que indica a Fides et Ratio, é lógico e consequente que também o
exame dos temas como matrimônio, divórcio e a comunhão venha desviado das
atenções da Fides et Ratio.
Por exemplo: se Deus é um “transcendental existencial”, como afirma Karl
Rahner, todos estamos dentro: os casados, unido em matrimônio, os que convivem
maritalmente (amasiados) e também os homossexuais. Não existem os ateus, como
não existem os pecadores. Haverá apenas um caminho para passar do ser cristãos
anônimos ao ser cristãos com nome; um caminho a ser feito juntos, sem excluir ou
condenar nenhuma situação particular de vida, porque todas podem ser um bom
ponto de partida. Muitos bispos exprimem esta visão teológica que, porém, reflete
uma particular filosofia de tipo existencialista. Karl Rahner era discípulo de Heidegger,
não de São Tomás. Quantos bispos são de Rahner e não de São Tomás?
O grande filosofo Cornelio Fabro colocava a questão em termos de relação entre
essência e existência. Sartre dizia que a existência precede a essência; Fabro dizia que
a essência precede a existência. Também neste Sínodo o problema filosófico – e
portanto, consequentemente, também teológico – é este: Se o matrimônio seja um
dado que diz respeito à essência ou seja apenas um dado existencial, reversível a belprazer.
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