Comunicação: linhas gerais • A comunicação não é uma ciência com um único enfoque, mas sim uma área de estudos multidisciplinar, que busca seus modelos teóricos ou paradigmas em diversas outras ciências, de acordo com o assunto a ser pesquisado. • A Comunicação é, portanto, um fenômeno que pode ser entendido a partir de várias abordagens ou paradigmas, com base nos pensamentos da Sociologia, Psicologia e das Ciências Exatas, por exemplo. É disso que se ocupa a disciplina Teorias da Comunicação, que muitos profissionais de jornalismo, publicidade, relações públicas, por exemplo, cursaram na faculdade. • Além de apresentar as linhas gerais de como os meios de comunicação evoluíram até aqui, o objetivo dessa disciplina geralmente é discutir quais são os modelos teóricos utilizados para compreender problemas de comunicação ao longo dos tempos, especialmente durante o século XX - quando a comunicação de massa ganhou força em todo o mundo - até os dias de hoje, quando vivemos a era da comunicação digital. • Mas antes de estudarmos as teorias da comunicação propriamente ditas, vamos fazer um breve resumo da história dos meios de comunicação, história essa que pode ser dividida nas seguintes etapas: 1. Símbolos e sinais • Comunicação por gestos resultantes de instintos herdados. O comportamento adquirido através da comunicação (cultura) era mínimo. Há cerca de 60 mil anos, fala e linguagem. 2. Escrita • A Era da Escrita, posteriormente, acontece há 5 mil anos, entre os sumérios e egípcios no antigo Crescente Fértil da Mesopotâmia – região entre os rios Tigre e Eufrates onde hoje existem a Turquia, o Iraque, o Irã e o Egito. • Papiro/pergaminho/papel 3. Imprensa • 1455, na cidade alemã de Mainz, quando Johannes Gutenberg imprimiu a Bíblia com tipos móveis. 4. Comunicação de Massa • Impressão de massa no século XIX e invenção do rádio, telégrafo, fotografia, telefone. 5. Era da Informação • Década de 60/70, com expansão das redes de informação, fibra ótica e processadores. • A nova estrutura social dominante, a sociedade em rede, dá origem a uma nova economia, a economia da informação ou global. Surge também uma nova cultura, a cultura da virtualidade real, ou do real virtual. O início das pesquisas em Comunicação • A partir do século XIX, com a crescente industrialização e migração para os grandes centros, surge a problemática da “sociedade de massa” e dos meios de difusão de massa • Conceito de massa: conjunto de contágios psíquicos essencialmente produzidos por contatos físicos; condição coletiva; grupo sem vínculos fortalecidos - históricos ou sociais. • Nesse período, a massa apresenta-se como ameaça real ou potencial para a sociedade como um todo. • Sociológico italiano Scipio Sighele e médico psicopatologista francês Gustave Le Bom fortalecem uma mesma visão manipulatória da sociedade. • Sighele: “A massa criminosa” (1891) – trata das violências coletivas da plebe, como greves, revoltas públicas. Segundo ele, em toda multidão há condutores e conduzidos, hipnotizadores e hipnotizados. • Jornalista é retratado como agitador, e leitores como “gesso molhado sobre o qual sua mão deposita sua marca”. • “Psicologia das multidões” (1895): Le Bon considera todas as formas coletivas como retrocesso á evolução das sociedades. Teoriza sobre raças “superiores” e “inferiores”. • Ortega y Gasset – (1883 – 1955): crítico da sociedade de massa, ressalta a ideia do “homem-massa”, que se encontra nos vários extratros sociais e é um indivíduo abrutalhado, violento, promotor do esgarçamento social. Afirma que os meios de comunicação fazem emergir a barbárie pela massa, que é descrita como sendo formada por indivíduos atomizados, reclusos nos seus espaços privados. • Os meios de comunicação fariam uma ponte entre tais indivíduos e a sociedade. • Os primeiros estudos sobre a comunicação de massa acontecem nos Estados Unidos, no começo do Século XX. São pesquisas basicamente instrumentais, e surgem a partir da necessidade política do governo norteamericano em classificar e quantificar o comportamento dos indivíduos expostos a peças de propaganda, como cartazes e filmes. • Tanto interesse tinha um motivo específico: entender como seria possível repassar aos cidadãos a importância do patriotismo e do nacionalismo, e assim motivá-los para o propósito da guerra. Communication Research: conjunto de abordagens sobre a comunicação de massa • • • • Teoria Hipodérmica Abordagem Empírico-experimental Abordagem Empírica de Campo Teoria Funcionalista • elaboradas no início do século XX em centros de pesquisa dos Estados Unidos. • Tais estudos tinham em comum métodos que buscavam resultados objetivos - herança positivista - já que utilizavam procedimentos das ciências naturais da época para tentar medir os efeitos da comunicação. • A Communication Research é baseada num modelo de pesquisa administrativa, que verifica a aplicação que o sujeito faz do conhecimento, partindo da premissa de que o conhecimento só tem valor se tiver aplicação ou função. Para os pesquisadores dessa corrente, a economia, e por conseguinte, os meios de comunicação, não são contra a cultura, mas se integram à cultura e ajudam a produzí-la. • Daí a analogia feita por Umberto Eco de que a Communication Research é integrada, e que a Escola de Frankfurt, na Alemanha e outras teorias de cunho crítico são apocalípticas, ou seja, tais pensadores defendem que os meios de comunicação de massa causam prejuízo à sociedade e que a economia destrói a cultura. 1. A Teoria Hipodérmica • A importância da Teoria Hipodérmica se deve ao fato de ter sido a primeira tentativa, embora falha, de conceituar o papel da comunicação numa sociedade de massa. • É uma abordagem global dos mass media. Isso quer dizer que não leva em conta a diversidade e especificidade de cada mídia, nem os diferentes impactos que cada uma delas poderia causar na percepção e nas formas de cognição humanas. A preocupação central desta abordagem teórica é descrever, e não verificar empiricamente, os efeitos da mídia. 1.1Contexto histórico da Teoria Hipodérmica • A Teoria Hipodérmica começa a se estruturar durante a I Guerra Mundial e é utilizada como modelo para explicar fenômenos comunicativos até a Segunda Grande Guerra, não só nos Estados Unidos, como também na Europa. • Os pensamentos sobre os efeitos da propaganda ganham força a partir da década de 20, época em que emergem os mass media e especialmente a sociedade de consumo norte-americana. • O conceito de comunicação ainda não era corrente, mas sim o da difusão, uma vez que o feedback do público para a mídia não era medido ou considerado: o papel dos meios era divulgar informações para a manipulação, enquanto indivíduos passivos eram vistos apenas como receptores. • O rádio era o meio mais popular, utilizado como inoculador de propaganda e entretenimento para grandes audiências. • O cinema também tinha função estratégica para os governantes, que levavam às salas de projeção as conquistas militares, as paradas em datas comemorativas, até instruções sobre como promover a purificação da raça na Alemanha nazista de Adolf Hitler. • Os meios de comunicação de massa eram considerados uma espécie de sistema de distribuição que injetava mensagens com uma agulha muito comprida, que poderia alcançar todas as camadas do tecido social, da mais superficial (instituições) até a mais profunda (sentidos humanos), de modo indiferenciado, daí o nome Teoria da Agulha Hipodérmica, criado por Harold Lasswell. • Diante desse contexto histórico - em que os Estados totalitários emergiam em todo o mundo, enquanto os meios de comunicação sofriam controle e serviam como ferramentas de dominação - os pesquisadores da época foram induzidos pelas evidências (contexto político) a pensar e afirmar que as mensagens causavam efeitos inevitáveis e instantâneos. • Por causa disso, a teoria também foi chamada de Bullet Theory, “Teoria da Seringa”, “Teoria da Bala”, ou “Teoria da Bala Mágica”, cujo alvo fácil era sempre a audiência. Vale lembrar que os efeitos da mídia foram apenas dados como certos pelos estudiosos dessa corrente, pois não houve pesquisas empíricas que de fato comprovassem esses efeitos.” 1.2 Algumas premissas da Teoria Hipodérmica • Com o capitalismo industrial, o enfraquecimento dos laços tradicionais entre os indivíduos contribuiu para o isolamento e a alienação desses indivíduos nas massas. • A atomização, a fragmentação e o isolamento do indivíduo nas sociedades modernas, que começam a ser formar no século XIX, favorecem a manipulação desse indivíduo pelos mass media e a formação das massas. • 1.2 Algumas premissas da Teoria Hipodérmica • A Sociologia Funcionalista - que enxerga a sociedade como um organismo, e o indivíduo como célula que deve colaborar para o equilíbrio social – teve grande influência sobre a Teoria Hipodérmica. • As mensagens dos mass media atuam como estímulos a determinados comportamentos; provocam impulsos, emoções e processos sobre os quais os indivíduos exercem escasso controle. • A teoria considerava "cada elemento do público pessoal e diretamente atingido pela mensagem" (Wright, 1975 apud Wolf). • 1.2 Modelo comunicativo da Teoria Hipodérmica • Psicologia behaviorista (comportamental): Segundo o behaviorismo, o estímulo provoca a resposta, e a relação entre eles é direta. Ou seja, para cada estímulo (informação veiculada), sempre a mesma resposta; presume-se que não haja interferência alguma entre emissor e receptor - um age diretamente sobre o outro. E → R (ESTÍMULO GERA RESPOSTA) • O contexto é de total controle da mídia, e tanto líderes políticos, como a ciência a serviço do poder, difundem a idéia de que não há capacidade entre os indivíduos de filtrar a informação recebida. Assim, as informações veiculadas (estímulo – propaganda) deveriam gerar sempre as mesmas respostas (comportamento massificado). • A superficialidade deste modelo está em não considerar nenhum tipo de obstáculo entre estímulo e resposta (como os ruídos, por exemplo) e simplesmente descartar a possibilidade de um estímulo (E1) gerar diferentes respostas (R1, R2, R3...). 1.4 O modelo de Lasswell e a superação da Teoria Hipodérmica • Propaganda: técnica de influenciar a ação humana através da manipulação das representações, como símbolos, por meio de rumores, relatos, imagens e outras formas de comunicação social. (Harold Lasswell) • Cientista político da Universidade de Chicago, um dos mais importantes da primeira metade do século XX nos EUA, Harold Lasswell se interessa por propaganda, opinião pública, negócios de Estados e eleições. • A eleição de Roosevelt em 1932 inaugura as técnicas de formação da opinão pública. Nascem as sondagens de opinião como ferramentas da administração cotidiana da coisa pública. As pesquisas pré-eleitorais de Gallup, Roger e Crossley conseguem prever a reeleição de Roosevelt. • Interesse de Lasswell pela ascenção, nos anos 30, das estratégias de propaganda das potências do Eixo e da União Soviética. • World Politics and Personal Insecurity (1935): Lasswell propõe o estudo sistemático do conteúdo da mídia e a elaboração de indicadores para revelar tendências (trends) do ambiente simbólico mundial para elaborar políticas • Coordena, de 1940 a 1941, a organização da War Time Communication Study da Biblioteca do Congresso Americano. • Pai da análise de conteúdo na Comunicação da Massa. É também considerado o fundador da Communication Research, porque foi o primeiro autor que escreveu sobre um tema da mídia de massa, e não apenas sobre o processo de comunicação, que já era estudado em outras ciências, como a psicologia, linguística e biologia. • A primeira obra da Mass Comunication Research é de 1927, Propaganda Techniques in the World War, de Harold D. Lasswell (1902- 1978), sobre o uso da propaganda na guerra de 1914-1918. • Meios de difusão – instrumentos indispensáveis para a gestão governamental das opiniões, tanto de aliados como de inimigos. • Para Lasswell, “propaganda rima com democracia”: meio de participação e gestual do homem médio • Propaganda constitui único meio de suscitar a adesão das massas • É mais econômica que a violência, a corrupção e outras técnicas de governo • Pode ser utilizada tanto para bons como para maus fins • A audiência é tida por Lasswell como alvo amorfo, que obedece cegamenta ao esquema estímulo-resposta. • Consagra visão da onipotência da mídia, considerada ferramenta de “circulação eficaz de símbolos” • Visão de Lasswell se une a teorias psicológicas da época: - “Psicologia das massas” de Le Bon; - Behaviorismo de John B. Watson - Teorias de condicionamento de Ivan Pavlov - “Violação das massas pela propaganda”, do russo Serge Tchakhotine (1939): alimenta a ideia de mídia e da propaganda todo-poderosas, com base nas teorias de Pavlov A sociologia funcionalista da mídia • Um dos primeiros modelos para o estudo da comunicação foi proposto por Lasswell no texto “ A estrutura e a função da comunicação da sociedade” ( 1948). Procurou apresentar um modelo teórico, tomando como ponto de partida estudos sobre mídia e política. • O modelo procura dar conta de uma articulação linear entre os vários elementos de uma interação. Lasswell desenvolve sua concepção a partir de uma ampliação do modelo de comunicação de Aristóteles (Emissor-Mensagem-Receptor) exposto na Arte Retórica. • Lasswell formula sua hipótese: publica um modelo de comunicação , criado a partir das análises feitas sobre o conteúdo das propagandas, e continha as seguintes premissas: • “Uma forma adequada para desenvolver um ato de comunicação é responder às seguintes perguntas: • QUEM • DIZ O QUÊ • A QUEM • POR QUE CANAL (OU A QUE CANAL, OU ATRAVÉS DE QUE MEIO) • COM QUE EFEITO” (1948) • O esquema proposto por Lasswell para analisar a mídia e seu conteúdo resultaria em outras frentes posteriores de pesquisa: análise do controle, análise de conteúdo, análise das mídias ou dos suportes, análise da audiência e análise dos efeitos. • Na prática, privilegiou dois pontos: análise dos efeitos e análise dos conteúdos. • “Essa técnica de pesquisa visa à descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto das comunicações” – estudar o conteúdo era estudar o próprio efeito, a reação sobre o público. A partir deste modelo, Lasswell especifica as funções da comunicação na sociedade: a) articulação das partes com o todo – estabelecimento de relações entre os compoentes da sociedade para produzir uma resposta ao meio; b) vigilância sobre o meio – revelar tudo o que poderia ameaçar ou afetar o sistema de valores de uma comunidade ou das partes que a compõem; c) transmissão da herança social – garantir continuação do sistema transmitindo conhecimento e valores de geração em geração (por isso, para fins de prova, a teoria hipodérmica também pode ser chamada de teoria funcionalista, ou teoria de base funcionalista) • A “falha” de Lasswell em sua obra foi acreditar que o simples estudo dos conteúdos, ou técnicas de elaboração da propaganda, era um modo de revelar sua eficácia. A atenção do modelo e dos estudos do autor recai sobre a emissão e a mensagem, enquanto a audiência é apenas dividida em classes genéricas, como idade e sexo, e não é analisada em profundidade (ausência de estudos de recepção consistentes).