Marketing Social: Origens, Desenvolvimento e

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# Gestão
Social e Gestão Pública: Interfaces e Delimitações #
Marketing Social: Origens, Desenvolvimento e Perspectivas
Airton Cardoso Cançado
Marcos Luís Procópio
José Roberto Pereira
Resumo
Este texto tem como objetivo analisar a trajetória do conceito de marketing social e
discutir suas perspectivas. Este esforço tem como base uma análise histórico-teórica do
conceito de marketing social, análise esta que, ao final, nos apresenta um possível caminho de
convergência com o conceito de gestão social na perspectiva de Fernando Tenório (2008a;
2008b; 2010). Para ilustrar a análise histórico-teórica do conceito de marketing social foi
utilizada a metáfora de Alan Andreasen (2003) das fases do crescimento humano (infância,
adolescência, vida adulta, meia-idade e velhice). Tal autor argumenta que o marketing social,
por ser um campo ainda muito novo, mal adentrou a vida adulta e ainda tem muito que
crescer. A título de consideração final, o principal resultado encontrado foi a possibilidade da
operacionalização do marketing social “adulto” por meio da gestão social, o que abre novos
horizontes para o marketing social em um momento crucial de seu desenvolvimento. Por
outro lado, a gestão social tem no marketing social “adulto” novas possibilidades teóricas e
empíricas de avançar enquanto conceito e prática.
Palavras-Chave: marketing comercial, marketing social, gestão social.
1 Introdução
Este texto tem como objetivo analisar a trajetória do conceito de marketing social e
discutir suas perspectivas. Este esforço teórico tem como base uma análise histórico-teórica
do conceito de marketing social que ao final nos apresenta um possível caminho por meio da
gestão social na perspectiva de Tenório (2008a; 2008b; 2010).
O marketing social é um campo relativamente novo na Administração. Pouco menos
de 40 anos se passaram desde a sua “fundação acadêmica”, em 1971, com um texto de Philip
Kotler e Gerald Zaltman (Andreasen, 2003). Em língua portuguesa, a primeira tradução é de
1992 (Vieira e outros, 2007), desde então o marketing social vem se desenvolvendo e se
mostrando como um campo bastante promissor no sentido da promoção do bem-estar social.
Os crescentes problemas econômicos, sociais e ecológicos que atingem muitas nações,
exigem da Administração novos modos de pensar, para não se dizer uma completa renovação
das suas bases (Aktouf, 1996; Guerreiro Ramos, 1981), no sentido da promoção do bem-estar
social e do interesse público.
No Brasil, a Reforma do Estado iniciada na década de 1990 descentralizou grande
parte de suas responsabilidades sociais para a sociedade civil organizada (Bresser-Pereira,
2006; Soczek, 2002). O interesse pela questão do bem-estar social, especialmente do
marketing social, difundiu-se pelos segundo e terceiro setores. Isso deu bastante evidência ao
campo do marketing social, acarretando também a difusão das suas idéias e princípios
(Araújo, 2001).
A evolução do conceito de marketing social, como será apresentada adiante, nos
mostra um afastamento progressivo do marketing comercial e uma aproximação com seu
“público-alvo”. Este movimento tende a reforçar as diferenças entre estes dois tipos de
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marketing, mas ao mesmo tempo faz com que o marketing social necessite de outros aportes
teóricos.
Este trabalho esta organizado nesta introdução, seguida de uma segunda seção onde
trataremos das origens, evolução e controvérsias acerca do conceito de marketing social. Na
seção seguinte apresentaremos a gestão social como uma possível perspectiva para o
marketing social. Após isto serão feitas algumas considerações finalizando o texto.
2 A Trajetória Histórico-Teórica do marketing social
Na condução histórico-teórica do conceito de marketing social, vamos nos valer da
metáfora Andreasen (2003), que se utiliza das fases do crescimento humano (infância,
adolescência, vida adulta, meia-idade e velhice) para explicar a evolução histórica do
marketing social. O autor argumenta que o marketing social, por ser um campo ainda muito
novo, mal adentrou a vida adulta e ainda tem muito que crescer.
No Brasil, tal como alerta Araújo (2001), a difusão das idéias e princípios do
marketing social não se deu de modo unívoco. Dado o grande frenesi que desperta em todos
aqueles que se interessam pelas questões ligas ao bem-estar social, além do Estado, o
marketing social sofre distorções e deturpações diversas a ponto de ser perigosamente
confundido com outras propostas de intervenção social existentes no universo das
organizações, tais como a Responsabilidade Social, o Marketing de Causa Social e o
marketing social Corporativo.
Cabe ressaltar que a diferenciação do marketing social diante de todas as outras
propostas corporativas de intervenção social foi debatida no Brasil por vários autores como
Higuchi e Vieira (2007), Vieira e outros (2007), Araújo (2001) e não constitui objeto de
discussão no presente ensaio. Porém, apenas a título de esclarecimento, podemos dizer que
esta diferenciação pode ser verificada, ao menos inicialmente, no nível teleológico:
diferentemente do marketing social que tem na busca pelo bem-estar social e pelo interesse
público seu fim último, as demais propostas que se confundem com ele se justificam a partir
dos benefícios que trazem às organizações promotoras. Dito de modo mais direto, enquanto o
marketing social tem como finalidade última promover o bem-estar social e o interesse
público, as demais propostas que se confundem com ele visam à obtenção de vantagens
estratégicas ulteriores – tais como maior lucratividade (no caso das empresas privadas), maior
aceitação popular (no caso das empresas públicas) ou maior poder de atuação (no caso das
organizações do terceiro setor) – em troca da busca (real ou simulada) pelo bem-estar social.
Uma vez que vários autores como Andreasen (2003), Peattie e Peattie (2003) e Araújo
(2001), dentre outros, concordam com o fato de que o marketing social encontra-se em uma
fase “crítica” e que, por isso, seu futuro ainda está por ser definido, cremos ser esta uma boa
oportunidade para apresentarmos nossas próprias propostas a cerca do que poderia ser sua
próxima fase evolutiva. Nesse sentido, fazemos nossas as palavras de Peattie e Peattie (2003,
p.383) que, ao parafrasearem Andreasen sustentam que “[...] o marketing social está agora em
uma grande encruzilhada que [...] cria um momento apropriado para se reconsiderar o que esta
disciplina necessita para seu futuro desenvolvimento”.
Dada a grande complexidade e imprecisão da matéria, iremos focar nosso debate em
torno de sete noções elementares que perpassam toda a evolução do marketing social, desde
sua “infância” até sua recente entrada na vida “adulta”. São elas: (1) “necessidade”, (2)
“produto”, (3) “comunicação”, (4) “transação”, (5) “orientação para o „cliente‟”, (6)
“Administração de Marketing” e (7) grau de dependência do marketing social em relação ao
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Marketing Comercial. Para efeito metodológico, iremos chamar essas noções referenciais
doravante de “indicadores comparativos” ou simplesmente “indicadores”.
Na teoria ortodoxa de Marketing (Peattie e Peattie, 2003; Chauvel, 1999), a
necessidade é um estado individual de insatisfação que, por tirar o indivíduo do equilíbrio,
exige uma compensação. Essa compensação é normalmente realizada via consumo de um
produto ou serviço minimamente tangível adquirido em uma transação onde o indivíduo
fornece algo (como tempo, dinheiro, esforço ou todos) em troca. A necessidade está, então, no
âmago da motivação dos indivíduos para a transação de marketing. Porém, para que o
indivíduo possa efetivar a transação e consumir o produto que trará a satisfação da sua
necessidade, é preciso antes que a existência de tal produto lhe seja comunicada por alguém;
ou seja, o produto precisa ser anunciado para que possa ser conhecido e desejado. A transação
é entendida, então, como relação social a partir da qual as necessidades serão satisfeitas, ou
relação a partir da qual a troca é realizada. A orientação para o “cliente” expressa o grau de
esforço necessário para se compreender as diversas necessidades existentes na vida do
consumidor (ou do possível consumidor) de certo produto e como tais necessidades podem
ser satisfeitas. A Administração de Marketing representa todo o (eventual) processo de
planejamento, implementação e controle das transações (ou programas de transações) voltadas
para a satisfação mutua das necessidades dos indivíduos. Nela estão presentes, inclusive, as
decisões sobre o produto.
Embora todas essas noções tenham pertencido primeiramente ao campo do Marketing
Comercial, elas foram apropriadas pelo marketing social. Iremos mostrar, no decorrer deste
ensaio, como cada um desses seis indicadores mudou historicamente dentro de cada uma das
fases do crescimento do marketing social (“infância”, “adolescência” e vida “adulta”). Nesse
sentido, ao analisar o crescimento do marketing social, iremos, também, demonstrar como
variou seu grau de dependência em relação ao Marketing Comercial.
Grosso modo, a idéia de Marketing que se fazia presente no mundo empresarial na
ocasião do surgimento do marketing social era a de que o Marketing consistia em uma
tecnologia gerencial voltada para a busca da satisfação das necessidades do cliente enquanto
indivíduo e, ao mesmo tempo, busca da satisfação das necessidades da organização, através
da realização de transações planejadas e controladas. A despeito da evidente preocupação com
o cliente e com sua satisfação, Peattie e Peattie (2003) observam que por trás do argumento do
“ganha-ganha” (ganha o cliente, ganha a empresa, simultaneamente) o que de fato sempre
dominou o debate acadêmico no âmbito do Marketing Comercial foi uma forte preocupação
com a obtenção de vantagem competitiva, ganho de confiança dos stakeholders e
administração de riscos de mercado por parte das empresas. Embora o “ganha-ganha” seja
professado conceitualmente, são as necessidades da empresa que primeiro contam no
Marketing Comercial, o que implica, em última instância, suas necessidades de lucro.
Ainda nos anos 50 G. D. Wiebe questiona, inicialmente, a respeito da viabilidade de se
aplicar as mesmas técnicas e ferramentas de Marketing utilizadas para se “vender” produtos
industrializados à “venda” de “causas sociais” (KOTLER e ZALTMAN, 1971). As primeiras
iniciativas de marketing social ocorreram no seio de organizações estatais, como agências
públicas promotoras de programas de saúde, campanhas antitabagistas, campanhas de
controle de natalidade, etc., e não no seio das empresas privadas que visavam melhorar seu
desempenho comercial a partir da adoção de uma “causa” social (MENDES, 2009;
ANDREASEN, 2003; ARAÚJO, 2001; KOTLER e ZALTMAN, 1971). Nem todas as
técnicas e ferramentas de Marketing Comercial puderam ser transpostas para o marketing
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social, devido às diferenças que existiam (e ainda existem) entre as iniciativas comerciais de
promoção de vendas e as iniciativas sociais de promoção de mudança de comportamento
(Kotler e Zaltman, 1971), bem como devido às diferenças que existem entre os dois contextos
onde tais iniciativas são propostas (Peattie e Peattie, 2003).
Como observa Andreasen (2003), enquanto as campanhas sociais eram organizadas
em torno da distribuição de produtos como preservativos, panfletos impressos e/ou remédios,
pouca mudança era necessária na ocasião da apropriação da tecnologia do Marketing
Comercial. Por isso, “não é surpreendente que os primeiros passos de bebê do marketing
social envolveram produtos relativamente simples, onde as principais ferramentas de
marketing utilizadas foram a promoção e distribuição convencionais” (Andreasen, 2003, P.
294).
“Produto”, “preço”, “ponto” e “promoção”, consagrados quatro “Ps” do Marketing
Comercial estão presentes no campo do marketing social em sua fase “infantil”, mesmo que
alguns deles estejam presentes metaforicamente para que possam ser aplicados ao novo
contexto (Peattie e Peattie, 2003). Isso vale, especialmente, para o “produto” e para o “preço”.
Uma vez que o marketing social muitas vezes lida com produtos intangíveis tais como idéias
e/ou comportamentos, o termo “produto” adquire nele uma conotação bem diferente daquele
que existe no Marketing Comercial. Da mesma forma, dado que as transações no marketing
social se deram inicialmente entre Estado e cidadão (e não entre vendedor e cliente), em
ocasiões onde a busca pelo lucro econômico não se fazia necessariamente presente, o termo
“preço” faz muito mais sentido quando pensado como o custo (monetário ou não) que o
cidadão deve enfrentar para poder se envolver em tais transações (Peattie e Peattie, 2003;
Andreasen, 1995; Kotler e Zaltman, 1971). Isso é o que Peattie e Peattie (2003, p.382)
chamam de “custo de envolvimento”. Todavia, o paralelo entre o marketing social e o
Marketing Comercial ainda é tão grande aqui que Kotler e Zaltman (1971, p.10), ao
conceituá-lo formalmente, expõem que “marketing social é o desenho, implementação e
controle de programas calculados para influenciar a aceitação de idéias sociais e que
envolvem considerações sobre planejamento de produto, precificação, comunicação,
distribuição e pesquisa de marketing” (grifo nosso). Segundo Andreasen (2003; 1995) essa
definição inicial de marketing social é pouco explicita e pode levar a muitas confusões.
Na fase infantil do marketing social, as necessidades do público-alvo são vistas como
demandas conhecidas e consensuais na sociedade, que apenas necessitam de uma
oportunidade para que possam ser adequadamente sanadas. Nas palavras de Kotler e Zaltman
(1971), trata-se de necessidades que precisam ser “canalizadas”. Por exemplo, a demanda por
controle de natalidade em sociedades perigosamente populosas, a demanda pelo não-consumo
de tabaco e a demanda por práticas sexuais que evitem a transmissão de doenças seriam,
dentro dessa perspectiva, latentes na sociedade. Uma vez que as necessidades existem e uma
vez que são relativamente consensuais, as transações entre o Estado e o cidadão seriam bem
simples e precisas, e consistiriam, por exemplo, em trocas de mais saúde por preservativos,
mais saúde por adesivos de nicotina ou mais espaço e conforto nas grandes cidades por
vasectomias. O produto a ser transacionado ainda é visto aqui sob o ângulo do Marketing
Comercial ortodoxo, ou seja, como algo acabado e relativamente tangível (preservativos,
panfletos, remédios, etc.) que é oferecido pelo agente de marketing, ou por sua organização,
ao “público-alvo”. A comunicação aqui é essencialmente unilateral e meramente instrutiva,
partindo do agente de marketing na direção daqueles que compõem o público-alvo da
campanha. De modo mais preciso, trata-se de uma forma de comunicação eminentemente
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funcional, aos moldes daquela prevista na Teoria das Organizações Formais, tal como descrita
por Chester Barnard (1979). O Estado promove uma campanha para informar os cidadãosalvo sobre os riscos do sexo sem preservativo e sobre onde eles podem ir e o que devem fazer
para obter algum. O “produto” preservativo é trocado pelo comportamento sexualmente
seguro e essa transação, imagina-se, ocorre sem resistência e/ou questionamentos uma vez
que representa uma “vantagem” óbvia para todos. Com efeito, para Kotler e Zaltman (1971)
todo o problema que envolve as transações no marketing social se resume a análise custobenefício realizada pelo indivíduo que compõe o “público-alvo” da campanha.
Percebe-se, então, que a transação é entendida de modo behaviorista, quase como uma
transação econômica vista sob o ângulo neoclássico, e que ocorre “verticalmente” entre o
agente de marketing e o indivíduo que compõe o público-alvo da campanha, cabendo a este
último apenas o papel de “consumidor” que busca por “vantagens”, a exemplo do que
acontece no Marketing Comercial ortodoxo. Da Psicologia Behaviorista, o marketing social
herdou a concepção passiva de indivíduo cuja motivação depende exclusivamente de um
estímulo externo. Da Economia Neoclássica, o marketing social herdou o cálculo utilitário de
conseqüências como razão única para a ação humana. Assim, no marketing social “infantil”
os indivíduos são vistos como seres essencialmente passivos, porém interesseiros na medida
em que se encontram dispostos a se envolver em transações somente mediante estímulos
exteriores que façam tais transações lhe parecerem úteis ou vantajosas. Trata-se de transações
do tipo “faça isso e receberá aquilo”, tais como criticamente estudadas – tanto no ambiente de
trabalho quanto no ambiente escolar e, também, no ambiente familiar na sociedade
contemporânea – pelo cientista do comportamento Kohn Alfie (1996) sob o rótulo apropriado
de “behaviorismo pop”.
Uma vez que supostamente exista grande conhecimento e consenso sobre as
necessidades da população, cabe pouco esforço por parte do Estado no sentido de investigálas e compreende-las. Por conseguinte, a orientação para o cliente aqui é mínima e se restringe
as questões relacionadas a como comunicar a campanha, onde dispor os produtos, como gerir
a logística, etc.. Assim, cabe ao Estado tão somente o papel de “canalizar” a satisfação da
necessidade de um modo que ela se mantenha sempre vantajosa na avaliação custo-benefício
realizada pelo cliente-cidadão.
Isso tudo nos leva ao modo como a Administração de Marketing é vista na fase
“infantil” do marketing social. Nessa fase, todo o desenho, planejamento, implementação e
controle das ações de marketing cabe a um único agente (ou poucos agentes), que atua(m) de
modo autocrático, neste caso, representando o Estado. Esta abordagem, definitivamente, se
caracteriza pela pouca “voz” daqueles que são “alvo” dos programas, ou seja, na medida em
que lhes resta pouco a falar sobre suas próprias necessidades. Os especialistas legitimariam as
campanhas, veiculadas de forma racional e altamente baseadas na informação (Peattie e
Peattie, 2003).
Durante sua “infância” o marketing social esteve paradoxalmente muito próximo e ao
mesmo tempo muito distante do seu “pai”, o Marketing Comercial. Próximo porque herdou
quase que integralmente sua visão behaviorista e utilitarista de transação e, também, porque
poucas mudanças tecnológicas foram feitas em termos das ferramentas e técnicas do
Marketing Comercial na ocasião da sua aplicação às “causas sociais”. Distante porque o
nascimento do marketing social ocorreu em um ambiente até então estranho para Marketing
Comercial, ou seja, o Estado. É importante frisar que logo no seu “nascimento” o marketing
social se diferenciava do Marketing comercial em função do contexto organizacional onde era
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praticado. Isso, certamente, diz muito sobre sua natureza e, quiçá, sobre seu futuro.
Entretanto, como houve pouca mudança em termos de visão de transação e de tecnologia
empregada, o grau de dependência do marketing social em relação ao Marketing Comercial
permaneceu ainda muito elevado durante sua “infância”.
Mudanças substanciais vão caracterizar a passagem do marketing social da “infância”
para a “adolescência”. De acordo com Andreasen (2003) foi apenas nos anos 1990 que o
marketing social reconheceu sua verdadeira natureza. Isso aconteceu, sustenta o autor, “[...]
quando um número significativo de líderes acadêmicos e líderes executivos entendeu que sua
essência não era mudar idéias, mas sim, mudar comportamentos” (ANDREASEN, 2003,
p.296). Assim sendo, nos últimos anos do século XX, uma nova definição de marketing social
começou a circular no campo da Administração:
marketing social é a aplicação das tecnologias do Marketing Comercial para
a análise, planejamento, execução e avaliação de programas desenhados para
influenciar o comportamento voluntário da audiência-alvo no sentido de
melhorar seu bem-estar e o bem-estar da sociedade da qual ela é uma parte
(Journal of Public Policy & Marketing, 1999 citado por Andreasen, 2003,
p.296). (grifo nosso)
As mudanças são bem relevantes. Em primeiro lugar, um fim último é fixado para toda
e qualquer atividade de marketing social, a saber, o bem-estar de indivíduos e da sociedade.
Muito embora ainda nos reste saber em que consiste, especificamente, esse bem-estar e
interesse público (isso será debatido mais adiante ainda nesta seção). Contudo, de certo modo,
essa diferença afasta o marketing social do Marketing Comercial (Andreasen, 1995). Este
último tinha, dada sua natureza, a “vantagem” ou simplesmente o lucro da empresa como fim
último de todas suas ações, mesmo que de um modo não explícito ou declarado. Isso não
significa, em hipótese alguma, que o marketing social se restringe somente às organizações
que não visam lucro. É nesta sua fase “adolescente”, mais do que na antiga fase infantil, que o
marketing social se mostra capaz de “servir” em uma gama maior de organizações,
perpassando tanto o Estado, quanto o mercado e a sociedade civil organizada. Com efeito,
enquanto o marketing social “infantil” era praticado quase que exclusivamente no contexto
das organizações públicas, ou em parceria com elas (VIEIRA e outros, 2007), o marketing
social “adolescente” já pode ser também encontrado tanto nas organizações privadas quanto
nas ONGs. Araújo (2001) chega a esta mesma conclusão ao realizar uma revisão de literatura
sobre o conceito. De acordo com esse autor, o marketing social pode ser encarado “[...] como
estratégia de mudanças comportamentais e atitudinais, podendo ser utilizado em qualquer tipo
de organização seja pública ou privada, lucrativa ou não, desde que tenha uma meta final de
produção de transformações e impactos sociais” (Araújo, 2001, p.15). Por outro lado, essa
relativa “universalização” do marketing social, e especialmente sua adoção por organizações
empresariais lucrativas, trazem novos problemas e desafios analíticos para sua correta
diferenciação frente a outras práticas corporativas de intervenção social. No Brasil, de acordo
com Araújo (2001), a confusão conceitual ainda é grande. Embora o marketing social possa
ser utilizado por diferentes tipos de organização, como reconhece o próprio autor, “[...] há
uma tendência em associar o termo marketing social as estratégias de agregar valor social a
produtos e melhorar a imagem de empresas privadas”. Nesse sentido, alerta o autor, “[...] as
ações sociais promovidas pelas empresas, classificadas como de responsabilidade social ou
qualquer outro termo, na maioria das vezes não utilizam estratégias de marketing social, mas
sim apenas de promoção social utilizando-se de Marketing Comercial”. (ARAÚJO, 2001,
p.12)
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Em segundo lugar, essa nova definição assume o “comportamento social” como objeto
de estudo e intervenção do marketing social, ao invés de se ater às “idéias sociais”. Mais do
que isso, foca o “comportamento social voluntário”, ou seja, aquele que não pode ser
“produzido” sem o mínimo de participação ou consentimento daqueles para os quais a ação de
marketing é direcionada. A opção pelo “comportamento social voluntário” traz implicações
sérias para o marketing social, especialmente, no que diz respeito ao questionamento da visão
behaviorista e utilitarista de transação.
Em terceiro lugar, de acordo com Andreasen (2003), essa nova definição de marketing
social efetivamente contribui para sua diferenciação diante de outras áreas e/ou atividades
planejadas de intervenção social que antes (na sua fase de “infância”) eram facilmente
confundidas com ele, a saber: a educação (que segundo esse autor atua no universo das
“idéias” e espera que o comportamento social propriamente dito seja influenciado em função
da aceitação delas) e o direito (que segundo esse autor influencia o comportamento social por
meio de leis e proibições que funcionam independentemente do consentimento dos indivíduos
a elas submetidos).
Por outro lado, a concepção “adolescente” do marketing social ainda deixa intactas
algumas das suas características “infantis”. Em primeiro lugar, ainda não estão claras quais
ferramentas do “mix de marketing” podem ser utilizadas no âmbito do marketing social e
quais não podem. Nesse sentido, os problemas que dizem respeito à adequação (real ou
metafórica) dos quatro “Ps” ao contexto social permanecem sem resposta. Para simplificar,
melhor seria dizer que eles poderão ou não ser aplicados, a depender da natureza da campanha
apreciada caso a caso. De qualquer modo, “a raiz das controvérsias que periodicamente
emergem dentro do campo do marketing social parece ser a falta da sua própria e única teoria
e vocabulário” (Peattie e Peattie, 2003, p.382).
Em segundo lugar, e ainda mais importante, a “nova” concepção de marketing social
persiste como uma “abordagem guiada por especialistas” (Peattie e Peattie, 2003). Nesse
sentido, ela ainda está baseada na separação entre “especialistas” e “público-alvo”,
idealizadores e “beneficiários” dos programas sociais, o que se torna bastante evidente na
passagem “[...] influenciar o comportamento voluntário da audiência-alvo [...]”.
[...] agir deliberadamente no sentido de mudar o comportamento dos
indivíduos em uma sociedade democrática instantaneamente levanta questões
sobre quem decide que comportamentos precisam ser mudados, com base em
que devem ser mudados, que meios serão usados para concretizar as
mudanças e quem prestará contas sobre todos esses atos (Peattie e Peattie,
2003, p.379).
Diferentemente do que acontecia na fase “infantil” do marketing social, ocasião onde
as necessidades do “público-alvo” eram vistas como demandas já conhecidas e consensuais na
sociedade, prontas para serem “canalizadas”, nesta sua nova fase de desenvolvimento as
necessidades por mudanças no comportamento social são bem mais complexas e muitas vezes
não são plenamente conhecidas e muito menos compartilhadas pelos membros da sociedade
ou segmento social em questão. Adicionalmente, a satisfação dessas necessidades dificilmente
é uma questão de “vantagem” óbvia para todos os envolvidos como acontecia na fase infantil.
Aqui é amplamente reconhecido que a campanha de marketing social tem que “competir”
diretamente com interesses dos próprios beneficiários que são muitas vezes totalmente
opostos aos seus objetivos. Ao invés de “concorrer” com outras campanhas que oferecem
benefícios similares, a competição na campanha de marketing social acontece, na maioria das
vezes, contra o comportamento atual ou preferido do próprio público-alvo (Kotler e outros,
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2002 apud Peattie e Peattie, 2003). Trata-se aqui da diferença entre “satisfação” e “bem-estar”
enquanto fins do marketing social. Segundo Chauvel (1999), amparando-se em Kotler (1972),
o termo “satisfação” (utilizado no vocabulário corrente do Marketing Comercial para se
referir a “satisfação do cliente”) possui um significado imediatista e tende a ser confundido
com o termo “desejo”. Nesse sentido, Mendes (2009, p.3) acertadamente ressalva que “longe
do marketing social favorecer a satisfação de um indivíduo ou uma população, se preocupa
com seu bem-estar, que pode ser avesso àquilo que os indivíduos concebem como satisfação”.
Como explicam Hastings e outros (2000), um risco enfrentado pelo marketing social
reside na sua super ênfase sobre o comportamento dos indivíduos e sua necessidade
de mudança, sem entender e considerar propriamente o contexto social que modela
esse comportamento (PEATTIE E PEATTIE, 2003, p.377).
Todas essas novas questões envolvendo o indicador comparativo “necessidade”,
questões essas que ao longe transcendem a visão behaviorista-utilitarista de comportamento
humano presente no marketing social “infantil”, trazem importantes implicações para os
outros indicadores. Algumas delas dizem respeito às transações. Segundo Peattie e Peattie
(2003), a própria palavra “transação”, tão cara à disciplina de Marketing de forma geral
(Kotler e Zaltman, 1971), carrega consigo um significado restrito às trocas racionaisutilitárias, significado esse que precisa ser urgentemente revisto no âmbito do marketing
social. Assim, tal como sugerem os autores, ao invés de “transação”, “o que é fundamental
para o marketing social é a conceituação mais abrangente de „interação‟” (PEATTIE E
PEATTIE, 2003, p.370).
[...] pode até existir um elemento de transação direto dentro da campanha –
por exemplo, quando recompensas são oferecidas em troca de visitas a
clínicas. De qualquer forma, na maioria das campanhas a oferta de coisas
como informação ou itens promocionais pelo agente do marketing social é
feita com a intenção de mudar comportamentos e não „na troca‟ por mudança
de comportamentos (PEATTIE E PEATTIE, 2003, p.369).
Essa importante observação demonstra que na sua fase “adolescente” o marketing
social está mais interessado em transações de significados e entendimentos, essencialmente
não behavioristas e bem diferentes daquelas transações utilitaristas do tipo “faça isso e
receberá aquilo” (Kohn, 1996). Trata-se, pois, de transações envolvendo “produtos”
essencialmente intangíveis que têm como objetivo estimular a motivação intrínseca dos
indivíduos rumo a uma nova e duradoura atitude, e não simplesmente cooptar suas ações no
curto prazo (Kohn, 1996). Observamos, então, que uma atitude ativa dos “beneficiários” da
campanha de marketing social, atitude essa capaz de transcender a mera busca calculista por
“vantagens”, é essencial para o sucesso dessa campanha.
Adicionalmente, uma vez que nem todos aqueles que compõem o publico alvo
compartilham ou conhecem as ditas necessidades de mudança de comportamento, transações
ou trocas preliminares de sentido precisam ser realizadas no interior do grupo social antes que
as transações “verticais” possam ser realizadas entre os membros do grupo social e o agente
de marketing. Em outras palavras, as transações “horizontais” são tão ou mais importantes do
que as próprias transações “verticais”, se o efeito desejado é uma mudança efetiva do
comportamento social. Dito de outra maneira, há um necessário envolvimento do público-alvo
consigo mesmo no processo de mudança de comportamento.
Todas essas mudanças ocorridas no indicador “transações” implicam, por sua vez,
mudanças igualmente importantes em termos do indicador “produto”. O produto passa a ser
entendido aqui como o resultado final das diversas transações de significados e entendimentos
(tanto horizontais quanto verticais) realizadas durante todo o processo de mudança de
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comportamento. Tais transações implicam, por si mesmas, mudanças comportamentais e
atitudinais dentro do grupo social em questão. Dito de forma mais clara, o produto passa a ser,
em última análise, a própria mudança no comportamento social.
Em termos de comunicação, esta não é mais essencialmente unilateral e meramente
instrutiva. Não se trata apenas de informar e esperar que o público-alvo informado passe a
agir de modo distinto.
Deste modo, percebemos que, assim como deve existir diálogo entre os indivíduos que
compõem o público-alvo, o diálogo também deve ser estabelecido entre o agente do
marketing social e o beneficiário da campanha em questão para que esta progrida
adequadamente. Tal diálogo pressupõe que os agentes do marketing social não são os “donos
da verdade” em termos de conhecimento sobre o comportamento do público-alvo, bem como
suas necessidades de mudança. Sem diálogo, o entendimento e o reconhecimento mútuos das
reais necessidades de mudança de comportamento não acontecem. Não há comprometimento
e, consequentemente, o produto final, “mudança de comportamento”, não ocorre. Isso
significa dizer que muito daquilo que o agente do marketing social irá propor em termos de
mudança do comportamento dos beneficiários da campanha não depende da sua condição de
“especialista”, mas sim, depende de todo esse processo coletivo de entendimento. Tal como o
produto, a comunicação no marketing social “adolescente” é vista como algo socialmente
construído.
Uma vez que os comportamentos sociais que serão influenciados são vistos como
ações minimamente voluntárias e não como ações meramente mecânicas, ou seja, uma vez
que necessitam de um mínimo de consentimento por parte dos indivíduos que compõem o
“público-alvo” para que possam, efetivamente, acontecer, o indicador “orientação para o
„cliente‟” deve revelar também um esforço maior por parte dos proponentes das ações de
marketing no sentido de conhecer melhor o público-alvo.
No que diz respeito a todo o processo de Administração de Marketing, acreditamos
que ele precisa ser urgentemente revisto com base nessas novas considerações. Embora as
ações de marketing social ainda possam ser desenhadas e planejadas por agentes
“especialistas” que estão “acima” do público-alvo, sua efetividade, certamente, depende do
consentimento coletivo. O público-alvo não é, neste caso, mais visto como agente passivo e
interesseiro, a espera de uma “solução” acabada e vantajosa para seus problemas sociais. Uma
vez que aqui as transações não são meramente behavioristas-utilitaristas e uma vez que os
produtos não são coisas acabadas (fornecidas pelo agente de marketing ou por sua
organização) que vão diretamente ao encontro das necessidades do público-alvo, é necessário
que as pessoas encontrem algum sentido em agir da maneira que lhes foi “comunicada” ou,
melhor dizendo, da maneira que foi acordada coletivamente. Nesse sentido, percebemos que a
abordagem “adolescente” do marketing social dá mais “voz” aos beneficiários dos programas
de marketing do que a abordagem “infantil”.
Certamente, os desafios enfrentados pelo marketing social “adolescente”,
especialmente aqueles desafios que giram em torno da definição do que é bem-estar social e
de qual é a importância e o papel do “especialista” de marketing no processo de mudança
comportamental, parecem indicar que o futuro do marketing social está no reconhecimento de
que a Administração de Marketing trata, na realidade, de um processo de gestão mais
participativo do que autocrático, pautado no livre entendimento. Entretanto, a gestão baseada
no livre entendimento ainda não se consolidou no marketing social “adolescente”. Na sua
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Social e Gestão Pública: Interfaces e Delimitações #
“adolescência” tudo que o marketing social fez, nesse sentido, foi indicar sutilmente uma
preferência por esse caminho.
Isto nos leva a algumas questões: como uma eventual radicalização da orientação para
o cliente, ou seja, como a colocação incondicional do cliente em primeiro lugar no marketing
social, impactaria o papel do especialista ou agente de marketing? Será que essa radicalização
implicaria finalmente reconhecer que o verdadeiro especialista seria o próprio cliente e não o
agente de marketing? Paralelamente, também poderíamos perguntar: será que o agente de
marketing, ao invés de atuar como especialista, destacado verticalmente do público-alvo, não
poderia atuar horizontalmente como um facilitador ou catalisador do processo de melhoria
social que o marketing social tem a pretensão de promover? Ainda caberia finalmente
perguntar: será que as necessidades que envolvem as transações de marketing não poderiam
ser definidas pelos próprios beneficiários do marketing social, eventualmente, com a ajuda do
facilitador? Acreditamos que tais questões podem nos dar boas pistas sobre quais caminhos o
marketing social pode seguir para alcançar sua maturidade.
Em relação ao grau de dependência do marketing social em relação ao Marketing
Comercial, podemos dizer que aqui ele ainda é mediano, porém, com fortes indícios de
distanciamento. Todavia, o maior distanciamento não ocorre propriamente com a maior
atenção e “voz” dadas aos beneficiários no marketing social “adolescente” em relação ao
marketing social “infantil”, pois o Marketing Comercial ortodoxo, também coloca seu
público-alvo sempre em primeiro lugar, embora não de um modo incondicional, estudando-o,
ouvindo-o e compreendendo-o (Peattie e Peattie, 2003). Ao compararmos o marketing social
com o Marketing Comercial não podemos nos esquecer que o segundo também evoluiu e se
sofisticou. Então, diferenças significativas também não vão ser encontradas propriamente no
modo mais interativo de se desenhar, planejar, implementar e controlar as ações de marketing,
uma vez que tal interação existe e tende a crescer em ambos os casos. Todavia, o marketing
social adolescente foi capaz de delimitar claramente seu campo de atuação e seu objetivo: a
busca pelo bem-estar social. Nesse sentido, ele se afastou bastante do Marketing Comercial
que possui outras finalidades. Além disso, colocou claramente em questão muitas das
ferramentas e técnicas herdadas do Marketing Comercial (destacadamente aquelas ligadas às
noções de “produto” e “preço”) que, para que não fossem totalmente abandonadas, passaram a
ser empregadas somente metaforicamente. Todavia, mudanças mais radicais ocorreram no
nível das transações, não só no reconhecimento da importância das transações horizontais
para o sucesso das iniciativas de marketing social como também no modo de ver a motivação
humana das transações. Enquanto que no marketing social infantil os membros da sociedade
eram vistos como seres puramente racionais-utilitários, no marketing social adolescente essa
visão foi relativizada em proveito de uma visão mais abrangente do comportamento humano.
Acreditamos que essas diferenças irão se acentuar ainda mais com a chegada do marketing
social à sua plena maturidade.
Alan Andreasen (2003) toma como base o evidente crescimento quantitativo e
qualitativo das atividades no campo do marketing social – tanto na academia quanto no
mundo gerencial de forma geral – para sustentar que este campo está, ao que tudo indica,
abandonando sua “adolescência” e adentrando sua vida “adulta”. Nessa fase as decisões mais
importantes sobre a conquista da maturidade do marketing social devem ser tomadas.
Segundo Peattie e Peattie (2003, p.382) “[...] o desenvolvimento da teoria e da prática do
marketing social nos últimos 20 anos se baseou no ofuscamento das diferenças entre os dois
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campos [marketing social e Marketing Comercial], ao invés da vontade de confrontá-los e
entender suas implicações”.
Para esses autores, que explicitamente defendem a emancipação definitiva do
marketing social em relação ao Marketing Comercial, “[...] o marketing social precisa
desenvolver seu próprio vocabulário, idéias e ferramentas distintos” (Peattie e Peattie, 2003,
p.365).
Nesse sentido, uma das características que mais aproximaram o marketing social, tanto
em sua fase infantil quanto em sua fase adolescente, do Marketing Comercial, foi a
perduração do mesmo “mix de marketing” em ambos os casos como discutiram Kotler e
Zaltman (1971). Entretanto, tal como discutimos anteriormente a partir das idéias de
Andreasen (2003; 1995) e Peattie e Peattie (2003), há sérias restrições ligadas a “importação”
cega dos quatro “Ps” do Marketing Comercial, sendo as mais evidentes aquelas que giram em
torno das idéias convencionais de “produto” e “preço”. Frente a essas contradições, típicas de
um campo jovem, ainda em desenvolvimento, “entender a atuação do marketing na área
social, com suas técnicas advindas do mercado, ainda é um desafio [...]” (Araújo, 2001, p.6).
Entretanto, será que o marketing social está eternamente fadado a conviver com os quatro
“Ps”, ou será que seu futuro pode ser promissor sem eles? Afinal, como ficariam os quatro
“Ps” no marketing social do futuro, amadurecido e emancipado em relação ao Marketing
Comercial?
De acordo com Peattie e Peattie (2003, p.382), “é difícil escapar à conclusão de que
um dos mais importantes passos que o marketing social, como campo, poderia dar adiante
seria finalmente abandonar os quatro „Ps‟ que, ao que parece, criam mais problemas do que
resolvem”. Em suma, para Peattie e Peattie (2003) a tentativa de se empregar metaforicamente
as noções do Marketing Comercial no marketing social deve ser entendida como algo
artificial e “forçado”, algo que revela a grande dependência e submissão do segundo campo
frente ao primeiro.
Certamente, não são apenas as noções do “mix de marketing” que perdem sentido
diante do marketing social amadurecido e emancipado do futuro. Tal como discutimos na
seção anterior com base em Peattie e Peattie (2003), a noção central de “transação”,
inicialmente entendida como troca racional-utilitária de “produtos”, é alargada para
compreender a troca de significados e entendimentos ou, mais simplesmente, a própria idéia
de interação social. Ao que tudo indica, o sucesso das ações do marketing social vêm
historicamente dependendo cada vez mais da comunicação plurilateral, da livre interação
social e do entendimento mútuo em torno dos problemas e necessidades de mudança do
comportamento social. Sendo assim, as relações de troca de significado e entendimento que
ocorrem no contexto do marketing social, fundamentais para a compreensão dos problemas
comportamentais ligados ao bem-estar e, por conseguinte, para a mudança do comportamento
social, vão muito além das trocas realizadas no contexto do mercado onde atua o Marketing
Comercial. Torna-se cada vez mais difícil imaginar que os proponentes das ações de mudança
comportamental são “vendedores” e que os beneficiários de tais ações são “compradores”,
“clientes” ou mesmo “consumidores”.
Na fase “adulta” do marketing social também não fará mais sentido se falar em
“público-alvo”. Com efeito, o termo “alvo” remete à idéia de passividade de alguém diante da
ação deliberada de outrem. E, definitivamente, a verticalização ou hierarquização das relações
sociais não é uma tendência no marketing social “maduro”.
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Em sua análise crítica sobre a dependência do marketing social em relação ao
Marketing Comercial, Peattie e Peattie (2003) chegam inclusive ao ponto de questionar se a
própria palavra “marketing”, que já vem sendo utilizada metaforicamente, é realmente
adequada para elucidar a natureza e o propósito do marketing social. Tal como
contundentemente argumentam os autores, mesmo que esta palavra seja utilizada também
metaforicamente, seu sentido ainda nos remete às relações comerciais. Paradoxalmente, “no
marketing social, a inexistência de compradores, vendedores, transações [comerciais] e
produtos podem fazer desta uma forma de marketing „livre de marketing‟” (Peattie e Peattie,
2003, p.378).
Diante de tudo isso, faz-se necessário resgatar a verdadeira vocação do marketing
social a fim de evitar que a disciplina se perca totalmente ao invés de amadurecer.
Ao que tudo indica, a vocação do marketing social está ligada a busca pela mudança
sustentável do comportamento social com vista ao bem-estar e ao interesse público. De
acordo com Andreasen (2003), esta vocação só se tornou realmente clara na fase
“adolescente” do marketing social, apenas nos últimos anos do século XX. Todavia, ela
parece já estar suficientemente consolidada a ponto de diferenciar e justificar a importância do
marketing social no contexto atual do século XXI.
A título de ilustração, o marketing social “adulto” poderia ser entendido, genérica e
provisoriamente, como o processo dialógico de proposição, adoção e manutenção de
comportamentos sociais que objetivam o interesse público e a melhoria no bem-estar social.
Esta definição, embora meramente ilustrativa, traz algumas inovações.
Primeiramente, ela reforça a finalidade última do marketing social que é o interesse
público e a busca pelo bem-estar social. Mas vai ainda além. Aqui não é apenas dito que o
bem-estar é o fim último de todas as atividades de marketing social, como já se afirmava na
sua fase “adolescente” (Andreasen, 2003). Cabe aos próprios beneficiários das ações de
marketing, e não necessariamente aos “especialistas”, entender coletivamente seus problemas
e suas necessidades de mudança do comportamento social. O gestor das ações de marketing
social, por sua vez, torna-se um facilitador ou catalisador nesse processo dialógico, tal como
evidencia Freire (1987; 1996; 2001) em seu conceito de educação dialógica. O conhecimento
sobre quais comportamentos precisam ser mudados e como devem ser mudados acontece por
meio da interação do facilitador junto com todos os outros envolvidos no processo. Em suma,
o papel do especialista é “horizontalizado”, mas não eliminado. Seu conhecimento e
experiência singulares irão certamente ajudar o grupo, eis sua nova importância.
Em segundo lugar, trata-se de um processo contínuo de melhorias sociais, ou seja, um
processo contínuo de melhoria do bem-estar social. O bem-estar social e o interesse público,
embora figure como fim último das atividades do marketing social, não é visto como um mero
objetivo operacional que pode ser terminantemente atingido. Nesse sentido, a mudança do
comportamento que visa o bem-estar social deve ser sustentável no tempo, porém dificilmente
será definitiva. A deliberação sobre a perenidade de um novo comportamento, ou sobre sua
nova necessidade de mudança cabe à coletividade ou aos próprios beneficiários das ações
(denominado anteriormente como “público-alvo”).
A tecnologia tradicional de Marketing (especialmente os quatro “Ps”) já não figura
mais como ferramental obrigatório, sendo seu uso (parcial ou total) regulado pela
especificidade e ocasião. Mais uma vez, por se tratar de um processo participativo e dialógico,
as decisões quanto ao uso ou não de tal ferramental cabe aos beneficiários das ações de
marketing social.
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Em termos de necessidades, o marketing social adulto está preparado para lidar com
aquelas mais complexas, ambíguas e desconexas, características do século XXI. Tal como já
dissemos, essas necessidades são “descobertas” coletivamente pelos próprios beneficiários
das ações do marketing social adulto, com a (eventual) ajuda de um facilitador/catalisador,
anteriormente conhecido como “especialista”. De nada servirá sua opinião isolada, ele terá de
participar da construção coletiva do entendimento acerca de tais necessidades.
Nesse sentido, comunicação e transação chegam a se confundir enquanto atividades
dialógicas horizontalizadas de troca de significados e entendimentos. Certamente, a
comunicação horizontal e dialógica está sempre presente em todos os momentos no marketing
social “adulto”, quer seja na “descoberta” coletiva dos problemas e necessidades de mudança
do comportamento social, quer seja na elaboração de planos ou programas de ação que visam
equacioná-los rumo ao bem-estar. No marketing social “adulto” a transação e a comunicação
horizontais imperam uma vez que nem os planos ou programas de ação nem mesmo as
necessidades que os motivam podem ser tomados como “óbvios” e passíveis de mera
“canalização”. (Kotler e Zaltman, 1971)
Assim como as necessidades de mudança do comportamento social são “construídas”
coletivamente através dos processos dialógicos, o mesmo vale para todas as demais atividades
de planejamento, implementação e controle da Administração de Marketing. As tendências
evolutivas reveladas por esse indicador comparativo (“Administração de Marketing”)
apontam para uma forte diferenciação do marketing social “adulto” em relação ao Marketing
Comercial, bem como em relação ao marketing social Corporativo e a Responsabilidade
Social, além daquela diferenciação no nível teleológico (ligada aos seus fins últimos) que
apresentamos na introdução. Trata-se, agora, de uma diferença substancial nos “meios”
através dos quais se dá a Administração de Marketing. Enquanto no Marketing Comercial e
nas demais formas de intervenção social corporativa que não têm o bem-estar social como
finalidade última as decisões que envolvem a Administração de Marketing são tomadas
mantendo-se um nível mínimo de autocracia, a tendência no marketing social “adulto” é a de
que tais decisões sejam tomadas coletivamente, por meio de um processo efetivamente
fundado no entendimento mútuo. Esta nova concepção aproxima-se da Gestão Social, como
discutiremos a frente.
Em termos de produto, esse definitivamente assume a feição do resultado prático dos
processos anteriores, ou seja, “materializa-se” na própria mudança do comportamento social,
guiado pela busca por bem-estar social, oriunda da construção dialógica dos entendimentos
que se fazem necessários durante todo o processo. Assim sendo, o produto nunca poderá ser
“produzido” antes de percorridos os processos dialógicos, pois nunca poder-se-á conhecer de
início as reais necessidades de mudança do comportamento social e muito menos a forma de
atendê-las.
Especificamente, no que diz respeito ao indicador “orientação para o “cliente‟”,
podemos dizer que não se aplica à nova realidade do marketing social “adulto”. Dado que
todos os envolvidos precisam se compreender mutuamente, o mais profundamente possível, e
dado que as interações sociais são as mais horizontalizadas possíveis, não há razão para supor
que alguém em especial precise conhecer o outro. Na verdade, tal como sugeriram Peattie e
Peattie (2003), entendemos que a orientação para o “cliente” perde o sentido de ser quando
não se concebe mais o “cliente” no marketing social.
Finalmente, no que diz respeito ao grau de dependência do marketing social em
relação ao Marketing Comercial podemos dizer que aqui ele é mínimo. Isso não somente
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devido ao fato de que não estamos falando de relações de troca propriamente comerciais
(Peattie e Peattie, 2003), mas, também, porque estamos falando de relações baseadas no
entendimento mútuo que vão muito além daquelas racionais-utilitárias presentes no “faça isso
e receberá aquilo” descrito e criticado por Alfie Kohn (1996). Nesse sentido, a motivação
humana que tende a imperar nessa nova fase do marketing social é a motivação intrínseca e
não a extrínseca.
No Quadro 1 temos uma síntese desta discussão em relação aos indicadores
comparativos.
Indicador
Comparativo
1) Necessidade
2) Produto
“Infância”
Concreta, conhecida e consensual
Idéias pré-concebidas sobre novos
comportamentos sociais
“vantajosos” associadas a produtos
acabados e minimamente tangíveis
(como preservativos panfletos e
remédios)
Unilateral, funcional e
predominantemente vertical
“Adolescência”
Abstrata, não plenamente
conhecida e muito menos
consensual
Novos comportamentos sociais
“desejáveis” que favorecem o
bem estar social
Socialmente “construída”
Dialógica e interativa,
predominantemente horizontal
4) Transação
Simples e precisa (racional
utilitária), de orientação
predominantemente vertical,
envolvendo idéias e coisas
relativamente acabadas
Parcialmente horizontal e
interativa, porém,
predominantemente funcional e
vertical
Complexa de orientação
horizontal e depois vertical
envolvendo significados e
entendimentos acerca de novos
comportamentos “desejáveis”
5) Orientação para
o Cliente
6) Administração
de Marketing
Baixa
Média
Autocrática
7) Grau de
Dependência com
Marketing
Comercial
Alto
Participativa, já que sua
efetividade depende de algum
consentimento do público-alvo,
porém ainda hierarquizada
Mediano
3) Comunicação
“Vida Adulta”
Novos comportamentos sociais
livremente negociados que
favorecem o bem-estar social
Complexa e de orientação
predominantemente horizontal,
envolvendo significados e
entendimentos acerca de novos
comportamentos que podem
favorecer o bem-estar social
Não se aplica
Gestão Social
Mínimo
Quadro 1 – Síntese da evolução do Conceito de marketing social
Fonte: Elaboração Própria
3 Marketing social “Adulto” e Gestão Social: o entendimento como base para a ação
No Brasil, o termo gestão social encontra-se ainda em fase de construção (FISCHER,
2002), sendo relativamente recente sua ampla utilização no país. Mesmo assim, a Gestão
Social tem se consolidado enquanto prática, sem ainda o consenso sobre o conceito (PINHO,
2010). A partir do início deste século, a temática vem tomando um formato mais definido,
mas ainda não acabado. Tânia Fischer (2002) apresenta o campo de gestão social (que ela
também denomina de gestão do desenvolvimento social) como “reflexivo das práticas e do
conhecimento constituído por múltiplas disciplinas” (p.29). A gestão social, segundo a autora,
seria ainda uma “proposta pré-paradigmática” que vem recebendo a atenção de muitos centros
de pesquisa no Brasil e no exterior, além de outras organizações que atuam no
desenvolvimento local.
Neste texto utilizaremos a abordagem de Tenório (2008a; 2008b; 2010) para gestão
social, por considerarmos a opção teórica mais avançada no campo. Existem outras
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Social e Gestão Pública: Interfaces e Delimitações #
abordagens complementares como França Filho (2008) e Fischer (2002) e algumas críticas,
como Pinho (2010) a esta abordagem, que é baseada em Habermas. Uma das críticas está
relacionada à própria nomenclatura do campo, que poderia ser denotado por “gestão
emancipadora” (PINHO, 2010).
A abordagem de Tenório (2008a, 2008b), parte de uma inquietação relacionada ao
status quo da administração, despertada segundo o autor pela leitura da obra de Guerreiro
Ramos1. Segundo Tenório, a Gestão Social poderia ser considerada como uma “linha de fuga”
em relação à hegemonia da tradição positivista centrada na racionalidade utilitária do
pensamento administrativo. O autor, baseado em Guerreiro Ramos e na Escola de Frankfurt
(Horkheimer, Marcuse, Adorno) e posteriormente na sua “segunda geração” com Jürgen
Habermas constrói seu conceito de Gestão Social.
Neste contexto a esfera pública (conceito habermasiano) seria o espaço de
intermediação entre Estado, sociedade e mercado, bem como a cidadania deliberativa seria o
processo participativo de deliberação baseado essencialmente no entendimento (e não no
convencimento ou negociação) entre as partes (Tenório, 2008a; 2008b) e “o procedimento da
prática da cidadania deliberativa na esfera pública é a participação”. (Tenório, 2008b, p.171)
(grifos do autor)
Diferente de um processo centralizador, tecnoburocrático, elaborado em gabinetes,
em que o conhecimento técnico é o principal argumento da decisão, sob uma
perspectiva descentralizadora, de concepção dialógica, a esfera pública deve
identificar, compreender, problematizar e propor as soluções dos problemas da
sociedade, a ponto de serem assumidas como políticas públicas pelo contexto
parlamentar e executadas pelo aparato administrativo de governo. (Tenório, 2008b,
p.162)
Outro conceito essencial para a construção do conceito de gestão social do Professor
Tenório é o agir comunicativo de Habermas. Para o autor a gestão social se baseia no
entendimento, estreitamente vinculado com a linguagem. Pois, ”No processo de Gestão Social
[...] a verdade é a promessa de consenso racional, [...] não é uma relação entre o indivíduo e a
sua percepção de mundo, mas sim um acordo alcançado por meio da discussão crítica, da
apreciação intersubjetiva”. (Tenório, 2008b, p.27)
Assim, para Tenório (2008b) a Gestão Social é entendida
Como processo gerencial dialógico em que a autoridade decisória e compartilhada
entre os participantes da ação (ação que possa ocorrer em qualquer tipo de sistema
social – público, privado ou de organizações não-governamentais). O adjetivo social
qualificando o substantivo gestão será entendido como o espaço privilegiado de
relações sociais no qual todos têm o direito à fala, sem nenhum tipo de coação.
(p.158) (grifos do autor)
Sintetizando as características da gestão social, baseadas em Tenório (2008a; 2008b;
2010), seriam: o entendimento como princípio, a dialogicidade enquanto processo e a
possibilidade de ocorrência em qualquer tipo de sistema social. Cabe ressaltar que estas
características podem ser consideradas como um tipo ideal weberiano, pois as relações de
poder, desigualdades sociais e culturais podem facilmente nos levar a crer que estas
características são impossíveis de se verificar na prática em estado ideal.
Resgatando nosso conceito provisório de Marketing social “adulto” temos: o processo
dialógico de proposição, adoção e manutenção de comportamentos sociais que objetivam o
interesse público e a melhoria no bem-estar social. A primeira congruência em relação à
gestão social é a dialogicidade em relação ao processo. Como o marketing social “adulto” já
1
Autor também citado por Fischer (2002) e França Filho (2008).
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ultrapassou as fronteiras das organizações públicas desde sua fase “adolescente” temos outra
aproximação, pois a gestão social, segundo Tenório (2008b) seria aplicada tanto aos setores
públicos e privados, como à sociedade civil organizada. Além disso, o marketing social
“adulto” também atua na perspectiva do entendimento, que seria “socialmente construído”,
pois não estaria mais baseado na negociação racional-utilitária (isto a troco disto) e sim no
diálogo horizontal para construção das demandas e de seu atendimento.
Por outro lado, não fica explícito o objetivo fim da gestão social. Poderia ser a própria
emancipação dos participantes, como aponta Tenório (2008b). Neste sentido, segundo Freire
(2001), este tipo de participação poderia levar a um aumento no nível de consciência e
consequentemente à própria emancipação (ou quebra da cultura do silêncio). Mas pode-se
considerar a emancipação como resultada da gestão social e não como seu fim, a gestão social
seria um processo (ou conjunto de premissas, princípios e técnicas) e pelo qual se opta por
gerir sem necessariamente um fim geral. Este pode variar de acordo com a ocasião. Pode-se
argumentar ainda que, pelas características da gestão social apresentadas, o interesse público e
o bem comum estariam implícitos neste processo, pois a construção foi efetivamente coletiva.
Em todo caso, pode-se perceber uma aproximação entre marketing social e gestão social de
forma que o indicador comparativo “Administração de Marketing” possa ser operacionalizado
por meio da gestão social.
4 Algumas Considerações
Não iremos fechar o texto com as tradicionais considerações finais ou com a
prescritiva conclusão, haja vista o ponto de construção onde ainda estamos. Serão feitas, no
entanto, algumas considerações...
Nosso principal resultado é a possibilidade da operacionalização do marketing social
“adulto” por meio da gestão social, que abre novos horizontes para o marketing social em um
momento crucial de seu desenvolvimento, onde procura novos caminhos. Por outro lado, a
gestão social tem no marketing social “adulto” novas possibilidades teóricas e empíricas de
avançar enquanto conceito e prática.
Para além deste texto existe ainda o perigo da banalização dos conceitos de marketing
social e gestão social, como já aconteceu com outros conceitos antes. Para minimizar este
problema os pesquisadores devem realizar um esforço teórico e empírico de sedimentar e
difundir estes conceitos para que a comunidade científica possa assimilá-los.
Outra discussão importante é o caminho que o marketing social seguirá de agora em
diante, pois existe sempre o risco Marketing Comercial cooptá-lo novamente diminuindo suas
possibilidades dialógicas e voltando à suas fases iniciais.
Tanto a gestão social como o marketing social são baseados no entendimento e no
processo coletivo de construção, porém, este processo como se sabe, é lento e necessita de
vontade política para ser concretizado, de um lado por meio da educação da população e de
outro por meio do papel dos gestores públicos, que devem entender os novos “tempos” do
processo. No caso brasileiro sempre há os perigos do populismo que não combina com
processos deste tipo.
Cabe à academia estar sempre atenta a estas colocações e perceber que, por mais
difícil e lento que possa parecer um processo de tomada de decisão coletivo, ele, em si, é
emancipador, como desejariam Paulo Freire e Guerreiro Ramos. O processo dialógico traz em
si um crescimento, o que nos aproximaria da Cidadania Deliberativa, proposta por Tenório
(2008b) como o caminho da construção da gestão social.
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A cidadania passa pela educação e pela participação em espaços como o da gestão
social e do marketing social, e quando falamos de educação não estamos nos referindo só à
educação formal, pois “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se
educam entre si, mediatizados pelo mundo”. (Freire, 1987, p.68)
Como sugestão para novos estudos fica a proposição de estudos empíricos que
mostrem a viabilidade destes dois conceitos, o que pode levar a ajustes e avanços na teoria.
Sugere-se ainda um aprofundamento maior nesta discussão, buscando conceitos auxiliares à
discussão como o de autogestão, por exemplo.
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Social e Gestão Pública: Interfaces e Delimitações #
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