Organizações Como Cérebros

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Processos de Gestão 2002/2003
Licenciatura em Engenharia Informática
Resumo do 4º Capítulo de
Imagens da Organização – Gareth Morgan
Aprendizagem e Auto-Organização
As Organizações como cérebros
Raul André Brajczewski Barbosa
Introdução
Existem três características essenciais do funcionamento cérebro que seria
interessante aplicar às organizações. Estas são a flexibilidade, a criatividade e
a robustez.
Muito do nosso pensamento actual concebe a organização como um
relacionamento entre partes especializadas ligadas por linhas de comunicação,
comando e controlo. Mesmo quando são feitas tentativas de deixar de parte o
modelo mecanicista percebe-se que isto é apenas possível através de novas
formas de ligação entre as partes organizacionais.
Usando o cérebro como uma metáfora para a organização pode tornar-se
viável o desenvolvimento da habilidade para realizar o processo de
organização de forma a promover a acção flexível e criativa. As organizações
baseadas em princípios mecanicistas são adequadas para desempenhar
actividades fixas de forma óptima em circunstâncias estáveis. Quando essas
condições são perturbadas estas organizações encontram muitos problemas.
Sob circunstâncias que mudam, é importante que os elementos da organização
questionem o que estão a fazer e alterem o seu procedimento para levar em
conta novas situações. É precisamente por esta capacidade que o cérebro é
conhecido. Este ponto foi já tocado superficialmente quando da estruturação de
diversas organizações com unidades de planeamento e decisão centrais, que
são capazes de pensar pela totalidade da organização, controlar e integrar. É,
no entanto, muito menos comum pensar sobre as organizações como se elas
fossem cérebros e ver se é possível difundir as características do cérebro por
toda a organização, contrastando com a criação de unidades especiais.
Organizações como cérebros processadores de informações
Caso se pense sobre isso, cada aspecto do funcionamento organizacional
depende do processamento de informações, sejam de um tipo ou de outro.
Cada elemento da organização procede de acordo com informações e regras
predeterminadas. As organizações são sistemas de informações. São sistemas
de comunicação, sendo também sistemas de tomada de decisão. Nas
organizações mecanicistas esses sistemas são altamente rotinizados. Nas
organizações matriciais e orgânicas estes sistemas são mais temporários e
flúem livremente. Pode-se, então, tentar compreender as organizações através
das características do seu processamento de informações.
Processamento de informação, decisão e planeamento organizacional
Esta é conhecida como a abordagem da tomada de decisão e explora o
paralelismo entre tomada de decisão humana e organizacional, argumentando
que as organizações nunca podem ser perfeitamente racionais, uma vez que
os seus membros estão limitados no seu processamento de informações. As
pessoas têm de agir com base em informações incompletas, exploram apenas
um número limitado de alternativas de decisão e são incapazes de atribuir
valores correctos aos resultados. Isto leva a que seja apenas possível chegar a
formas limitadas de racionalidade. Estes limites sobre a racionalidade humana
são institucionalizados na estrutura e modelos de funcionamento das nossas
organizações. Como consequência, esta teoria descreve as organizações
como tipos de cérebros que fragmentam, rotinizam e tolhem os processos de
decisão de forma a tornarem-se administráveis. A hierarquia organizacional
desempenha uma função semelhante, fornecendo canais de resolução de
problemas para ajudar a tornar a vida mais administrável.
Desde o aparecimento desta forma de pensar as organizações, numerosos
pesquisadores devotaram considerável atenção para entender a organização
do ponto de vista do processamento de informação. Grande parte do trabalho
focou os métodos utilizados pelas organizações para lidar com a incerteza e
complexidade apresentadas pelo ambiente. Actividades incertas requerem que
maiores quantidades de informação sejam processadas entre quem toma
decisões. Quanto maior é a incerteza, mais difícil é programar e rotinizar uma
actividade através do planeamento prévio de uma resposta e as organizações
encontram formas de controlar os resultados (colocando metas e objectivos)
em vez de controlar comportamentos (através de regulamentos).
Isto tem levado à criação de sofisticados Sistemas de Informação dentro das
organizações, com o objectivo de facilitar o processo de decisão e gestão das
mesmas. Em certos casos torna-se difícil distinguir organização do sistema de
informação, como é o caso do comércio electrónico, em que a organização
permanece cada vez mais dentro do sistema de informação.
A evolução de organizações para sistemas de informação é então capaz de as
transformar estrutural e espacialmente mas a questão realmente importante
levantada pela metáfora do cérebro é, no entanto, se as organizações se
tornarão mais inteligentes.
Cibernética, aprendizagem e aprender a aprender
Como podemos planear sistemas capazes de aprender de forma semelhante
ao cérebro? Esta pergunta tem preocupado o grupo de cientistas que se
interessou pelos problemas de inteligência artificial no domínio da cibernética.
A habilidade de um sistema funcionar segundo um comportamento autoregulador depende de um processo de troca de informação que envolve o
feedback negativo. Sistemas de feedback negativo funcionam detectando erros
e corrigindo-os de forma automática. A cibernética apresenta quatro princípioschave. Primeiro, os sistemas devem ter a capacidade de monitorar aspectos
significativos do seu ambiente. Segundo, devem relacionar essa informação
com as normas operacionais que guiam o sistema. Terceiro, devem ser
capazes de detectar desvios significativos dessas normas. Quarto, devem
iniciar acções correctivas quando são detectados desvios. Desta forma, o
sistema pode operar de forma inteligente e auto-reguladora. Todavia, a
capacidade de aprendizagem assim definida está limitada pelo facto de o
sistema poder apenas manter o curso de acção determinado pelos padrões
que o orientam. Isto funciona de forma correcta quando a acção definida pelos
padrões se adequa às mudanças encontradas no ambiente. Quando não é este
o caso, o sistema de feedback negativo irá tentar manter um padrão
inapropriado de comportamento.
Surge, por este motivo, a distinção entre o processo de aprendizagem e o de
aprender a aprender. Esta distinção é identificada em termos de aprendizagem
em “ciclo simples” e “ciclo duplo”.
Podem as organizações aprender a aprender?
Muitas organizações tornaram-se excelentes na aprendizagem em ciclo único,
desenvolvendo a capacidade para monitorar o ambiente, colocar objectivos e
avaliar o desempenho geral do sistema em relação a esses objectivos. No
entanto, a capacidade de aprender em ciclo duplo revela-se mais difícil de
atingir.
Enquanto
que
algumas
organizações
tiveram
sucesso
institucionalizando sistema que revêem e desafiam normas operacionais em
relação a mudanças que ocorrem nos seus ambientes, encorajando o debate
contínuo e a inovação, muitas outras falham neste ponto. Existem três
obstruções que merecem especial atenção e que levam ao insucesso do
processo de aprendizagem:
1) É habitual a imposição de estruturas fragmentadas de pensamento aos
membros das organizações, não os encorajando a pensar por si próprios. A
racionalidade limitada cria barreiras à aprendizagem, sendo que os
empregados são encorajados a ocupar e manter um lugar predeterminado
dentro do todo, sendo recompensados por fazer isso. A aprendizagem em ciclo
único pode assim evitar a aprendizagem em ciclo duplo.
2) O princípio da responsabilidade burocrática dita que os empregados são
mantidos como responsáveis pelos seus desempenhos dentro de um sistema
que recompensa o sucesso e pune as falhas. Desta forma, os empregados
procedem protegendo-se a si mesmos e tendem a encontrar formas de ofuscar
assuntos e problemas que os poderão deixar mal vistos. Além disso, existe a
tentação de dizer aos gerentes aquilo que gostariam de ouvir. Se estes
sistemas de imputabilidade fomentam este tipo de defesa, uma organização
não será capaz de tolerar altos níveis de incerteza.
3) Existe frequentemente um desfasamento entre o que as pessoas dizem e
aquilo que fazem. Muitos gerentes e empregados tentam transmitir a impressão
de que sabem o que estão a fazer. Isto pode não ser apenas para impressionar
os outros mas também para os convencer de que tudo vai bem e que
conseguem lidar com o problema.
Existem algumas formas de superar estes problemas. Primeiro, é necessário
valorizar uma abertura que aceita erros e incertezas como um aspecto
inevitável da operação em ambientes mutáveis, permitindo aos membros da
organização lidar com incertezas de forma construtiva. Segundo, é também
necessário encorajar as abordagens que reconheçam a importância da
exploração de diferentes pontos de vista, ajudando a definir meios para
enquadrar e reenquadrar assuntos de forma a que possam ser encarados de
forma aberta. Terceiro, deve evitar-se que a organização falhe em estar a par
das solicitações do ambiente por estabelecer metas inflexíveis. Quando metas
e objectivos têm um carácter predeterminado tender a oferecer estrutura para
uma aprendizagem em ciclo único. O quarto princípio relaciona-se com a
necessidade de incentivar a criação de estruturas e processos organizacionais
que ajudem a implementar os princípios anteriormente apresentados.
Cérebros e organizações vistos como sistemas holográficos
Comparar o cérebro com um holograma é um passo no sentido do quarto
princípio anteriormente apresentado. É possível estender essa imagem para
criar uma visão da organização na qual as capacidades necessárias no todos
estão embutidas nas partes, permitindo ao sistema aprender e auto-organizarse. O segredo das capacidades do cérebro parece depender da condutividade
entre neurónios, que permite processamento simultâneo de informação nas
diferentes partes, o que é também a base da difusão holográfica. O cérebro é
composto por unidades repetitivas do mesmo tipo, o que faz com que aquilo
que se encontra como diferentes funções seja sustentado por estruturas muito
semelhantes. Um aspecto interessante desta condutividade está no facto de
criar um grau muito maior de ligações cruzadas e trocas que podem ser
activadas em qualquer momento.
Construindo padrões de condutividade entre partes semelhantes podem-se
criar sistemas que são tanto especializados como genéricos, bem como
possibilitar a reorganização da estrutura interna e as funções de forma a que
elas aprendam a enfrentar desafios colocados por novas solicitações.
Como facilitar a auto-organização: princípios do planeamento holográfico
Garantir o todo em cada parte, criar conexão e redundância, criar
simultaneamente especialização e generalização e criar a capacidade de autoorganização é o que tem de ser feito para criar uma organização do tipo
holográfico.
Qualquer sistema com uma capacidade de auto-organização deve ter um
elemento de redundância. Foram sugeridos dos métodos para introduzir a
redundância num sistema. O primeiro envolve a redundância das partes, no
qual cada uma das partes é concebida para desempenhar a partir de uma
função específica, sendo adicionadas partes especiais ao sistema com o
objectivo de controlar, apoiar ou substituir partes que falhem. O segundo
incorpora uma redundância de funções. Em vez de adicionar partes isoladas ao
sistema, funções extra são adicionadas às partes em funcionamento, de forma
a que cada unidade seja capaz de ter um conjunto de funções e não apenas
uma função especializada.
Quando se implementa este tipo de planeamento organizacional chega-se,
inevitavelmente, à pergunta a respeito de quanta redundância deverá ser
incluída em cada uma das partes. Enquanto o princípio holográfico sugere que
se deveria tentar integrar todas as partes ao todo, em muitos sistemas
humanos isto é um ideal impossível. A ideia da variedade de requisito torna-se
aqui importante. A diversidade interna de qualquer sistema auto-regulador deve
atender à variedade e complexidade do seu ambiente para melhor lidar com os
desafios por ele propostos. A variedade (redundância) deve ser sempre
integrada num sistema em que seja necessária. Isto tem implicações
importantes no planeamento de quase todos os aspectos da organização. Com
frequência os administradores fazem o contrário – reduzem a variedade para
chegarem a um maior consenso interno.
Para que estes princípios assumam uma direcção coerente devem ser
mantidos em mente outros dois: o princípio da mínima especificação crítica e o
de aprender a aprender.
O princípio da mínima especificação crítica sugere que administradores devam
adoptar um papel de facilitadores, criando condições favoráveis a que o
sistema encontre a sua própria forma. Quanto mais se tente especificar ou préplanear aquilo que deve ocorrer, mais se desgasta a flexibilidade necessária. O
perigo desta flexibilidade é que tem o potencial para se tornar caótica. É por
isto que o princípio de aprender a aprender deve ser também desenvolvido.
Para que o sistema holográfico adquira integração e coerência, bem como para
evoluir em resposta às solicitações de mudança, as capacidades de
aprendizagem devem ser activamente encorajadas. Uma das funções dos
responsáveis pelo planeamento das condições favoráveis já referidas é a que
diz respeito à ajuda para a criação de um contexto que promova esse tipo de
identidade compartilhada e orientação para o aprender.
Forças e limitações da metáfora do cérebro
As principais forças das ideias exploradas são as suas contribuições para a
compreensão da aprendizagem organizacional e às suas capacidades de autoorganização. Sugere-se, em particular, que organizações inovadoras devem
ser planeadas como sistemas aprendentes que dão ênfase especial a estar
abertas à investigação e auto-crítica. A organização verdadeiramente
inovadora necessitará de uma tradição e espírito holográficos em que as
atitudes inovadoras e capacidades desejadas do todo estejam contidas nas
partes.
Outra grande força baseia-se na sua contribuição para a compreensão de
como a administração estratégica pode ser planeada para facilitar o aprender a
aprender.
A terceira maior força da perspectiva desenvolvida é que esta oferece meios
através dos quais se pode ultrapassar a racionalidade limitada anteriormente
referida.
Finalmente, oferece meios de pensar sobre como desenvolvimentos da área
informática e tecnológica podem ser utilizados para facilitar novos estilos de
organização.
Contra estes pontos fortes é necessário identificar a fraqueza que é o perigo de
se não levar em conta importantes conflitos entre os requisitos da
aprendizagem e auto-organização, por um lado, e as realidades de poder e
controlo, por outro. Outra fraqueza importante é o facto de que aprendizagem e
auto-organização geralmente necessitam de importantes mudanças de atitudes
e valores. Para muitas organizações isto solicita uma “mudança de
personalidade” que só pode ser alcançada num período de tempo considerável.
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