a distância do pleno emprego

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A DISTÂNCIA DO PLENO EMPREGO
Gilmar Mendes Lourenço*
A taxa de desemprego no Brasil, medida pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME),
realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em seis regiões metropolitanas, registrou, em dezembro de 2010, o menor patamar da série histórica iniciada em 2002.
A desocupação de 5,3% da População Economicamente Ativa (PEA), aliada à escassez
quase generalizada do fator trabalho e ao substancial recuo do tempo despendido com a
procura de emprego, propiciou inclusive a feitura de diagnósticos de ocorrência do fenômeno
de pleno emprego no País, que é atingido, conforme a experiência internacional, quando as
taxas ficam abaixo de 5,0%. A subida para 6,1% da PEA em janeiro de 2011 não representa
ameaça à trajetória cadente, pois situou-se em patamar bem menor que no mesmo mês
de 2010 (7,2%).
Mais que isso, o declínio do desemprego de 12,4% da PEA em 2003, ano da acentuada
recessão promovida pela gestão Lula para a conquista da credibilidade junto aos mercados, para
8,1% em 2009 e 6,7% em 2010, acompanhado da intensificação da formalização e da verificação
de reajustes reais de salários superiores aos ganhos de produtividade, já representaria empecilho
ao controle da espiral de preços.
Ressalte-se que a trajetória de preços vem sendo fortemente influenciada pela ampliação
da demanda por itens de serviços, para os quais não existe a válvula de escape das importações,
e por elementos exógenos. Dentre estes destaca-se a alteração da estrutura de preços relativos,
determinada pela subida das cotações das commodities, acoplada à impulsão da demanda da
China e ao panorama de reduzidos retornos financeiros, ocasionado pelas políticas de juros reais
negativos, implementadas pelas nações avançadas, estimulando a migração de excedentes para
os fundos lastreados em papéis de produtos primários.
A elevação da massa de salários reais é consequência da rápida reativação do ciclo de
negócios no Brasil, depois da superação dos efeitos do colapso do subprime, propiciando a
restauração do poder de barganha dos trabalhadores organizados e a acentuação da disputa
de contratações de contingentes qualificados, pelas empresas, e da valorização do salário
mínimo (majoração real superior a 100,0% em 16 anos), favorecendo a impulsão da remuneração da base da pirâmide social.
A despeito da firme etapa de recuperação
econômica, parece precipitada a conclusão
de ocorrência de pleno emprego no Brasil
* Economista, pesquisador
do IPARDES.
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Apesar da evidente fase de consolidação da recuperação econômica, depois do
mergulho associado à crise externa de 2008-2009, e da constatação de reduzidas margens
de ociosidade dos meios de produção em certas regiões e, principalmente, em alguns
segmentos dinâmicos, parece precipitada a conclusão de pleno emprego, em face da persistência de pelo menos duas distorções.
A primeira delas corresponde à pronunciada discrepância entre a intensidade de
desemprego nas distintas áreas, experimentando o pico de 11,0% em Salvador e o piso de
3,0% em Porto Alegre (a Região Metropolitana de Curitiba, que se situou em 2,3%, não
integra o cálculo nacional). Na média de 2010, a desocupação foi de 11,0% em Salvador,
8,7% em Recife e 7,0% em São Paulo.
Os dados da PME retratam um país em estágio de desenvolvimento bastante heterogêneo,
marcado por menor grau de precarização das relações de trabalho e maior rendimento médio nos
espaços geográficos mais industrializados, e menor dinamismo do mercado e da renda
proveniente do esforço produtivo da mão de obra nas áreas do Nordeste, por exemplo.
Mesmo considerando que 80,0% das vagas incrementais de emprego abertas no Brasil
na última década sejam formais, mais de 55,0% da população ocupada ainda atua à margem
dos direitos constitucionais e é detentora de diminutos níveis educacionais e de qualificação.
É preciso atentar que parte relevante do acréscimo do emprego reflete a transformação de
ocupação precária em registrada, em razão do ambiente de confiança produzido pela
estabilidade econômica.
A segunda anomalia equivale ao caráter parcial da mensuração do desemprego,
referindo-se exclusivamente ao parâmetro “aberto e metropolitano”, não englobando as
modalidades de trabalho precário, a desocupação por desalento e o comportamento menos
previsível das ocupações das bases econômicas do interior do País.
Na verdade, o advento do pleno emprego requereria taxas de expansão mais robustas
e qualitativamente superiores dos níveis de atividade, resultantes da discussão e incorporação de avanços na direção da flexibilização da legislação trabalhista, da diminuição dos
encargos incidentes sobre a folha de pagamentos, notadamente da contribuição previdenciária,
da redução da informalidade e da jornada de trabalho, da maior mobilidade da mão de obra,
e da realização de investimentos em educação e capacitação dos trabalhadores, normalmente
de longa maturação temporal.
ANÁLISE CONJUNTURAL, v.33, n.1-2, jan./fev. 2011
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