O desemprego ainda vai aumentar neste ano antes de começar a cair

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El País, 5 de fevereiro de 2017
“O desemprego ainda vai aumentar neste ano antes
de começar a cair”
Segundo o economista, apesar da forte recessão da economia e a alta taxa
de desocupação, não houve uma piora na distribuição de renda do
trabalho
João Saboia, economista e professor da UFRJ. MAURO PIMENTEL
O Brasil registrou, no fim do ano passado, um número recorde de
desempregados, somando um total de 12,342 milhões de pessoas em busca
de uma vaga. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(Pnad) Contínua, publicada no fim de janeiro, só nos últimos três meses do
ano houve uma alta de 36% no número de desempregados em relação ao
mesmo período de 2015, o que significa cerca de 3 milhões de brasileiros a
mais na fila do desemprego. Os dados refletem o tamanho da recessão
econômica que o país ainda atravessa. As notícias para os próximos meses
tampouco são animadoras. O assunto ganhou urgência para o Governo
Temer, que tem anunciado todas as suas reformas como imprescindíveis para
garantir a melhora da economia, e por consequência, do mercado de trabalho.
Nos dados recentes divulgados sobre o desemprego, um único dado
positivo chama a atenção do economista. Saboia avalia que apesar da
recessão e alta taxa de desocupação, ainda não houve uma piora na
distribuição da renda do trabalho no país.
Pergunta. Qual a perspectiva do desemprego para este ano?
Resposta. A nossa taxa de desemprego vem registrando índices muito ruins
há dois anos e, mesmo que este ano exista alguma expectativa de uma leve
melhora na economia, tudo está muito incerto ainda. É difícil falar neste
momento sem uma informação concreta, mas até agora não houve nenhuma
melhora significativa. Minha expectativa é um mercado de trabalho ainda
pior do que 2016 e 2015, pelo menos até haver alguma sinalização de
retomada econômica. Mas não acredito que será uma piora significativa
como foi a dos últimos dois anos. Em 2016 já piorou muito, caiu muito, é
difícil continuar nesse ritmo. Mas provavelmente ainda vamos ter o aumento
do desemprego no início deste ano.
P. Quais setores ainda devem fazer mais cortes?
R. Quem começou a sofrer mais no início da crise foi a indústria,
especialmente de transformação, seguido pelo setor da construção civil. O
último setor a sentir o impacto da crise foi o que mais gera emprego: o
terciário, especialmente o setor de prestação de serviços. Então, mesmo que
a indústria talvez seja o primeiro setor a reagir, a capacidade de geração de
emprego da indústria é limitada. Cerca de dois terços dos empregos no país
é do setor terciário. A recuperação, quando vier, vai atingir os vários
segmentos da economia, até porque a própria indústria demanda serviços.
P. Esses dois anos de aumento forte do desemprego já está gerando um
impacto para a desigualdade de renda e para a precarização do trabalho?
R. Nos últimos anos, o movimento de distribuição de renda foi de melhora.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2015 mostrou
ainda que, mesmo com a crise econômica, esse movimento não se inverteu.
A vantagem desse levantamento é que ele pega todas as rendas e é a melhor
maneira de se avaliar a distribuição de renda. E mesmo quando você olha a
PNAD Contínua até o terceiro trimestre do ano passado, que analisa só a
renda do trabalhador, você confirma que não houve piora da distribuição de
renda do trabalho. O que ela mostra é que, para as pessoas que continuam
ocupadas, a renda não piorou. O que é um dado positivo. A minha primeira
expectativa era de que o movimento tivesse invertido diante da crise. Ele
perdeu força, mas não inverteu.
P. Por que não inverteu?
R. Acho que não houve uma mudança porque temos muitos mecanismos de
transferência de renda na economia brasileira que estão protegidos pelo
salário mínimo. E sabemos que o salário continuou protegido contra a
inflação nesse período todo. Todas as pessoas, por exemplo, que recebem
aposentadoria e pensões estão protegidas de não ganhar menos que um
salário mínimo. Isso também vale para quem permaneceu no mercado de
trabalho. Essas pessoas têm garantido um salário mínimo, mesmo que haja
pessoas que ganhavam mais e não conseguiram manter o seu salário - ou
porque perderam emprego ou porque não negociaram reajuste de salário bom
na sua empresa. Ou seja, as pessoas de baixa renda conseguiram pelo menos
o salário mínimo e quem ganha mais e não conseguiu o reajuste acabou
contribuindo para a distribuição da renda não ter piorado.
P. Além da retomada da economia, você acha que há alternativa para aquecer
novamente o mercado de trabalho?
R. O governo tentou aquele Programa de Proteção ao Emprego, mas o
volume de empresas que quiseram aderir foi pequeno, voltado
principalmente para o setor da indústria. O Governo está apostando, agora,
nessa retirada do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para
quem tem conta inativa desde 2015, já que isso poderia reativar a economia
e portanto, reaquecer o mercado de trabalho. Acho, entretanto, que essa
retomada vai vir muito devagar, porque estamos num quadro recessivo com
uma capacidade ociosa enorme. Antes de novos investimentos, essa
capacidade ociosa deve ser utilizada. Por essas e outras que a retomada deve
vir muito lentamente e a do mercado de trabalho também. O desemprego
ainda vai aumentar antes de reagir e cair. Para voltar ao patamar da economia
e do mercado anterior a 2014, levaremos alguns bons anos
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