Centro Universitário Salesiano – UNISAL

Propaganda
Centro Universitário Salesiano – UNISAL
Faculdade de Direito
Eutanásia:
Considerações Jurídicas
Trabalho de Direito Penal
Professor: Dr. Pedro Santucci
Campinas, 29 de Maio de 2008
Ernani Ferreira Alves Netto
Eutanásia: Considerações Jurídicas
Trabalho de Direito Penal apresentado como
avaliação bimestral no primeiro semestre do 4º
ano.
Professor Dr. Pedro Santucci
Campinas 2008
ERRATA
Folha Linha
Onde se lê
Leia-se
RESUMO
Esta obra trata dos aspectos jurídicos acerca da Eutanásia e suas variantes, em análise
humanista do Direito à Vida.
Palavras-chave: Eutanásia, Vida, Ortotanásia, Direito, Penal.
ABSTRACT
This play about the legal aspects of Euthanasia and its variants, in humanist analysis of
Right to Life.
Keywords: Euthanasia, Life, Ortotanásia, Law, Criminal
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
7
1 A EUTANÁSIA
8
1.1 ETIMOLOGIA
8
1.2 CONCEITO
8
1.3 TIPOS DE EUTANÁSIA
9
1.4 CONCEITO MÉDICO
10
1.5 CONCEITO JURÍDICO
11
1.5.1 A EUTANÁSIA NO ANTEPROJETO DE CÓDIGO PENAL DE 1998
11
1.5.2 DIREITO COMPARADO – A EUTANÁSIA PELO MUNDO
12
1.6 OS ARGUMENTOS A FAVOR E CONTRA A EUTANÁSIA
14
2 AS OUTRAS “TANÁSIAS”
16
2.1 QUAIS SÃO AS OUTRAS “TANÁSIAS”?
16
2.2 A ORTOTANÁSIA
16
2.2.1 ETIMOLOGIA
16
2.2.2 CONCEITO
16
2.2.3 A RESOLUÇÃO CFM 1805/2006
17
2.3 A DISTANÁSIA
18
2.3.1 ETIMOLOGIA
18
2.2.2 CONCEITO
18
2.4 A MISTANÁSIA
19
2.4.1 ETIMOLOGIA
19
2.4.2 CONCEITO
19
CONSIDERAÇÕES FINAIS
20
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
22
INTRODUÇÃO
A Eutanásia é um assunto polêmico e delicado, sendo discutido sempre de forma
calorosa e nem sempre lógica. Muitos defendem suas posições baseados em ideologias
religiosas, outros pensam em avanços tecnológicos e alguns na valorização da vida e na
dignidade na hora de morrer.
Nesse texto iremos ver o conceito de Eutanásia, sua classificação, a posição do Direito
no Brasil e no Mundo e algumas idéias de quem a defende ou critica.
Trataremos também, porém de forma mais sucinta, sobre as variações da morte
abreviada, tais como: Ortotanásia, Distanásia e Mistanásia.
O assunto, apesar de extenso, será analisado de forma concisa e objetiva, sendo
abordado em sua totalidade.
7
1
1.1
A EUTANÁSIA
ETIMOLOGIA
A palavra Eutanásia tem origem grega: eu + thanatos. De forma que “EU” significa
boa e “THANATOS” significa morte.
A explicação que nos é dada pelo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira1 é de que:
“1. Morte serena, sem sofrimento. 2. Med. Prática, ger. sem amparo legal, pela qual
se busca abreviar sem dor ou sofrimento a vida dum enfermo incurável e terminal
(2)”.
1.2
CONCEITO
A Eutanásia é entendida como a abreviação da vida em caso de moléstia grave e
incurável, que no decurso de tempo abala o doente de tal forma que fica insuportável conviver
com as complicações provenientes do desenvolvimento da moléstia.
Essas complicações são tanto de ordem física quanto de ordem moral, sendo que a
física é a alegação mais comum dos que defendem essa prática.
Contudo, o conceito de Eutanásia foi ganhando com o tempo novas especificações, o
que acabou por subdividir o termo em algumas variações, as quais iremos citar e especificar
no momento apropriado.
________________________
1 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, Miniaurélio: o minidicionário da língua portuguesa, 6ª ed. rev.
amp., Ed Posigraf, 2004, p. 306.
8
1.3 TIPOS DE EUTANÁSIA
A Eutanásia pode ser classificada quanto ao agente ou modo de agir, quanto à vontade
do paciente e também pela classificação de Jimenez de Asúa2.
A classificação quanto ao agente ou modo de agir é divida em ativa, passiva e de
duplo efeito. De forma que, a Eutanásia ativa é aquela em que uma pessoa age, de forma a
matar o enfermo, com o fito de pôr termo ao sofrimento causado por doença. Já a Eutanásia
passiva é aquela em que não há tratamento, desde o diagnóstico da enfermidade, ou então a
partir da interrupção do tratamento, mesmo que seja apenas para aliviar a dor e sofrimento.
No caso de haver apenas ações médicas, no intuito de aliviar o paciente das agruras causadas
pela doença, e essas ações causarem como conseqüência indireta o óbito do enfermo, temos
caracterizada a Eutanásia de duplo efeito.
Quanto à vontade do paciente a Eutanásia é classificada em voluntária, involuntária e
não voluntária. A Eutanásia voluntária ocorre no caso de o paciente solicitar que seja
praticado o ato eutanásico. Na hipótese de ocorrer a morte do paciente sem o seu
consentimento temos então a Eutanásia involuntária. Todavia, em caso de não haver o
enfermo opinado sobre a Eutanásia, nem autorizando e nem proibindo, caracteriza-se a
Eutanásia não voluntária.
Jimenez de Asúa classificou, em 1942, a Eutanásia em: Eutanásia libertadora,
Eutanásia eliminadora e Eutanásia econômica. Em caso de haver solicitação do paciente, que
sofre de doença incurável e que o submete a grande sofrimento, ou seja, no caso clássico de
Eutanásia, temos a Eutanásia libertadora. Porém se a morte do indivíduo se dá apenas para
livrar do convívio familiar ou social o portador de doença mental, mesmo que não haja a
________________________
2 Jiménez de Asúa, L. Libertad para amar y derecho a morir. Buenos Aires: Losada, 1942, pp. 476-477 in
www.bioetica.ufrgs.br
9
proximidade da morte ou situação de morte provável caracteriza-se a Eutanásia eliminadora,
que pode ser considerada como eugenia e propagadora da idéia de higienização social. Já a
Eutanásia econômica é aquela em que o tratamento da doença é longo e dispendioso, e a
manutenção do paciente não interessa a sociedade, que analisa o doente pelo prisma do
binômio custo/benefício, porém pode também abranger o doente que fica inconsciente e que
quando recobre a consciência, o que talvez não aconteça, pode sofrer em razão da doença.
1.4 CONCEITO MÉDICO
Do ponto de vista da medicina, a Eutanásia é procedimento que visa por termo em
tratamento onde já se esgotaram todos os meios de cura e alívio da dor. Todavia, a dor é um
sentimento que não há como mensurar, já que um indivíduo pode conviver com as
complicações e dores de uma doença e outra pessoa não as suportar.
O consenso entre a maioria dos médicos é de não há fundamentos que motivem a
prática de Eutanásia, ao contrário de outras formas de se “abreviar” a vida, tais como a
Ortotanásia e Distanásia, sendo que na verdade essas não são formas de se matar o paciente,
como veremos adiante.
Ademais, há de se considerar que em face dos avanços tecnológicos e das descobertas
de novos medicamentos e procedimentos de tratamento, uma doença que hoje é considerada
incurável, pode ter a cura anunciada amanhã.
10
1.5 CONCEITO JURÍDICO
Juridicamente, a Eutanásia é entendida como o direito de matar ou o direito de morrer,
tanto em razão de sofrimento ou por razões de seleção e eugenia.
A Eutanásia não encontra amparo legal no Código Penal brasileiro, sendo tipificada
como homicídio simples (art 121), homicídio privilegiado (art 121, § 1º) ou induzimento,
instigação e auxílio ao suicídio (art 122), dependendo das circunstâncias e entendimento
judicial.
1.5.1 A EUTANÁSIA NO ANTEPROJETO DE CÓDIGO PENAL DE 1998
No anteprojeto de 1998 de alteração do Código Penal, em estudo, há a previsão de
inclusão da Eutanásia e Ortotanásia como fato típico (Eutanásia) e excludente de ilicitude
(Ortotanásia).
Esse anteprojeto3 prevê a inclusão de dois parágrafos no artigo 121 do Código Penal
em vigor, como vemos, In Verbis:
“Art. 2º. A Parte Especial do Código Penal (Decreto-lei nº 2.848, de
7 de dezembro de 1940) passa a vigorar com a seguinte redação:
Homicídio
Art. 121. Matar alguém:
Pena - Reclusão, de seis a vinte anos.
________________________
3
http://www.mpdft.gov.br/Orgaos/NIC/legis_armas/Legis%20compl%20(div)/Anteprojeto%20
Código%20Penal.doc, consultado dia 24/05/2008.
11
Eutanásia
§ 3º Se o autor do crime agiu por compaixão, a pedido da vítima,
imputável e maior, para abreviar - lhe sofrimento físico insuportável,
em razão de doença grave:
Pena - Reclusão, de três a seis anos.
Exclusão de ilicitude
§ 4º Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio
artificial, se previamente atestada por dois médicos, a morte como
iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente, ou
na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge,
companheiro ou irmão”.
Como podemos ver, se aprovadas essas mudanças do anteprojeto supra, a Eutanásia
terá uma definição jurídica, por força de lei, de forma que não serão mais usados os
entendimentos doutrinários ou pessoais para se identificar um caso em que houve ou não as
hipóteses utilizadas atualmente.
1.5.2 DIREITO COMPARADO – A EUTANÁSIA PELO MUNDO
Como já mencionado anteriormente, a Eutanásia, apesar de não estar tipificada no
direito brasileiro, é crime se praticada em nosso país, sendo considerada como homicídio em
sua modalidade ativa ou induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio em sua modalidade
12
passiva. Mesmo se aprovadas as mudanças no Código Penal, a Eutanásia não será permitida,
apenas terá tipo penal específico.
Em outros países existem várias correntes ideológicas que versam sobre o assunto.
Somente para demonstrar essa diversidade de assuntos, citarei alguns países e sua legislação a
respeito do tema:

Holanda – Eutanásia e suicídio assistido são legalizados, se cumpridos alguns
critérios;

Bélgica – Eutanásia legalizada se cumpridas determinadas condições;

Canadá – Eutanásia é considerada homicídio;

Espanha – Eutanásia e suicídio assistido são crimes;

Uruguai – a Eutanásia não é autorizada, mas existe a possibilidade do agente
causador não ser penalizado se forem cumpridos alguns requisitos, há a
previsão dessas possibilidades no art. 37 do Código Penal Uruguaio, conhecido
como “homicídio piedoso”. O suicídio assistido é crime;

Austrália – entre julho de 1996 e março de 1997 houve legislação em vigor que
permitia a Eutanásia ativa;

Suécia – o suicídio assistido não é um delito punível, em casos extremos os
médicos podem desligar aparelhos respiratórios;
Esse assunto, por ser polêmico, não encontra uma forma geral e mundial de se lidar
legalmente com as implicações de causar a morte a outrem, cada país acaba usando seus
costumes e cultura da população para determinar a legalização ou não da Eutanásia.
13
1.6 OS ARGUMENTOS A FAVOR E CONTRA A EUTANÁSIA
Como vimos anteriormente, existem várias formas de lidar com a Eutanásia, e todas
essas formas encontram defensores e opositores.
Enquanto alguns lutam por provar que a vida é um bem indisponível, seja visto pelo
aspecto religioso, moral ou legal, os que defendem a Eutanásia tentam demonstrar as
vantagens de uma morte digna e os infortúnios causados por uma enfermidade incurável e que
cause dor ao doente.
Citarei, então, alguns temas e os argumentos que os sustentam, tanto os prós quanto os
contras:

Dores e sofrimentos insuportáveis: os que defendem a Eutanásia argumentam
que nem todos os medicamentos existentes podem retirar a dor ou sofrimento
do paciente por completo, ao contrário dos que condenam a Eutanásia que
afirmam que através de medicamentos as dores podem ser suportadas e até
anuladas;

Doenças incuráveis: é um dos argumentos mais concretos de ambas ideologias,
sendo que os defensores da Eutanásia afirmam que se, a doença é incurável e
terminal, não há solução senão a morte, e abreviá-la é livrar o enfermo do
sofrimento, de forma que mesmo sendo descoberto um novo medicamento não
haveria tempo hábil entre a descoberta e a comercialização do mesmo,
enquanto os que condenam essa prática afirmam que sempre é possível ser
descoberta uma forma de cura, em tempo hábil, além da possibilidade de haver
erro médico no diagnóstico;

Vontade do paciente, solícito da morte: este é um ponto que gera uma
polêmica a respeito de até onde o paciente tem consciência do que está
14
pedindo, e se só o faz por ter um desejo transitório em razão de sentir dores
durante um período de agravamento da doença, o que é usado pelos que
condenam a Eutanásia, enquanto os que defendem a Eutanásia afirmam que o
doente tem total controle sobre sua vida, desde que consciente e lúcido, e que
não há porque fazê-lo conviver com uma dor que ele mesmo afirma não
suportar;

Ônus econômicos em doenças sem possibilidade de reversão: essa discussão é
focada nesse tema principalmente em países subdesenvolvidos, haja vista que
em hospitais desses países, inclusive no Brasil, muitas vezes se faz necessário
decidir quem vai morrer e quem vai viver baseando-se no critério de quanto
custa salvar uma vida ou outra, além de se verificar quanto tempo um paciente
vai ocupar um leito, sem perspectivas de melhora, enquanto há uma fila de
doentes com chance de recuperação aguardando o leito vagar, e nesse ponto os
que condenam a prática da Eutanásia dizem que todas as vidas tem o mesmo
valor e que não cabe ao médico, e nem a ninguém, decidir quem deve morrer
ou viver, ao passo que chamam essa prática de “Mistanásia”, como veremos
mais adiante;
Essa é uma discussão acirrada e muito antiga, e claro, existem muitos outros assuntos
e temas que são usados como sustentáculos das idéias das diversas correntes de pensamento e
doutrinárias a respeito do tema, porém não é possível citar todas as teses defendidas, pois
ficaria um tema extenso e exaustivo, além do mais não nos levaria muito mais adiante do que
já vimos. Ademais, por ser um assunto muito debatido, e com desdobramentos fáticos no dia a
dia da população, nunca se chegará a um consenso e um momento em que se pode ter o
assunto por esgotado em todas as vertentes de pensamento.
15
2
AS OUTRAS “TANÁSIAS”
2.1 QUAIS SÃO AS OUTRAS “TANÁSIAS”?
Como já vimos o sufixo tanásia vem do grego “THANATOS”, que significa morte,
isto é, trataremos então das outras formas de morrer, que derivam do termo Eutanásia.
Neste capitulo veremos: a Ortotanásia, a Distanásia e a Mistanásia.
2.2 A ORTOTANÁSIA
2.2.1 ETIMOLOGIA
O termo Ortotanásia tem origem grega: orthos + thanatos. De forma que “ORTHOS”
significa correta e “THANATOS” morte, ou seja, é a morte correta, no tempo certo para o
paciente terminal.
2.2.2 CONCEITO
Alguns autores defendem que essa morte no tempo certo não pode ser considerada
Eutanásia passiva, ao passo que alguns assim a classificam. A Ortotanásia é, então, a busca da
utilização dos meios adequados de tratamento de doentes em fase terminal, sem que se
prolongue indefinidamente a vida, e de forma que o paciente fique confortável, na medida que
for possível, até que a morte ocorra de forma normal.
16
2.2.3 A RESOLUÇÃO CFM 1805/2006
Em 28 de novembro de 2006 o Conselho Federal de Medicina publicou a resolução
supra, de forma a dirimir qualquer dúvida sobre a aplicação da Ortotanásia e a conseqüente
responsabilidade do médico.
Transcrevo seu conteúdo para elucidar a questão:
“Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e
tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de
enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de
seu representante legal.
§ 1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou a seu
representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada
situação.
§ 2º A decisão referida no caput deve ser fundamentada e registrada
no prontuário.
§ 3º É assegurado ao doente ou a seu representante legal o direito de
solicitar uma segunda opinião médica.
Art. 2º O doente continuará a receber todos os cuidados necessários
para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a
assistência integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual,
inclusive assegurando-lhe o direito da alta hospitalar”.
17
Esse entendimento encontra respaldo no anteprojeto de alteração da Parte Especial do
Código Penal, que como já vimos anteriormente é causa de exclusão de ilicitude, de forma
que acaba por tornar-se uma linha de pensamento dominante, e que respeita a vida em seu
curso natural.
2.3 A DISTANÁSIA
2.3.1 ETIMOLOGIA
O termo Distanásia tem origem grega: dis + thanatos. De forma que “DIS” significa
mal e “THANATOS” morte, ou seja, é a morte errada, morte retardada ou morte lenta.
2.3.2 CONCEITO
Distanásia é o prolongamento da vida de enfermo incurável, em condições
deploráveis, principalmente se o doente se encontrar lúcido.
Essa expressão foi proposta por Morache4, em 1904, com o significado de agonia
prolongada, morte com sofrimento físico ou psicológico do indivíduo lúcido.
É, portanto, manter o enfermo vivo, às custas de dor e sofrimento, para que ele demore
mais a morrer, já que a doença é terminal e incurável.
Muitos dos que defendem essa tese de morte alegam que o médico tem a obrigação de
empregar os meios necessários para manter o ser humano vivo. Os que criticam essa tese se
valem do argumento de que não há motivo para imprimir mais sofrimento a alguém que já
terá sofrimento decorrente da enfermidade.
________________________
4 Morache. Naisance et mort. Paris: Alcan. 1904 in www.bioetica.ufrgs.br
18
2.4 A MISTANÁSIA
2.4.1 ETIMOLOGIA
O termo Mistanásia foi proposto por Leonard Martin, padre e professor especialista
em bioética, e refere-se à morte do miserável.
2.4.2 CONCEITO
A Mistanásia, também chamada erroneamente de Eutanásia social, é a morte dos
pobres e miseráveis que não chegam nem a ter acesso a tratamento médico. É comum esse
termo referir-se a países subdesenvolvidos e com problemas de distribuição de renda
acentuado.
No Brasil mesmo temos exemplos de casos de Mistanásia, onde milhares de pessoas
enfrentam fila para conseguir pronto atendimento em hospitais públicos e muitas vezes
aguardam por meses, e até anos, para conseguir marcar consultas e cirurgias após o
diagnóstico de alguma doença, de forma que muitos falecem sem o início do tratamento.
Não pode ser considerada como uma forma de Eutanásia já que não há a intenção de
que a pessoa morra, e sim uma omissão do poder público para que exista um tratamento
decente e digno, além de imediato, e que indiretamente acarreta no óbito do indivíduo.
19
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para concluir esse estudo sobre a Eutanásia, tecerei algumas considerações, lembrando
que somente é minha opinião e não a palavra final sobre esse assunto tão delicado.
Atualmente não se tem uma legislação específica sobre a “boa morte”, o que causa
certa confusão ao se tratar um paciente, afinal, como se deve proceder? É certo tratá-lo apenas
para aplacar o sofrimento? Ou então tratá-lo a todo custo, mesmo que causando dor e
sofrimento? Ou simplesmente abreviar-lhe a vida?
Meu entendimento é consoante com o anteprojeto da Parte Especial do Código Penal,
de que não deve ser permitida a Eutanásia, em sua forma ativa, isto é, que se mate o paciente
com consciência do ato, já que estaria sendo delegado aos médicos, e por conseqüência aos
parentes e cuidadores de enfermos terminais e incuráveis, o poder de matar sem ter as
implicações legais. Ademais, também teríamos um grave problema de herdeiros que fariam de
tudo para provar que seus ascendentes não teriam mais condições de continuar vivendo, para
que fiquem com o dinheiro. Da mesma forma, se não houvesse uma rígida fiscalização
teríamos a possibilidade de criar uma indústria da morte e ficaríamos sempre em dúvida se
não seria uma forma de se legalizar a eugenia.
Acertadamente, o legislador contemplou o princípio da morte digna ao propor a
permissão a Ortotanásia, que é uma forma digna de permitir que o enfermo tenha seu tempo
de vida preservado, sem antecipar a morte ou prolongar a vida de forma artificial, e ao mesmo
tempo o mantém de forma que não sinta dor, ou ao menos alivia a dor da melhor forma
possível. Entendimento esse que corrobora a resolução do Conselho Federal de Medicina, que
isenta o médico da responsabilidade da morte de paciente que não teve sua vida prolongada
artificialmente.
20
Apesar de não ser contemplada na nossa legislação e nem no anteprojeto de alteração
da Parte Especial do Código Penal, comentamos aqui sobre a Distanásia, que de todas é a
forma mais cruel, pois imprime dor e sofrimento ao paciente para prolongar uma existência
que de forma alguma subsistiria sem o tratamento médico. Essa forma cruel de se praticar a
Medicina, não é pratica comum nos dias atuais, já que os médicos tendem a adotar uma visão
mais humanista da prática médica.
A Mistanásia é o assunto mais polêmico, já que não se tratam apenas de pacientes
terminais e incuráveis, mas sim de uma camada da população sem acesso às condições
mínimas de dignidade e urbanidade, e que morre muitas vezes sem ao menos receber o
diagnóstico e em alguns casos poderiam ser curados com procedimentos simples. Esse
assunto, não envolve somente a bioética ou a medicina, mas sim os altos escalões do governo
que deveriam ter olhos mais voltados aos problemas da população de baixa renda, ou seja, é
um assunto mais político do que ético, haja vista que na política nem sempre o valor moral e
ético é respeitado em detrimento de outros métodos de análise de grau de relevância em cada
ação do governo e destinação de verbas.
Em síntese, então, aguardamos a decisão acerca do anteprojeto do Código Penal para
que possamos ter uma conduta legalizada ao tratar dos casos de Eutanásia e Ortotanásia.
Porém, já é entendimento médico de que a Ortotanásia não é punível e nem eticamente
reprovável, ao passo que a própria sociedade já expressa o apoio a essa prática, conforme se
percebe desde conversas em público até em opiniões sobre esse tema em telenovelas.
A nós, operadores do Direito, cabe apenas levantar a questão para que seja sempre
preservado o direito à Vida, mas não apenas a Vida em si, nossa obrigação enquanto
defensores do direitos das pessoas é defender a vida digna e uma morte idem.
21
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
(1) FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, Miniaurélio: o minidicionário da língua
portuguesa, 6ª ed. rev. amp., Ed Posigraf, 2004
(2) Jiménez de Asúa, L. Libertad para amar y derecho a morir. Buenos Aires: Losada,
1942
(3) http://www.mpdft.gov.br/Orgaos/NIC/legis_armas/Legis%20compl%20(div)/Anteproj
eto%20Código%20Penal.doc
(4) Morache. Naisance et mort. Paris: Alcan. 1904
(5) http://www.bioetica.ufrgs.br
(6) http://www.jusnavigandi.com.br/doutrina
22
Download