Bypass Iliacopoplíteo Cruzado Sem Incisão Intermediária

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BYPASS ILIACOPOPLiTEO
CRUZADO, SEM INCISAO INTERMED,IARIA: RELATO DE
CASOS
Existe urn grupo de pacientes com doen9a oclusiva iliofemoral unilateral que nao
sao candidatos para cirurgia de aorta, apresentando doen9a extensa que nao
permite 0 uso de tecnicas de revasculariza9ao tradicionais nem mesmo endovasculares. Os autores descrevem tres casos de bypass iliacopoplfteo cruzado realizados recentemente como metoda altemativo. Com a vantagem de evitar a
incisao nas regiOes inguinais, diminui 0 risco potencial de infec9ao.
Unitermos: reconstrugiio extra-anatornica, bypass cruzado, doenga oclusiva
iliofemoral
o
s bypasses extra-anatomicos
dos membros infedores constituem metodo altemativo efetivo de reconstru9ao vascular em condi90es clfnicas especfficas nas quais as revasculariza90es tradicionais estao contra-indicadas. As indica90es mais comuns sao: infec9ao, pacientes de alto risco cinirgico, abdome hostil e multiplos
. procedimentos vasculares previos. 9 0
nosso relata inclui tres casos de bypass
iliacopoplfteo cruzado realizados recentemente na Unicamp.
RELATO DE CASOS
Paciente 1. A primeira paciente era uma
mulher de 64 anos acompanhada em nosso servi90 desde 1992, entao submetida
a bypass aorto-biilfaco acima da prega
inguinal devido aobstru9ao aorto-ilfaca.
Evoluiu bern ate dezembro de 98 quando
iniciou claudica9ao limitante no membro
inferior direito e desaparecimento do pulso femoral deste lado. Realizou arteriografia que confirmou oclusao do ramo
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direito da protese e reenchimento da arteria poplftea supra-genicular em fase tardia (Foto 1). Decorridos seis meses, devido a piora da claudica9ao, a paciente
foi submetida a bypass cruzado do ramo
esquerdo da protese, acima do ligamento, para a arteria poplftea supra-genicular direita com incisao intennediaria na
regiao inguinal e Indice TfbiolEraquial (I
TIE) pos-revasculariza9ao igua1 a 0,91.
Dois meses apos havia safda de secre9ao puru1enta pela incisao intennediaria
da regiao inguinal direita e uma fistulografia foi realizada para determinar a extensao da infec9ao (Foto 2).0 tratamento com antibioticos e curativos obteve
pouca melhora, sendo optado pela rota9ao de retalho do musculo sartorio para
cobrir a protese exposta. A paciente retoma ao Pronto-Socorro quatro meses
depois com deiscencia da cicatriz, sendo
realizada retirada de segmento da protese infectada. Ela procurou 0 ambulatorio
com dor de repouso e 1 TIE = 0,19 no
membra inferior direito. Uma nova arteriografia mostrou padrao semelhante a
Charles Angotti Furtado de
Medeiros
Medico Residente da Disciplina de
Cirurgia Vascular Periterica - FCM
-UNICAMP.
Carlos Siade
Medico Residente da Disciplina de
Cirurgia Vascular Periterica - FCM
-UN/CAMP.
George Carchedi Luccas
Professor Livre-Docente da Disciplina de Cirurgia Vascular Periferica - FCM - UNICAMP.
Disciplina de Cirurgia Vascular
Periferica - Faculdade de Citmcias Medicas - Universidade Estadual de Campinas UNICAMP.
Charles Angotti Furtado de
Medeiros
Rua Izabel Negrao Bertoti, 101 ap52
13087 - 671 Campinas - SP
e-mail: [email protected]
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Foto 1 - Angiografia por SUbtrar;:ao Digital. Note
bypass aorto-bifemoral.
anterior e a paciente foi submetida a outro bypass cruzado do ramo esquerdo da
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a oclusao do ramo direito da pr6tese do
sem incisao intermediaria (Foto 3).
Paciente 2. 0 segundo paciente era urn
homem de 57 anos, hipertenso e diaMtico, encaminhado de outro servi~o com
hist6ria de lesao tr6fica no segundo pododactilo direito ha duas semanas e pio-
ra progressiva da ferida. Ao exarne apresentava-se com ausencia de pulsos no
membro inferior direito e presen~a de
gangrena umida no antepe . A arteriografia evidenciou obstru~ao da arteria ilfaca externa direita, apenas circula~ao
colateral ao nfvel da coxa e reenchirnento
da arteria poplftea acim;1 do joelho, estando pervia a arteria tibial anterior ate 0
pe. 0 paciente foi submetido a bypass
cruzado da arteria ilfaca extema esquerda para arteria poplftea supra-genicular
direita sem incisao intermediaria na regiao inguinal.
Paciente 3. 0 terceiro paciente tarnbern
era homem, 75 anos, hipertenso, tabagista e nefropata com lesao tr6fica extensa
no pe esquerdo e I T/B = 0,25. Realizou
angiografia que evidenciou: oclusao da
arteria ilfaca comum esquerda na origem,
oclusao da arteria Femoral Superficial e
reenchimento da arteria poplftea acima do
joelho (Foto 4). Foi submetido a bypass
cruzado da arteria ilfaca extema direita
para a arteria poplftea supra-genicular
contralateral sem incisao intermediaria
(Foto 5).
DISCUSSAO
Foto 2 - Fistulografia mostrando 0 desenho
do seguimento da pr6tese de Dacron acometida pela infecr;:ao.
pr6tese aorto- biilfaco, acima do ligamento
inguinal, para a arteria poplftea direita
supra-genicular por abordagem lateral e
o
Foto 3 - Cont'ole intra-operat6rio da anastomose distal (acesso lateral na arteria poplftea).
Desde a primeira descri~ao do bypass
extra-anat6mico em 1952 por Freeman e
Leeds, 1.9 uma grande variedade de procedimentos engenhosos tern sido descrita e usada amplarnente com graus variados de sucesso para restaurar 0 fluxo
sangtifneo dos membros inferiores. Alguns autores classificaram tais reconstru~6es em duas categorias: bypasses
convencionais, incluindo os axilofemorais e femorofemoral, e bypasses ampliados, como os axilopoplfteos e femoropopUteo cruzado. l
Estas tecnicas apresentam duas desvantagens em rela~ao aos procedimentos tradicionais: perviedade a longo prazo e incidencia de infec~ao. Diversos trabalhos
tern estabelecido que quando 0 influxo e
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Tabela 1 - Detalhes dos tres pacientes descritos.
TABELAl
Paciente Idade
Indic~ao
~
Cirurgia
Previa
protese
infectada
~
dorde
repouso
2
57
gangrena
isquemia
miocilrdio
Arteria
ramo
da
protese
ro~ao~
~cru:zado
nenhuma
PrOtese
ITIB
pre- pos
poplitea
acima
(lateral)
~
0,19
poplitea
acima
~
06n:un
Arteria
Doadora Receptora
iliaca
extema
06n:un
1,0
0,30
1,0
3
75
gangrena
~
nenhuma
iliaca
extema
poplitea
acima
~
0,25
08n:un
0,83
adequado, 0 estado do leito arterial distal e 0 principal responsavel pela perviedade a longo prazo. 9 , 12 Por outro lado,
foram demonstrados pelo menos quatro
fatores que contribuiriam para aumentar
o risco de infecr;;ao: manipular;;ao da pr6tese, bacteremia, drenagem linfatica e
complicar;;6es da ferida cinirgica. IO
Mas existe urn subgrupo de pacientes
com doenr;;a oclusiva iliofemoral unilateral que nao se enquadra clinicamente
para cirurgia a6rtica e 0 qual a extensao
da doenr;;a nao permite 0 uso de tecnicas
. de revascularizar;;ao tradicionais nem
mesmo endovascular. Alguns destes, inclusive, ja submetidos a outros procedimentos vasculares. Em tais situar;;6es, os
bypasses extra-anat6rnicos sao a melhor
escolha,2, 6, 9 em grande parte devido a
simplicidade tecnica, baixa morbidade e
bons resultados,4. 7, 8, 14, 16
o primeiro caso relatado era de uma paci-
Foto 4 - Angiografia por Subtragao Digital. Note oclusao da arteria ilfaca comum esquerda
na origem.
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ente com multiplas cirurgias anteriores,
infecr;;ao da pr6tese e insucesso no tratamento conservador, enquanto que os
dois outros eram pacientes com morbidade elevada e risco de perda do membro (Tabela 1). Vma opr;;ao util para tais
situar;;6es e 0 usa do bypass femoropopUteo cruzado. Apesar dos poucos artigos publicados, 1,4,5 acredita-se ter melhores resultados em relar;;ao ao bypass
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I
Foto 5 - Tunelador maleavel ja encurvado. Note a ponta romba em forma de ogiva contendo
orificios que permitem amarrar a extremidade de uma pr6tese e puxa-Ia atraves do tunel
realizado.
axilopopliteo, com perviedade superior a
este ultimo e pequena taxa de complica-
~6es.
A outra altemativa seria usar a arteria
•
Figura 1 - Anastomose termino-Iateral da pr6tese com a arteria poplftea acima do joelho
atraves de acesso lateral.
2
Figura 2 - Esquema i1ustrativo da cirurgia
proposta 'que evita incisao nas regioes inguinais bilateralmente.
femoral profunda mas, ela ou esta severamente doente ou associada a oclusao
do ramo de urn bypass aorto-bifemoral,
ou mesmo em area infectada. E sabido
que a sua revasculariza~ao nao e suficiente nos casos de les6es tr6ficas extensas e, que a coxa pode ser perfundida,
satisfatoriamente, por colaterais via fluxo retr6grado da anastomose distaL5 Portanto optamos pela tecnica descrita abaixo.
Nos tres casos mencionados (Tabela 1) a
exposi~ao cirtirgica da arteria doadora (ou
ramo da pr6tese) foi via incisao convencional na fossa iliaca e abordagem retroperitoneal. Em particular essa tecnica de
tomada da deri va~ao acima do ligamento
inguinal evita incisao na virilha mantendo a regiao femoral desse lado intacta. A
arteria poplitea (receptora) foi abordada
na sua por~ao supra-genicular por meio
de acesso lateral em urn paciente e acesso medial nos outros dois. 0 acesso lateral e utilizado nos casos em que a abordagem convencional faz-se diffcil ou impossivel, por causa da extensa fibrose
ou infec~ao associados a uma incisao
previa do lado medial. I.2. 4, 10 Atraves do
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septa intermuscular na face lateral do terc;o distal da coxa, a arteria poplftea e facilmente isolada das outras estruturas do
feixe neurovascular e, com uma leve trac;ao, a anastomose pode ser realizada sem
dificuldade (Figura 1). A pr6tese de Dacron, utilizada nos tres casos, foi disposta em tunel subcutaneo ate a regiao
da anastomose distal com 0 uso de urn
tunelador maleavel (Foto 6) sem incisao
intermediana na virilha desse lado (figura 2).0 que significa que a regiao inguinal foi evitada bilateralmente, fato considerado de suma importancia, uma vez
que, de todos os locais este e 0 sftio mais
predisposto a infecc;ao. 10
Os procedimentos foram realizados sob
bloqueio anestesico epidural continuo
sem intercorrencias. De resultado imediato, todos os tres pacientes apresentaram
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melhora clinica e do I TfB ap6s a revascularizac;ao (Tabela 1). 0 segundo paciente,
de forma surpreendente, decidiu pela amputac;ao transtibial apesar da grande melhora da extensa area de lesao tr6fica com
infcio de granulac;ao, que foi realizada no
vigesimo setimo dia de p6s-operat6rio,
mesmo estando com 0 bypass pervio e com
pulso tibial anterior presente. Apesar deste resultado, sabe-se que a taxa de salvamento de membros e maior que a de patencia, fato comprovado tambem para os
bypasses femoropoplfteos cruzados.1,3,5 0
terceiro paciente desenvolveu hematoma
subcutaneo no terc;o medio da coxa que
infectou e teve que ser drenado no trigesimo quarto dia de p6s-operat6rio, mas sem
comprometimento das anastomoses. Acreditamos que essa complicac;ao ocorreu
porque foi utilizado outro instrumento no
lugar do tunelador maleavel e 0 mnel ficou
muito superficial. Assirn, e necessario muito cuidado na passagem do tunelador, sempre direcionando-o lateralmente, do sentido distal para proximal, para fugir da regiao
inguinal. Entretanto, nenhum paciente foi
a 6bito, e 0 bypass estava patente em todos ate a Ultima consulta,
Para finalizar, acreditamos que 0 bypass iliacopoplfteo cruzado e uma altemativa factivel para os casos complexos de obstruc;ao iliofemoral unilateral, traz resultados
satisfat6rios e tern como grande vantagem
poder ser realizado sem incisao alguma nas
regi6es inguinais diminuindo assim 0 risco
potencial de infecc;ao, aumentando as chances de sucesso. Sao necessanos estudos
a longo prazo para estabelecer 0 seu verdadeiro papel no rol das reconstruc;6es extra-anat6micas,
SUMMARY
CROSSOVERILIOPOPL:rrE!L BYPASS WITHOUT GROIN INCISIONS - CASE REPORT
There is a group of patients with unilateral iliofemoral occlusive disease who are unfit for aortic surgery, and whose pattern of
disease is not amenable to revascularization either by traditional bypass or endovascular techniques. The authors describe
three cases of crossover iliopopliteal bypass perfornled recently as an alternative method. In advantage it avoids groin
incisions which might decrease the infection risks.
Key- Words: extra-anatomic reconstruction, crossover bypass, iliofemoral occlusive disease
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