SUPORTE BÁSICO DE VIDA ADRIANA VADA SOUZA FERREIRA , ELIANA G ARCIA Comitê Nacional de Ressuscitação — Funcor Endereço para correspondência: Rua Guiará, 325 — ap. 71 — CEP 05025-020 — São Paulo — SP O suporte básico de vida inclui o reconhecimento precoce de pacientes com os primeiros sinais e sintomas de síndrome coronariana aguda, acidente vascular cerebral e obstrução de via aérea. Inclui as manobras de ressuscitação cardiopulmonar nas vítimas de parada e manobras de desobstrução de vias aéreas por corpo estranho. Atualmente inclui também as tentativas de desfibrilação de vítimas que apresentem fibrilação ventricular ou taquicardia ventricular sem pulso, como ritmo de colapso, por meio do uso de desfibriladores externos automáticos. Somente a ação simultânea em várias etapas do atendimento a essas vítimas poderá reduzir os índices de mortalidade. Cada comunidade deve reconhecer seu ponto fraco e trabalhar melhorias em torno dele. Palavras-chave: ressuscitação cardiopulmonar, parada cardíaca, cuidados para prolongar a vida. (Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 2001;2:214-25) RSCESP (72594)-1083 INTRODUÇÃO Em situações de emergência, a avaliação da vítima e seu atendimento devem ser prontamente realizados de forma objetiva e eficaz, a fim de aumentar a sobrevida e reduzir as seqüelas dessas vítimas. O suporte básico de vida inclui várias etapas do socorro à vítima em situação que represente risco de vida. Na maioria das vezes, o socorro a essas vítimas tem início fora do ambiente hospitalar. O reconhecimento precoce da vítima de infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral deflagra o suporte básico de vida, que inclui: 1. Ativação do sistema de serviço médico de emergência — No Brasil, cada pessoa deve conhecer o número do telefone do sistema de serviço médico de emergência local, uma vez que não existe um número único para todas as regiões, como ocorre em outros países (911 nos Estados Unidos, 112 na Europa ou 119 no Japão). 2. Avaliação da vítima com perda súbita da consciência e realização de manobras para sustentação das vias aéreas, respiração e cir- 214 culação, conforme necessário. 3. Tentativa de desfibrilação de pacientes com fibrilação ventricular ou taquicardia ventricular utilizando desfibrilador externo automático. 4. Reconhecimento da vítima com obstrução de via aérea por corpo estranho e realização de manobras de desobstrução, conforme indicado. Atualmente, existem evidências de que a ressuscitação cardiopulmonar imediata realizada por voluntários e a desfibrilação precoce diminuem a mortalidade de vítimas de parada cardíaca. A ressuscitação cardiopulmonar imediata previne a deterioração da fibrilação ventricular para assistolia, pode aumentar a chance de desfibrilação e contribui para a preservação das funções cardíaca e cerebral. A desfibrilação precoce é o fator isolado que, comprovadamente, mais aumenta a sobrevida de adultos com parada cardíaca(1). A fim de garantir a ressuscitação cardiopulmonar imediata e a desfibrilação precoce para vítimas de parada cardíaca, é fundamental o treinamento em massa da comunidade e a disponi- Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida bilidade de desfibriladores externos automáticos em locais públicos. EPIDEMIOLOGIA DA PARADA CARDIOPULMONAR NO ADULTO Adultos vítimas de parada cardíaca súbita não-traumática, na maioria das vezes, apresentam fibrilação ventricular como ritmo de colapso. Existem relatos de comunidades treinadas com o primeiro choque ocorrendo nos primeiros três minutos de parada cardíaca com sobrevida de 74% das vítimas (2). Esses dados contrastam com relatos de que quando o primeiro choque é realizado com mais de doze minutos de parada cardíaca, a sobrevida gira em torno de 2% a 5%. Por esse motivo, quando um único socorrista atende uma vítima adulta com perda súbita de consciência, ele primeiro ativa o sistema de serviço médico de emergência local e solicita um desfibrilador externo automático, depois retorna à vítima e realiza as manobras de ressuscitação cardiopulmonar, conforme necessário (“chame primeiro”). Nas crianças, as doenças primariamente respiratórias são mais freqüentes. Quando uma vítima de parada respiratória é prontamente socorrida, a sobrevida é muito mais elevada quando comparada ao suporte básico de vida realizado quando já ocorreu parada cardíaca por hipoxia, secundária à parada respiratória. Sendo assim, quando uma criança apresenta perda de consciência e um único socorrista está disponível, ele primeiro realiza um minuto de manobras de suporte básico de vida, conforme necessário, e depois ativa o sistema de serviço médico de emergência (“chame rápido”). Quando mais de um socorrista está disponível, um deles ativa o sistema de serviço médico de emergência e o outro fica ao lado da vítima, realizando ressuscitação cardiopulmonar, em qualquer faixa etária. Existem algumas exceções a essas recomendações: vítimas de submersão, de trauma ou de uso abusivo de drogas — “chame rápido” em qualquer faixa etária. E para crianças com doença prévia conhecida de risco para distúrbios do ritmo cardíaco — “chame primeiro”. SÍNDROME CORONARIANA AGUDA: COMO RECONHECER PRECOCEMENTE E COMO AGIR Com o advento da terapêutica fibrinolítica e das intervenções coronarianas percutâneas, tornou-se possível a desobstrução coronariana. Entretanto, para o sucesso dessas intervenções é fundamental que o intervalo de tempo do início dos sintomas até a realização do procedimento não exceda poucas horas. Para que esses pacientes sejam submetidos a tempo a esses procedimentos, é necessário que a população leiga reconheça precocemente os sinais e sintomas do chamado ataque cardíaco, que o sistema de serviço médico de emergência seja acionado e que a vítima seja rapidamente transportada para o hospital. Freqüentemente, pacientes e seus acompanhantes demoram para reconhecer a síndrome coronariana aguda. O sintoma clássico é o desconforto subesternal vago, às vezes descrito como uma pressão ou aperto, geralmente irradiado para o braço esquerdo, o pescoço ou a mandíbula. Pode estar associado a respiração curta, náuseas, vômitos, palpitação ou sudorese. Os sintomas da angina costumam durar menos de 15 minutos, enquanto no infarto agudo do miocárdio duram mais de 15 minutos. Alguns pacientes, principalmente idosos, mulheres ou diabéticos, podem apresentar sintomas atípicos ao invés da descrição clássica da dor torácica. O socorrista leigo que presencia uma vítima com dor torácica deve: reconhecer os sinais e sintomas da síndrome coronariana aguda; manter a vítima em repouso, sentada ou deitada; e se o desconforto durar cinco minutos ou mais, deve ser ativado o sistema de serviço médico de emergência. Após ativação do sistema de serviço médico de emergência, o socorrista deve permanecer ao lado da vítima; no caso de perda de consciência, avaliar a necessidade de respiração de resgate, compressão torácica e uso do desfibrilador externo automático, se disponível. A ativação precoce do sistema de serviço médico de emergência permite o envio de ambulância de suporte básico ou avançado, conforme necessário, além de fornecer orientações sobre o uso de nitroglicerina e aspirina. O Sistema pode fornecer orientações para socorristas previamente treinados ou também sem treinamento anterior (ensinar compressão torácica apenas, no meio do tórax da vítima). A disponibilidade e o papel que o sistema de serviço médico de emergência representa variam nas diversas regiões. Cada comunidade deve adaptar essas recomendações a sua realidade, enquanto os serviços de Saúde devem se empenhar para fortalecer essa etapa do atendimento. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 215 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL: COMO RECONHECER PRECOCEMENTE E COMO AGIR A nova terapêutica fibrinolítica permite limitar a lesão neurológica e melhorar o prognóstico do acidente vascular cerebral isquêmico. A terapêutica fibrinolítica endovenosa deve ser considerada para todos os pacientes que se apresentem no hospital até três horas do início de sinais e sintomas compatíveis com acidente vascular isquêmico. Da mesma forma que nas síndromes coronarianas agudas, o socorrista leigo deve ser treinado a reconhecer precocemente e ativar o sistema do serviço médico de emergência a fim de transportar rapidamente a vítima de acidente vascular cerebral para o hospital. As manifestações iniciais podem ser repentinas e podem incluir paralisia facial, alteração da fala, alteração do nível de consciência, perda de força ou sensibilidade em membros ou face, convulsão, alteração de equilíbrio e perda de visão. Uma vez detectada qualquer dessas alterações, imediatamente deve ser ativado o sistema de serviço médico de emergência. O socorrista presente à cena deve avaliar a vítima e realizar ressuscitação cardiopulmonar, se indicado, e a vítima deve ser transportada para o hospital o mais rápido possível. O hospital deve ser avisado antecipadamente da chegada de paciente com suspeita de acidente vascular cerebral, a fim de agilizar sua admissão no setor de emergência e a realização da tomografia computadorizada, que irá confirmar ou não o diagnóstico de acidente vascular isquêmico. Com esses dados disponíveis, os pacientes que preenchem os critérios para terapia fibrinolítica recebem a droga endovenosa. Se, por um lado, existe um limite de tempo para a ação benéfica da terapia fibrinolítica, por outro lado existem muitas etapas sujeitas a demora tanto antes do paciente chegar ao hospital como dentro do ambiente hospitalar. Fica, portanto, evidente a importância do treinamento da população leiga e da ação integrada dos serviços pré-hospitalares e hospitalares. SEQÜÊNCIA DO SUPORTE BÁSICO DE VIDA(1) Para padronizar o atendimento do suporte básico de vida, usaremos o termo vítima adulta para as vítimas com mais de 8 anos de idade. O suporte básico de vida consiste de vários passos e manobras feitos seqüencialmente, que 216 incluem uma avaliação e uma intervenção em cada fase da ressuscitação cardiopulmonar. Cada passo começa com uma avaliação: A) abertura das vias aéreas (avaliação e posicionamento correto das vias aéreas); B) boca-aboca (avaliação dos movimentos respiratórios; na ausência destes, realização da respiração de resgate); C) circulação (avaliação de sinais de circulação; se indicado, realização de compressões torácicas). Nos Estados Unidos, o sistema de serviço médico de emergência é ativado quando uma vítima é encontrada inconsciente. Em outros países, a recomendação pode ser diferente, ativando o sistema de serviço médico de emergência quando a vítima está inconsciente e sem respirar ou sem pulso. Avaliação do nível de consciência Após ter certeza de que o local está seguro, o socorrista deve se aproximar da vítima e rapidamente avaliar a presença de qualquer trauma e determinar se a pessoa está respondendo, batendo e agitando gentilmente os ombros da vítima e gritar: “Você está bem?”. Se há suspeita de trauma, o socorrista deve mover a vítima somente se necessário, pois qualquer movimento inadequado pode causar lesão medular. Ativar o sistema de serviço médico de emergência Quando a vítima se encontra inconsciente, deve ser ativado o serviço médico de emergência e também deve ser solicitado um desfibrilador externo automático. Ativar o serviço médico de emergência significa telefonar para o número de emergência local (pronto-socorro próximo, serviço de atendimento médico domiciliar, bombeiros, etc.). Esse número deve ser largamente divulgado na comunidade. A pessoa que chama o serviço médico de emergência deve estar apta a fornecer os seguintes dados: 1) Localização — endereço completo e pontos de referência. 2) Telefone do local. 3) O que aconteceu — acidente automobilístico, ataque cardíaco, etc. 4) Quantas pessoas necessitam de atendimento. 5) Condições das vítimas. 6) O que está sendo feito para as vítimas. 7) Outras informações solicitadas pelo pessoal do serviço médico de emergência. Vias aéreas Para que a avaliação e a ressuscitação se- Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida jam eficazes, a vítima deve estar em decúbito dorsal, sobre uma superfície plana e rígida. Se a vítima estiver com a face voltada para o chão, role-a como uma unidade (em bloco); assim, a cabeça, o pescoço, os ombros e o tronco serão movidos sem torção. Todo o corpo da vítima deve estar em um mesmo plano, com os braços ao longo do corpo. O socorrista deve estar ao lado da vítima, posicionado para fazer respirações e compressões torácicas (a altura dos ombros da vítima é ideal). É importante lembrar que a língua é a causa mais comum de obstrução das vias aéreas em uma vítima inconsciente, uma vez que está presa na parte posterior da mandíbula. Quando a mandíbula é movida para a frente, a língua é levantada, liberando a parte de trás da faringe, permitindo a passagem de ar. Se não há evidência de trauma craniano ou cervical, o socorrista deve usar a manobra de inclinação da cabeça/elevação do queixo (descrito a seguir) para abrir a via aérea, remover qualquer material/vômitos da boca e secar os líquidos com os dedos protegidos por luvas ou panos. O socorrista deve tirar qualquer substância da boca da vítima, enquanto mantém a via aérea aberta com a outra mão. Inclinação da cabeça/elevação do queixo Para fazer a manobra de abertura das vias aéreas, o socorrista deve colocar uma das mãos firmemente sobre a testa da vítima e inclinar a cabeça para trás. Simultaneamente, colocar o segundo e o terceiro dedos da outra mão na parte óssea do queixo e realizar movimento de elevação do queixo (Fig. 1). Figura 1. Manobra de abertura de via aérea: inclinação da cabeça/elevação do queixo. Tração da mandíbula O socorrista deve colocar as mãos, uma de cada lado da cabeça da vítima, apoiando seus cotovelos na superfície em que a vítima está deitada. Segurar firmemente no ângulo inferior da mandíbula e levantar ambos os lados. Se os lábios se fecharem, abri-los com os polegares. Se a respiração boca-a-boca for necessária, manter a tração da mandíbula e fechar as narinas da vítima, colocando sua face contra elas. Essa técnica é muito eficaz para abrir as vias aéreas, porém tecnicamente difícil e cansativa para o socorrista, sendo a mais segura para uma abordagem inicial de uma vítima com suspeita de trauma cervical. O socorrista deve se lembrar de apoiar a cabeça sem movê-la para os lados ou para trás. Respiração Para avaliar a respiração, o socorrista deve colocar seu ouvido próximo à boca/nariz da vítima, enquanto mantém a via aérea aberta. Assim, enquanto observa o tórax da vítima, o socorrista deve: (1) ver se o tórax da vítima se eleva, (2) ouvir se há ruído de ar durante a respiração, e (3) sentir se há fluxo de ar. Se não há elevação do tórax e não há fluxo de ar, a vítima não está respirando. Essa avaliação não deve durar mais que 10 segundos. A ausência ou respiração inadequada (sinais de obstrução das vias aéreas, “gasping”, etc.) requer a realização da respiração de resgate. Posição de recuperação Se a vítima estiver respirando e apresentar sinais de circulação (pulso, respiração normal, tosse ou movimentos) durante ou após a ressuscitação, o socorrista deve manter as vias aéreas abertas e colocar a vítima em posição de recuperação. A posição de recuperação é usada para vítimas inconscientes, com respiração e sinais de circulação. Se uma vítima inconsciente permanecer em decúbito dorsal e respirando espontaneamente, as vias aéreas podem ficar obstruídas com secreção, vômitos ou com a língua. Esse problema pode ser resolvido quando colocamos a vítima de lado, facilitando a drenagem de líquidos pela boca. Não há uma posição perfeita para todas as vítimas. Ao decidir em que posição colocar a vítima, leve em consideração: 1. A vítima deve estar o mais próximo possível do decúbito lateral, permitindo a drenagem dos líquidos pela boca. 2. A posição deve ser estável. 3. Não deve haver pressão sobre o tórax a pon- Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 217 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida to de impedir a respiração. 4. Deve ser possível colocá-la de lado e de costas com facilidade e segurança, sem trauma cervical. 5. Deve ser possível a observação e a avaliação das vias aéreas. 6. A posição não deve causar dano à vítima. Respiração de resgate: respiração boca-a-boca Quando a vítima não apresenta respiração efetiva, devem ser iniciadas as respirações de resgate. A palma de uma das mãos deve ser mantida sobre a testa da vítima e as narinas da vítima devem ser ocluídas com o polegar e o dedo indicador, o que evitará que o ar saia. O socorrista realiza uma inspiração profunda, sela sua boca ao redor da boca da vítima e promove duas respirações lentas efetivas, de aproxima- Figura 2. Respiração boca-a-boca. damente dois segundos, observando a elevação do tórax da vítima durante a respiração. A freqüência usada quando apenas a respiração é necessária é de 10 a 12 por minuto (Fig. 2). A fim de reduzir o risco da distensão gástrica e suas complicações, é recomendado que o volume ofertado seja de aproximadamente 10 ml/kg (700 ml a 1.000 ml) em dois segundos, por ventilação. Se as tentativas iniciais de respiração forem frustradas, o socorrista deve reposicionar a cabeça da vítima e tentar novamente; a abertura inadequada da via aérea é a principal causa de dificuldade para ventilar a vítima. Se a vítima não puder ser ventilada mesmo após o reposicionamento da cabeça, deve-se suspeitar de obstru- 218 ção da via aérea por corpo estranho. O profissional de saúde (não o socorrista leigo) deve iniciar a manobra de desobstrução da via aérea (descrita a seguir). Respiração boca-nariz A respiração boca-nariz é o método recomendado quando a respiração boca-a-boca for impossível (trisma, trauma bucal ou selo boca-aboca ineficaz). Pode ser recomendada para vítimas de submersão, pois o socorrista pode iniciar a respiração tão logo a cabeça da vítima esteja fora da água. Para realizar a respiração boca-nariz, o socorrista deve inclinar a cabeça da vítima para trás com uma das mãos na testa e a outra na mandíbula (como na manobra de inclinação da cabeça/elevação do queixo) e fechar a boca da vítima. Respirar profundamente, selar seus lábios ao redor do nariz da vítima e expirar para dentro do nariz, então remover os lábios e permitir a expiração passiva, podendo ser necessário abrir os lábios da vítima com os polegares. Respiração boca-estoma Quando uma pessoa traqueostomizada precisa de respiração de resgate, deve ser feita a ventilação boca-estoma. Para executá-la, o socorrista deve colocar seus lábios ao redor do estoma formando um selo, soprar o ar até que ocorra expansão torácica e remover a boca para que ocorra a exalação passiva. Uma cânula de traqueostomia pode estar presente no estoma, que deve estar pérvio para que as ventilações possam ser realizadas. Se a cânula não estiver pérvia e não for possível aspirar a secreção ou desfazer a obstrução, a cânula deve ser removida e outra deve ser colocada. Se não há outra cânula disponível e a vítima necessita de respirações de resgate, o socorrista deve fazer a respiração diretamente no estoma. Respiração boca-barreira O uso de barreiras deve ser encorajado quando se faz ressuscitação cardiopulmonar fora do ambiente doméstico. Há dois tipos de barreiras disponíveis: máscaras e lenços faciais. As máscaras, normalmente, possuem uma válvula unidirecional que impede que o ar expirado entre na boca do socorrista. Os lenços faciais não possuem válvulas e o ar expirado sai entre o lenço e a face da vítima. Os dispositivos de barreira devem ter baixa resistência ao fluxo de ar para permitir a ventilação. Para a respiração boca-máscara, é usada uma máscara transparente com ou sem válvula unidirecional. A válvula permite o direcionamento Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida do ar mandado pelo socorrista, enquanto mantém o ar exalado fora do contato com o socorrista. Algumas possuem entrada para oxigênio, permitindo oferta de oxigênio suplementar. Se houver oxigênio suplementar, o volume total ofertado será de 6 ml/kg a 7 ml/kg (400 ml a 600 ml). Esse volume mantém a oxigenação sanguínea e diminui o risco de distensão gástrica. A ventilação com máscara é particularmente efetiva, pois permite que o socorrista use as duas mãos para fazer o selo da máscara com a face da vítima. Há duas formas de realizar respiração boca-máscara: 1. Técnica cefálica: o socorrista fica acima da cabeça da vítima. Pode ser usada por um socorrista quando a vítima está em parada respiratória, durante a ressuscitação com dois socorristas, e também facilita a manobra de tração mandibular, pois o socorrista está voltado para o tórax da vítima. 2. Técnica lateral: o socorrista fica ao lado da vítima e usa a elevação da cabeça-inclina- Figura 3. Respiração boca-máscara. ção do queixo. É ideal para ressuscitação com um socorrista, pois o socorrista mantém a mesma posição para fazer as respirações e as compressões torácicas (Fig. 3). Bolsa-máscara O dispositivo bolsa-máscara é usado no atendimento pré-hospitalar. Esse dispositivo é o método mais utilizado no pré- e no intra-hospitalar para promover ventilação com pressão positiva. A maioria das unidades disponíveis comercialmente tem o volume de aproximadamente 1.600 ml, o qual normalmente é adequado para insuflar o pulmão. A bolsa-máscara é mais eficiente quando usada por dois socorristas treinados e experientes: enquanto um faz o selo o outro aperta a bolsa. Se houver apenas um socorrista, coloquese acima da cabeça da vítima. Se não há certeza sobre trauma cervical, eleve a cabeça da vítima e coloque um apoio sob ela (travesseiro ou toalha) para atingir a posição de “cheirar”. Coloque a máscara sobre o nariz, seus dedos indicador e polegar sobre a máscara e os demais abaixo da mandíbula; com a outra mão, pressione a bolsa, observando a expansão torácica. A ventilação será mais efetiva se realizada por dois socorristas: um socorrista segura a máscara e o outro pressiona a bolsa. Se um terceiro socorrista estiver disponível, pode fazer pressão cricóide. A técnica de pressão cricóide consiste em aplicar pressão sobre a cartilagem cricóide da vítima, empurrando a parte posterior da traquéia sobre o esôfago durante as respirações de resgate. É utilizada para diminuir o risco de distensão gástrica e conseqüente aspiração. Deve ser usada apenas em vítimas inconscientes, por profissionais de saúde treinados, e requer um socorrista a mais no local. Circulação Estudos recentes demonstraram a dificuldade de socorristas leigos em determinar a presença ou não de pulso em vítimas inconscientes (3). A fim de evitar atraso na ressuscitação, passou-se a recomendar verificação dos sinais de circulação para socorristas leigos ao invés de avaliação do pulso. Isso significa que, após oferecer as ventilações iniciais, deve-se procurar por respiração normal, tosse ou movimentos como resposta às ventilações. O socorrista deve ver, ouvir e sentir a respiração enquanto procura por movimentos. Ensina-se procurar por respiração normal para não haver confusão com respiração agônica. Para profissionais de saúde, acrescenta-se a verificação do pulso enquanto se procura por outros sinais de circulação, como tosse, movimentos e respiração. Essa avaliação não deve demorar mais de dez segundos. O profissional de saúde deve verificar o pulso enquanto procura por sinais de circulação. Se não estiver certo da presença de pulso, deve iniciar imediatamente as compressões torácicas. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 219 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida 220 Para verificar o pulso em vítimas com mais de um ano de idade, deve-se palpar a artéria carótida do mesmo lado que o socorrista se encontra. Compressões torácicas Dados de estudos em animais e humanos demonstram que com o ritmo de 80 compressões por minuto obtém-se bom fluxo sanguíneo durante a ressuscitação. Por essa razão, recomenda-se que o ritmo de compressões torácicas seja de 100 por minuto. Prefere-se velocidade e não o número de compressões. A velocidade de 100 compressões por minuto resultará em menos que isso, principalmente quando feita por um socorrista que interrompe as compressões para fazer a respiração. A recomendação anterior para adultos era de 15 compressões e duas ventilações para um socorrista e 5 compressões e uma ventilação para dois socorristas. A recomendação atual é de 15 compressões e duas ventilações para um e dois socorristas, pois, dessa forma, obtêm-se mais compressões por minuto, uma vez que a qualidade das compressões e das ventilações não é afetada pela freqüência. Durante a parada cardíaca, a pressão de perfusão coronariana aumenta gradualmente com as compressões torácicas, sendo mais elevada após 15 compressões se comparada a 5 compressões. Essa recomendação é para socorristas leigos e para profissionais de saúde. Após a via aérea ser estabelecida (intubação orotraqueal), a ressuscitação pode ser sem sincronia, com a freqüência de 5:1. O posicionamento adequado das mãos é estabelecido quando identificada a metade inferior do esterno. A seguir estão descritas recomendações que podem ser utilizadas: 1. Com seus dedos, localizar o rebordo costal da vítima (do lado que você está). 2. Deslizar os dedos para cima do rebordo costal até encontrar o apêndice xifóide. 3. Colocar a parte inferior de uma das mãos na parte inferior do esterno e a outra mão por cima desta. Certificar-se de que o áxis de sua mão está sobre o áxis do esterno. Isso manterá a força da compressão sobre o osso e diminuirá a chance de fratura de costela. Não faça as compressões sobre a base inferior do esterno. 4. Manter os dedos estendidos ou entrelaçados e afastados do tórax (Fig. 4). Outro método utilizado para localização das mãos é colocar a base de uma das mãos sobre a outra no centro do esterno entre os mamilos. Esse método é usado pelos “despachantes” americanos há mais de dez anos. Para compressões efetivas, devem ser seguidas as seguintes orientações: 1. Com os braços estendidos, travar os cotovelos e posicionar os ombros perpendicularmente às mãos. Dessa forma, cada compressão será diretamente sobre o esterno. 2. Comprimir o esterno de um terço a metade do diâmetro ântero-posterior do tórax da vítima. A compressão ideal do esterno gera pulso carotídeo ou femoral (para ser checado, é necessário um segundo socorrista). 3. Descomprimir o tórax, até que o tórax volte à posição normal, para que o sangue possa circular pelo coração. Isso deve ser feito a cada compressão, mantendo as mãos em contato com a vítima no mesmo local. 4. A efetiva perfusão coronariana e cerebral ocorre quando as fases de compressão e relaxamento são iguais, ou seja, 50% do tempo para cada fase. Os socorristas conseguem essa freqüência com facilidade. 5. As mãos devem ser mantidas na mesma posição, não devem ser movidas ou levantadas durante as compressões, mas deve-se permitir que o tórax volte à posição normal após cada compressão. As respirações de resgate e as compressões torácicas devem ser combinadas para uma ressuscitação eficaz. Durante a ressuscitação, a compressão car- Figura 4. Compressões torácicas. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida díaca adequadamente realizada pode gerar pressão arterial sistólica de 60 mmHg a 80 mmHg, mas a pressão diastólica é muito baixa. O débito cardíaco gerado na compressão torácica não ultrapassa um terço do normal e diminui quando a ressuscitação se prolonga. Para otimizar o fluxo sanguíneo, recomenda-se que, durante a ressuscitação, a força e o ritmo das compressões sejam mantidos. Compressões torácicas sem respirações de resgate(4) Sabe-se que a respiração de resgate é uma técnica segura e eficaz, que tem salvo muitas vidas. Algumas publicações, porém, têm demonstrado certa relutância dos socorristas em realizar a respiração boca-a-boca em vítimas desconhecidas, por medo de contrair doença infecciosa. As evidências demonstram que a evolução de pacientes que receberam apenas compressões torácicas sem as ventilações é melhor que quando não são realizadas manobras de ressuscitação em vítima com parada cardíaca. Alguns estudos em animais e humanos sugerem que a ventilação com pressão positiva não é necessária nos primeiros seis a doze minutos de parada. Outros demonstram que o “gasping” pode manter os parâmetros ventilatórios próximos do normal na ressuscitação sem ventilação com pressão positiva, pois o débito cardíaco cai para 25% do normal, diminuindo a necessidade ventilatória para manter ótima relação ventilação/perfusão. Portanto, a compressão cardíaca sem ventilação é recomendada apenas nos seguintes casos: — quando o socorrista treinado não pode ou não quer fazer as ventilações; — quando o socorrista não-treinado recebe orientações telefônicas simplificadas. Desfibrilação Na maioria dos adultos com parada cardíaca súbita não-traumática, o ritmo mais freqüente é a fibrilação ventricular. Por essa razão, o tempo entre o colapso e a desfibrilação é determinante para a sobrevivência. A sobrevivência de uma parada cardíaca por fibrilação cai de 7% a 10% por minuto sem desfibrilação. Portanto, os profissionais de saúde devem estar aptos e equipados para promover a desfibrilação o mais rápido possível em vítimas de morte súbita. A desfibrilação precoce também deve ser feita nos hospitais e ambulatórios; portanto, todo o pessoal responsável pela atendimento de emergência deve estar apto a usar o desfibrilador em vítimas de parada cardíaca por fibrilação dentro de três minutos do colapso. Para atingir esse objetivo, todos devem estar treinados e familiarizados com o desfibrilador de sua área. Reavaliação Após quatro ciclos de 15 compressões e duas ventilações, verificam-se sinais de circulação (por 10 segundos). Se não houver sinais de circulação, reiniciar a ressuscitação pelas compressões torácicas; se houver sinais de circulação, avaliar a respiração. — Se a respiração estiver presente, colocar a vítima em posição de recuperação, monitorando a respiração e a circulação. — Se a respiração estiver ausente, mas com sinais de circulação, promover respiração de resgate, uma ventilação a cada 4 a 5 segundos (de 10 a 12 por minuto) e monitorar os sinais de circulação de tempos em tempos. — Se não houver sinais de circulação, continuar a ressuscitação. — Parar para verificar sinais de circulação a cada poucos minutos. — A ressuscitação não deve ser interrompida, exceto em situações específicas. — Quando houver sinais de circulação e ventilação espontânea adequada, colocar a vítima em posição de recuperação, mantendo a abertura da via aérea. Ressuscitação cardiopulmonar com dois socorristas Todas as pessoas que prestam atendimento de emergência, seja por profissão ou por ocupar cargo que exija treinamento em emergência, devem ser treinadas para realizar a ressuscitação com um e com dois socorristas; quando possível, deve ser acrescentado treinamento com barreiras e máscara. Na ressuscitação com dois socorristas, um deles deve se posicionar ao lado da vítima e realizar as compressões torácicas; o outro socorrista deve se colocar na altura da cabeça da vítima, manter as vias aéreas abertas, realizar as respirações de resgate e monitorar o pulso carotídeo. As compressões torácicas devem ser feitas na freqüência de 100 por minuto e a relação deve ser de 15 compressões para cada duas ventilações. Quando o socorrista que está fazendo as compressões torácicas ficar cansado, os socorristas devem mudar de posição, porém a interrupção das manobras deve ser a menor possível. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 221 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida 222 Desobstrução das vias aéreas por corpo estranho A completa obstrução das vias aéreas pode resultar em morte se não for tratada em poucos minutos. A causa mais comum de obstrução das vias aéreas superiores é a língua durante a perda da consciência e parada cardiopulmonar. Uma vítima inconsciente pode desenvolver obstrução da via aérea por causa intrínseca (língua e epiglote) e por causa extrínseca (corpo estranho). A língua pode cair para trás e obstruir a faringe; a epiglote pode bloquear a entrada da via aérea, na vítima inconsciente. Vítimas de trauma facial podem apresentar sangramento e coágulos podem obstruir a via aérea. A obstrução de via aérea por corpo estranho é relativamente rara e é uma causa pouco comum de morte. Não é comum em casos de afogamento, pois a água não causa obstrução da via aérea; portanto, a manobra de desobstrução da via aérea não é usada em vítimas de afogamento. A obstrução de via aérea por corpo estranho deve ser considerada causa de parada cardiopulmonar em qualquer vítima, especialmente crianças que subitamente param de respirar, ficam cianóticas e perdem a consciência sem causa aparente. Em adultos, normalmente, a obstrução de via aérea por corpo estranho ocorre durante a alimentação e a carne é a causa mais freqüente. Entre os fatores associados à obstrução de via aérea por corpo estranho estão as tentativas de ingerir grandes pedaços de comida, elevado teor de álcool e uso de dentadura. O corpo estranho na via aérea pode causar obstrução parcial ou total. Se a obstrução for parcial, a vítima será capaz de fazer a troca de ar, que pode ser boa ou má, dependendo do grau de obstrução. Com boa troca de ar a vítima está consciente e consegue tossir fortemente, embora algumas vezes pode-se ouvir um ruído entre as respirações. Enquanto existir boa troca de ar, encoraja-se a vítima a tossir e o socorrista não deve interferir, mas manter-se atento caso seja necessária alguma atitude. Se a obstrução persistir, o serviço médico de emergência deve ser ativado. Algumas vítimas de obstrução de via aérea por corpo estranho podem apresentar má troca de ar, imediatamente, ou, inicialmente, boa troca de ar progredindo para má troca de ar. Os sinais de má troca de ar incluem fraqueza, tosse ineficaz, batimento de asa de nariz durante a respiração, aumento da dificuldade respiratória Figura 5. Sinal universal de engasgo. e cianose. Trata-se a pessoa com obstrução parcial das vias aéreas e má troca de ar como uma obstrução completa — a ação deve ser imediata. A completa obstrução das vias aéreas não permite que a pessoa fale, respire ou tussa. Ela ainda pode estar com as mãos ao redor do pescoço. Não há passagem de ar. O público deve ser encorajado a usar o sinal universal de dificuldade respiratória quando se encontra engasgado (Fig. 5). O socorrista deve perguntar à vítima se ela pode falar; caso a vítima não possa falar, isso indica completa obstrução das vias aéreas e o socorrista deve agir imediatamente. Recomenda-se que socorristas leigos usem a manobra de Heimlich (pressão subdiafragmática ou pressão abdominal) para desobstruir as vias aéreas de uma vítima consciente a partir de um ano de idade, não sendo recomendada para bebês. Também é recomendada quando usada por profissionais de saúde em vítimas inconscientes (adultos e crianças, mas não em bebês). A manobra de Heimlich por meio de pressão abdominal eleva o diafragma, aumentando a pressão do ar, forçando-o para fora dos pulmões, que pode ser suficiente para criar tosse artificial, e expelir o corpo estranho das vias aéreas. O sucesso do uso da manobra já foi relatado pela imprensa pública e médica. Entretanto, o uso da manobra de Heimlich pode causar complicações, como rompimento de órgãos internos, e não deve ser usada se não for realmente necessá- Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida ria. Portanto, toda vítima que necessite dessa manobra deve ser avaliada, posteriormente, por um médico. Para minimizar a possibilidade de trauma, a mão não deve ser colocada sobre o processo xifóide ou nas bordas das costelas. As mãos devem estar abaixo dessas estruturas, porém acima da cicatriz umbilical e na linha mediana. Mesmo quando realizada corretamente, a manobra de Heimlich pode acarretar regurgitação e conseqüente aspiração. Manobra de Heimlich em vítima consciente sentada ou em pé O socorrista deve ficar atrás da vítima, passar seus braços ao redor do abdome e proceder como se segue: — Fechar uma das mãos em forma de punho. — Colocar o lado do polegar contra o abdome da vítima, na linha mediana acima da cicatriz umbilical e abaixo do processo xifóide. — Colocar a outra mão sobre a que está fechada, e pressioná-las contra o abdome da vítima em movimentos rápidos para dentro e para cima. — Repetir as compressões abdominais até que o corpo estranho seja expelido ou a vítima se torne inconsciente. Deve haver um intervalo entre as compressões, pois cada movimento deve ser feito distinto e separadamente um do outro. Quando a vítima se torna inconsciente, o sistema de emergência deve ser acionado. Se o socorrista for leigo, a orientação atual é que se inicie a ressuscitação cardiopulmonar, uma vez que as manobras descritas a seguir são muito complexas e de baixa retenção pelo aluno leigo. Cada vez que a via aérea for aberta (durante os ciclos da ressuscitação), porém, deve-se procurar por algum objeto na garganta e removê-lo, caso seja visualizado. As compressões torácicas da ressuscitação cardiopulmonar, na prática, podem servir como manobra de desobstrução de via aérea. Se o socorrista for um profissional de saúde, deve passar para a seqüência de desobstrução das vias aéreas da vítima inconsciente (descrita a seguir). Compressões torácicas em vítimas obesas e mulheres grávidas A pressão torácica pode ser uma alternativa para vítimas em estágio final de gravidez ou muito obesas, em substituição à manobra de Heimlich. O socorrista deve: — Ficar atrás da vítima com os braços sob as axilas e abraçar o tórax. — Colocar a região do polegar de uma das mãos em forma de punho na linha mediana sobre o esterno, com cuidado para não apoiar so- bre o processo xifóide ou arco costal. — Colocar a outra mão sobre a primeira e pressionar o tórax até que o corpo estranho seja expelido ou a vítima fique inconsciente. — Se não conseguir abraçar o tórax da vítima, podem ser realizadas compressões torácicas com a vítima em decúbito dorsal (o socorrista posiciona-se a seu lado; a posição das mãos é a mesma das compressões torácicas na ressuscitação). Varredura digital e elevação mandíbula-língua A varredura digital deve ser usada somente por profissionais de saúde, em vítimas inconscientes. Jamais deve ser utilizada em vítimas conscientes ou em crise convulsiva. O socorrista deve posicionar a vítima com o rosto para cima e proceder aos passos descritos a seguir. — Abrir a boca da vítima, segurar a língua e a mandíbula entre seus dedos polegar e indicador, e puxar a língua para a frente da faringe, onde o corpo estranho pode estar alojado (essa manobra pode, por si só, desobstruir a via aérea). — Colocar o dedo indicador da outra mão dentro da boca da vítima e percorrer as bochechas e a faringe (até a base da língua). Usar o dedo em forma de gancho, seja para remover o corpo estranho ou para pressioná-lo contra o lado oposto à faringe, e puxá-lo para fora. Deve-se tomar muito cuidado para não empurrar o objeto para dentro da faringe. Desobstrução da via aérea por corpo estranho em vítimas inconscientes — profissionais de saúde As vítimas de obstrução de via aérea por corpo estranho podem estar conscientes quando encontradas pelos socorristas e ficar inconscientes; nessa circunstância, o socorrista saberá a causa dos sintomas. Algumas vezes o socorrista pode encontrar a vítima inconsciente e só saberá que se trata de obstrução de via aérea por corpo estranho após a tentativa de ventilação sem sucesso. Se o socorrista souber que a perda de consciência é decorrente de obstrução de via aérea por corpo estranho, recomenda-se a seqüência: 1. Ativar o Sistema de Emergência. Se houver um segundo socorrista, este deve acionar o Sistema de Emergência enquanto o primeiro atende a vítima. Coloque a vítima em decúbito dorsal. 2. Fazer elevação língua-mandíbula, seguida de varredura digital para remover o corpo estranho. 3. Abrir a via aérea e tentar ventilar; se o tórax Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 223 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida 224 da vítima não se expandir, a cabeça deve ser reposicionada e deve ser feita nova tentativa de ventilação. 4. Se não conseguir ventilações efetivas mesmo após reposicionamento da cabeça, o socorrista deve suspeitar de obstrução de via aérea por corpo estranho. 5. O socorrista deve se posicionar “a cavalo” sobre as coxas da vítima e realizar cinco compressões abdominais (manobra de Heimlich). 6. A seqüência elevar língua-mandíbula, varredura digital, tentativas de ventilação e manobras de Heimlich deve ser feita até que a via aérea seja liberada (ventilação efetiva com expansão do tórax) ou até que esteja disponível suporte avançado (pinça Kelly ou Magil ou cricotirotomia). 7. Se a via aérea for liberada, o socorrista deve verificar a respiração. Se a vítima não estiver respirando, promover as respirações de resgate, após verificar os sinais de circulação. Se não houver sinais de circulação, iniciar as compressões torácicas. Para realizar as compressões abdominais em uma vítima inconsciente, o socorrista deve ajoelhar-se sobre as coxas da vítima e colocar a base de uma das mãos contra o abdome da vítima, sobre a linha mediana acima da cicatriz umbilical e bem abaixo do processo xifóide. Colocar a outra mão diretamente sobre a primeira, e pressionar as mãos contra o abdome em movimentos rápidos para dentro e para cima do abdome. O uso de pinças (Magil ou Kelly) para remover corpo estranho é permitido apenas se este estiver visível, podendo ser utilizadas lanternas e laringoscópios para visualização direta do objeto. A cricotirotomia deve ser feita apenas por profissionais treinados e autorizados a procedimentos cirúrgicos. Profissionais de saúde — desobstrução das vias aéreas por corpo estranho quando a vítima é encontrada inconsciente Se a vítima for encontrada inconsciente, a recomendação é a seguinte: 1. Ativar o Sistema de Emergência. Se um segundo socorrista estiver presente, este deve ativar o Sistema enquanto o primeiro atende a vítima. 2. Abrir a via aérea e tentar ventilar com as respirações de resgate. Se o tórax não expandir, reposicionar a cabeça e tentar novamente a ventilação. 3. Se a vítima não for ventilada adequadamente, mesmo após o reposicionamento da cabeça, o socorrista deve ajoelhar-se sobre as coxas da vítima e realizar a manobra de Heimlich (5 compressões abdominais, como descrito anteriormente). 4. Após as 5 compressões abdominais, o socorrista deve abrir a via aérea usando a elevação da língua-mandíbula e fazer a varredura digital para remover o objeto. 5. O socorrista deve repetir a seqüência ventilar, manobra de Heimlich, elevação da língua-mandíbula e varredura digital, até que a via aérea seja liberada (objeto removido ou expansão torácica durante a ventilação) ou até que esteja disponível suporte avançado (pinça Magil ou Kelly, cricotirotomia). 6. Se a obstrução for resolvida, o socorrista deve verificar a respiração. Se a vítima não estiver respirando, promover as respirações de resgate, verificando, posteriormente, os sinais de circulação. Se não houver sinais de circulação, iniciar as compressões torácicas. SEGURANÇA DO SOCORRISTA: RISCO DE TRANSMISSÃO DE DOENÇAS No treinamento de ressuscitação cardiopulmonar com manequins, devem ser respeitadas normas de descontaminação dos manequins a fim de minimizar o risco de transmissão de doenças infecto-contagiosas entre as pessoas em treinamento(5). Nos Estados Unidos, até o momento, aproximadamente 70 milhões de pessoas já realizaram treinamento de ressuscitação cardiopulmonar em manequins e não há relato de complicações infecciosas. Alunos que sabidamente estão na vigência de doença infectocontagiosa devem ser convidados a adiar o curso para outra ocasião, após resolução da doença. Quanto à realização de respiração boca-aboca em vítimas reais, até o momento não existem relatos de transmissão de hepatite B ou aids. Nas duas últimas décadas, existem 15 relatos de transmissão de doença durante a ressuscitação cardiopulmonar real. O risco é maior para doenças de transmissão respiratória (Neisseria meningitidis, tuberculose, vírus respiratórios). Sendo assim, qualquer pessoa que tenha realizado respiração boca-a-boca em vítima com doença infecto-contagiosa deve ser tratada como contactante. Sempre que disponível, deve ser utilizada uma barreira na realização das respirações de resgate. Preferencialmente, deve ser utilizada máscara acoplada a bolsa-valva, ou, então, máscaras com filtros e válvula de fluxo unidirecional, ou os lenços faciais como terceira opção, pois são menos eficazes, permitindo contato de secreção entre a vítima e o socorrista. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 FERREIRA AVS e col. Suporte básico de vida BASIC LIFE SUPPORT ADRIANA VADA SOUZA FERREIRA , ELIANA G ARCIA The basic life support includes the early recognition of victims with the first signs and symptoms of acute coronary syndromes, stroke and airway obstruction; includes the cardiopulmonary resuscitation maneuvers and techniques to relieve foreign-body airway obstruction; includes the attempted defibrillation of patients with ventricular fibrillation or ventricular tachycardia with an automated external defibrillator. The basic life support actions serve as the foundation for emergency cardiovascular care throughout the community. Each community should identify weaknesses in its actions and strengthen each step through cardiopulmonary resuscitation programs, automated external defibrillator available and an optimized emergency medical system. Key words: cardiopulmonary resuscitation, heart arrest, life support care. (Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 2001;2:214-25) RSCESP (72594)-1083 REFERÊNCIAS 1. American Heart Association. Guidelines 2000 for Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care. Circulation 2000;102(suppl I):I-22-I-59. 2. Valenzuela TD, Roe DJ, Nichol G, Clark LL, Spaite DW, Hardman RG. Outcomes of rapid defibrillation by security officers after cardiac arrest in casinos. N Engl J Med 2000; 343: 1206-9. 3. Dick WF, Eberle B, Wisser G, Schneider T. The carotid pulse check revisited: what if there is no pulse? Crit Care Med 2000;28(suppl):N183-N185. 4. Kern KB. Cardiopulmonary resuscitation without ventilation. Crit Care Med 2000;28(suppl):N186-N189. 5. The Emergency Cardiac Care Committee of the American Heart Association. Risk of infection during CPR training and rescue: supplemental guidelines. JAMA 1989;262: 2714-5. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo — Vol 11 — No 2 — Março/Abril de 2001 225