Técnicas de reconstrução da linha média nas hérnias

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42º Curso de Atualização em Cirurgia do Aparelho Digestivo, Coloproctologia, Transplante de Órgãos do Aparelho
Digestivo
Técnicas de reconstrução da linha média nas hérnias
ventrais da parede abdominal
Ricardo Z. Abdalla
A
reconstrução da parede abdominal tem sido o termo empregado atualmente
visando a importância conceitual em se criar a condição anatômica para recuperar as múltiplas funções fisiológicas dos músculos que a compõem.
Algumas destas funções, no entanto, estão comprometidas por fatores como
idade, obesidade, hábitos e vícios, tamanho do defeito, perda de substância e doenças associadas que mesmo que a parede abdominal acometida seja recriada a sua
origem, a fisiologia normal do tronco não recuperará totalmente suas propriedades e
atividade normais.
Os grandes defeitos, apesar de sua classificação variada, são assim chamados quando maiores que 7 a 10cm latero laterais e as hérnias recidivantes da parede
anterior ou hérnias ventrais ou hérnias incisionais da linha média ainda carecem de
um consenso entre os cirurgiões. Não há evidencias científicas suficientes para escolha da melhor técnica para tais casos ditos complexos. Apesar de todo rigor exigido
ao avaliar estes doentes a experiência e vivência individual e do grupo cirúrgico faz
diferença na escolha do tratamento e no seu resultado. São situações não raras que
se apresentam como pacientes difíceis, com comorbidades consuptivas para eles e
para o cirurgião e equipe.
Portanto, existe um grupo de pacientes com hérnias gigantes, recidivantes,
obesos, diabéticos, predispostos a infecções, imunossuprimidos, com vasculopatias
periféricas, isquemia de pele e perda de domicílio do conteúdo abdominal que demandam um planejamento cirúrgico e estratégia terapêutica que vão além do fechamento
de um defeito ou como dizem nossas agências de saúde uma herniorrafia.
A separação de componentes surge como uma terapêutica que usa os conhecimentos da anatomia da parede abdominal, considerando seu suprimento vascular, inervação e conformação músculo esquelética, porções carnosa e tendínea, para poder conter as estruturas da cavidade abdominal e permitir a funcionalidade eficiente do tronco.
O desenvolvimento das próteses, seus materiais e estrutura biomecânica trouxeram muitas mudanças ainda em atividade. Pesquisas no processo de cicatrização
e o uso de medicação sistêmica para auxiliar na terapêutica cirúrgica influenciam
positivamente a correção e entendimento das hérnias incisionais. A escolha do método, das próteses, seus tamanhos, fixações e reconstrução possível são muitas vezes
decididos no per operatório, o que dificulta rotina e pode causar aumento de custos.
Ao mesmo tempo uma decisão favorável no momento cirúrgico economiza a saúde do
paciente e o financeiro da administração.
Gastrão 2015
Anais do Gastrão 2015 p.188
42º Curso de Atualização em Cirurgia do Aparelho Digestivo, Coloproctologia, Transplante de Órgãos do Aparelho
Digestivo
Neste universo a soltura de elementos anatômicos, agrupados nos estojos
musculares da parede abdominal, no seu centro e lateral esquerdo e direito, permite
a medialização dos mm retos abdominais e a ressutura da linha alba na sua posição
de origem, sem causar tensão sobre a sutura, mas lembrando que pode alterar a
circunferência abdominal. O método pode ser feito por via aberta ou laparoscópica,
com ou sem assistência robótica dependendo da condição do serviço. Em comentário
recente, um estudioso de hérnia e parede abdominal, Prof Schumpelick falou no 1º
Congresso Mundial em Milão que “devido a tecnologia nós passamos da operação
aberta, por via anterior da parede abdominal para a operação fechada, videolaparoscópica olhando a parede por dentro e agora estamos dentro da parede, entre suas
camadas, como se esta fosse uma cavidade própria e individualizada”.
A vídeo cirurgia nos mostrou uma anatomia pela sua face escondida, expondo
estruturas de uma maneira nova, com imagem em espelho permitindo manuseio mais
direto, sem alterar outros tecidos como pele e subcutâneo diminuindo eventos adversos na ferida operatória de 18 a 31%, como infecção, isquemia e necrose tecidual.
Este manuscrito trata do tema de forma ampla e mostra diferentes alternativas
e aplicações tecnológicas para obtenção do resultado de reconstrução da linha média
com reaproximação da musculatura a partir da sutura e relaxamento de suas fáscias
e tendões.
Técnica de Separação Anatômica de Componentes
Em 1990 Oscar Ramirez propôs sua separação de componentes para tratamento dos grandes defeitos, baseado em incisões relaxadoras que ajudavam na
aproximação mediana dos mm retos. Ramirez descreveu sua técnica como um conjunto muscular complexo a ser reposicionado, mas que conserva sua inervação. Este
conjunto era formado pelos músculos transverso abdominal, oblíquo interno e reto
de cada lado (o m oblíquo externo fica desinserido). O avanço desde bloco muscular
reconstruía a linea alba e permitia o fechamento da cavidade.
O m oblíquo externo é incisado ao nível de sua aponeurose 1cm em paralelo
a linha semilunar, ou seja, a incisão é sobre a aponeurose do m oblíquo externo 1cm
antes de chegar a sua inserção na bainha anterior do m reto abdominal. Esta abertura
vai desde o gradil costal até a ossatura do púbis. A partir daí o m oblíquo externo é delaminado de sua aponeurose anterior até a linha imaginária axilar anterior, permitindo
o avanço da linha média de 4cm de cada lado medialmente, na altura do epigástrio,
8cm no mesogástrio e 3cm no hipogástrio.
Um “segundo tempo” do procedimento de Ramirez, nem sempre necessário, é
feito para ganhar mais 2cm de cada lado, em casos mais extremos: a bainha posterior
do reto é incisada, também do gradil costal até a linha arqueada (de Douglas), onde
termina.
Quando são feitas todas as incisões, portanto, conseguimos 12, 20 e 10cm de
aproximação desde o epigástrio até o púbis.
Ramirez teve muitos problemas de dor, seromas, hematomas e recidivas, ele
não usava telas, o que manteve o procedimento sem uso por muitos anos. Com pequenas modificações e uso de tela a técnica voltou como opção cirúrgica.
Anais do Gastrão 2015 p.189
Gastrão 2015
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Dentre as modificações o uso da vídeo cirurgia para incisar a aponeurose anterior do m oblíquo externo é uma opção na tentativa de diminuir a área de dissecção
e assim suas potenciais complicações.
Separação de Componentes Posterior
Como escrito anteriormente, a separação de componentes proposta por Ramirez, em 1990, mostrou ser dolorosa e tinha índices de recidiva de 32% na técnica
original sem tela. Outras alternativas surgiram, ao redor dessa ideia e a reconstrução
da parede tendendo ao fechamento do defeito e o reforço com tela tornaram-se uma
tendência.
A separação de componentes posterior, proposta por Rosen, Novitsky et col,
traz uma escolha para os pacientes que recidivaram a separação de componentes
anterior. Atualmente o grupo divulga a técnica tanto por via aberta como vídeo cirurgia chamada de Separação de Componentes Posterior com Liberação do Transverso
Abdominal (PCS/TAR).
Por uma laparotomia mediana, as aderências são liberadas e o conteúdo abdominal é separado da parede abdominal. Depois a aponeurose posterior do reto é
incisada 0,5cm da linha média e um amplo espaço retro muscular do m reto é formado
desde o processo xifoide até o espaço de Retzius. Lateralmente este espaço ao atingir a linha semilunar permite reconhecer as fibras do m. transverso e a inervação e
irrigação que vêm lateralmente para suprir o m reto.
Gastrão 2015
Anais do Gastrão 2015 p.190
42º Curso de Atualização em Cirurgia do Aparelho Digestivo, Coloproctologia, Transplante de Órgãos do Aparelho
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O músculo transverso abdominal é, então, incisado com o cuidado de preservar as estruturas neurovasculares, que ficam junto a parede posterior do m reto ao
se atingir o espaço retro m transverso e pré fascial, pré peritoneal. Este espaço pode
ser amplamente criado desde o diafragma cranialmente, o m psoas lateralmente e
a região inguino crural, inferiormente. O saco peritoneal pode então ser suturado na
sua mediana, com sutura de pequenas aberturas, formando uma cavidade integra.
Uma tela é posicionada sobre a sutura desta cavidade, ampla, cobrindo todo o saco,
de uma maneira a reforçar a circunferência peritoneal. As aponeuroses anteriores
dos mm retos é fechada neste momento, as vezes com dificuldade, para recriar a
linea alba. Alguns grupos drenam os espaços descritos e fixam suas telas com pontos
transparietais.
A vídeo cirurgia clássica ou assistida por robô permite todas estas dissecções
e reconstruções de uma maneira a evitar as ocorrências da ferida operatória. São incorporações tecnológicas inquestionáveis e que vieram para ajudar tanto ao paciente
quanto ao médico.
Anais do Gastrão 2015 p.191
Gastrão 2015
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