CEFAC CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA AUDIOLOGIA CLÍNICA EMISSÕES OTOACÚSTICAS E A DETECÇÃO PRECOCE DA DEFICIÊNCIA AUDITIVA EM RECÉM-NASCIDOS Monografia de conclusão do curso de Especialização em Audiologia Clínica Orientadora: Mirian Goldenberg ALESSANDRA JÁCOMO LOYOLA GOIÂNIA 1999 CEFAC (16) CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA (12) AUDIOLOGIA CLÍNICA (14) EMISSÕES OTOACÚSTICAS E A DETECÇÃO (18) PRECOCE DA DEFICIÊNCIA AUDITIVA EM RECÉM-NASCIDOS ALESSANDRA JÁCOMO LOYOLA (14) GOIÂNIA (14) 1999 (14) 2 marido Dedico essa pesquisa ao meu e ao meu filho pela compreensão da ausência e pelo estímulo constante. 3 RESUMO A incidência da surdez em bebês é maior que outras doenças que já são avaliadas na maternidade. Estatísticas indicam que em cada 1000 recém-nascidos, 2 a 6 apresentam algum tipo de perda auditiva. Esta incidência é alta quando comparada com outros teste de Triagem Neonatal. Qualquer recém-nascido pode apresentar um problema auditivo ao nascimento ou adquirí-lo nos primeiros anos de vida. Isso pode ocorrer mesmo quando não haja caso de surdez na família ou fatores de risco de parentes. O diagnóstico após os seis meses de idade, poderá acarretar alterações inaceitáveis ao desenvolvimento global da criança. A avaliação das Emissões Otoacústicas é executada pelo fonoaudiólogo e pode ser realizada no próprio berçário em sono natural ou em clínica especializada. É o mais recente método para detecção de perdas auditivas em neonatos. É um tipo de intervenção não invasiva, rápida e de fácil aplicabilidade. Emissões Otoacústicas são sons provenientes da cóclea - órgão sensorial responsável pela audição - após a apresentação de um estímulo sonoro. O método não tem o objetivo de quantificar a deficiência auditiva, porém detecta a sua ocorrência, visto que as Emissões Otoacústicas estão presente em todas as orelhas funcionalmente normais. Elas deixam de ser observadas quando os limiares auditivos se encontram acima de 30dBNA, ou seja, quando existir qualquer alteração auditiva. 4 SUMMARY The incidence of the deafness in babies is greater that other illnesses that alread are evaluated in the maternity. Statisticians indicate that in each 1000 justbeen born, 2 the 6 present some type of auditory loss. This incidence high when is compared with other test of Neonatal Selection. Any just-born can present na auditory problem to the birth or acquire it in the first years of life. This can occur exactly when it does not have case of deafness in the family or factors of risk of relatives. The diagnosis after the six months of age, will be able to cause unacceptable alterations to the global development of the child. The evaluation of the Otoacústicas Emissions is executed by the fonoaudiólogo and can be carried through in the proper nursery in natural sleep or specialized clinic. It is the most recent method for detention of auditory losses in neonatos. It is a type of not invasive, fast intervention and of easy applicability. Otoacústicas emissions are sounds proceeding from the cóclea - responsible sensorial agency for the hearing. 5 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................................................1 A AUDIÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM.........................................................................................4 PERÍODOS CRÍTICOS..........................................................................8 ANATOMOFISIOLOGIA DA AUDIÇÃO..............................................11 EMISSÕES OTOACÚSTICAS DOS PRODUTOS DE DISTORÇÃO........................................................................................15 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................19 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................................20 ANEXOS 6 INTRODUÇÃO A incidência de deficiência auditiva em neonatos, aparentemente normais, é avaliada em 1:1000, mas cresce drasticamente para 1:50 em recém-nascidos de alto risco. O diagnóstico precoce da deficiência auditiva em crianças é preferencialmente realizada nos primeiros 6 meses de vida, visto que essa deficiência poderá acarretar alterações no processo de aquisição de linguagem e das habilidades cognitivas. Até 1993, a Audiometria de Respostas Elétricas do Tronco Cerebral (BERA) vinha sendo utilizada como triagem auditiva para recém-nascidos. Porém como a maioria das perdas auditivas congênitas e perinatais são de origem coclear, em anos recentes, o estudo das emissões otoacústicas vem sendo usado como o exame de escolha para triagem auditiva em recém-natos, já que este exame avalia especificamente a audição coclear. . O exame das Emissões Otoacústica trata-se de um método objetivo, relativamente simples, rápido, não invasivo, o qual dispensa o uso de eletrodos. Pode ser realizado em qualquer faixa etária, ressaltando–se sua aplicação em recém-nascidos. Geralmente é feito com o bebê em sono pós–prandial, não exigindo sedação como o BERA. A avaliação das Emissões Otoacústicas é executada por fonoaudiólogo e está entrando na rotina de audiologia clínica. As Emissões Otoacústicas foram primeiramente observadas pelo inglês David Kemp, em 1978, o qual as definiu como liberação de energia sonora originada da cóclea , que se propaga pela orelha média, até alcançar o conduto auditivo externo. O registro das ondas sonoras é captada através de uma pequena sonda introduzida no meato acústico externo. Ele pode demonstrar que as Emissões Otoacústicas estão presentes em todos ouvidos funcionalmente normais e que deixam de ser detectadas quando os limiares tonais estiverem acima de 20 –30 dB. O seu recente descobrimento contribuiu substancialmente para a formação de novo conceito sobre a função da cóclea, mostrando que esta não é só capaz de receber sons, mas também de produzir energia acústica (Prost, 1990). Este fenômeno está relacionado ao processo de micromecânica coclear, além do fato de que as Emissões Otoacústicas, ao serem geradas na cóclea, sugere que nesta encontre-se um componente mecanicamente ativo, acoplado à membrana basilar através do qual ocorre o processo reverso de transdução de energia sonora (Lim, 1986). Esta propriedade vem sendo recentemente atribuída às células ciliadas externas (Plinkirt, 1991), e é controlada através das vias auditivas eferentes. Brownel, em 1984, demonstrou “in vitro” que as células ciliadas externas possuem no seu citoplasma proteínas contráteis. Essas células são pouco adaptadas à função sensorial, pois a inervação aferente é pouco abundante, sem mielina. Por outro lado, sua inervação aferente poderia modular, através do sistema nervoso central, o sistema de proteínas contráteis, do seu citoplasma, colocados em evidência (Flock e col, 1982). Esses fenômenos gerados pela atividade das células ciliadas externas são chamados de fenômenos ativos endococleares. Já as células ciliadas internas realizavam a transdução da energia acústica em fenômenos bioelétricos. Essas células seriam transdutores passivos, isto é, elementos que transduzem informações mecânicas que lhe são transmitidas pelas estruturas cocleares. Assim, as células ciliadas internas não poderiam ser a base das otoemissões (Bonfils, 1987). A função auditiva normal depende de mecanismos cocleares ativos e passivos. As Emissões Otoacústicas podem ser classificadas em duas categorias (Prost et al.,1991): Espontâneas e Evocadas. 7 Emissões Otoacústicas Espontâneas foram descritas inicialmente por Kemp, em 1979, como sinais acústicos de banda estreita que podem ser mensurados na ausência de estímulo sonoro deliberado. Por não necessitarem de estimulação sonora, uma sonda contendo apenas um microfone é suficiente para captá-las. O microfone deve ter alta sensibilidade, e haver baixo ruído de fundo, para salientar as pressões sonoras de pequena amplitude das Emissões Otoacústicas Espontâneas, que geralmente não excede 20 dB NPS. Ela ocorre em 50% das orelhas normais com incidência aproximadamente 10% maior em crianças, sendo mais freqüentes em indivíduos do sexo feminino. Ocorrem menos em indivíduos com mais de 50 anos. Tem pouca utilidade clínica, mas podem ter muitas implicações em pesquisas. Emissões Otoacústicas Evocadas ocorrem em 100% das orelhas normais e são subdivididas em três tipos, de acordo com a natureza do estímulo utilizado: 1.TRANSIENTES: em resposta a sinais acústicos de curta duração, “clicks”, “tone burst”. Têm sido sugerido que elas podem ser particularmente úteis na detecção de desordens cocleares; na clínica, porém este método não quantifica a deficiência auditiva. 2.ESTÍMULO – FREQUÊNCIA: são produzidas por tons puros contínuos e mostram características semelhantes aquelas emissões transientes. Contudo, em decorrência de seu registro oferecer muitas dificuldades técnicas e o tempo de exame ser maior, elas não tem sido incorporadas aos testes de uso clínico. 3.PRODUTO DE DISTORÇÃO: são evocadas por dois tons puros de diferentes freqüências (f1 e f2), apresentados simultâneamentes. Eles apresentam a resposta não linear da orelha interna aos estímulos tonais e consiste de novas freqüências diferentes daquelas inicialmente apresentadas, são os produtos distorcidos. Através dos produtos de distorção, podemos avaliar a atividade da cóclea em freqüências específicas, o que nos proporciona mais ampla aplicação clínica quando comparado com as emissões transientes que por utilizarem um ruído desencadeante de banda larga, avalia a cóclea de forma global. Produtos de Distorção são importantes, uma vez que analisam as freqüências sonoras em faixa que vão de 500Hz a 8000Hz. Uma das importâncias das Emissões Otoacústicas é a possibilidade de estudar os aspectos mecânicos da função coclear de forma não invasiva e objetiva, e que independe do potencial de ação neural. Desta maneira, informações objetivas podem ser obtidas, clinicamente, sobre os elementos pré-neurais da cóclea. Os demais métodos objetivos, não permitam medir diretamente as respostas destes elementos (Probst, 1990). Essa pesquisa tem o objetivo de aumentar a consciência coletiva para o problema da surdez na infância e salientar a necessidade da detecção precoce através da avaliação das Emissões Otoacústicas dos Produtos de Distorção em recém-nascidos. Com isso, facilitar a aquisição e desenvolvimento das habilidades de comunicação dessas crianças e minimizar a influência que esta deficiência sensorial terá em seu desenvolvimento global. Diante disso, vemos a necessidade desse exame fazer parte da triagem universal de recém-nascidos. Esse trabalho tem como metodologia a revisão bibliográfica. A AUDIÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM A surdez é uma deficiência não visível fisicamente e se limita a atingir uma pequena parte da anatomia do indivíduo. Suas conseqüências, no entanto, são extraordinárias no que diz respeito ao desenvolvimento emocional, social e educacional do surdo (Fine, 1977), isto porque a privação de um dos sentidos devido à existência de uma inter-relação funcional, tem como conseqüência uma interferência direta no mecanismo perceptual. Automaticamente, há uma alteração 8 dos padrões de adaptação e de conduta do ser humano. Falta ao surdo a capacidade de situar através do som um objeto no espaço, como também, as indicações alertadoras e os avisos do nosso ambiente físico. Falta–lhe, sobretudo, a facilidade de aquisição da linguagem a fim de que possa se servir dela, desde a mais tenra idade para participar efetivamente do ambiente, expressar com facilidade suas necessidades básicas e utilizá-las como instrumento mental, emocional e de integração social. Por muito tempo a psicologia não considerou a linguagem como fator participante da formação dos processos mentais da criança. Vigotsky, por volta de 1934, diz ter a linguagem um papel decisivo na formação dos processos mentais e, para prová-lo, empreendeu uma série de experiências que visaram testar a formação da atenção ativa, processos de desenvolvimento da memória ( por meio da aquisição da linguagem, a memorização passa a ser ativa e voluntária) e outros processos mentais superiores. Outros estudiosos mostraram que a participação da fala na elaboração de novas conexões mentais é essencial, e pode alterar-se no caso de lesões cerebrais que provoquem um desenvolvimento anormal. Nestes casos, os processos de atividade nervosa superior e a fala são imperfeitos e, chegando a ser impossível a participação da linguagem na formação de novas conexões, estas se elaboram sem a necessária participação da função abstrativa e generalizadora da palavra. Ou seja, ao nomear os objetos e definir assim suas conexões e relações, o adulto cria novas formas de reflexão da realidade na criança, incomparavelmente mais profunda e complexas que as que esta poderia formar mediante sua experiência individual. Todo este processo da transmissão do saber e a formação de conceitos, que é o modo básico em que o adulto influi na criança, constitui o processo central do desenvolvimento intelectual infantil. A criança ao ficar excluída da comunicação verbal por sua deficiência auditiva, deixa de possuir todas estas formas de reflexão da realidade que se produzem graças à linguagem verbal. O surdo a quem não se ensinou a falar indica objetos ou ações com um gesto e é incapaz de abstrair a qualidade ou a ação do próprio objeto, incapaz de formar conceitos abstratos, de sistematizar os fenômenos do mundo exterior com ajuda de sinais abstratos proporcionados pela linguagem e que não são normais à experiência visual adquirida praticamente. Segundo Myklebust (1964), precisar lutar para adquirir a linguagem própria de sua cultura, desde a primeira infância, é , provavelmente, uma das tarefas mais árduas do surdo, e é bastante possível que essa incapacidade de se comunicar do mesmo modo que as demais pessoas, atue de modo significativo na desenvolvimento da personalidade. Na fase decisiva da formação psíquica, ou seja, do ativamento das estruturas inatas genético-constitucionais da personalidade (primeiros anos de vida), a falta do intercâmbio auditivo-verbal, principalmente com a mãe, traz ao D. A. prejuízos no desenvolvimento da personalidade. Com uma visão mais ampla, pode-se dizer que a audição desempenha papel significativo na evolução integral dos sentimentos de identificação. A experiência pré-verbal da criança é de suma importância para o futuro equilíbrio emocional. Assim, o isolamento, a carência de estímulos e a falta de interação entre a criança e seus pais podem ter efeitos desintegradores na marcha evolutiva emocional da criança. O isolamento pela falta de audição deve ser colocado, também, como um dos principais problemas de integração do surdo em termos emocionais, influindo, portanto, em sua personalidade. Esse isolamento é causado não só pela falta do domínio de um dos principais meios de comunicação que é a língua usada pelo contexto em que vive o surdo, mas porque o sentido auditivo proporciona uma série de informações referentes ao ambiente que o cerca. Estudos mostram que um dos critérios fundamentais para se manter a estabilidade emocional é a capacidade de comparar os próprios pensamentos e sentimentos com os das pessoas que fazem parte do próprio meio social. Este tipo de comportamento tem como finalidade manter um domínio firme da realidade. E para que este processo se realize em sua totalidade, torna-se imprescindível a presença da audição e da linguagem. O significado social da surdez está intimamente ligado a ausência da linguagem comum e ao meio cultural em que vive o D. A. . Em decorrência da limitação imposta pela dificuldade de comunicação através da linguagem, é menor no surdo a tendência a agrupar-se no período da pré-adolescência, embora, posteriormente, tende a fazê-lo. Prefere, no entanto, companheiros que apresente a mesma deficiência. Neste sentido, distingui-se dois aspectos fundamentais da reeducação do surdo: recuperação ( deficiente auditivo consegue uma compensação das funções prejudicadas sem conseguir o desenvolvimento de um 9 processo de reintegração social), e reabilitação ( o surdo alcança o estado de convivência e automanutenção no meio social dos ouvintes). Sob todos os aspectos, a educação não será completa se o deficiente auditivo isolar-se da sociedade que o cerca. A adaptação de uma pessoa ao seu meio social depende diretamente de compreensão e aceitação mais ou menos críticos do mesmo. É essencialmente através da linguagem que se amplia os círculos sociais, da família à escola, ao grupo vicinal, esportivo, religioso, profissional e político e é pela linguagem que o processo socializante vai exercendo sua influência contínua por toda a existência do indivíduo, pronto a alterar seu comportamento social à medida que toma consciência dos fatos e ocorrências que o cercam. A linguagem envolve um processo altamente complexo, uma vez que está diretamente relacionada à elaboração e simbolização do pensamento humano. É a faculdade humana e abstrata de representação de conteúdos. É por seu intermédio que o homem pode estabelecer contatos com seus semelhantes, desenvolvendo a habilidade de compartilhar suas experiências, pensamentos, idéias, desejos, na busca de novos conhecimentos, ou seja, comunicar-se com outrem. A comunicação, além de satisfazer uma necessidade básica do ser humano, isto é, o saber, é um dos mais penetrantes, complexos e importantes aglomerados de seu comportamento social. Nossas vidas cotidianas são afetadas seriamente pelas nossas comunicações com os outros. A capacidade de aquisição da linguagem é uniforme e específica da raça humana. A língua e seu funcionamento é complexa, abrangendo princípios ou sistemas de organização altamente abstratos. Mesmo assim, nos primeiros anos de vida, uma criança é capaz de dominar um sistema lingüístico idêntico àquele empregado pelas pessoas que a cercam. Entretanto , o desenvolvimento da linguagem processa-se em seqüências inter-relacionadas. A primeira etapa constitui a fase de recepção de estímulos sensoriais, principalmente, auditivos, visuais e cinestésicos, sob o comando do Sistema Nervoso Central. A audição tem um papel preponderante e decisivo para que a linguagem falada se desenvolva. É pela integridade das vias auditivas que podemos localizar a fonte sonora, possuir habilidade de distinguir e reconhecer o significado dos sons, juntamente com sua capacidade de produzir e simbolizar variedade deles através da fala. Assim, desenvolver um sistema de comunicação estruturado e único da espécie humana, a linguagem falada. A aquisição da linguagem pela audição “é uma função que depende do tempo e está relacionada a períodos de maturação precoce, que são denominados períodos críticos para o desenvolvimento de funções biológicas, as quais são responsáveis pela aquisição da linguagem em tempo certo ” , segundo Lenneberg, citado por Russo e Santos (1994). Um bebê que não recebe estimulação de linguagem adequada durante os 2 ou 3 primeiros anos de vida nunca terá seu potencial de linguagem completamente desenvolvido, não importa a razão de sua privação. Em vista da necessidade de se ouvir bem é que se torna premente atacar os problemas auditivos das crianças com toda a habilidade e possibilidades de que somos capazes. A segunda fase do desenvolvimento constitui na maturação precoce do sistema receptivo estabelecendo a prontidão para a maturação do sistema expressivo no devido tempo. O sistema receptivo desenvolve a capacidade de compreender, decodificar, associar a linguagem falada, ou seja, a interpretação dos sons lingüísticos que a criança ouve em seu ambiente. A interpretação depende da integridade dos centros de associação do Sistema Nervoso Central para possibilitar o funcionamento de processos complexos como : memória, não somente de símbolos verbais, mas de pessoas; objetos; eventos; atividades e conceitos intelectuais que eles representam; organização têmporo-espacial; análise-síntese; figura-fundo; motivação, além de experiências emocionais. A terceira fase do desenvolvimento da linguagem constitui na capacidade de produzir os sons da fala, isto é, a emissão. Essa etapa envolve uma atividade motora que é comandada pelo Sistema Nervoso Central. È a habilidade fonoarticulatória necessária à produção dos sons da fala. Ao exteriorizar seu pensamento por meio da linguagem verbal, o homem precisa desejar fazê-lo e ter a capacidade para isso, pois este ato engloba uma seqüência de eventos que inclui separar a idéia principal; colocá-la em simbologia verbal adequada, em forma gramatical e cadência vocal apropriadas; mentalizar a imagem cinestésica e acionar adequadamente os órgãos fonoarticulatórios (OFA), a fim de produzir os sons de fala desejados. O choro da criança , organicamente determinado nos três primeiros meses de vida, dá lugar a vocalização que por volta dos seis meses, transforma-se na fase do balbucio. Segundo, Menyuk (1975), “ o uso de sons pela criança de modo repetitivo 10 indica a época em que o sistema de feedback está efetivo “. Por feedback acústico articulatório entende-se a monitorização que o ouvido exerce sobre as produções articulatórias do indivíduo. Durante a fase do balbucio muitos sons são acrescentados e ocorrem além da seqüência consoante-vogal, várias combinações complexas. Neste estágio o bebê produz todos os sons que forma a base fonética das línguas. Por volta de nove meses a um ano de vida a criança começa a usar as primeiras palavras. As etapas do desenvolvimento da linguagem são inter-relacionados, diante disso, podemos depreender que o material da linguagem falada consiste num longo período de recepção dos símbolos auditivos da linguagem, o qual é pré- requisito para a posterior emissão desta. Assim, é evidente que a concepção do mundo de quem está privado da audição, desde o nascimento ou a partir de tenra idade, não poderá ser a mesma de um ouvinte normal, visto serem muitos os processos que dependem do sentido auditivo em termos de aprendizagem e constatações do universo das pessoas e das coisas que o cercam. Muito embora comumente esteja cercado de educação especial adequada, paciência, maturidade, perseverança, muita atenção dos educadores e familiares, o surdo está substancialmente privado de entender e participar de uma grande parte das circunstâncias e incidentes cotidianos. Esta possibilidade da falta de experiência integradas aos fatos do dia-adia fatalmente poderá influir em seus sentimentos e atitudes. PERÍODOS CRÍTICOS Quando é necessário para uma criança, destituída da audição, receber entrada de linguagem? A resposta está baseada em períodos críticos para o desenvolvimento da linguagem de várias funções. A teoria dos períodos críticos estabelece que há certos períodos, no desenvolvimento do organismo, são programados para receber e utilizar tipos particulares de estímulo, e que posteriormente, o estímulo terá potência gradualmente diminuída em afetar o desenvolvimento do organismo, na função representada. No caso da audição, significa que em um certo estágio de desenvolvimento, os sinais auditivos serão recebidos e utilizados por atividades prélingüísticas importantes, mas uma vez que esse estágio tenha passado, a utilização efetiva desses sinais gradualmente decresce (Northern e Downs, 1989). Uma teoria análoga para o desenvolvimento da linguagem, sustenta que a entrada da linguagem deve ser experimentada num determinado estágio, ou ela se torna decrescentemente efetiva para utilização em habilidades emergentes de linguagem. Lenneberg (1967) diz que a puberdade coloca o último marco importante para a aquisição da linguagem. Com relação aos efeitos da privação precoce, ele menciona a diferença entre a criança congenitamente surda e aquelas que adquire a surdez através de meningite, após uma livre exposição à linguagem. Ele afirma que aquelas que perdem a audição após terem sido expostas à experiência de fala, podem ser treinadas muito mais facilmente em todas as artes de linguagem, mesmo que o treinamento formal comece alguns anos depois delas terem ficado surdas. Conforme Lenneberg (1967), “parece como se mesmo uma curta exposição à linguagem, um breve momento durante o qual a cortina tivesse sido suspensa e estabelecida a comunicação oral, fosse suficiente para dar à crianças algum alicerce no qual mais linguagem posterior pode ser baseada. “ A maturidade cerebral e o término de um estado de plasticidade organizacional são fatores limitantes do período crítico. Templin , citado por Northern e Downs (1986), compara em um estudo as habilidades da linguagem das crianças deficientes auditivas com as habilidades de grupos de crianças normais. Em algumas áreas de linguagem, os deficientes auditivos não mostraram melhora sistemática em seu desempenho depois dos 11 anos. Neste ponto, tais habilidades como o significados das palavras, a construção da sentença e analogias, atingiram um platô e permaneceram lá sem discernimentos ou melhoras. O indivíduo auditivo normal continua a alcançar o nível de linguagem até os 14 anos, que foi o limite mais elevado do estudo. Deve ser enfatizado que não havia diferença substancial nas habilidades intelectuais entre os grupos, e que o 11 deficiente auditivo havia tido treinamento intensivo de linguagem em suas escolas. Sua taxa de aprendizagem até 11 anos era comparável com a do grupo de ouvintes normais. Porém, um déficit irreversível de linguagem apareceu nesse nível de idade e impediu um desenvolvimento mais adiantado. A complexidade das formas de linguagem e símbolos da linguagem abstrata sofre um grande salto próximo a essa idade e deixa um deficiente auditivo sem auxílio, atrás de si. A culpa pode ser atribuída somente à privação precoce da linguagem, cobrindo muitos períodos críticos para a aprendizagem. Segundo Edwards (1968), nos primeiros anos de vida, ocorre a construção do discernimento e resposta da linguagem, isso devido a um mecanismo neurológico subjacente para a aprendizagem de linguagem, presente em cada organismo humano normal. “Experiência, a experiência correta, é essencial.” A hereditariedade e o meio ambiente interagem. As possibilidades hereditárias são configuradas pela influência que somente a raça humana pode fornecer; são potencialidades que podem ser desenvolvidas enquanto o organismo neurológico jovem está ainda crescendo rapidamente, maleavelmente, aberto ao estímulos. A experiência certa deve vir no tempo certo, ou o potencial deve permanecer para sempre não realizado. Embora seja difícil tomar como alvo a idade exata na qual é fundamental o fornecimento de estimulação de linguagem para bebês, Dennis (1973) realizou estudos com crianças e descobriu que há um período próximo ao segundo aniversário que é o período crítico para a recuperação completa dos efeitos de privação experimental. Considerando do ponto de vista fisiológico, o sistema auditivo do bebê é plástico, isto é, pode ser modificado não apenas por alteração anatômica mas também por variações nos estímulos acústicos. A ausência dos estímulos sonoros resultará em desvio da função auditiva. Os sistemas auditivos periféricos e centrais controlam-se mutuamente, segundo Rubens e Rapin, citado por Northren e Downs ( 1986). Na medida em que o ouvido interno amadurece suas entradas é necessário o desenvolvimento de pelo menos parte do sistema nervoso auditivo. Próximo ao período em que o sistema auditivo periférico está completamente desenvolvido, sua entrada parece ser necessária para maturação e inervações de porções do sistema auditivo central. Portanto, os sons ambientais têm o maior efeito na configuração da habilidade auditiva desde o tempo em que o ouvido interno e o oitavo nervo craniano pela primeira vez tornam-se funcionais quando a maturação do SNC é alcançada. O tempo para a ação é precoce no primeiro ano de vida. Furth, citado por Katz (1989), realizou pesquisa comparando as pessoas surdas com as de audição normal em medidas gerais quantitativa e qualitativa de capacidade cognitiva. Entretanto, os indivíduos estudados demonstraram algumas dificuldades em certos testes quando comparado com a população normal. Furth diz que a maioria das dificuldades atribuídas a determinadas deficiências lingüísticas e experimentais, ou seja, um grupo de pessoas que são tipicamente privadas de certos tipos de experiências, estão privadas de certas capacidades cognitivas que são aprendidas através destas experiências, então, são passíveis de prevenção ou correção com educação adequada. A perda auditiva têm grandes efeitos sobre um indivíduo. Esses efeitos são especialmente debilitantes para uma criança pré-lingüísticamente surda, ou seja, perda auditiva antes do desenvolvimento da linguagem, e incluem deficiências na área da linguagem oral em algumas das funções cognitivas e na adaptação social e emocional. A comunicação e as repercussões profissionais são extensas mesmo para aqueles indivíduos com perda de grau abaixo de severo ou com surdez que ocorre na idade adulta. Apesar destas dificuldades, a maioria das pessoas com deficiência auditiva pode trazer valiosas contribuições à sociedade. Os principais problemas experimentados pelas pessoas com perda auditiva continuam sendo a falta de serviços de intervenção, isto é, programas educacionais adequados, assim como a falta de sensibilidade e de aceitação pela sociedade em geral. Crianças com deficiência auditiva representam um desafio formidáve l para o audiologista. Raramente completamos um teste diagnóstico em uma criança, aconselhamos os pais, respondemos às perguntas de um professor de sala de aula, ou concluímos uma sessão de terapia, sem nos dar conta do impacto que tem a deficiência auditiva sobre todos os aspectos da vida de uma criança. Quando trabalhamos com uma criança deficiente auditiva tanto no diagnóstico quanto na habilitação, em pouco tempo obtemos uma estimativa da influência que tem a deficiência auditiva, não apenas sobre a função comunicativa mas também sobre seu desenvolvimento global, social, emocional, educacional e vocacional. 12 ANATOMOFISIOLOGIA DA AUDIÇÃO O estudo da anatomia e fisiologia dos elementos é de suma importância para entender qualquer doença, por mais simples que seja. Será apresentado a anatomofisiologia da audição com a maior simplicidade possível, procurando dar interpretação clínica aos pontos mais importantes. O aparelho auditivo divide-se em três partes: Orelha externa, orelha média e orelha interna. A orelha externa compreende o pavilhão auricular e o meato acústico externo. O pavilhão auricular e o meato acústico externo têm como função proteger a membrana timpânica contra danos mecânicos e promover a captação e o encaminhamento da onda sonora para a orelha média. Além disso, a presença da cabeça no campo sonoro tem, junto aos elementos estruturais da orelha externa efeito na intensidade sonora que atinge a membrana timpânica, sendo sua “sombra sonora” importante no processo de localização da fonte, a qual se faz devido à audição binaural. O pavilhão auricular e o meato acústico externo possuem propriedades acústicas que ampliam o efeito da “sombra sonora” da cabeça e realçam a sensibilidade para determinados sons. O meato acústico externo termina em uma membrana complacente que transmite e reflete a energia sonora. Modifica o comprimento da onda, gerando uma ressonância acima de uma ampla faixa de freqüência, que é ainda complementada pelo efeito de ressonância da concha do pavilhão A orelha média é constituída pelo antro mastoídeo, cavidade timpânica e tuba auditiva. A cavidade timpânica preenchida por ar, escavada no osso temporal contém a cadeia de ossículos; martelo, bigorna, e estribo; seus tendões, ligamentos e os músculos, tensor do tímpano e estapédio. Comunica-se com a nasofaringe por intermédio da tuba auditiva, responsável pela ventilação da cavidade timpânica. Os ossículos estabelecem uma cadeia ininterrupta entre a membrana timpânica e a janela oval. A orelha média tem função transformadora de energia sonora. Conduz o som da orelha externa à orelha interna. A ação efetiva de transformação da membrana timpânica e cadeia ossicular segundo Békésy, é o produto do efeito de alavanca dos ossículos e efeito hidraúlico, pela maior superfície da membrana, agindo sobre uma superfície 30 vezes menor. A orelha interna localiza-se na parte petrosa do osso temporal e é responsável pelos órgãos da audição (cóclea) e do equilíbrio (canais semicirculares). Sistematicamente pode ser dividida em 3 partes: o labirinto endolinfático ou membranoso, o labirinto perilinfático ou ósseo e a cápsula ótica. A seguir falaremos de cada uma destas partes em separado. Labirinto endolinfático ou membranoso: Trata-se de um sistema de canais e tubos epiteliais preenchido por um líquido claro chamado de endolinfa. É envolvido quase que totalmente por uma parede óssea, o labirinto ósseo e sem tecido de sustentação. É divivido em utrículo, sáculo, ducto e saco endolinfático, ductos semicirculares e suas ampolas e finalmente pelo ducto coclear. As terminações do VII par terminam no revestimento interno do sistema de ductos. Dentre os diversos ductos daremos ênfase ao coclear. Seu assoalho é formado por um espessamento do periósteo recobrindo a parte periférica da lâmina 13 óssea espiral e continua como membrana basilar, alcançando o periósteo que se situa na parede periférica do canal ósseo coclear. O epitélio do assoalho coclear é altamente especializado, constituindo o órgão de Corti, aonde terminam as fibras do nervo acústico. A estria vascular situa-se em um espessamento da parede periférica do ducto coclear. O teto é constituído por uma membrana denominada membrana vestibular ou de Reissner. O órgão de Corti encontra-se apoiado sobre a membrana basilar. É constituído basicamente de elementos sensoriais, as células ciliadas, das células de sustentação e da membrana tectória que encontra-se fixa no limbo espiral e apoiada sobre os estereocílios das células ciliadas. Existem dois grupos de elementos sensoriais: as células ciliadas internas que formam uma única fileira ao longo do neuroepitélio coclear e estão apoiadas em células de sustentação relativamente rígidas e as células ciliadas externas que somam de três a quatro fileiras ao longo das espiras da cóclea apoiadas em células de sustentação muito flexíveis. A vascularização do labirinto é feita pela artéria auditiva interna – ramo da artéria basilar e a drenagem venosa pela veia auditiva interna. A inervação é dada pelo nervo vestíbulo-coclear. Labirinto perilinfático ou ósseo: É constituído por uma matriz óssea mais dura do que o resto do osso petroso. Divide-se em três compartimentos: o vestíbulo, parte mais volumosa, os canais semicirculares em número de três e a cóclea que se assemelha a concha de um caracol. Cápsula Ótica: Envolve todo o labirinto, ossifica-se de numerosos centros sem formar suturas e tem seu máximo desenvolvimento no 5° mês de gestação. A cóclea possui paredes ósseas limitando três tubos enrolados em espiral em torno de uma parte óssea chamada de modíolo ao redor do qual dão duas voltas e meia. Esquematicamente, se a cóclea for desenrolada três tubos se formarão assim como também três rampas: rampa vestibular, rampa média, a qual contém o Órgão de Corti, e a rampa timpânica. As rampas vestibulares e timpânicas se comunicam no ápice da cóclea e são preenchidas por perilinfa, rica em sódio. Já o canal coclear contém endolinfa, rico em potássio e não se comunica com as outras rampas. Sobre o órgão de Corti está a membrana tectória. As ondas sonoras transmitidas pelo sistema tímpano-ossicular através da janela oval viajam através da perilinfa fazendo com que ocorram deslocamentos simultâneos das membranas do canal coclear, de Reissner e da basilar. Cada onda tem um ponto de deflexão máximo na membrana basilar entre a origem da onda, junto ao estribo e até onde ela termina. Neste local que depende da frequência da onda, a membrana vibra com facilidade e a energia da onda se dissipa. Para cada frequência o máximo de vibração ocorre em áreas diferentes da membrana basilar. Quanto maior a frequência mais próximo ao estribo e quanto menor mais próximo ao helicotrema. No órgão de Corti existem dois sistemas de células ciliadas: as externas e as internas. Células ciliadas externas: Em número de 10.000 a 14.000 e dispostas em três fileiras ao longo das espiras cocleares. O seu potencial elétrico de repouso é de – 70 mV. Não atuam como receptor coclear, não codificando a mensagem sonora. Elas se contraem quando estimuladas e possuem capacidade para dois tipos de contração: rápida e lenta. Estas células, devido à energia mecânica liberada na contração rápida são as responsáveis pelas otoemissões acústicas. Trata-se de um biomecanismo ativo das células ciliadas externas e funcionaria como um amplificador coclear, permitindo um aumento de até 50 dB do estímulo sonoro. Já as contrações lentas não seguem ciclo por ciclo a estimulação sonora, ao contrário do que ocorre com as contrações rápidas e seriam responsáveis pelo controle da tonicidade das células ciliadas externas, regulando as propriedades mecânicas da membrana basilar. O sistema eferente das células ciliadas externas provocaria o mecanismo das contrações lentas que modularia as contrações rápidas sendo importante para: capacidade do indivíduo de detectar um sinal em um ruído; afinamento da seletividade frequencial; proteção contra superestimulação; focalizar um determinado fenômeno acústico; regular a amplificação coclear. Podem também reduzir as otoemissões acústicas quando estimulados. A inervação aferente das células ciliadas externas é dada por 5% das fibras do nervo acústico. São fibras finas, ramificadas, não mielinizadas e cada fibra 14 inerva de 10 a 20 células ciliadas externas. A inervação eferente compreende o sistema eferente medial e lateral. No sistema eferente medial cada fibra mantém contato com 15 a 30 células, são mielinizadas, podendo elevar o limiar das resposta do nervo acústico. Funcionaria então como um sistema modulador das contrações rápidas. Células ciliadas internas: São em número de 3.500, dispondo-se em uma só fileira sobre a membrana basilar. Seu potencial de repouso é de – 40 mV e são os verdadeiros receptores da mensagem sonora produzindo codificação em mensagem elétrica, que seria então enviada pelas vias nervosas centrais aos centros auditivos do lobo temporal. A inervação aferente é dada por 90 a 95% das fibras do nervo acústico, em número de 10 neurônios para cada célula ciliada interna. O sistema eferente é formado por fibras que se originam no bulbo e não se sabe a exata função deste sistema. Conforme a anatomia do órgão da audição descrito acima, será apresentado o mecanismo da audição de forma simplificada. A onda sonora entra no meato acústico externo, batendo diretamente na membrana timpânica. O martelo, que se integra na membrana timpânica, é deslocado e, por ser articulado á bigorna e estribo, move os ossículos. Eles transferem a energia sonora para a orelha interna através da janela vestibular que está presa à base do estribo pelo ligamento anular. Para que esta transferência de energia seja suficiente, o espaço da orelha média aonde estão alojados os ossículos devem funcionar à pressão atmosférica. Este equilíbrio de pressão é mantido pela tuba auditiva funcionante. A partir do estribo, o trajeto da energia sonora é feito em espaço preenchido por líquido. Imaginamos o som como uma onda sonora de compressão que passa pelas duas espiras e meia da escala vestibular da cóclea até seu ápice. Neste ponto, a direção da onda de compressão é invertida, mandando a energia de volta através das duas e meia espiras da escala timpânica. A compressão é abrandada pela membrana móvel da janela coclear. Quando a base do estribo move para dentro, a janela coclear move-se para fora com uma defasagem de 180º. A onda de compressão produz um movimento ondulatório correspondente ao longo da membrana basilar que sustenta o órgão de Corti. A onda em movimento, junto com a distorção da membrana basilar associada, age sobre as células ciliadas, produzindo o potencial do impulso nervoso. Este potencial atua primeiramente nas fibras do nervo coclear que se une num tronco nervoso no modíolo. Estes pequenos potenciais elétricos são transmitido para o gânglio espiral, para os núcleos do tronco cerebral e, finalmente para o córtex auditivo do cérebro. EMISSÕES OTOACÚSTICAS DOS PRODUTOS DE DISTORÇÃO Foram registradas pela primeira vez por Kemp em 1978. O autor relatou detectar um sinal acústico no meato acústico externo que parecia um eco da cóclea após uma estimulação acústica. As emissões detectadas por Kemp, antes não haviam sido observadas por serem fracas e difíceis de detectar sem selar um microfone no canal auditiva e usar uma técnica de promediaçao. Kemp, definiu produtos de distorção, como energia acústica no canal auditivo originada da interação não linear de dois tons puros simultâneos, aplicados dentro da cóclea. Os dois tons puros apresentam-se com duas frequências diferentes (f1 e f2) , as quais são chamadas de frequências primárias. Em humanos a mais ampla DPOAE (produtos de distorção) ocorre na frequência equivalente a 2f1 – f2, onde f1 < f2 . Sequndo Probst em 1990, produtos de distorção são fenômenos encontrados em muitos sistemas físicos. São gerados por elementos não lineares , os quais distorcem o sinal e desse modo criam frequências adicionais. Quando dois sinais de tom puro de frequências diferentes passam por um sinal não linear, como a cóclea , os dois sinais intermodulam e produzem componentes de frequências no sinal de saída, as quais não estavam presentes no sinal original. A intermodulação causada pela não lineariedade é devida à amplitude e à modulação de frequência dos componentes de frequências mais altas pelos componentes de frequências mais baixas (OSTERHAMMEL; RASMUSSEN, 1992). Baseados em achados de pesquisas (BROWN; KEMP, 1985; MARTIN et al., 1987), foi assumido que a geração de 2f1 – f2 DPOAE ocorre primariamente no local de frequência ao longo da divisão coclear, onde a transmissão das ondas de 15 deslocamento progressivo de f1 e f2 se sobrepõe ao máximo. Essa região de frequência particular é representada facilmente como uma média geométrica de frequência das duas primárias. As otoemissões acústicas apareciam com um atraso mais longo do que a resposta da orelha média. Sabia-se previamente, que após apresentação de um breve clique existia no canal uma resposta oscilatória que caía rapidamente a zero dentro de 6ms e que era uma resposta da orelha média. Kemp mostrou que após 6ms um outro sinal, a emissão começava a surgir. Este sinal crescia em amplitude até cerca de 10 a 15ms e então declinava lentamente e desaparecia num período de 50 a 60ms. As emissões otoacústicas dos produtos de distorção são avaliadas de duas maneiras. Um dos métodos de registrar as DPOAE é chamado de DP-Gram, onde são medidas as amplitudes das emissões, em respostas ao estímulo nos dois tons puros primários (f1 e f2), numa mesma intensidade. Ao se apresentarem as duas frequências na mesma intensidade, por uma razão de biomecânica da cóclea, há uma distorção, e outras frequências são produzidas: estas são os produtos de distorção. Quando se realiza o DP-Gram das DPOAE, as emissões são usualmente evocadas por f1 e f2 com médias geométricas de frequências entre 500Hz a 8kHz em 4 a 12 pontos por oitava, dependendo da necessidade da resolução de frequência. O outro método DP Growth Rate ou resposta/crescimento ou função input/output (entrada/saída), obtida através de uma frequência particular, em que a amplitude da emissão é registrada como uma função de crescimento sistemático em níveis de tons primários. A média geométrica específica de frequências examinadas dessa maneira é equivalente às frequências audiométricas em 500Hz, 1kHz, 2kHz, 4kHz, 6kHz e 8kHz. A intensidade do estímulo sonoro influencia a amplitude dos produtos de distorção. Os níveis de intensidade das primárias nunca devem exceder 80 dB NPS, para não excitar o músculo estapédio, o que afetaria a função de transferência do ouvido médio. Estas otoemissões com origem na cóclea provocariam vibrações da cadeia ossicular que seriam transmitidas ao meato acústico externo onde podem ser registradas com um microfone sensível. O registro utilizado para medir as DPOAE consiste em dois osciladores através dos quais os sinais de saída são enviados via atenuadores para dois transdutores. A resposta é registrada no meato acústico externo fechado por uma sonda, onde localiza um microfone sensível (emissor – receptor) que capta a emissão vinda da orelha interna. O microfone serve também, como uma referência para estabelecer os níveis de estímulo. As amplitudes das emissões otoacústicas evocadas ou provocadas em relação à amplitude dos estímulos são altamente não–lineares. Próximo ao limiar das otoemissões, os desvios da linearidade são mínimos. A não- linearidade é máxima em níveis moderados e altos de intensidade, ou seja, maior que 20 a 30 dB, quando ocorre saturação. Isto significa que a resposta não se altera com intensidade dos estímulos superiores a estas. Esta característica limita muito sua aplicação clínica, pois as otoemissões não ocorrem em surdez coclear. Entretanto constitui uma nova técnica de exploração do estado da função da cóclea (Bonfils e col., 1987). Pelo fato das DPOAE medirem a atividade de frequências altas (entre 4kHz e 8kHz), apresentam sensibilidade para estágios iniciais de disfunção coclear. Sabe-se que a maioria das perdas auditivas neurossensoriais, com exceção da doença de Ménière, iniciam-se com lesão das células responsáveis pelas frequências agudas. Esse teste pode trazer também um ótimo entendimento do local primário das lesões que causam certas doenças otológicas, como por exemplo perda auditiva sensórioneural idiopática. Outra característica benéfica é o monitoramento da cóclea que pode ser empregado em situações de tratamento em que utilizam drogas ototóxicas. As emissões otoacústicas dos produtos de distorção apresentam uma natureza contínua e baixa latência, o que permite testar intencionalmente qualquer frequência situada entre 1kHz a 8kHz, aproximadamente. Sendo assim, indicadas como um complemento ao audiograma convencional. Têm uma ampla faixa dinâmica em termos de crescimento de amplitude de resposta, bem como, a função do nível de estímulo para uma avaliação completa da função coclear em ambos os níveis de estimulação liminar e supraliminar e permite também estudar as funções remanescentes das células ciliadas externas nos ouvidos dos pacientes com perda auditiva de 45 a 55 dB NA. Analisando os parâmetros de respostas das otoemissões, o limiar da detecção é mais baixo que o limiar subjetivo em 10 dB, que aumenta com a idade. Aplicandose como estímulo, clique não-filtrado, gerado por onda retangular de 200ms, 16 observa-se no registro o clique de estimulação durante mais ou menos 5ms e após um outro som com duração em 15ms a 30ms. A amplitude máxima ocorre em 15ms a 20ms; é a otoemissão acústica. As latências com menos 20ms são chamadas curtas e as com mais que 20ms são latências longas. As formas de ondas emitidas evidenciam dispersão de frequências com os componentes de frequências mais altas , tendo as latências mais curtas; e os de frequências baixas têm sucessivamente latências mais longas. O espectro de frequência é de banda larga com frequência máxima de 1kHz a 2kHz, e vários picos de frequência de banda estreita. O mecanismo de produção das otoemissões deve-se a um mecanismo biomecânico ativo dentro da cóclea. A possível origem deste mecanismo é nas células ciliadas externas do órgão de Corti, devido a sua capacidade de eletromotilidade, ou seja, de suas propriedades mecânicas (Brownell, 1990). A produção das otoemissões seria resultante deste mecanismo bioativo da cóclea, ou seja, contração das células ciliadas externas assim sendo, aumenta a sensibilidade das células ciliadas internas devido à amplificação de energia sonora a que elas chegam. Evidência da origem coclear das otoemissões acústicas é o fato de seu desaparecimento quando as células ciliadas externas estão alteradas, como nas deficiências auditivas cocleares. O recém-nascido que teve anóxia, ou foi submetido a tratamento que utilizou drogas ototóxicas, como àcidoetacrínico, furosemida, aspirina, salicilato de sódio, antibióticos aminoglicosídeos, podem alterar as células ciliadas externas da cóclea e assim diminuir ou abolir as otoemissões. Orelhas com deficiências auditivas condutivas naturalmente não apresentam as otoemissões. Quando a perda é sensorioneural, as otoemissões só aparecem quando não ultrapassa 30 dB HL. Na ausência das otoemissões deve-se suspeitar de deficiência auditiva e realizar uma bateria de testes complementares, como testes audiométricos comportamentais, imitanciometria e ABR (BERA). HALL et al. (1994) ressalva que a aplicação clínica de rotina das emissões otoacústicas será facilitada por estudos em larga escala dos efeitos das características individuais, como gênero e idade, em emissões otoacústicas por transiente e produto de distorção; investigações clínicas das emissões otoacústicas em grande populações de pacientes com diagnósticos neurológicos específicos; orientações para os protocolos de testes das emissões em ambientes clínicos; e critérios claros para análise de emissões otoacústicas em populações clínicas. Uma das aplicações clínicas das emissões otoacústicas é a triagem auditiva em berçários de terapia intensiva, já que é um método objetivo, não invasivo, fácil e rápido de realizar. Estudos experimentais e clínicos mais detalhados são necessários para a melhor compreensão dos aspectos fisiopatológico e epidemiológico das emissões otoacústicas e sua aplicabilidade clínica. 17 CONSIDERAÇÕES FINAIS Essa pesquisa surgiu com os objetivos principais de aumentar a consciência coletiva; médicos, fonoaudiólogos e a quem mais possa interessar, sobre o problema da surdez na infância. E também, mostrar a necessidade da avaliação das Emissões Otoacústicas na detecção precoce em recém-nascidos e com isso, minimizar as alterações no desenvolvimento global das crianças. Através dessa pesquisa, observei que a concepção do mundo de quem está privado da audição, desde o nascimento ou a partir de tenra idade, não poderá ser a mesma de um ouvinte normal, visto serem muitos os processos que dependem do sentido auditivo em termos de aprendizagem e constatações do universo das pessoas e das coisas que o cercam. A experiência sonora no primeiro ano de vida é imprescindível para o desenvolvimento do processo da linguagem e das habilidades cognitivas. Bebês com perda auditiva diagnosticada ao nascimento e com tratamento iniciado até os 6 meses de idade, apresentam desenvolvimento muito próximo ao de uma criança ouvinte. O diagnóstico após os seis meses traz prejuízos inaceitáveis ao desenvolvimento da criança e sua relação com a família e ao mundo social. Muito embora esteja cercado de educação especial adequada, paciência, maturidade, perseverança e muita atenção dos educadores e familiares, o surdo está substancialmente privado de entender e participar de uma grande parte das circunstâncias e incidentes cotidianos. Esta possibilidade da falta de experiência integradas aos fatos do dia-a-dia, fatalmente poderá influir em seus sentimentos e atitudes. Visto que, a deficiência auditiva causa considerável déficit no desenvolvimento global de uma criança se não diagnosticada precocemente, é esperado que essa pesquisa possa contribuir para a conscientização da importância da avaliação das Emissões Otoacústicas como triagem auditiva neonatal universal. Assim como o teste do pezinho diagnostica posssíveis doenças neurológicas, o exame das Emissões Otoacústicas possa diagnosticar uma possível deficiência auditiva. Através dos produtos de distorção, podemos avaliar a atividade da cóclea em frequências específicas, o que nos proporciona mais ampla aplicação clínica quando comparado com as emissões transientes que por utilizarem um ruído desencadeante de banda larga, avalia a cóclea de forma global. Produtos de Distorção são importantes, uma vez que analisam as freqüências sonoras em faixa que vai de 500Hz a 8000Hz. Uma das importâncias das Emissões Otoacústicas é a possibilidade de estudar os aspectos mecânicos da função coclear de forma não invasiva e objetiva, e que independe do potencial de ação neural. Desta maneira, informações objetivas podem ser obtidas, clinicamente, sobre os elementos pré-neurais da cóclea. Os demais métodos objetivos, não permitem medir diretamente as respostas destes elementos (Probst, 1990). 18 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Frota, Silvana. Fundamentos em Fonoaudiologia .R. J. , Guanabara Koogan, 1998. Hungria, Hélio . Otorrinolaringologia. R.J., Guanabara Koogan,1991. Katz, Jack. Tratado de Audiologia Clínica .S. P. Manole, 1989. Kerdel, Juan Armando Chiossone. “Aplicacione Clinicas de Las Emisione Otoacusticas” em Acta Otorrinolaringológica (vol. 8, nº 2 ). Lilacs,1996. Lopes, Otacilio Filho e CAMPOS, Carlos Alberto H. de. Tratado de Otorrinolaringologia .São Paulo. , Roca, 1994. 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