FACULDADE MAURÍCIO DE NASSAU CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA 3º SEMESTRE WELLINGTON ALEIXO LUCAS A Hipnose como auxílio no controle da dor no contexto odontológico FORTALEZA 2014 Wellington Aleixo Lucas A HIPNOSE COMO AUXÍLIO NO CONTROLE DA DOR NO CONTEXTO ODONTOLÓGICO Artigo científico realizado como requisito para compor a nota parcial da Segunda Avaliação da disciplina Métodos e Técnicas da Pesquisa Psicológica, que integra o curso de graduação em Psicologia da Faculdade Maurício de Nassau, Fortaleza/CE. Orientadora: Me. Maria Regina Ponte da Silva Fortaleza 2014 2 AGRADECIMENTOS A realização deste projeto seria muito menos fluida e prazerosa se não contasse com apoio de alguns amigos e colegas de curso, que me auxiliaram com as informações perdidas durante minha ausência, por motivo de viagem. Agradeço à minha amiga Dra. Karina Oyama Siqueira, odontóloga, CRO 3.728, que me permitiu realizar as pesquisas de campo em seu consultório e pelo apoio incondicional em meus demais projetos, tanto profissionais quanto pessoais. Agradeço a Luciana Cosenza, amiga, psicóloga, biomédica e hipnóloga, pela valiosíssima ajuda na construção e revisão, imprescindíveis para concretizar este projeto. 3 A HIPNOSE COMO AUXÍLIO NO CONTROLE DA DOR NO CONTEXTO ODONTOLÓGICO Wellington Aleixo Lucas*1 Resumo Muitas pessoas relutam ao máximo quando precisam ir ao dentista, alegando que preferem protelar o tratamento a ter de enfrentar um procedimento desconfortável, provocado pelo medo ou trauma de más experiências anteriores. Com o propósito de amenizar esses tipos de sofrimentos e proporcionar mais conforto ao paciente, alguns odontólogos estão se utilizando de técnicas de hipnose em seus consultórios, especialmente em procedimentos nos quais a anestesia não costuma ser utilizada, e costumam gerar, na maioria dos casos, incomodo em maior ou menor grau a depender do paciente, e para aqueles que têm alergia à substância química presente no anestésico. A literatura aliada à prática clínica mostrou ser possível, com o auxílio da hipnose, fazer desde profilaxias, até extrações complexas se utilizando de nenhuma ou pouca anestesia. Os resultados se mostram satisfatórios e os pacientes estão perdendo seus medos e se permitindo ter uma saúde bucal mais adequada diante da intervenção da hipnose. Palavras chave: Hipnose. Odontologia. Dor. Anestesia. Trauma. Abstract Many people are reluctant to the fullest when in need to go to the dentist. They claiming to prefer delaying treatment than have to confront an uncomfortable procedure, caused by fear or trauma from previous bad experiences. Aiming to minimize these kinds of sufferings and provide more comfort to the patient, some dentists are using hypnosis techniques in their offices, especially in procedures in which anesthesia is not usually used and it generates, in most cases, discomfort in a greater or lesser degree depending on the patient, and for those who are allergic to the chemical present in the anesthetic. The literature and the clinical practice has proved * Graduando em psicologia, hipnólogo e hipnoterapeuta. E-mail: [email protected] 4 to be possible to make prophylaxis and even complex extractions using little or none anesthesia with the hypnosis's help. The results are shown being satisfactory and patients are losing their fears and allowing themselves to improve their oral health with the intervention of hypnosis. Key words: Hypnosis. Dentistry. Pain. Anesthetic. Trauma. 5 SUMÁRIO Introdução ..............................................................................................................................6 O que é e como funciona a hipnose ..................................................................................7 Hipnose e dor ...........................................................................................................................8 Hipnodontia .............................................................................................................................8 Estudos de caso........................................................................................................................9 Conclusão ...............................................................................................................................11 Referências.............................................................................................................................12 6 1 INTRODUÇÃO Em 1837, já se ouvia falar de casos de extrações dentárias feitas sob um chamado “sono magnético”, fazendo referência ao médico austríaco Franz Anton Mesmer, que produzia curas através de sua técnica conhecida como “magnetismo animal”. O dentista em questão era o francês Jean Etienne Oudet, que comunicou à Academia Francesa de Medicina, ter feito uma extração de molares usando esta técnica (WEISSMAN, 1958). Com o passar do tempo e o termo “hipnose” já cunhado e citado pela primeira vez pelo Dr. James Braid, em 1843, em sua publicação Neurypnology or the rationale of nervous sleep, esta ferramenta passou a ser reconhecida em diversas áreas, devido ao seu imenso poder de construir novas realidades aos sujeitos simplesmente através da linguagem (FERREIRA, 2003). Existe nos EUA, na Faculdade de Medicina de Concordia, em Moorhead, Minesota, uma disciplina dedicada exclusivamente ao estudo da hipnose voltada para a odontologia, a hipnodontia e, em 1955, Karl Weismann organizou os primeiros cursos de hipnodontia no Brasil a convite da Associação Brasileira de Odontologia, formando diversos alunos ao longo dos anos (WEISSMAN, 1958). Em 24 de agosto de 1966, o Conselho Federal de Odontologia normatizou, sob a lei 5081, o uso da hipnose na Odontologia (FERREIRA, 2003). A hipnose é utilizada nos consultórios odontológicos para diversos fins, tais como reduzir ou eliminar manifestações de fobias, medos, apreensões, ansiedades, hostilidades, resistência aos procedimentos, entre outros. O principal uso visa a eliminação da sensação de dor, fator que mais incomoda os pacientes durante determinados procedimentos. Além disso, a anestesia hipnótica pode ser usada sem nenhum risco em pacientes que apresentam alergias à anestesia química tradicional, provocando uma ação anestésica local e proporcionando um tratamento completamente indolor (WEISSMAN, 1958). 7 2 O QUE É E COMO FUNCIONA A HIPNOSE Quando se ouve a palavra "hipnose", normalmente esta é associada com alguma espécie de poder do hipnotizador sobre o hipnotizado, controle da mente e há, constantemente, uma aura e misticismo pelo fato desta estar associada a apresentações de ilusionismo e filmes que, muitas vezes, exageram e criam um sensacionalismo fictício a respeito deste fenômeno que não passa de algo natural que ocorre diariamente com todas as pessoas. O estado de transe hipnótico é frequentemente comparado ao estado de sono – daí vem o termo hypnos = sono – devido ao relaxamento profundo que ele provoca no sujeito hipnotizado. Porém, também existem estados hipnóticos em que este relaxamento não ocorre, fazendo com que o sujeito permaneça em estado de alerta e com total controle sobre sua musculatura. A Associação Americana de Psicologia define a hipnose como sendo um procedimento durante o qual um profissional de saúde ou pesquisador sugere a um cliente, paciente, ou sujeito que vivencie mudanças em sensações, percepções, pensamentos ou comportamentos12. Este contexto é iniciado após um procedimento de indução, em que sujeito necessita seguir instruções simples e manter sua atenção e concentração voltada para a voz do hipnólogo a fim de que as mudanças aconteçam e o sujeito vivencie uma experiência na qual terá acesso a novas formas de processamentos e acesso a informações, modulação de respostas sensoriais, dentre outras alterações derivadas do funcionamento cerebral em estado hipnótico. Quando o sujeito está em transe hipnótico, acontece de o córtex pré-frontal, responsável pelo julgamento crítico, reduzir seu funcionamento fazendo com que as sugestões dadas pelo hipnólogo atinjam diretamente os níveis inconscientes provocando mudanças fisiológicas imediatas. Existem vários mitos acerca da hipnose, o maior deles é que a pessoa perde o autocontrole e faz absolutamente tudo que o hipnólogo sugere, podendo até revelar segredos. No entanto, isto não acontece, pois quando a funcionalidade da parte da consciência crítica é reduzida a parte inconsciente, que representa uma parte muito maior, continua ativa e protegendo o sujeito contra algo que vá contra seus princípios. 1 <http://www.apa.org/topics/hypnosis/media.aspx> acessado em 25/10/2014 8 Porém, é extremamente importante que exista confiança no profissional da hipnose, pois alguém mal intencionado pode utilizar artifícios para burlar este "sistema de segurança" gerando mal estar ao sujeito hipnotizado. 3 HIPNOSE E DOR A dor é uma sensação fisiológica que, apesar de incômoda, é extremamente necessária e de alto valor adaptativo, pois é ela que nos indica quando algo está errado em nosso organismo e, sem ela, qualquer lesão ou inflamação nos passaria despercebida fazendo com que não procurássemos solução para a ameaça iminente e a situação se agravasse. Diante disso, a partir do momento que se sabe o agente etiológico da dor e se tem a solução para o problema, como acontece no ambiente do consultório odontológico, ela passa a ser um desconforto desnecessário e a fim de interrompê-la a hipnose vem como uma alternativa completamente natural para que essa sensação desapareça sem a necessidade de qualquer substância química. Além de um método para remoção da dor em um caso onde ela já está estabelecida, a hipnose também é utilizada antes de procedimentos dolorosos, como o caso citado nas publicações de Cloquet, em 1829, onde é relatada uma amputação de mama em uma paciente sob transe hipnótico (ANGELOTTI; FIGUEIRÓ, 2003). 4 HIPNODONTIA Hipnodontia é um termo cunhado para designar o uso da hipnose para fins de procedimentos odontológicos criado pelo norte-americano Dr. Aaron A. Moss, que a define como ramo da ciência dental que trata da aplicação da sugestão controlada e da hipnose à Odontologia2.3 Não se trata apenas de fazer extrações dentárias sem dor, mas do uso racional da metodologia num amplo leque de aplicações. O próprio Moss esclarece que há duas aplicações: A) TERAPÊUTICA HIPNODÔNTICA 1. Relaxamento do paciente 2 MOSS, A.A.. Hipnodoncia o hipnosis en odontologia. Buenos Aires: Mundi, 1961. 9 2. Eliminação dos temores do paciente e ansiedade em torno do tratamento 3. Eliminação de toda objeção ao tratamento necessário 4. Manutenção da comodidade do paciente durante a árdua e longa operação 5. Adaptação à aparelhagem ortodôntica e protética B) USO OPERATÓRIO 1. Anestesia ou analgesia 2. Amnésia para intervenções desagradáveis 3. Substituições ou complementação de medicamentos como anestesia geral 4. Prevenção de vômitos ou náuseas 5. Controle da salivação 6. Controle de hemorragias 5 ESTUDOS DE CASO Foram realizados, na Clínica Odontológica Dra. Karina Oyama, situada em Fortaleza-CE, alguns procedimentos nos quais os pacientes se submeteram à hipnose antes do início do trabalho odontológico. Neste artigo serão apresentados três estudos de caso a fim de ilustrar como funciona na prática o trabalho com hipnose no controle da dor dentro do contexto odontológico. CASO 1: Paciente: mulher, 40 anos. Procedimento realizado: profilaxia para remoção de tártaro. A paciente apresenta em seu histórico queixas de dores na presença de estímulos gelados e quentes e sangramento durante a escovação. Em entrevista, relata que seu limiar de dor costuma ser baixo, e sente um forte incômodo durante vários tipos de procedimentos, incluindo a profilaxia. Na última, realizada nove meses antes, relatou sentir muitas dores durante o procedimento e que estas perduraram por alguns dias. Na profilaxia realizada após uma indução hipnótica utilizando fixação de olhar, aprofundamento de transe fracionado e sugestões de calma, tranquilidade, conforto e 10 bem estar na região da boca, foi sugerido que a paciente relembrasse da sensação de ter recebido anestesia anteriormente em algum local na boca; o efeito alcançado foi de adormecimento da boca sem nenhuma sensação dolorosa, e o sangramento foi reduzido drasticamente durante a passagem do jato de bicarbonato. Ao término do procedimento a paciente relatou não ter sentido nenhuma dor durante o processo e a e a sensação de dormência permaneceu por algumas horas evitando dores posteriores. CASO 2: Paciente: mulher, 57 anos. Procedimento realizado: restauração. A paciente relata que na primeira vez que fez uma restauração sentiu muita dor e houve muito sangramento, necessitando duas doses de anestesia para que o procedimento pudesse ser concluído. Nos dias seguintes os dentes ficaram sensíveis diante da presença de alimentos ou bebidas quentes e geladas. No mesmo procedimento, anteriormente ao uso da hipnose, a paciente se encontrava apreensiva e com medo de sentir dor devido à experiência vivenciada anteriormente. Foi realizado um relaxamento através da respiração, indução através de fixação ocular seguido de um relaxamento progressivo usando contagem de 1 a 5. A sugestão dada para a paciente foi relembrar da última vez que teve na boca a sensação de anestesia, livre de dores. O resultado obtido não foi de boca dormente, no entanto, a sensação dolorosa desapareceu por completo permanecendo apenas a sensação dos toques e a pressão dos instrumentos utilizados durante o processo. A restauração foi concluída com êxito, desta vez sem a necessidade de nenhuma dose de anestesia química e a sensibilidade posterior também não ocorreu. CASO 3: Paciente: homem, 35 anos. Procedimento realizado: remoção de dor de dente O paciente chegou ao consultório queixando-se de dor de dente no lado inferior direito, impossibilitando o início do procedimento a ser realizado. Utilizando uma 11 técnica de visualização aplicada para a remoção da dor, foi solicitado ao paciente que desse um valor de 0 a 10 para a dor sentida e a resposta dada foi 5. Em seguida, foi pedido para que ele escolhesse uma forma geométrica e uma cor que representasse esta dor e a resposta obtida foi um retângulo vermelho. E, por fim, uma cor que representasse a ausência da dor tendo como resposta a cor azul. Foi iniciado o processo hipnótico com 3 ciclos de respirações profundas e lentas, visando a tranquilização do paciente seguido de uma indução por fixação ocular, que não se mostrou eficaz, então foi pedido ao mesmo que fechasse os olhos e visualizasse a si mesmo num local agradável e que sentisse bem. Neste lugar, que visualizasse um retângulo vermelho com um número 5 estampado, seguindo de uma contagem regressiva de 5 a 0, modificando a cada contagem a forma geométrica, a cor para uma tonalidade mais clara e próxima ao azul e a numeração estampada na forma que diminuía decrescentemente. Ao final da contagem, no número 0, a forma era um círculo azul bem pequeno, semelhante a uma bola de sabão, a qual foi se distanciando gradativamente e sumindo no espaço. Após uma mudança de foco do assunto, com perguntas triviais sobre seu cotidiano, foi questionado como estava a dor e o paciente relatou que a mesma havia desaparecido completamente. 6 CONCLUSÃO Os resultados obtidos na citada pesquisa de campo corroboram com os descritos na literatura, desta forma, ambos demonstram a eficácia da hipnose como auxiliar no controle da dor no contexto odontológico. Para tal, no entanto, é necessário que os pacientes apresentem certo grau de suscetibilidade hipnótica, não necessitando que este seja alto, bastando apenas a cooperação e aceitação do paciente ao procedimento. Existe um certo grau de rejeição dos pacientes ao recurso da hipnose, e esta rejeição se dá por pré conceitos, falta de conhecimento sobre o que é, como funciona e o que a hipnose é capaz de proporcionar. No entanto, os pacientes que aceitam passar pelo processo, relatam terem experienciado um procedimento odontológico mais tranquilo, confortável e indolor. 12 REFERÊNCIAS BRASIL. Código Penal Brasileiro. Decreto-Lei n° 5081 de 24 de agosto de 1966. FERREIRA, Marlus Vinicius da Costa. Hipnose na Prática Clínica. São Paulo: Atheneu, 2003. MOSS, A.A.. Hipnodoncia o hipnosis en odontologia. Buenos Aires: Mundi, 1961. <http://revistavivasaude.uol.com.br/saude-nutricao/66/artigo103999-1.asp/> Acessado em 19/09/2004 <http://www.apa.org/topics/hypnosis/media.aspx> Acessado em 25/10/2014 WEISSMAN, Karl. O Hipnotismo – Psicologia, técnica e aplicação. Rio de Janeiro: Prado, 1958.