JORNAL DA associação médica Página 14 • Fevereiro/Março 2010 ESPECIALIDADE Hipniatria: útil, mas pouco conhecida Alexandre Guzanshe Hipniatria é a utilização da hipnose clínica na medicina. Apesar de ser considerada pelo Conselho Federal de Medicina como “valiosa prática médica subsidiária de diagnóstico ou tratamento”, a hipniatria ainda é pouco conhecida entre os médicos. Para estimular os debates sobre o tema, o Departamento de Hipniatria da Associação Médica de Minas Gerais quer retomar suas atividades. “A ideia é reunir os médicos interessados”, afirma o hipniatra Mozart Smyth, representante e ex-presidente do departamento, que há 22 anos atua com hipnose clínica. Fundado em 1983 pelo psiquiatra Armando Naves, o Departamento de Hipniatria da AMMG é pioneiro no Brasil e precedeu até mesmo a publicação do Parecer do CFM 42/1999, que reconhece a hipniatria como ato médico. Os relatos de utilização da hipnose clínica, no entanto, remontam à Antiguidade e à Grécia Antiga. No século XIX, seu efeito anestésico era utilizado em cirurgias. Hoje, segundo Smyth, a hipniatria pode ser útil a diversas especialidades, tanto clínicas como cirúrgicas. “A hipnose médica pode utilizar fenômenos físicos, como analgesia, anestesia e catalepsia, ou psíquicos, como dissociação, reorientação temporal e hipermnésia”, explica o médico. Segundo ele, fenômenos hipnóticos como esses podem auxiliar no preparo para intervenções propedêuticas e procedimentos cirúrgicos, promovendo maior conforto pré, per e pós intervenção. A catalepsia permite que o paciente hipnotizado permaneça em posições desconfortáveis por longos períodos e, com isso, possa ser submetido ao desbridamento de feridas sem desconforto – exemplifica. Outro fenômeno da hipnose clínica citado por Smyth é a contração subjetiva do tempo, útil nas intervenções e internações. “O paciente tem a sensação de que o tempo é muito menor que o tempo real, cronológico. Com isso, reduz-se o estresse”, afirma. Fobias, transtornos de estresse pós-traumáticos e distúrbios psicossomáticos também podem ser tratados com o auxílio da hipnose clínica. “É importante ressaltar que o tratamento não é feito pela hipnose clínica e, sim, sob a hipnose clínica. Ela é um componente da estratégia geral do tratamento.” Em artigo publicado no Journal of Clinical and Experimental Hypnosis [2007 Jul, 55(3): 303-317], Elvira Lang afirma que o advento de novos procedimentos cirúrgicos passíveis de serem realizados em pacientes conscientes fez da hipnose clínica uma ferramenta valiosa na redução da dor, do estresse e do tempo de intervenção. A autora cita trabalho científico de Faymonville e equipe [p.307-308], que analisaram 1.650 casos cirúrgicos em que a anestesia geral foi substituída por técnicas da hipniatria aliada à sedação em pacientes conscientes. Eles O hipniatra Mozart Smyth quer reunir na AMMG médicos interessados em aprender sobre a hipnose clínica concluíram que os pacientes foram largamente beneficiados pela hipnose clínica e que tiveram participação ativa e maior conforto durante o ato cirúrgico, recuperação mais rápida e tempo de internação menor, na comparação com protocolos usuais de anestesia. O representante do Departamento de Hipniatria da AMMG explica ainda que o estado hipnótico é um fenômeno natural e que a grande maioria das pessoas é hipnotizável. “O grau de hipnotizabilidade varia de indivíduo para indivíduo, mas o paciente sempre permanece consciente, no ‘comando’ do que se passa. Somente com sua permissão e disponibilidade é possível induzir o estado hipnótico”, enfatiza. Segundo Mozart Smyth, as contra-indicações da hipnose clínica são relativas e dependem do quadro clínico e da oportunidade da intervenção. “A contra-indicação absoluta é o Transtorno Delirante Paranóide”, explica. Assim, ela só deve ser aplicada em pacientes cuja percepção da realidade não esteja afetada. Apesar de ter sido aceita como instrumental médico pela Sociedade Médica Britânica, em 1955, e pela Associação Médica Americana, em 1958, a hipnose clínica ainda é subutilizada, atesta Mozart Smyth e outros estudiosos da área. “Apresentações circenses, programas de TV, livros e filmes que mostram pessoas hipnotizadas em situações ridículas colaboram para a manutenção de conceitos incorretos”, afirma o médico. Por isso, como diz o próprio parecer do CFM, a hipniatria deve ser exercida somente por profissionais qualificados e sob rigorosos critérios éticos. Médicos interessados em conhecer a hipniatria e suas indicações propedêuticas e terapêuticas devem entrar em contato com o Setor Científico da AMMG pelo telefone (31) 3247 1619 ou e-mail [email protected]. Entidades médicas e instituições hospitalares podem solicitar palestras sobre o tema. O artigo científico mencionado pode ser encontrado no Centro de Documentação Científica da AMMG: www.cdc.inf.br ou (31) 3247 1633. Nefrologia lança “Pensar Mineiro” A Sociedade Mineira de Nefrologia lança este ano o Projeto de Ensino para Nefrologistas e Serviços com Alunos Residentes, batizado como “Pensar Mineiro”. Segundo o presidente da entidade, Ricardo Furtado, o objetivo é promover a discussão de casos clínicos, aumentando o intercâmbio entre nefrologistas do Estado. “Temos grandes profissionais atuando em toda Minas Gerais. Queremos ver como o mineiro pensa a nefrologia”, afirma. A estreia do projeto, no último dia 25 de fevereiro, trouxe um convidado de São Paulo: o patologista Luiz Moura. Os encontros serão realizados na última quinta-feira de cada mês, na sede da Associação Médica de Minas Gerais. Mais informações: (31) 3247 1616.