UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL Disciplina: SEMINÁRIOS APLICADOS SÍNTESE DE LIPÍDEOS EM RUMINANTES E INFLUÊNCIA DA DIETA NO PERFIL DE ÁCIDOS GRAXOS DA CARNE BOVINA Nome: Renata Cunha dos Reis Orientador: Prof. Dr. Moacir Evandro Lage GOIÂNIA 2013 ii RENATA CUNHA DOS REIS Disciplina: SEMINÁRIOS APLICADOS SÍNTESE DE LIPÍDEOS EM RUMINANTES E INFLUÊNCIA DA DIETA NO PERFIL DE ÁCIDOS GRAXOS DA CARNE BOVINA Seminário apresentado junto à Disciplina de Seminários aplicados do programa de Pósgraduação em Ciência Animal da Escola de Veterinária e Zootecnica da Universidade Federal de Goiás Área de Concentração: Sanidade Animal, Ciência e Tecnologia de Alimentos. Linha de Pesquisa: Higiene, ciência, tecnologia e inspeção de alimentos. Orientador: Prof. Dr. Moacir Evandro Lage Comitê de Orientação: Prof. Dr. João Restle - UFT Prof. Dr. Cristiano Sales Prado - UFG GOIÂNIA Setembro/2013 iii SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................ 6 2 REVISÃO DE LITERATURA .......................................................................... 7 2.1 Qualidade da carne bovina ........................................................................ 7 2.2 Lipídeos na carne bovina .......................................................................... 8 2.3 Síntese de ácidos graxos ........................................................................ 11 2.4 Biohidrogenação ...................................................................................... 16 2.5 Ácidos graxos Ômega 3 e Ômega 6 ....................................................... 18 2.6 CLA – Ácido linoleico conjugado ........................................................... 21 2.7 Ácido Vacênico ......................................................................................... 23 2.8 Eicosanoides ............................................................................................ 24 2.9 Trans.......................................................................................................... 26 2.10 A Influência da alimentação no teor de ácidos graxos ....................... 27 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 30 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 31 iv LISTA DE FIGURAS FIGURA 1. Diferentes índices de marmorizado simulados em placa acrílica .... 8 FIGURA 2. Médias por raça para ácidos graxos do Longissimus thoracis de bovinos.......................................................................................................... 11 FIGURA 3. Formação de acetato pela fermentação bacteriana ruminal. HSCoA = coenzima A; Pi = fosfato Inorgânico........................................................... 14 FIGURA 4. Conversão de Acetil-CoA à Malonil-CoA ....................................... 15 FIGURA 5. Biossíntese dos ácidos graxos....................................................... 16 FIGURA 6. Estrutura do ácido oleico, ácido linoleico e do ácido α-linolênico .. 20 FIGURA 7. Esquema da dessaturação e elongação do ácido linoleico e do ácido α-linolênico .................................................................................................... 21 FIGURA 8. Via metabólica proposta para biossíntese do C18:2 cis 9 trans 11. ...................................................................................................................... 25 FIGURA 9. Biossíntese de ácidos graxos n-3 e formação de eicosanoides .... 27 v LISTA DE ABREVIAÇÃO ACP - proteína carregadora de acila C14:0 – Ácido mirístico C16:0 – Ácido palmítico C18:0 – Ácido esteárico C14:1 cis 9 – Ácido miristoleico C16:1 cis 9 – Ácido palmitoleico C18:1 cis 9 – Ácido oleico C18:1 trans – Ácido trans vacênico C14:1 trans – Ácido miristelaídico C18:2 cis 9,12 (C18:2n-6) - Ácido linoleico C18:2 cis-9, trans-11 Ácido rumênico C18:3 cis 9,12,15 (C18:3n-3) - Ácido linolênico C20:4 cis 5,8,11,14 (C20:4n-6) – AA - ácido araquidônico C20:5 cis 5,8,11,14,17 (C20:5n-3) – EPA – Ácido eicosapentaenóico C22:5 cis 7,10,13,16,19 (C22:5n-3) – Ácido docosotrienóico C22:6 cis 4,7,10,13,16,19 (C22:6n-3) – DHA – Ácido docosahexaenóico CLA – Ácido linoleico conjugado PUFA - Poli-insaturados trans-11 C18:1 - Ácido trans-vacênico Ω-3 ou n-3 - Ômega-3 Ω-6 ou n-6 - Ômega-6 6 1 INTRODUÇÃO A qualidade da carne bovina é um fator muito importante para o consumidor, uma vez que a compra é definida por características como a cor, a proporção de gordura, a maciez, dentre outros aspectos. Os lipídeos contribuem significativamente nos parâmetros de qualidade citados acima, pois são responsáveis pela palatabilidade dos alimentos, além de trazer influências para a maciez e valor nutricional da carne. O valor nutricional vem sendo alvo de grande preocupação quanto a aspectos relacionados à saúde, uma vez que a carne bovina possui grande quantidade de gordura saturada. A maioria dos lipídeos nos alimentos são triglicerídeos. Este componente é formado pela união de três moléculas de ácidos graxos e uma molécula de glicerol. Os ácidos graxos podem ser classificados em saturados e insaturados, sendo que na primeira classificação a molécula não apresenta dupla ligação em sua estrutura e quando ingerida, pode trazer malefícios, como o aumento do LDL, uma lipoproteína de baixa densidade que ajuda no desenvolvimento de doenças coronárias. Já os ácidos graxos insaturados possuem pelo menos uma dupla ligação em sua estrutura e podem ser identificados como os ômegas 3 e ômega 6, que por sua vez, contribuem de modo inverso aos saturados, ajudando na diminuição do LDL e contribuindo para alguns benefícios importantes, como o bom funcionamento do sistema imunológico. Com base nessas informações, é necessário que se estude formas de aumentar o teor de ácidos graxos insaturados na gordura intramuscular bovina, uma vez que a biohidrogenação pode não acontecer totalmente, produzindo ácidos graxos como o linoleico conjugado (CLA), que tem agregado importantes funções ao organismo humano, como o combate a obesidade, a prevenção do câncer, a modulação do sistema imune, entre outros. Animais alimentados à pasto produzem carnes com maiores níveis de ômega 3 e 6 do que animais em confinamento. O uso de lipídeos e antimicrobianos na dieta também tem sido usados para aumentar o teor de gordura insaturada, pois as bactérias existentes no rúmen são as grandes responsáveis pela hidrogenação das duplas ligações e são sensíveis a estes componentes. 7 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Qualidade da carne bovina A qualidade da carne é determinada por consumidores pela percepção de características como, cor desejável e uniforme, maciez, menor quantidade de exsudação, alta proporção de marmorizado e moderado teor de gordura visível. Além disso, o consumidor espera que a qualidade da carne seja confiável em relação à segurança e nutrição, dentre outros fatores (TROY & KERRY, 2010). A qualidade também está associada à composição e à palatabilidade da carne. A cor da carne está relacionada com a quantidade de mioglobina, presente no músculo. O marmorizado, gordura intramuscular que possui relação direta com a suculência e sabor da carne, deve estar presente durante o corte, (Fig. 1). A capacidade de retenção de água, que a carne possui para reter a água durante a aplicação de forças externas, tais como corte, aquecimento, moagem ou prensagem, é um fator que também determina a suculência da carne (FERNANDES DE SÁ, 2004; LIMA JÚNIOR et al., 2011; MACIEL et al., 2011). FIGURA 1. Diferentes índices de marmorizado simulados em placa acrílica (SHIRANITA et al., 1998). Além dos fatores qualitativos, o depósito de gordura da carne é de grande importância em relação à composição de ácidos graxos e da saúde humana. O interesse na composição de ácidos graxos da gordura intramuscular tem aumentado a conscientização dos produtores em alterar a quantidade e a composição do depósito de gordura na carne (SCOLLAN et al., 2006). NUERNBERG et al. (2005) citaram que a carne tem recebido atenção, devido sua composição de lipídeos, visto que, além de fornecer sabor, aroma e textura à carne, a gordura pode trazer implicações à saúde humana, quando 8 ingerida. Em muitos países, a gordura da carne é considerada um componente não saudável, no entanto, sua presença nos tecidos adiposo e muscular contribui significativamente para vários aspectos da qualidade e são essenciais para o valor nutritivo da carne (WOOD et al., 2008). Os tecidos adiposos subcutâneo e intramuscular são os depósitos de gordura mais importantes sobre características de qualidade de carne. É desejável que a carcaça tenha quantidades mínimas de gordura no tecido subcutâneo sem uma diminuição prejudicial da gordura intramuscular (COSTA et al., 2013; PICKWORTH et al., 2010). A produção pecuária tem como objetivo fornecer carnes de alta qualidade. Deste modo, a bioquímica muscular e genômica pode ajudar a compreender melhor os mecanismos biológicos da determinação do teor de gordura intramuscular (HOCQUETTE et al., 2010). 2.2 Lipídeos na carne bovina A gordura da carne bovina é o componente que apresenta maior variação, e as quantidades depositadas normalmente resultam do balanço entre energia da dieta e requerimentos metabólicos (ERIKSSON & PICKOVA, 2007). ROSSATO et al. (2010) estudaram a composição centesimal de animais terminados a pasto e encontraram valores de 2,99 e 3,17% para lipídeos totais em Longissimus thoracis de bovinos Nelore e Angus, respectivamente. Os óleos e as gorduras são compostos de estrutura orgânica originados na sua maioria pela união de três ácidos graxos e um poliálcool chamado glicerol, formando uma estrutura conhecida como triglicerídeo, que compõe aproximadamente 98% da gordura dos alimentos. São classificados em saturados, monoinsaturados e poli-insaturados (BRANDÃO et al., 2005). Dentre as diferenças nos ácidos graxos vale ressaltar a presença de pelo menos uma dupla ligação na estrutura molecular dos insaturados. A elevação da concentração plasmática de colesterol e de LDL também pode ser evidenciada quando ácidos graxos saturados são consumidos (LOTTENBERG, 2009). A composição em ácidos graxos dos alimentos é de grande importância, principalmente os poli-insaturados das famílias ômega-3 e ômega-6, aos quais 9 se atribuem numerosos benefícios ao organismo humano (LIRA et al., 2004). Ambos os tipos podem ser encontrados na carne bovina (SCOLLAN et al., 2006). Os ácidos graxos são denominados trans, quando os hidrogênios ligados aos carbonos de uma insaturação encontram-se em lados opostos. As gorduras trans sempre estiveram presentes na alimentação humana, através do consumo de alimentos provenientes de ruminantes (FELDMAN et al., 1996; MARTIN et al., 2004) Como exemplo de ácido graxo monoinsaturados pode-se citar o ácido trans-vacênico, que apesar de ter configuração trans atua como precursor para a formação do ácido linoleico conjugado (CLA), que é classificado com ácido poli-insaturado, nos tecidos. Por ser um produto intermediário no processo da biohidrogenação do ácido linoleico no rúmen, após ser absorvido, este ácido graxo trans pode ser transformado em CLA nos tecidos dos ruminantes, através da enzima delta-9-dessaturase (GRIINARI et al., 2000; MAGGIONI, 2006). A Figura 2 apresenta a composição dos ácidos graxos presentes no Longissimus thoracis de bovinos Nelore e Angus. Para esta avaliação, os autores concluem o estudo afirmando que grupos genéticos B. taurus e B. indicus terminados a pasto influenciaram o perfil de ácidos graxos. Esse efeito é mais pronunciado nos ácidos graxos poli-insaturados trans vacênico (C18:1 trans), ácido linoleico (C18:2 cis 9), CLA trans 11, e ácido linolênico (C18:3n-3), o que sugere diferença entre animais das raças (ROSSATO et al., 2010). Pelo sistema de nomenclatura oficial, nos ácidos graxos saturados, a terminação “o” do hidrocarboneto (18 carbonos: octadecano) é substituída por “oico” (octadecanóico), enquanto que em ácidos graxos insaturados, a designação “anoico” é modificada para “enoico”, indicando a presença de uma dupla ligação (octadecenóico) (DAMODARAN et al., 2010). O sistema de abreviação numérica também pode ser utilizado. O ácido graxo é represando pelo número de carbonos e pelo grau de insaturação, indicando o número de duplas ligações, isto e, se for ácido graxo saturado, será zero, ou 1,2,3, etc., no caso de serem respectivamente mono, di, tri-insaturado, etc. Por exemplo, o ácido esteárico C18:0, oleico C18:1 (SOUZA et al., 1998). O primeiro número nesse sistema designa o número de carbonos do ácido graxo, enquanto o segundo designa o número de carbonos de ligações duplas. As posições das duplas ligações estão numeradas por delta (Δ), que indica a 10 posição da dupla ligação a partir do carbono carboxílico. Por exemplo, o ácido oleico, que tem 18 carbonos e uma dupla ligação entre os carbonos 9 e 10, seria abreviado para 18:1 Δ9 (DAMODARAN et al., 2010). FIGURA 2. Médias por raça para ácidos graxos(a) do Longissimus thoracis de bovinos (ROSSATO et al., 2010). 11 2.3 Síntese de ácidos graxos A deposição de gordura em animais ruminantes ocorre principalmente por dois processos: incorporação dos ácidos graxos pré-formados, transportados pelas lipoproteínas do plasma e por meio da síntese de ácidos graxos. Cerca de 90% da síntese de ácidos graxos ocorre no tecido adiposo, onde o principal precursor é o acetato (VERNON, 1981; KOZLOSKI, 2009). A composição de ácidos graxos de produtos de origem animal (ovos, leite e carne) leva a refletir tanto na síntese de ácidos graxos do tecido quanto na composição de ácidos graxos dos lipídeos ingeridos pelos animais. Essa relação é mais forte em monogástricos (suínos, aves domésticas e coelhos) do que em ruminantes, que sofrem biohidrogenação no rúmen (KOUBA & MOUROT, 2010). O rúmen fornece o ambiente propício para o crescimento e reprodução de micro-organismos que fermentam a glucose e produzem ácidos graxos voláteis (AGV) (OLIVEIRA et al., 2007). Os AGV são a principal fonte de energia para os ruminantes (BERCHIELLI et al., 2006). Os principais ácidos graxos voláteis produzidos por micro-organismos do rúmen são acetato, propionato, e butirato, e servem como os precursores principais para glicose e gordura em ruminantes (BERCHIELLI et al., 2006; NASCIMENTO et al., 2008; VERNON et al., 2001). Segundo GOULARTE et al. (2011), o total de AGV em ruminantes está entre 60 e 150 mM/mL de líquido ruminal, sendo estes ácidos, reflexo da atividade microbiana e da absorção através da parede ruminal. Quando a dieta é rica em carboidratos fibrosos as proporções molares de acetato:propionato:butirato são de 75:15:10, quando são dietas ricas em carboidratos não fibrosos, a proporção é de 40:40:20 respectivamente. O acetato é o principal produto de digestão de carboidratos em ruminantes, uma vez que é o único ácido graxo volátil encontrado no sangue em quantidades significativas (OSORIO & VINAZCO, 2010). Segundo MOTA et al. (2010) a degradação da celulose e hemicelulose produz maior proporção de acetato, enquanto que a degradação dos carboidratos solúveis (amido e açúcares), eleva a produção de propionato, diminuindo a proporção de acetato e de butirato. A diminuição na proporção de acetato em dietas com alto teor de carboidratos de rápida fermentação ocorre por conta da morte das bactérias fibrolíticas e dos 12 protozoários (principais produtores de acetato), ocasionada pela diminuição do pH ruminal. Estudos a fim de avaliar a influência da dieta na quantidade de AGV em ruminantes são realizados. GOULARTE et al. (2011) avaliaram a interferência da alimentação de vacas leiteiras mestiças que receberam variadas proporções de volumoso:concentrado (o volumoso utilizado foi silagem de milho, e o concentrado foi à base de milho (20%), sorgo (20%), farelo de soja (27%), casca de soja (20%), suplemento mineral, ureia (2%) e gordura protegida (9%) na quantidade de AGV. Como resultados obtiveram média dos AGV totais de 96,36 mM/mL, com concentração máxima em 8,40 horas após alimentação e 45% de concentrado na dieta, aproximadamente. A não observação de alterações com aumento do teor de concentrado indica que o volumoso utilizado (silagem de milho) foi de excelente qualidade, sendo fundamental na manutenção das condições ruminais. CHAPAVAL et al. (2008) ao analisarem diferentes proporções de volumoso e concentrado, não observaram efeito da proporção de concentrado na dieta sobre a soma dos AGV dosados. Uma diferença metabólica bem reconhecida e importante entre os ruminantes e monogástricos é a insuficiente quantidade de carbono a partir da glucose para contribuir com a síntese de ácido graxo no interior dos tecidos de um ruminante, que conta com a baixa atividade das enzimas ATP citrato liase e malato desidrogenase (LALIOTIS et al., 2010). Em monogástricos, o acetil-CoA e malonil-CoA agem como doadores de carbono e o NADPH como agente redutor. O acetil-CoA provém da mitocôndria, saindo sob forma de citrato, sendo regenerado a acetil-CoA pela citrato liase ao chegar no citosol. O malonil-CoA é formado a partir da condensação do acetil-CoA com bicarbonato pela ação da acetil-CoA carboxilase tendo a biotina como cofator. A partir da combinação do acetil-CoA, malonil-CoA e NADPH ocorre a síntese dos ácidos graxos (LEHNINGER et al., 2000; VEMURI & KELLEY, 2007). A formação do acetato, por meio da fermentação microbiana no rúmen, está demonstrada na Fig. 3. 13 FIGURA 3. Formação de acetato pela fermentação bacteriana ruminal. HSCoA = coenzima A; Pi = fosfato Inorgânico (PALMQUIST & MATTOS, 2006). Em ruminantes, o acetato é absorvido diretamente pelo epitélio ruminal ou intestinal e é transformado a acetil-CoA por meio da oxidação dentro da mitocondria, na presença de acetil-CoA sintetase, no citosol. Este é a maior fonte de Acetil-CoA em ruminantes uma vez que a atividade da ATP citrato liase é extremamente reduzida, e a passagem de acetil-CoA mitocondrial é limitada (NASCIMENTO et al., 2008; OSORIO & VINAZCO, 2010). Para a síntese de ácidos graxos, a primeira reação é a conversão do acetilCoA em malonil-CoA pela atividade da acetil-CoA carboxilase (enzima chave). Nesta reação, catalisada pela biotina (vitamina B 7), o CO2 é fixado ao carbono metílico do acetato, conforme Figura 4 (PALMQUIST & MATTOS, 2006). FIGURA 4. Conversão de Acetil-CoA à Malonil-CoA. 14 Malonil-CoA reage então com a proteína carregadora de acila (ACP), na presença de malonil-CoA-ACP transciclase, formando malonil-ACP. O mesmo acontece com o acetil-CoA na presença de acetil-CoA-ACP transciclase formando acetil-ACP. Em seguida acontece a reação entre acetil-CoA e malonilACP, aumentando a cadeia em dois átomos de carbonos, resultando no butirilACP. Logo após, o butiril-ACP reage com o malonil-ACP, resultando na elongação da cadeia em mais dois carbonos originando o caproil-ACP. A elongação da cadeia acontece por sucessivas reações dos complexos “ACP” com a malonil-CoA até que o palmitoil-ACP seja formado. A ação da tioesterase específica, produz o ácido palmítico livre. Toda a reação está representada abaixo (NASCIMENTO et al., 2008): Acetil-CoA + 7Malonyl-CoA + 14 NADPH + H+ ➔ Ác. Palmítico + 14NADP + 8CoA + 7CO2 + + 7H2O O palmitato é então utilizado como substrato para posterior síntese de ácidos graxos através de procedimentos de alongamento e/ou dessaturação, no retículo endoplasmático, através da interação de muitas enzimas catalíticas (por exemplo, redutases, dessaturases, elongases) (LALIOTIS et al., 2010). O palmitato é um ácido graxo representado pela sigla numérica 16:00, ou seja, 16 átomos de carbono e não há sítios de insaturação (SHERIFF, 2004). O alongamento envolve a condensação de grupos de acetil-CoA com malonil-CoA, como na reação de síntese do palmitato. Como produto resultante tem-se a formação de dois átomos de carbono a mais ao da cadeia anterior, com liberação de CO2 a partir de malonil-CoA, que é submetido a redução seguida de desidratação e posterior redução, produzindo assim um ácido graxo saturado. As reações de redução de alongamento requer NADPH como cofator, assim como para as reações semelhantes catalisadas pela síntese de ácido graxo (SHERIFF, 2004). Em mamíferos, a dessaturação envolve três enzimas dessaturases, delta5, delta-6 e delta-9-dessaturase, que introduzem a insaturação nos carbonos C5, C6 ou C9. Destas, apenas a delta-9-dessaturase atua em ácidos graxos saturados, para convertê-los ao seu respectivo ácido graxo monoinsaturado. O mais abundante é o ácido oleico produzido do ácido esteárico (18:00). A delta- 15 9-dessaturase, que é codificada pelo gene estearoil-CoA desaturase, também converte o ácido trans-vaccênico ao seu correspondente ácido linoleico conjugado (CLA) isómero cis-9, trans-11 CLA (SMITH et al., 2009). O ácido esteárico (18:0) é muito importante para a síntese de ácidos graxos insaturados. A introdução de uma dupla ligação entre os átomos de carbonos 9 e 10 é catalisada pela enzima delta-9-dessaturase. Esta enzima está presente em plantas e animais, e converte o ácido esteárico para o ácido oleico (Figura 5) (CALDER, 1998; TEITELBAUM & WALKER, 2001). FIGURA 5. Biossíntese dos ácidos graxos (CALDER, 1998). Portanto, o ácido oleico (18:1) não é um ácido essencial, consequentemente, pode competir com os ácidos linoleico e α-linolênico e seus produtos intermediários, para as reações mediadas por dessaturases e elongases (WOUTERSEN et al, 1999). Nas plantas, a enzima delta-12dessaturase converte o ácido oleico em ácido linoleico e a delta-15-dessaturase converte o ácido linoleico em ácido α−linolênico (CALDER, 1998; TEITELBAUM & WALKER, 2001). JOHN et al. (1991) verificaram uma capacidade limitada de dessaturação de ácidos graxos no fígado de bovinos e que, o tecido adiposo é o principal local 16 onde ocorre o alongamento e a dessaturação de ácidos graxos pela enzima delta-9-dessaturase. Ainda como resultados, encontraram que há maior atividade de elongases do que de dessaturases. A carne dos bovinos é rica em ácidos graxos saturados derivados do processo peculiar de digestão de lipídeos nos ruminantes. Ao mesmo tempo, crescem as recomendações, por órgãos de saúde, da ingestão dos ácidos graxos poli-insaturados (PUFA) e do equilíbrio dietético entre os insaturados, na relação ômega 6:ômega3 (LIMA JÚNIOR et al. 2011). Cerca de 5% dos ácidos graxos totais em carne são compostos de ácidos poli-insaturados, o mais abundante é o ácido linoleico, que pode ser derivado do ácido graxo monoinsaturado CLA cis-9, trans-11, que contém uma ligação dupla na posição do carbono 9, introduzida na estrutura do ácido graxo por uma planta, uma vez que este ácido não é produzido pela delta-9-dessaturase em tecidos animais (SMITH et al., 2009). A relação de ômega 6:ômega 3 é particularmente equilibrada, nas carnes de ruminantes, especialmente na carne de animais criados a pasto, com altos níveis de ácido linolênico (ω-3). Ruminantes também produzem naturalmente o ácido linoleico conjugado (CLA), que pode ter grandes benefícios na promoção da saúde (SCOLLAN et al. 2001; SCOLLAN et al. 2006). 2.4 Biohidrogenação A biohidrogenação é obtida pela adição de um íon hidrogênio em uma dupla ligação, resultando na conversão de ácidos graxos insaturados em seus saturados correspondentes. Como exemplo, a maioria dos ácidos insaturados que têm 18 carbonos (18:1, 18:2 e 18:3, respectivamente, oleico, linoleico e linolênico) ou 16 carbonos (16:1, o palmitoleico) será convertida a ácido esteárico (18:0) e palmítico (16:0), respectivamente. Uma vez que, o processo de biohidrogenação não é 100% completo para todos os poli-insaturados, alguns como o ácido linoleico, linolênico e produtos intermediários tais como ácidos linoleico conjugados e trans-11 C18:1 (ácido trans-vacênico) alcançam o duodeno e são absorvidos (HOLANDA et al., 2011). 17 Os ácidos graxos provenientes da dieta são hidrolisados e, em seguida os poli-insaturados são rapidamente hidrogenados pelos micro-organismos do rúmen, resultando na produção de ácidos graxos saturados (principalmente ácido esteárico; 18:00). Esta é uma das principais razões pela alta natureza saturada dos lipídeos nos ruminantes. Este processo também resulta na formação de ácido linoleico conjugado (CLA) e seus intermediários, incluindo o ácido cis-9, trans-11 CLA e ácido vacênico (VA; trans-11 18:01 (KIM et al., 2009). Para minimizar os efeitos tóxicos dos ácidos graxos obtidos da alimentação, sobre a fermentação ruminal, as bactérias lipolíticas secretam lipases como, a ácido linoleico isomerase, para liberar os ácidos graxos insaturados (PARODI, 1999). A lipólise é um pré-requisito para que ocorra a biohidrogenação. Os lipídeos provenientes da dieta são hidrolisados extensivamente por lipases microbianas ruminais, que provocam a liberação de seus ácidos graxos constituintes (JENKIS, 1993). Após a lipólise, com a oxidação dos triacilgliceróis a ácidos graxos livres e glicerol, a síntese do CLA tem início, propriamente, com a isomerização dos ácidos graxos insaturados e posterior biohidrogenação pelas bactérias ruminais (os protozoários desempenham um papel secundário neste processo) (HOLANDA et al., 2011). A isomerização consiste na mudança de orientação da dupla ligação da molécula do ácido graxo, convertendo os isômeros nativos cis em isômeros trans, mudando a localização da dupla ligação na cadeia de carbono. O passo de isomerização muda a posição da dupla ligação da posição 12 para a posição 11 e muda sua configuração de cis para trans. Os trans são subsequentemente hidrogenados e convertidos a ácido esteárico (HOLANDA et al., 2011). Diferentes estratégias nutricionais tem sido utilizadas, como a alimentação de ruminantes com forragem, óleos vegetais, sementes de oleaginosas, produtos marinhos e até antimicrobianos (monensina) para verificar a eficácia sobre a composição da comunidade microbiana no rúmen. O principal substrato de ácidos graxos para biohidrogenação em animais de pasto é ácido linolênico, porque é o ácido graxo mais abundante presente em glicolipídios e fosfolipídios de gramíneas e outras forragens, enquanto suplementos de ácido linoleico em 18 forma de triacilgliceróis são geralmente o principal substrato para biohidrogenação (LOURENÇO et al., 2010). Os ácidos graxos poli-insaturados são mais tóxicos para as bactérias que participam da biohidrogenação em relação aos ácidos graxos monoinsaturados. Quando ácidos graxos poli-insaturados são ingeridos por ruminantes, a biohidrogenação acontece para permitir a sobrevivência da bactéria Butyrivibrio fibrisolvens, que é a maior responsável por este processo (MAIA et al., 2007; MAIA et al., 2010). O consumo de grãos diminui o pH do rúmen, reduzindo a atividade da B. fibrisolven, ao contrário das dietas à base de capim que prevê um ambiente ruminal mais favorável para a síntese bacteriana subsequente (BESSA et al., 2000). 2.5 Ácidos graxos Ômega 3 e Ômega 6 São ácidos graxos poli-insaturados considerados essenciais, devido à incapacidade do organismo de sintetizá-los, devem ser adquiridos através da dieta (SCOLLAN et al., 2006). As famílias ômega 6 e ômega 3, representados pelo ácidos graxos linoleico e α-linolênico, abrangem ácidos graxos que apresentam insaturações separadas apenas por um carbono metilênico, com a primeira insaturação no sexto e terceiro carbono, respectivamente, enumerado a partir do grupo metil terminal (MARTIN et al., 2005). Os ácidos graxos ômega-3 (Ω-3 ou n-3) e ômega-6 (Ω-6 ou n-6) consistem de ácidos graxos poli-insaturados contendo de 18 a 22 carbonos. A designação de ômega tem relação com a posição da primeira dupla ligação, contando a partir do grupo metílico final da molécula de ácido graxo. Os ácidos graxos n-3 apresentam a primeira dupla ligação entre o terceiro e o quarto átomo de carbono, enquanto os ácidos graxos n-6 têm a primeira dupla ligação entre o sexto e o sétimo átomo de carbono (WILEY & SONS, 1979). A Figura 6 apresenta as estruturas do ácido oleico, linoleico e linolênico. 19 FIGURA 6. Estrutura do ácido oleico, ácido linoleico e do ácido α-linolênico (ROSE & CONNOLLY, 1999). Nos seres humanos, o ácido linoleico pode ser elongado e dessaturado em ácido araquidônico e o ácido α-linolênico em ácido eicosapentaenóico (C20:5n3; EPA) e ácido docosahexaenóico (C22:6n-3; DHA), conforme demostrado na Figura 7 (LEE & LIP, 2003). Os ácidos graxos ômega 3 podem ajudar a prevenir ou tratar uma variedade de doenças, incluindo doenças do coração, câncer, artrite, depressão, mal de Alzheimer, dentre outros. Os ômega 6 exercem importante papel fisiológico: participam da estrutura de membranas celulares, influenciando a viscosidade sanguínea, permeabilidade dos vasos, ação antiagregadora, pressão arterial, reação inflamatória e funções plaquetárias (MORAES & COLLA, 2006). A redução no consumo de alimentos ricos em ácidos graxos n-3, em sociedades industrializadas, aumenta a relação n-6:n-3. É necessário que esta relação seja adequada, pois o balanceamento inadequado pode acentuar um estado de deficiência de n-3 (CONNOR, 2000; SUÁREZ-MAHECHA et al., 2002). O consumo exclusivo e constante de gorduras vegetais contendo grandes quantidades de n-6 pode resultar em produção excessiva de eicosanóides e peróxidos da série Leucotrienos4, PGI2 e TXA2. Em um organismo sadio, 20 quantidades extremamente baixas de eicosanóides são produzidas, enquanto que em tecidos alterados e em condições patológicas, como inflamações, artrites, hemorragias, lesões vasculares e oncogêneses, grandes quantidades são sintetizadas. Estes fenômenos têm relação com as prostaglandinas, leucotrienos, tromboxanos e radicais livres dos peróxidos (LIMA JÚNIOR, et al., 2011). FIGURA 7. Esquema da dessaturação e elongação do ácido linoleico e do ácido α-linolênico (CALDER, 1998; TEITELBAUM & WALKER, 2001). Nos ruminantes, o ácido linoleico, o qual é em níveis elevados nos alimentos concentrados (grãos e oleaginosas), é degradado em ácidos graxos monoinsaturados e saturados no rúmen por biohidrogenação microbiana e só uma pequena proporção, está disponível para a incorporação nos lipídeos dos 21 tecidos. Este ácido graxo encontra-se em níveis mais elevados no músculo do que o tecido adiposo. O ácido α-linolênico que está presente em muitos alimentos concentrados, mas em níveis inferiores ao 18:2n- 6, também tem uma grande proporção biohidrogenada a ácidos graxos saturados no rúmen (WOOD et al., 2008). GLASSER et al. (2008) conduziram uma análise de digestão de ácidos graxos no rúmen com 294 tratamentos. Os maiores fatores que influenciaram a biohidrogenação foram: pH ruminal, relação volumoso:concentrado, nível de consumo e suplementação de óleo de peixe. Estes autores encontraram um efeito significativo protetor do baixo pH ruminal para o ácido linoleico e αlinolênico. Da mesma forma, uma alta proporção de forragem na dieta teve efeito negativo nos fluxos de 18:2n-6 e 18:3n-3 para o duodeno, sugerindo aumento da biohidrogenação. Altos níveis de ingestão de 18:3n-3 presente no óleo de peixe, contribuiu para a permanência de 18:3n-3 e trans-18:1, diminuindo a proporção de 18:00, no total dos fluxos duodenais. ROSSATO et al. (2010) avaliaram a influência da alimentação a pasto em animais da raça Nelore e Angus. Como resultado, encontraram na gordura intramuscular de animais Nelore maior deposição de C18:2n-6, C18:3n-3, bem como maior deposição de ácidos graxos intermediários da biohidrogenação (C18:1 trans e C18:2 trans 11). Segundo os autores, esses resultados sugerem duas alternativas de resultados na raça Nelore, ou houve maior aporte nas quantidades de C18:2 n-6 e C18:3 n-3, seguido de maior produção de ácidos graxos intermediários da biohidrogenação, ou maior quantidade de C18:2n-6 e C18:3n-3 passou no rúmen sem sofrer biohidrogenação, acompanhada de maior biohidrogenação incompleta. FERNANDES et al. (2009) estudaram a terminação em confinamento de animais Canchim com dietas contendo grãos de girassol, que contem alta quantidade de ácidos graxos poli-insaturados, verificando que a dieta proporcionou maior quantidade de ácido linoleico conjugado (cis 9-trans 11) e ácidos graxos poli-insaturados na gordura intramuscular. 2.6 CLA – Ácido linoleico conjugado 22 Produzido no rúmen, pela fermentação microbiana da Butyrovibrio fibrisolvents, o ácido linoleico conjugado (CLA) é produto da isomerização do ácido linoleico (JENKINS et al., 2008). O CLA é o conjunto de isômeros geométricos do ácido linoleico que tem propriedades bioativas distintas (anticarcinogênicas, hipocolesterolêmica, combate a obesidade e participa na modulação do sistema imune). É originário da biohidrogenação dos ácidos linoleico e linolênico no rúmen (HOLANDA et al., 2011). O CLA têm duas duplas ligações separadas por apenas uma ligação simples (insaturação conjugada). A conjugação da dupla ligação é geralmente nas posições 9 e 11 ou 10 e 12, podendo apresentar configuração geométrica nas formas cis-cis, cis-trans, trans-cis e trans-trans. (ABU-GHAZALEH et al., 2001). Existem nove diferentes isômeros do CLA, sendo o mais abundante, além de ser a forma biologicamente ativa, a isoforma cis-9, trans-11 C18:2 (ácido rumênico), que representa de 80 a 90% do total de CLA na gordura intramuscular e subcutânea de bovinos (EVANS et al., 2002). CLA é um termo genérico utilizado para referir a posições e geometria dos isômeros do ácido linoleico com uma dupla conjugada. Os dois principais isômeros de CLA, cis-9, trans-11 e trans-10, cis-12, são naturalmente encontrado em produtos lácteos e carnes de ruminantes, com cis-9, trans-11 CLA, sendo o isómero mais abundante (aproximadamente 75 a 90% de cis-9, trans-11 CLA, 10 a 25% de trans-10, cis-12 CLA). Uma vez que a maioria de cis9, trans-11 CLA nos tecidos animais é sintetizado pela delta-9-dessaturase no rúmen (KIM et al., 2009). Os ruminantes possuem elevados teores de C18:2 cis-9 trans-11 pelo fato de ser este um intermediário da biohidrogenação ruminal do ácido linoléico. Outra fonte de CLA na carne de ruminantes é a ação da enzima delta-9dessaturase sobre o ácido vacênico (C18:1 Trans-11), no próprio tecido adiposo (BAUMAN et al., 2000). Para transformar o ácido linoléico em ácido vacênico é necessário a presença da enzima cis-12, trans-11 linoleato isomerase que catalisa a reação. Para completar a reação, são necessários radicais carboxila (COOH) livres 23 (KEPLER et al., 1966). Os radicais carboxilas são oriundos da lipólise dos galactolipídios, fosfolipídios e triglicerídeos da dieta, que acontece anterior à isomerização. Várias espécies de bactérias possuem um complexo capaz de hidrolisar as ligações éster dos ácidos graxos (BAUMAN et al., 2000). Na Figura 8 estão apresentadas a via metabólica proposta para biossíntese do C18:2 cis 9 trans 11. Embora seja evidente que o CLA exerce efeitos benéficos à saúde em animais na melhora do metabolismo plasmático de lipoproteínas e na prevenção de aterosclerose, não há informações suficientes sobre seus efeitos em humanos, tornando difícil predizer os efeitos da suplementação com CLA em longo prazo (GROFF FUNCK et al., 2006). FIGURA 8. Via metabólica proposta para biossíntese do C18:2 cis 9 trans 11, adaptado por BAUMAN et al. (2000). 2.7 Ácido Vacênico O ácido vacênico, C18:1 trans-11 é formado no processo de biohidrogenação, por meio da redução da ligação cis do ácido graxo CLA (HARFOOT & HAZLEWOOD, 1988). O ácido vacênico também serve como substrato para síntese endógena de CLA, através da enzima delta-9dessaturase, que adiciona uma insaturação no carbono 9 do ácido vacênico. 24 O último processo de biohidrogenação, que consiste na conversão do ácido vacênico em ácido esteárico (C18:0), pode ser inibido quando óleo de peixe é adicionado à dieta, aumentando significativamente a concentração ruminal de ácido vacênico (WHITLOCK et al., 2006). Em bovinos, o aumento do teor de ácido vacênico com óleo de peixe é importante por ser capaz de aumentar a síntese endógena de CLA (GRIINARI et al., 2000). WANG et al. (2008) não detectaram nenhum resultado prejudicial à saúde de ratos, magros ou obesos que receberam alimentação em curto prazo, de 1,5% de ácido vacênico. Além disso, a suplementação na dieta com ácido vacênico levou a uma diminuição significativa da concentração plasmática de triglicerídeos. Estas observações corroboram a hipótese de que os ácidos graxos trans industriais e de ruminantes têm bioatividade diferentes que garante mais investigação. 2.8 Eicosanoides Os dois ácidos graxos essenciais mais importantes de 20 carbonos são, o ácido araquidônico (C20: 4n-6, AA), que é formado pela dessaturação e alongamento de ácido linoleico, e ácido eicosapentaenóico (C20: 5n-3, EPA), que é formado pela dessaturação e alongamento de ácido α-linolênico. A carne e o óleo de peixe são as únicas fontes alimentares importantes de C20:4n-6 (ácido araquidônico) e C22: 6n-3 (ácido docosahexaenóico), respectivamente (SMITH, 2007). Os ácidos graxos de cadeia longa, como o ácido araquidônico e ácido eicosapentaenóico estão relacionados com a produção de eicosanóides. O ácido araquidônico está presente em carnes magras, principalmente em animais alimentados a pasto (WOOD et al., 2008). O ácido araquidônico tem grande importância nos primeiros meses de vida de seres humanos, sendo constituinte de estruturas celulares e precursores de mediadores inflamatórios (SCHMEITS et al. 1999). Os eicosanóides são metabólitos oxigenados, com 20 átomos de carbono. A família dos eicosanóides é composta por prostaglandinas, leucotrienos, prostaciclinas, tromboxanos e derivados dos ácidos graxos hidroxilados. Os 25 substratos para a formação dos eicosanóides são o ácido dihomo-gammalinolênico, o ácido araquidônico e o ácido eicosapentaenóico. Para a síntese destas substâncias, o ácido graxo precursor é clivado dos fosfolipídios da membrana pela ação da fosfolipase A2 ou fosfolipase C (KONING et al., 1997). O primeiro passo na biossíntese dos eicosanóides é a libertação de ácidos graxos poli-insaturados da membrana fosfolipídica através de fosfolipases. O ácido livre é o substrato para as enzimas que sintetiza vários eicosanóides. (RATNAYAKE & GALLI 2009). Os eicosanóides oriundos do metabolismo do ácido graxo poli-insaturado ômega-6, particularmente araquidônico, são da série par, e são as prostaglandinas2, leucotrienos4, e tromboxanos A2. O ácido graxo alfa-linolênico (ômega-3) pode ser convertido em ácido eicosapentaenóico (EPA) e docosahexaenóico (DHA) que competem com o araquidônico pelas vias enzimáticas da ciclooxigenase e lipoxinase e também formam eicosanóides. No entanto, são eicosanoides da série ímpar, como as prostaglandinas da série 3, leucotrienos da série 5, e tromboxanos A3 (PADILHA & PINHEIRO, 2004; WYNDER et al., 1997). A Figura 9 mostra essa conversão. Os eicosanoides provenientes do ácido araquidônico são biologicamente ativos em pequenas concentrações e, se formados em elevadas quantidades, favorecem a síntese de eicosanóides inflamatórios e contribuem para formação de trombos e ateromas. Logo, deve-se aumentar a ingestão de EPA e, consequentemente, diminuir a ingestão de AA, resultando na produção de compostos menos inflamatórios. Quando seres humanos ingerem ácidos graxos n-3, os EPA e DHA provenientes da dieta substituem parcialmente os ácidos graxos n-6, principalmente, o ácido araquidônico nas membranas e células do fígado. Portanto, o metabolismo dos eicosanóides provenientes do ácido araquidônico é alterado, favorecendo a formação de eicosanóides antiinflamatórios (UAUY & VALENZUELA, 2000; SURETTE 2008). A Prostaglandina E2 e o leucotrieno4 são potentes eicosanoídes próinflamatórios oriundos da metabolização do ácido araquidônico pelas enzimas ciclooxigenase e lipooxigenase, respectivamente (ANDRADE & CARMO, 2006). Os PUFAs contidos na dieta reduzem o nível de colesterol e de lipoproteínas de baixa densidade no sangue, mas, ao mesmo tempo, a presença de grandes quantidades de n-6 pode resultar em uma produção excessiva de 26 eicosanóides e peróxidos. Os ácidos graxos n-3 são, portanto, pobres geradores de peróxido quando comparados ao ácido araquidônico e constituem falsos substratos para a cicloxigenase, conseguindo inibir a síntese posterior de eicosanóides não apropriados. Assim como o EPA inibe a síntese de prostaciclina e tromboxano, o DHA inibe preferencialmente a síntese de tromboxano. Isto significa que o DHA é um melhor fator antitrombótico (LANDS, 1986). FIGURA 9. Biossíntese de ácidos graxos n-3 e formação de eicosanoides (WARD, 1995). 2.9 Trans Cerca de 90% dos ácidos graxos trans são originados por meio da hidrogenação catalítica parcial de óleos vegetais ou marinhos. Isômeros trans também podem ser formados, embora em pequenas quantidades (0,2 a 6,7%), no processo de desodorização de óleos vegetais e em operações de fritura de 27 alimentos (0 a 35%), por mecanismo induzido termicamente (MARTIN et al., 2008; MARTIN et al., 2005; RIBEIRO et al., 2007). Os ácidos graxos trans atuam como fatores de risco para doença arterial coronariana, modulando a síntese do colesterol e suas frações e atuando sobre os eicosanóides (RIBEIRO et al., 2007). Os altos níveis de ácidos graxos poli-insaturados dos óleos vegetais da dieta são extremamente vulneráveis a auto-oxidação. Esta característica limita o tempo de vida. A hidrogenação parcial dos óleos vegetais diminui a rancidez e aromas não desejáveis, aumentando a vida de prateleira, tornando disponíveis gorduras mais baratas em grande escala, no entanto, diminui o conteúdo de ácidos graxos poli-insaturados, e aumenta os ácidos graxos saturados (LICHTENSTEIN et al., 2001). Em bovinos, os ácidos graxos trans encontram-se naturalmente presentes por meio da biohidrogenação ocorrida no rúmen, como isômeros trans do CLA. Em modelos experimentais tem-se atribuído ao CLA ação protetora na redução do câncer e da aterosclerose, na estimulação de certas funções imunes, na redução da massa gordurosa, dentre outras características (MOREIRA et al., 2002). 2.10 A Influência da alimentação no teor de ácidos graxos A melhoria na qualidade nutricional da carne bovina pode ser obtida através da alimentação fornecida aos animais (NUERNBERG, 2005). Alterar o perfil de ácidos graxos da carne para obter uma menor proporção de ácidos graxos saturados é uma forma importante para produzir uma carne mais saudável para o consumidor, no entanto, as melhores fontes lipídicas utilizadas para alcançar essa manipulação, ainda não estão bem descritas (LADEIRA et al.,2013; WOOD et al., 2008; DALEY et al., 2010). Apesar de farelo de soja ser considerado a principal fonte de proteína para a alimentação animal, em algumas partes do mundo, o grão de soja integral é usado para aumentar o conteúdo de lipídios da dieta, e pode ser uma opção para melhorar o perfil de ácidos graxos de produtos ruminantes (OLIVEIRA et al., 28 2012). Outra fonte lipídica importante é a gordura protegida, que corresponde a ácidos graxos de cadeia longa que ficam livres em um processo de cisão dos triglicerídeos em óleos vegetais. Os ácidos graxos reagem com sais de cálcio, unidos na forma de um sal (R-COO-Ca), popularmente conhecidos como sabões de cálcio e pode resultar em um aumento de ácidos graxos monoinsaturados na deposição da gordura na carne (NRC, 2007; GRESSLER & SOUZA, 2009). OLIVEIRA et al. (2012) utilizaram diferentes fontes de óleo de soja ou de linhaça, e gordura protegida (produto comercial, Megalac-E®, rico em ômega 3, produzido por saponificação do óleo de soja com sais de cálcio), ou desprotegidos da degradação ruminal em dietas. Para a raça Nelore, o uso de óleo de linhaça, independentemente da proteção, foi uma estratégia para melhorar a composição dos ácidos graxos de carne, especialmente para aumentar a quantidade de n-3 e melhorar as relações entre n-6:n-3. O óleo de soja sem proteção é a melhor opção para reduzir o colesterol, produzir carne com melhor aparência, maciez e suculência na análise sensorial e aumentar os níveis de ácido linoleico conjugado. O aumento natural do CLA cis 9 trans 11 e do ácido vacênico dentro da fração lipídica de carne bovina pode ser realizado por dietas ricas em forragens de gramíneas verdes in natura. Estudos com ruminantes alimentados com gramíneas tem mostrado que se produz 2 a 3 vezes mais CLA do que os ruminantes alimentados em confinamento com dietas ricas em grãos, em grande parte devido a um pH ruminal mais favorável (DALEY et al., 2010; RULE et al., 2002; FRENCH et al., 2000). A revisão feita por DALEY et al. (2010) demostra que nenhuma mudança significativa quanto a concentração de n-6 é notado entre dietas feitas a pasto e em confinamento utilizando grãos, apesar de que, a carne do animal alimentado a pasto mostra um maior teor de n-3 em relação as carnes obtidas de animais em confinamento, criando um ambiente mais favorável para a relação n-6:n3. Há uma série de estudos que relatam efeitos positivos da maior ingestão de n-3 em doenças cardiovasculares. Um estudo feito sobre a influência da dieta de monensina, óleo de peixe ou da combinação dos dois anteriores resultou no aumento do ácido graxo vacênico e no CLA cis 9, trans-11, nos tecidos e no leite. Segundo os autores da pesquisa, é necessário realizar mais estudos sobre a taxa de dessaturação de trans-11 29 C18:1 no nível do tecido e do mecanismo de síntese do trans-10, cis-12 CLA no rúmen. Também são necessários métodos adequados para a aplicação de óleo de peixe e monensina (WANG et al., 2005). LADEIRA et al. (2013) estudaram o efeito da monensina, soja moída e gordura protegida na alimentação de novilhos da raça Red Norte. A monensina, no nível utilizado, não teve praticamente efeito algum sobre o perfil de ácidos graxos do longissimus dorsi. A inclusão de grão de soja moído na dieta aumentou o teor de ácidos graxos poli-insaturados no músculo Longissimus dorsi, em comparação com o músculo de animais alimentados com gordura protegida, o que tornava mais suscetíveis à oxidação lipídica. 30 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do exposto, nota-se que a qualidade nutricional da carne bovina está associada à composição da gordura intramuscular. Mesmo com o processo de biohidrogenação no rúmen, que converte a gordura insaturada em gordura saturada, esta composição pode ser dependente do tipo de dieta disponibilizada ao animal. Considerando que, ácidos graxos linoleico e linolênico são essenciais e não podem ser produzidos pelo organismo animal, é muito importante incorpora-los à dieta. O processo de hidrogenação da dupla ligação nos ruminantes, quando incompleto, origina o CLA, que apesar de possuir isômeros trans, podem contribir para a saúde humana. Deve existir uma razão adequada de consumo entre n6:n3, visto que os eicosanóides produzidos pelo EPA possuem características anti-inflamatórias e os derivados da família n-6 têm características inflamatórias, quando em excesso no organismo. 31 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABU-GHAZALEH A.A., SCHINGOETHE D.J., HIPPEN A.R. Conjugated linoleic acid and other beneficial fatty acids in milk fatty from cows fed soybean meal, fish meal, or both. 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