05 - PSICOLOGIA - CIÊNCIA OU BOM SENSO

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5.PSICOLOGIA:
CIÊNCIA OU BOM SENSO?
Ao terminar a leitura deste capitulo, você deverá ser capaz de:
1. Compreender a Psicologia como ciência.
2. Compreender o objeto da Psicologia.
3. Compreender o dilema ético do uso da Psicologia na organização.
A preocupação de conhecer o comportamento humano tem sido uma constante desde
os primórdios da Humanidade. A análise da evolução dessa preocupação mostra
diferentes tentativas, cada uma delas baseada nas crenças e nos conhecimentos da
cultura em que se inspira. A crença de que o caráter da criança seria determinado pela
posição dos astros no momento do seu nascimento fundamenta-se na Astrologia. Essa
crença, apesar de milenária, ainda persiste em determinados grupos culturais. A
semelhança fisica dos indivíduos com os animais sugere outra explicação do
comportamento humano. Assim, à medida que os indivíduos apresentam certas
semelhanças físicas com os animais, também apresentam semelhanças com o
comportamento desses animais: agressividade do leão, lealdade do cão, mansidão do
carneiro, sagacidade do gato etc.
Provérbios e a Psicologia
As crenças populares constituem também outras formas de explicação do
comportamento. Essas crenças são transmitidas de geração a geração através dos
provérbios. Estes, por sua vez, pressupõem hipóteses básicas que são tomadas como
postulados científicos e que passam a orientar as ações humanas e o relacionamento
social. Quando se afirma “o líder nasce feito” e “faça trabalho de branco’ há um
pressuposto básico de que a hereditariedade genética é o fator determinante do
comportamento humano. Por outro lado, provérbios como “as roupas fazem o homem”
e “diga-me com quem andas e dir-te-ei quem és” têm como principio básico a
predominância dos fatores ambientais. Os provérbios “nunca é tarde para aprender” e
“não se ensina truque novo a cachorro velho” mostram crenças e posições diferentes
quanto à aprendizagem humana. De um lado, surge a crença de que os seres humanos
têm a capacidade de aprender durante toda a sua vida; de outro, afirma-se que há uma
limitação com a idade cronológica.
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As idéias e opiniões de pensadores e a Psicologia
Observa-se, ainda, que muitas vezes se confunde a Psicologia com as idéias e opiniões
de escritores e pensadores acerca dos sentimentos e da realidade psicológica dos
seres humanos. Na realidade, como mostram McKeachie e Doyle (1972), trata-se de
especulações, de reflexões pessoais. São, portanto, proposições subjetivas, definidas
de acordo com um ângulo particular, que não podem, conseqüentemente, ser
confundidas com postulados científicos.
Ao comparar as idéias e as reflexões de pensadores com provérbios e crenças
populares, observa-se que as primeiras trazem uma lógica maior, são fruto de
observações pessoais e de reflexões, enquanto os provérbios e as crenças populares
carecem de qualquer preocupação reflexiva. Falta, entre tanto, nas idéias e reflexões
dos pensadores a identificação das leis e dos princípios básicos que determinam os
processos psicológicos e dirigem o comportamento humano.
Bases cientfficas da compreensão do comportamento humano
A correta compreensão das diferenças individuais, dos grupos, das comunidades e das
organizações como entidades psicossociais pode levar à compreensão e a predições
razoáveis do comportamento individual, do grupo, da organização e da comunidade. No
decorrer do desenvolvimento da Psicologia, muitos cientistas buscaram, e ainda
buscam, aplicar o método cientifico ao estudo dos fenômenos psicológicos, na tentativa
de conhecer as leis e os princípios que os regem. Freud (1895-1935) utilizou a
observação e a análise de conteúdo dos relatos de seus pacientes. Thorndike (19111932) observou animais no processo de aprendizagem (abertura de caixas para obter
alimentos). Kurt Lewin (1926-1946) observou grupos (observação de processos grupais
tais como liderança, coesão, formação de normas, definição de objetivos etc.), estudou
a natureza e a origem das forças grupais e introduziu a pesquisa-ação como uma forma
de investigação e de intervenção nos fenômenos de mudança social, isto é, dos valores
do grupo e/ou da sociedade e conseqüentes mudanças das suas estruturas. Miller e
Dollard (teoria do estimulo-resposta) estudaram a personalidade dentro da abordagem
S-R e realizaram investigações que ilustram e testam a posição teórica que adotaram.
Piaget, (1920-1980) psicólogo suíço, epistemólogo e filósofo, dedicou sessenta anos de
sua vida ao estudo do desenvolvimento da inteligência humana e ao desenvolvimento
dos diferentes tipos de pensamento. É conhecido como psicólogo infantil por ter
desenvolvido suas pesquisas com crianças.
Defmição e evolução da Psicologia como ciência
A palavra Psicologia tem suas origens em duas palavras gregas: psyche, que significa
alma, e logos que significa discurso.
A Psicologia, nos seus primórdios, era considerada uma área de estudo da
Filosofia denominada Filosofia Mental. A mente era um dos tópicos estudados
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por esta área. Entretanto, no decorrer dos tempos os fflósofos passaram a traduzir o
termo psyche por mente e a psicologia passou a ser ciência da mente. O estudo da
mente encontrou grandes dificuldades. Não se conseguiu chegar a uma conceituação
aceita por todos. A sua própria natureza é controvertida. A sua investigação mobiliza as
camadas mais profundas do inconsciente, sendo, portanto, ameaçadora para o próprio
investigador. Por esta razão, o estudo da mente deu origem a superstições e
preconceitos, alguns deles ainda presentes. O psicólogo é considerado um adivinho,
com poderes especiais para identificar problemas, sentimentos, reações psicológicas e
emoções dos demais seres humanos, assim como para interferir em suas mentes. A
Psicologia confunde- se com as chamadas “ciências ocultas”.
A Psicologia, entretanto, somente conseguiu integrar-se às Ciências Sociais à medida
que o seu objeto foi definido como o comportamento observável dos seres vivos
(humano e animal). Porém, as diversas teorias psicológicas têm entendido esse objeto
de formas diferentes por terem estas teorias partido de compreensões ou paradigmas
de pensamento diferentes acerca do que é o ser humano.
Divergências na definição de comportamento humano
Para os behavioristas (comportamentalistas), o comportamento humano compreende
apenas as reações observáveis de forma direta. Os cognitivistas (entre eles, Freud e
Kurt Lewin) conceituam o comportamento observável de forma mais ampla, ou seja,
consideram-no como sendo todas as reações do organismo, inclusive as inferidas de
outros comportamentos. Os processos psicológicos não passíveis de observação direta
integram igualmente esse conceito de comportamento. Exemplos deles são os
processos perceptivos, a memória, a cognição, o raciocínio, os motivos, os sentimentos
etc. Para essas teorias, todos os processos psicológicos são comportamentos
observáveis e, portanto, são objeto das ciências psicológicas.
Estas divergências caracterizam a influência do paradigma de pensamento (Khun,1994)
seguido pelos psicológos pertencentes às diversas correntes psicológicas. Isto significa
dizer que cada pesquisador parte de valores e de pressupostos filosóficos que orientam
a sua concepção do ser humano, ou seja, o que ele é, bem como a forma pela qual o
comportamento humano deverá ser estudado. Assim, pode-se observar que os
fundadores e os seguidores da corrente behaviorista (comportamentalista) partiram do
pressuposto materilaista do ser humano, para eles o individuo é uma entidade biológia,
constituído por u m conjunto de orgãos interligados sob o comando do cérebro. O
comportamento humano é explicado pelas conexões cada vez mais elaboradas da rede
de neuronios e isto se dá em contextos ambientais específicos. O ser humano é
reduzido ao sistema fisiológico e o estudo do comportamento humano deve ser
objetivo, estudando as leis do comportamento humano e animal da mesma forma que
são estudadas as leis do comportamento físico e químico de um comportamento
qualquer (Guillaume, 1942). O paradigma de pensamento do125
minante é a concepção materialista do ser humano e a idéia de cientificidade tendo
como exigência básica a relação causa-efeito (mecanicismo cartesiano), a observação
direta e a quantificação.
Já os cognitivistas têm como paradigma de pensamento o ser humano como um ser
bio-psico-social..Partem do pressuposto que o ser humano é ser cognitivo, de desejos,
de emoções, de linguagem e de interação e comunicação, .pressupõem a existência da
mente humana.
Todavia algumas correntes cognitivistas reduzem o ser humano a um elemento
especifico e temtam explicar e controlar o comportamento humano a partir deste
elemento. A corrente denominada humanista tem como pressuposto básico a natureza
sócio-emocional do ser humano. Abordam o estudo e o controle do comportamento
humano à partir da identificação dos fatores emocionais e da satisfação das
necessidades emocionais do ser humano.
Relação entre escolas, técnicas e métodos de comprovação de suas hipóteses
A influência positivista se faz presente na discussão do caráter científico da observação
indireta. Os cientistas de orientação positivista enfatizam a aplicação rigorosa de um
conjunto de normas e procedimentos defendidos por eles como método científico no
estudo dos fenômenos psicológicos. Tentam adaptar o fenômeno em estudo ao método
adotado nas ciências físicas.
Influência dos resultados de observações e estudos cientificos
À medida que o campo da Psicologia foi-se ampliando em função de estudos e
observações cientificas realizadas, foi surgindo uma preocupação maior dos psicólogos
em adotar métodos e técnicas mais adequados ao fenômeno em estudo sem, contudo,
abandonar os requisitos básicos do método científico, isto é, a objetivação das
observações. Os estudos e experimentos com grupos possibilitaram a sua identificação
como entidades psicossociais com características próprias, cujo comportamento se
distingue do comportamento dos individuos que os constituem. Os postulados e as
exigências básicas do estudo cientifico têm sido mantidos; o método e as técnicas,
entretanto, são adaptados ao fenômeno em estudo, ou seja, ao comportamento grupal.
A Psicologia Social e a Psicologia Organizacional vêm-se desenvolvendo da mesma
forma. A organização e os grupos, tomados como entidades psicossociais, com
características próprias, têm sido nos últimos anos objeto de pesquisas e de estudos
científicos. A representaçaõ social, seu processo de formação, suas influências nos
demais processos psicológicos bem como no sentir e no agir do indivíduo têm sido
amplamentente estudados.
A mudança social, abordada como um fenômeno comportamental, tem sido também
objeto de estudo cientifico por parte dos psicólogos. A investiga126
ção desse fenômeno por meio da pesquisa-ação é outro exemplo da diversidade e da
adaptabilidade do método cientifico aos diferentes fenômenos psicossociológicos.
Como se pode concluir, a Psicologia vem adotando o método cientifico de formas
diversas, respeitando não somente a orientação teórica daquele que realiza o estudo
cientifico, mas também a natureza do fenômeno em estudo.
Psicologia e demais ciências
No momento em que a Psicologia teve seus objetivos definidos em descrevei; explicar e
predizer o comportamento, conseguiu-se, no decorrer do seu desenvolvimento,
especialmente com a crescente contribuição de conhecimentos obtidos através de
estudos, experimentos e pesquisas, ampliar e compreender melhor a complexidade de
seus objetivos. Cada vez mais tem sido abandonada a hipótese de causa única na
formação do comportamento humano. O desenvolvimento cientifico de áreas do
conhecimento como Sociologia, Antropologia, Biologia, Ciências Políticas e Economia
trouxe uma contribuição muito importante para o estudo do comportamento. A
integração dos conhecimentos de outras áreas do conhecimento humano tem
possibilitado a identificação de fatores que influenciam o comportamento. E impossível
explicar o comportamento através de uma causa única.o comportamento humano é
uma resultante de fatores psicológicos e não-psicológicos, tais como fatores biológicos,
antropológicos, sociológicos, econômicos, psicológicos e políticos. Esses fatores
interagem, mantendo uma dinâmica responsável pela formação, pelo desenvolvimento
das caracteristicas e processos psicológicos e consequentemente pela mudança do
comportamento. Os fenômenos psicológicos não são estáticos e não podem ser
explicados, como muitos tentam fazê-lo, através da abordagem linear causa-efeito.
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Ciência
Para compreender a Psicologia como ciência, é importante ter presente o que se
entende por ciência e a forma pela qual a ciência é feita. Por ciência, entende-se aqui a
forma rigorosa do saber humano, isto é, o conjunto de conhecimentos precisos e
metodicamente ordenados com relação a determinado domínio do saber. Para fazer
ciência são necessários:
a) o método científico, isto é, o conjunto de etapas, ordenadamente dispostas, a serem
vencidas na investigação da busca das verdades, O método inclui técnicas que são os
modos de fazer de forma mais perfeita algum tipo de atividade, O método é científico à
medida que garante a exatidão dos conhecimentos adquiridos, assim como o
desenvolvimento desses conhecimentos; diferentes métodos podem ser científicos;
b) o método cientifico por si só não garante o desenvolvimento científico, mesmo
porque o próprio método deverá ser inovado e reformulado quando o objeto do estudo
cientifico for diferente;
c) capacidade mental do cientista para realizar operações mentais de transformação
dos dados coletados;
d) consciência clara do paradigma do pensamento adotado o qual direcionará reflexão
científica;
e) verdade cientifica significa que é ela feita de certas idéias veri-ficadas. No mundo
plural em que vivemos não existe mais uma verdade mas verdades, e toda verdade é
uma procura da verdade. As verdades científicas são temporais e serão sempre
ultrapassadas quando novos estudos científicos alcançarem novas verdades.
Etapas do método científico
O método cientifico tem sido definido como um conjunto de proposições explicitas,
atitudes e normas de acordo com as quais o investigador ou pesquisador:
a) coleta dados por meio de observações sistemáticas;
b) avalia os dados obtidos;
c) analisa e infere conclusões;
d) divulga os resultados, as conclusões e suas interpretações;
e) apresenta os resultados de forma a possibilitar a repetição da pesquisa ou do estudo;
f) integra esses resultados aos obtidos por diferentes pesquisadores, reformula ou inova
os conhecimentos anteriores e realiza novos estudos a partir dos resultados alcançados
nas diferentes áreas do conhecimento;
g) generaliza os conhecimentos alcançados, isto é, conclui leis gerais universalmente
válidas para todos os casos da mesma espécie ou levanta novas hipóteses a serem
pesquisadas.
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No entanto, é a própria concepção de método científico, enquanto método, que se
modifica. Não são somente as técnicas utilizadas na sua aplicação que variam de uma
ciência para outra, mas o próprio método.
Dentro de uma visão cartesiana, o método reduz-se a um conjunto de regras e por si só
garante a obtenção dos resultados desejados. Haverá, portanto, vários modos — uns
corretos, outros não — de atingir o conhecimento cientifico. Nesse sentido identifica-se
como técnica supostamente válida para a utilização dos mais diversos domínios da
ciência. Não se discute se os padrões aceitos e estabelecidos do método cientifico
permitem o conhecimento mais perfeito do fenômeno em estudo. Isto é, até que ponto
permitem que o fenômeno em estudo suna com maior pureza, ao mesmo tempo que
possibilitam a realização das operações mentais, as “transformações” que caracterizam
o trabalho cientifico, como acentua Cardoso, Míriam (1972). O método, afirma ela, só é
cientifico à medida que a validade do seu emprego para o problema em estudo
apresentar o caráter de novidade essencial para o desenvolvimento cientifico. Entendese, assim, o método como parte de um corpo teórico integrado, que envolve as
técnicas, dando-lhes sua razão, perguntando- lhes sobre as possibilidades e as
limitações que trazem às teorias que servem, no trabalho sobre o seu objeto. Exige-se
portanto, a reflexão sobre o método, questionando seus próprios fundamentos. Essa
reflexão é fundamental ao exercicio da ciência entendida como a forma rigorosa do
saber humano. Fazer ciência exige, como acentua Cardoso (1972), a renovação
permanente da teoria, do método, da técnica e do objeto.
O método cientifico foi adotado em Psicologia como uma forma de investigar com maior
segurança as causas do comportamento e as relações entre dois ou mais processos
comportamentais. É, portanto, um meio e não um fim em si mesmo.
Função das teorias psicológicas
As teorias científicas são enunciados universais, são formulas simbólicas ou esquemas
simbólicos, são representações lingüísticas segundo Popper (1972). Para este autor as
teorias são redes, lançadas para capturar aquilo que se denomina como “mundo”: para
racionalizá-lo, explicá-lo, dominá-lo. A observação, o estudo científico, se faz à luz de
teorias. Uma teoria é, pois, um conjunto de enunciados relativos a uma determinada
realidade ou fenômeno que os permite testar a sua veracidade através da pesquisa
empírica.
Como enunciados (teóricos) são elaboradas a partir da idéia ou da concepção que um
dado cientista tem acerca do fenômeno em estudo. Piaget, por exemplo, ao
desenvolver postulados teóricos acerca do desenvolvimento cognitivo da criança,
verificou na realidade empírica, através da observação cientifica, se estes postulados
explicavam o processo cognitivo do ser humano. E foi a partir destas verificações
científicas que corrigiu e reformulou a sua teoria, dando à mesma maior credibilidade
científica. Piaget, porém, partiu de um paradigma de pensamento que influenciou a
elaboração dos postulados
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teóricos e o método de pesquisa por ele adotado. A visão da essência do seu objeto de
pesquisa, o ser humano como ser bio-psico-social, o levou a “olhálo” de uma forma
integrada e considerar, no seu método de pesquisa, as relações causais como um
processo de interação de fatores.
Todavia, as teorias psicológicas nem sempre foram formuladas obedecendo o rigor
científico e muitas delas, hoje largamente difundidas, nem sequer foram objeto de
verificação científica. A teoria das necessidades humanas de Maslow, a teoria da
inteligência emocional e a teoria da learning organization são exemplos
Entretanto, nem todas as teorias psicológicas apresentam o mesmo grau de
objetividade e de valor cientifico. A validade cientifica das teorias psicológicas podem
ser identificadas por meio de critérios como: capacidade de explicar fatos psicológicos,
possibilidade de revelar relações não conhecidas entre conceitos e fatos observados e
capacidade de levantar hipóteses e sugestões de explicação do comportamento
passíveis de verificação posterior por meio de novos estudos. As teorias psicológicas
não são definitivas. Os conhecimentos adquiridos através de novas pesquisas e de
novos estudos são integrados às teorias, levando-as, assim, a reformulação e
atualização.
Entretanto, considerações de ordem ética constituem obstáculos à observação e à
descrição dos fatos psicológicos, bem como à sua divulgação. Ë importante ressaltar as
limitações determinadas pelos direitos humanos, entre eles o direito à privacidade e à
integridade física e moral. Essas circunstâncias impedem, em Psicologia, a realização
de muitos estudos possíveis em outras áreas do conhecimento humano.
A Psicologia como ciência e o controle do comportamento humano
Ao se desenvolver como ciência, a Psicologia trouxe, ao lado de conhecimentos de
grande importância para a compreensão do comportamento humano, problemas éticos
e de valores.
Kelman já em 1968 mostrava que as pesquisas e os estudos científicos desenvolvidos
nas diferentes áreas da Psicologia levavam a um conhecimento cada vez mais objetivo
e sistemático, o que, em conseqüência, possibilitava o controle e a manipulação do
comportamento humano. Esses problemas deveriam, segundo ele, preocupar não só os
psicólogos, como também aqueles que fazem uso dos conhecimentos de natureza
psicológica no exercício de diferentes funções, especialmente dentro das organizações.
Pesquisadores como Max Pagés (1990), Dejours (1994) Chanlat (1990), Akatouf
(1993), Aguiar (1998), denunciaram a crescente e inescrupulosa utilização de
conhecimentos científicos das diferentes áreas das ciências humanas como
instrumentos poderosos de controle dos seres humanos especialmente pelas
organizações.
A atitude do cientista do comportamento, diante dos problemas éticos que lhe são
colocados, quer na sua atividade de pesquisa, quer na atividade de agente de
intervenção, vai depender de seus valores, de suas crenças na natureza humana e nos
direitos humanos. Ruch e Zimbardo, ao discutirem a com130
preensão das relações causais entre os fatos psicológicos, a identificação dos
processos psicológicos envolvidos em determinado comportamento e a identificação da
maneira como esses processos se desenvolvem, mostraram desde 1971 que esses
fatores abriam caminho para duas importantes possibilidades. Em primeiro lugar, a
possibilidade de identificar situações necessárias para a ocorrência de diferentes fatos
e, por tanto, de prever esses fatos. Em segundo lugar, a possibilidade de interferir no
próprio comportamento ativando ou mesmo provocando o processo que levaria a um
comportamento desejado. De fato, à medida que se possa caracterizar
comportamentos, explicar seus conteúdos e descrever as situações e condições nas
quais eles tendem a ocorrer, criam-se condições para um maior controle do
comportamento humano. Esse controle toma a forma de intervenções na maneira de
sentir, de. pensar e de agir das pessoas, e constitui um caminho pelo qual se poderia
chegar ao planejamento das ações e dos sentimentos dos outros seres humanos.
Psicologia e planejamento do comportamento
Os autores mostram que, a esse respeito, podem ser observadas duas posições
antagônicas, tanto entre os cientistas do comportamento, como entre aqueles que se
utilizam dos conhecimentos científicos da Psicologia. A primeira posição baseia-se na
crença de que a liberdade e a autodeterminação do ser humano são inerentes à sua
natureza e constituem, portanto, um direito inalienável de cada indivíduo. A segunda
posição parte do pressuposto de que outros podem e devem decidir sobre o que é
melhor para o indivíduo. Assim, evidencia-se, nesta segunda posição, que não só seria
possível, como também recomendável, planejar comportamentos de terceiros,
condicionando seu desenvolvimento em determinada direção. Essa posição leva ao uso
de estímulos externos, de influências não identificadas conscientemente pelos
individuos. Desta forma, o individuo é tomado como mero objeto de influência,
manipulado de acordo com objetivos traçados pelo agente de intervenção e afinal
reduzido a um passivo seguidor de um plano comportamental elaborado e executado
sem o seu conhecimento.
Ideologia e Psicologia
A Psicologia, como acentuam Kelman (1968) e Ruch e Zimbardo (1971), pode ser
utilizada como um instrumento de libertação do ser humano. Pode ser utilizada para
ajudá-lo a libertar-se quer das barreiras internas, quer das externas, que impedem seu
crescimento e desenvolvimento. Mas também pode ser usada como um instrumento
para conduzir o individuo de acordo com os interesses de outros, seja da sociedade em
sentido mais amplo, seja das organizações, seja de grupos ideológicos. Aqui, o dilema
ético coloca-se em dois níveis. Primeiro, ao definir como seu objetivo o conhecimento
cientifico do comportamento, a Psicologia poderá, fatalmente, envolver o controle e a
ma131
nipulação do comportamento humano, colocando um problema ético para aqueles que
acreditam na liberdade e na autodeterminação dos indivíduos como seres humanos. O
segundo dilema reside na direção a ser dada ao comportamento — e aqui o problema
ético é ainda mais grave. Em outras palavras:
Quem deve manipular e controlar o comportamento humano? Quais os objetivos dessa
manipulação e controle? Quem, e a titulo de que, estará autorizado a exercer tais
funções?
Essas são perguntas que ainda não encontraram respostas definitivas. Mesmo assim, o
que resulta claro de uma reflexão sobre essas questões é que a prevenção das
nefastas conseqüências de um uso equivocado dos instrumentos psicológicos é tarefa
não apenas dos agentes, mas também dos “objetos” desses usos: à medida que os
indivíduos se tomarem conscientes das forças que influenciam seu comportamento,
terão condições objetivas de se contra- porem a influências e manipulações, tornandose mais livres e responsáveis pelas suas próprias ações. O conhecimento cientifico da
Psicologia pode, em síntese, ser usado para libertar ou escravizar, para formar os
indivíduos seres atuantes ou seguidores passivos.
RESUMO
O objeto da Psicologia foi definido como o comportamento observável dos seres vivos
(animal e humano) e somente após esta definição a Psicologia conseguiu integrar-se às
Ciências Sociais. As divergências na conceituação do objeto da Psicologia foram
discutidas, mostrando-se os pressupostos básicos das diferentes abordagens. Os
objetivos da Psicologia foram definidos como sendo os de descrever, explicar e predizer
o comportamento. A integração das informações das demais áreas do conhecimento
humano à Psicologia foi mostrada como uma das características do desenvolvimento da
Psicologia como ciência. Ao mesmo tempo, discutiram-se os problemas éticos
colocados pelo desenvolvimento da Psicologia como ciência, desenvolvimento que
possibilita cada vez mais o controle e o planejamento do comportamento humano.
Método cientifico e o objeto da Psicologia foram analisados, enfatizando- se a natureza
do fenômeno em estudo, que exige flexibilidade cientifica e diferentes métodos e
técnicas de estudo. As diferentes funções da Psicologia foram discutidas. Salientou-se
a importância do paradigma de pensamento e do sistema de valores do cientista na
própria definição da Psicologia, bem como na sua aplicação.
TERMOS E CONCEITOS A SEREM LEMBRADOS
Behaviorismo: escola psicológica que limita o comportamento às ações diretamente
observáveis dos seres vivos (humano e animal).
Cognitivismo: escola psicológica que considera os fatores internos (consciênciainconsciência) como objeto da Psicologia.
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Comportamento humano: resulta da interação de fatores ambientais e genéticos.
Ideologia: conjunto de crenças ou sistemas de valores aceitos por um indivíduo, pelos
grupos ou pela sociedade.
Método científico: instrumento utilizado pela ciência na sondagem da realidade.
Instrumento formado por um conjunto de procedimentos, mediante os quais os
problemas científicos são formulados e as hipóteses cientificas são examinadas.
Objetivos da Psicologia: descrever, explicar e predizer comportamentos.
Objeto da Psicologia: comportamento observável nos seres vivos (animal e humano).
Pesquisa-Ação: processo em que o cientista social estuda o processo social ao mesmo
tempo em que participa na intervenção da realidade.
Psicologia: ciência do comportamento dos seres vivos (humano e animal).
Ciência: forma rigorosa do saber humano. Resulta da investigação sistemática e das
operações e transformações mentais que o cientista realiza com os dados observados.
A ciência não é verdade acabada. Poderá ser desenvolvida ou modificada por novas
descobertas científicas.
APLICAÇÃO
1. Exemplos de observações cientfficas na Psicologia
1.1. Experiência do psicólogo social Salomon Asch
Asch estudou a influência das normas grupais sobre o comportamento de seus
membros. A hipótese levantada por esse pesquisador era a de que as percepções dos
indivíduos são modificadas em função dos padrões de perceptibilidade do grupo.
Experimento
Organizou-se um grupo de seis indivíduos do sexo masculino, de idade e
conhecimentos acadêmicos semelhantes. Os indivíduos deviam emitir opiniões sobre o
tamanho de linhas que lhes eram apresentadas, duas a duas, em cartões individuais.
Os participantes do experimento, com exceção de um, foram orientados para dar
respostas erradas, ou seja, para afirmar que as linhas eram iguais, quando na realidade
eram diferentes, e vice-versa. O indivíduo que não havia recebido esta orientação
passou por um processo de influência grupal: no final de algumas exposições dos
cartões, passou a duvidar das próprias afirmativas e começou a dar respostas iguais às
do grupo, ou seja, erradas. Este experimento possibilitou que se inferisse a influência
das forças grupais no comportamento de seus membros.
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QUESTÕES
1. Explique a diferença entre Psicologia como ciência e bom senso.
2. Qual o objeto de estudo da Psicologia?
3. Explique a diferença entre comportamento observável diretamente e comportamento
inferido através de outros comportamentos. Quais os sistemas de valores que
embasam essas definições?
4. Explique por que a compreensão e o conhecimento objetivo dos processos
psicológicos envolvidos em determinado comportamento permitem o exercício de uma
maior influência na mudança do comportamento.
5. Explique por que a manipulação do comportamento humano é um problema ético.
6. Explique por que o comportamento humano na organização não pode ser explicado
somente por meio de fatores psicológicos.
7. Quais as características de um método cientifico?
8. O que é método?
9. O que é científico?
10. O que é ciência?
TRABALHO PRÁTICO
Trabalho de grupo
1. Pesquise na Internet e junto a diferentes organizações (pública, privada, nacional e
multinacional) os objetivos da aplicação dos conhecimentos psicológicos, assim como
as formas de sua aplicação (seleção psicológica, treinamento etc.).
2. Analise o sistema de valores que os fundamentam.
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