Seminário de Iniciação Científica e Tecnológica, 10., 2013, Belo Horizonte Qualidade microbiológica de leite UHT, isolamento de bactérias esporuladas e caracterização do seu potencial deteriorador Letícia Loures de Oliveira(1), Cláudia Lúcia de Oliveira Pinto(2) Luana Virgínia Souza(3), Vinicius Álvares da Silva Meloni(4), Maurílio Lopes Martins(5) (1) Bolsista PIBIC FAPEMIG/EPAMIG, [email protected]; (2) Pesquisadora/Bolsista BIP FAPEMIG/EPAMIG - Viçosa, [email protected]; (3) Graduanda IF Sudeste MG - Rio Pomba, [email protected]; (4) (5) Graduando IF Sudeste MG - Rio Pomba, [email protected]; Professor IF Sudeste MG - Rio Pomba, [email protected] INTRODUÇÃO A pasteurização do leite tipo UHT é o leite homogeneizado, tratado entre 130 ºC e 150 ºC, por 2 a 4 segundos, resfriado a 32 ºC ou temperatura inferior, e envasado em condições assépticas (BRASIL, 1997). Constitui um produto estável do ponto vista bacteriológico à temperatura ambiente, o que permite classificá-lo como comercialmente estéril (TETRA PAK, 1996). Dentre os leites fluidos disponíveis no mercado brasileiro, o leite UHT é, atualmente, o mais consumido, fato que pode ser associado ao tipo de embalagem e à sua maior vida útil. A contaminação do leite UHT por bactérias esporuladas, como Bacillus, Paenibacilluse, Clostridium, representa um dos principais entraves na sua cadeia produtiva (VITTORI, 2008), pois essas bactérias produzem enzimas termoestáveis e são capazes de formar biofilmes (TEH et al., 2011). Essas bactérias têm como hábitat o solo e as pastagens. Assim, sua presença no leite é indicativa do emprego de condições higiênicas inapropriadas de produção e processamento. A boa qualidade microbiológica da matéria-prima é um pré-requisito para a obtenção de produto com alto padrão de qualidade e prevenção de perdas associadas à atividade de enzimas termoestáveis durante a sua vida útil (PINTO, 2004). Essas enzimas causam problemas tecnológicos, como coagulação doce, alterações sensoriais (off flavors, instabilidade térmica. sabor amargo) e A ocorrência de lipólise no leite resulta da ação de EPAMIG. Resumos expandidos 2 lípases naturais e/ou microbianas caracterizadas pela hidrólise de triglicérides, constituintes da gordura, com liberação de ácidos graxos de cadeia curta como butírico, caproico, caprílico e cáprico, principais responsáveis por odores desagradáveis no leite. As proteases, mesmo em concentrações baixas, apresentam atividade hidrolítica, o que causa defeitos em produtos de vida de prateleira longa, a exemplo do leite UHT e do leite em pó. Embora seja crescente a importância do leite UHT no mercado, são poucos os estudos relacionados com a qualidade microbiológica desse produto. Os objetivos deste trabalho foram avaliar a qualidade microbiológica de leite UHT, isolar e caracterizar bactérias esporuladas quanto ao potencial deteriorador. MATERIAL E MÉTODO Amostras de leite UHT integral de 11 marcas (A, B, C, D, E, F, G, H, I, J e K), processadas em indústrias de laticínios no estado de Minas Gerais, foram coletadas, aleatoriamente, entre setembro e novembro de 2011, no mercado de Juiz de Fora, MG, que representa o maior centro distribuidor da Zona da Mata mineira. Foram avaliadas quatro amostras por marca, em um total de 44 amostras quanto à contagem de microrganismos aeróbios mesófilos (BRASIL, 2003) e bactérias esporuladas. Para a contagem de bactérias esporuladas, as amostras de leite foram submetidas previamente ao tratamento térmico de 80 ºC, por 10 minutos. Posteriormente, foram analisadas em Ágar Infusão de Cérebro e Coração (BHI), com incubação a 37 ºC, por 48 horas. O isolamento de bactérias esporuladas foi feito a partir da seleção de três a quatro colônias no Ágar BHI. Os isolados foram caracterizados quanto a reação à coloração de Gram, morfologia, produção de catalase, urease, fermentação de glicose, crescimento em anaerobiose e produção de proteases, lípases e lecitinases a 6,5 °C, por dez dias e a 21 °C e 35 °C, por 72 horas (PINTO, 2004). A capacidade dos isolados em alterar a estabilidade térmica do leite foi avaliada por meio da inoculação individual dos isolados em leite desnatado, armazenado a 37 ºC, por 24 horas, mediante teste de cocção. Seminário de Iniciação Científica e Tecnológica, 10., 2013, Belo Horizonte 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Quatro das onze marcas (36%) apresentaram concentração de bactérias mesofílicas aeróbias acima de 102UFC/mL (Tabela 1), ou seja, em desacordo com o padrão de qualidade microbiológica exigido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastacimento (MAPA) (BRASIL, 2003). Esses resultados são semelhantes aos observados por Bersot et al. (2010) e Domareski et al. (2010). Altas concentrações de microrganismos mesófilos aeróbios em leite UHT são indicativas do emprego de leite cru de baixa qualidade higiênico-sanitária, condições inadequadas de armazenamento e processamento ou contaminação pós-processamento. A presença de bactérias esporuladas foi constatada em três (27%) marcas de leite UHT em concentrações acima de 102 UFC/mL (Tabela 1). Foram isoladas 27 estirpes bacterianas esporuladas a partir das amostras contaminadas, as quais foram caracterizadas como bastonetes, Gram-positivos, urease negativa, fermentadores de glicose, com multiplicação em condições de microaerofilia e pertencentes ao gênero Bacillus spp. Deve-se considerar que espécies desse gênero como B. sporothermodurans podem resistir ao tratamento térmico UHT (BUSATTA; VALDRUGA; CANSIAN, et al., 2005). Quando concentrações dessa bactéria são superiores a 102UFC/mL o leite UHT é classificado como em desacordo com o padrão microbiológico (BRASIL, 1997). Além disso, existem relatos de isolamento de bactérias esporuladas patogênicas como B. cereus de leite UHT (MAZIERO et al., 2010; MONTANHINI; PINTO; BERSOT, et al., 2012), microrganismo este associado a toxinfecções alimentares, pela capacidade de produzir diferentes tipos de toxinas: enterotoxinas, hemolisinas, fosfolipase C e toxina emética. Portanto, o consumo de produtos alimentícios contaminados com essa bactéria constitui um risco à saúde pública. A presença de atividade proteolítica foi observada em 37% das estirpes de Bacillus a 21 ºC e em 22%, a 35 ºC. A atividade de lecitinase a 21 ºC e a 35 ºC foi observada em 14,8% das estirpes de Bacillus. Nenhum dos isolados apresentou atividade enzimática a 6,5 ºC. Observou-se perda de estabilidade térmica do leite desnatado inoculado individualmente com as estirpes de 4 EPAMIG. Resumos expandidos Bacillus spp., após armazenamento a 37 ºC, por 24 horas, resultado associado à atividade proteolítica dos isolados. CONCLUSÃO O alto porcentual de marcas de leite UHT, em desacordo com os padrões microbiológicos além do alto potencial deteriorador constatado nas bactérias esporuladas isoladas, pode ser associado ao emprego de matériaprima de baixa qualidade microbiológica, ao emprego de práticas higiênicas inapropriadas de produção, estocagem, transporte e processamento e/ou tratamento térmico inapropriado do leite. AGRADECIMENTO À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), pelo financiamento das pesquisas e pelas bolsas concedidas. REFERÊNCIAS BERSOT, L.S. et al. Avaliação microbiológica e físico-química de leites UHT produzidos no Estado do Paraná-Brasil. Semina: Ciências Agrárias, Londrina, v.31, n.3, p.645-652, 2010. BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Portaria no 370, de 4 de setembro de 1997. Aprova a inclusão do Citrato de Sódio no regulamento técnico para fixação de identidade e qualidade do leite UHT (UAT) Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 8 set. 1997. BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa no 62, de 26 de agosto de 2003. Oficializa os métodos analíticos oficiais para análises microbiológicas para controle de produtos de origem animal e água. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 18 set. 2003. Seção 1, p.14. BUSATTA, C.; VALDRUGA, E.; CANSIAN, R.L. Ocorrência de Bacilluss porothermodurans em leite UAT integral e desnatado. Ciência e Tecnologia de Alimentos, Campinas, v.25, n.3, p.408-411, jul./set.2005. 5 Seminário de Iniciação Científica e Tecnológica, 10., 2013, Belo Horizonte DOMARESKI J.L. et al. Physico-chemical and microbiological evaluation of UHT milk commercialized in three Mercosul countries (Brazil, Argentina and Paraguay). Archivos Latinoamericanos de Nutrición, v.60, n.3, p.261-269, 2010. MAZIERO, M.T. et al. Incidência e avaliação da atividade lipolítica e proteolítica de Bacillus cereus em leite UHT. PUBVET, Londrina, v.5, n.27, 2011. MONTANHINI M.T.M; PINTO, J.P.A.N.; BERSOT, L.S. Ocorrência de Bacilluscereusem Leite Comercializado nos Estados do Paraná, Santa Catarina e São Paulo. Unopar Científica. Ciências Biológicas e da Saúde v.14, n.3, p.155-8, 2012. PINTO, C.L.O. Bactérias psicrotróficas proteolíticas do leite cru resfriado granelizado destinado à produção de leite UHT. 2004. 97p. Tese (Doutorado em Microbiologia Agrícola), Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, 2004. VITTORI, J. et al. Qualidade microbiológica de leite UHT caprino: pesquisa de bactérias dos gêneros Staphylococcus, Bacillus e Clostridium. Ciência Rural, Santa Maria, v.38, n.3, p.761-765, maio/jun. 2008. TEH, K. H. et al. Thermo-resistant enzyme-producing bacteria isolated from the internal surfaces of raw milk tankers. International Dairy Journal, v.21, n.10, p.742-747, 2011. TETRA PAK. Dairy processing handbook. Lund: Sweden, 1996. 1 CD-ROM. Tabela 1 - Média da contagem de microrganismos aeróbios mesófilos e bactérias esporuladas em amostras de 11 marcas de leite UHT Marcas Aeróbios Mesófilos (UFC/mL) A 3,8 x 10 E 4,3 x 10 F 3,2 x 10 I 5,6 x 10 B,C,D,G,H, J e K < 1,0 x 10 Bactérias esporuladas (UFC/mL) 2 3,8 x 10 2 2 4,7 x 10 2 3,2 x 10 3 < 1,0 x 10 2 2 0 0 < 1,0 x 10 0