Atualização Sobre Programas de Educacão e Reabilitação Para

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Atualização Sobre Programas de Educacão e Reabilitação
Para Pacientes Renais Crônicos Submetidos à Hemodiálise
RESUMO
Introdução: A preocupação em buscar terapias e procedimentos eficazes para
a melhoria da qualidade de vida de pacientes renais crônicos levou alguns
pesquisadores a investir em programas educacionais e de reabilitação para
estes pacientes. Objetivo: Dentro desta visão e na busca da compreensão
destas investigações, optamos por realizar uma revisão de literatura, com objetivo de localizar artigos na área de educação e reabilitação de pessoas com
insuficiência renal crônica. Casuística e Método: Realizou-se a busca eletrônica nas bases de dados Medline e CINAHL, no período de 1997 a 2002. A elegibilidade dos artigos incluiu estudos que apresentassem programas educacionais e de reabilitação para pacientes renais crônicos em hemodiálise, instrumentos de qualidade de vida aplicados nas amostras para se detectar o
impacto da doença no cotidiano. Assim, para localização dos artigos, foram utilizadas as palavras-chave “programas educacionais”, “programas de reabilitação”, “hemodiálise”, “insuficiência renal crônica” e “qualidade de vida”. Resultados: De um total de 58 artigos publicados nas duas bases de dados, apenas
oito atenderam os critérios de inclusão, sendo que, nestes, quatro programas
foram encontrados. Todos os programas propõem importantes intervenções
multiprofissionais focalizadas na educação e na reabilitação, auxiliando na
modificação do estilo de vida. As medidas mais utilizadas foram as específicas,
como o KDQ e KDQOL-SF, e, embora as medidas genéricas fossem menos
numerosas, destaca-se o SF-36, aplicado em todos os programas. Conclusão:
Os programas descritos mostram a crescente evidência da relação entre intervenções educacionais, de reabilitação específica e melhora da qualidade de
vida. (J Bras Nefrol 2004;26(1):45-50)
Descritores: Hemodiálise. Insuficiência renal crônica. Programas educacionais
e reabilitação.
Marielza R. Ismael Martins
Claudia Bernardi Cesarino
Faculdade de Medicina de Rio
Preto - FAMERP, Rio Preto,
SP, Brasil
ABSTRACT
Update on education and rehabilitation programs for chronic renal
failure patients undergoing hemodialysis
The concern with effective therapy and procedures to improve the quality of life
of patients with chronic renal failure has led investigators to develop education al and rehabilitation programs for these patients. This review was carried out to
better understand how these programs were created and what their objectives
are. Articles were found through an electronic search in Medline and CINAHL
database from 1997 to 2002 using the keywords “educational programs”, “reha bilitation programs”, “hemodialysis”, “chronic renal failure”, and “quality of life”.
Eligibility of the articles included studies with educational and rehabilitation pro grams for patients with chronic renal failure undergoing hemodialysis, and which
quality of life instruments were used in the samples to find out the impact of the
disease in their daily lives. Of a total of 58 publications in the two databases,
only eight met the inclusion criteria, and out of these, 4 programs were identi fied. All of the programs propose relevant multiprofessional interventions
focused on education and rehabilitation providing support in the change of life
Recebido em 6/5/2003
Aprovado em 27/10/2003
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Programas educacionais e de reabilitação para renais crônicos
style. Specific instruments such KDQ and KDQOL-SF
were the most used instruments, and although generic
assessments were less numerous, stand out SF-36, which
was used in all of the programs. The programs reported
show the increasing evidence of the relationship between
specific educational and rehabilitation interventions and
better results including health-related quality of life. (J
Bras Nefrol 2004;26(1):45-50)
Keywords: Hemodialysis. Chronic renal failure. Educa tion and rehabilitation programs.
INTRODUÇÃO
Atualmente, as atenções começaram a se voltar
para uma terapêutica que vise a melhora da qualidade de
vida do paciente renal crônico, como um fator relevante
no cenário da terapêutica renal, e não apenas a extensão
da sua vida 1.
Em razão da Insuficiência Renal Crônica (IRC)
não apenas debilitar o organismo, mas, também, provocar
alterações físicas associadas ao tratamento hemodialítico,
estas constituem fatores limitantes das atividades diárias e
rotineiras2. Sabe-se que o tratamento do paciente com
insuficiência renal crônica, por meio do tratamento
dialítico, tem como objetivo aumentar a sobrevida, mas
também deve almejar a reabilitação.
Geralmente, esses problemas são o isolamento
social, perda de emprego, dependência da previdência
social, perda da autoridade no contexto familiar, afastamento dos amigos, parcial impossibilidade de locomoção
em razão do estado clínico geral, impossibilidade de passeios e viagens prolongadas em razão da periodicidade
das sessões de hemodiálise, diminuição da atividade física (prática de esportes), disfunção sexual, entre outros3-5.
Apesar do tratamento de hemodiálise ser caracterizado por um avanço tecnológico diversificado e rápido,
o qual tornou-se possível a partir da década de 60, várias
dificuldades técnicas foram sendo superadas e, a partir dos
anos 70, a hemodiálise estava definida como um dos tratamentos que fariam a manutenção da vida dos pacientes
renais crônicos, condição até então fadada ao êxito letal6,7.
A década que se seguiu, até o início dos anos 90,
confirmou a tendência mundial de crescimento de pessoas
mantidas sob tratamento substitutivo da função renal6,7. Os
resultados deste tipo de análise levaram pesquisadores a
preocuparem-se com esta população, que evidenciou vários
sentimentos relacionados à irreversibilidade da doença renal
e à obrigatoriedade de submissão ao tratamento, ocasionando um impacto na qualidade de vida destes indivíduos8,9.
Evidenciam-se importantes avanços em técnicas,
equipamentos e manuseio terapêutico, mas, ainda assim,
a IRC é uma condição com problemas médicos, sociais e
econômicos devastadores em todo o mundo, principalmente em países do terceiro mundo, havendo regiões
pobres da Ásia e África Central onde nem há a possibilidade regular de suporte dialítico6,7.
Estes fatos têm conduzido a estudos que abordam
a qualidade de vida e o surgimento de programas educacionais e de reabilitação para esta clientela, fazendo com
que profissionais de áreas diversificadas criem condições
e oportunidades para o desenvolvimento do conhecimento e da ação desses pacientes, para enfrentar a nova realidade6,7,10-12,19.
Vários estudos relatam que o sedentarismo e a limitação funcional estão presentes no cotidiano destes
pacientes e, a seguir, serão comentados programas educacionais e de reabilitação que promovem benefícios, modificando seu estilo de vida e seu comportamento frente à
doença11-13,17,18.
Assim, considera-se imprescindível a realização
de estudos com foco na temática “qualidade de vida” para
avaliar o impacto da doença e do tratamento nas suas
condições de vida, a fim de subsidiar a construção das
políticas de saúde direcionadas aos renais crônicos em
hemodiálise no Brasil.
O objetivo do presente estudo foi identificar intervenções e avaliações destes programas, dando grande
atenção aos que possam melhorar os parâmetros de qualidade de vida desta população focalizados na reabilitação.
Sendo esta a temática atual, procurou-se conhecer
os aspectos básicos necessários na elaboração dos programas, e quais instrumentos que possam auxiliar na identificação, desenho, elaboração e monitorização destes programas, bem como na análise dos resultados do tratamento de pacientes renais crônicos submetidos ao tratamento
de hemodiálise.
MATERIAL E MÉTODO
Trata-se de um estudo de natureza descritiva, retrospectiva, de revisão bibliográfica sobre o tema “programas de educação e reabilitação para pacientes renais
crônicos submetidos à hemodiálise”.
O objeto deste trabalho foram os artigos publicados
em periódicos nacionais e internacionais sobre o tema em
questão nos últimos seis anos, entre janeiro de 1997 e
dezembro de 2002. Realizou-se, para localização dos trabalhos, a busca eletrônica nas bases de dados Comprehen sive Medline (Medical Literature and Retrieval System on
Line) e CINAHL (Cumulative Index to Nursing and Allied
Health Literature). De um total de 58 artigos, apenas oito
atenderam aos critérios de inclusão. Assim, para compor
J Bras Nefrol Volume XXVI - nº 1 - Março de 2004
esta amostra, foram obedecidos os seguintes critérios:
foram considerados apenas os periódicos; artigos indexados através das palavras-chave “programas de educação”,
“programas de reabilitação”, “hemodiálise”, “insuficiência
renal crônica” e “qualidade de vida”; publicações de programas educacionais e de reabilitação para pacientes renais
crônicos em tratamento hemodialítico; artigos que continham instrumentos de qualidade de vida. Foram excluídos
os estudos com transplantados e pacientes que não tinham
iniciado o tratamento de hemodiálise e que não atendiam
aos critérios de inclusão. Os dados obtidos foram armazenados em banco de dados do Microsoft Excel e analisados mediante o uso de estatística descritiva.
Programas Educacionais e de Reabilitação Para
Pacientes Renais
LORAC
O Life Options Rehabilitation Advisory Coun cil8,12,22 é um programa de reabilitação renal, multidisciplinar, criado em 1994 pelo Instituto de Educação Médica,
Estados Unidos, engajado em pesquisa e, com parceria com
organizações, oferece suporte técnico e desenvolve materiais de alta qualidade educacional, baseado em incentivo,
educação, exercício, emprego e avaliação, para todos os
pacientes renais e profissionais da área. Fazem parte deste
conselho, profissionais de todo o país envolvidos no cuidado renal – pesquisadores, médicos, enfermeiros, terapeutas,
nutricionistas e assistentes sociais, como, também, representantes governamentais, pacientes e empresas privadas.
Trata-se de um programa nacional particularmente ativo
em três áreas: reabilitação, programas e publicações e
pesquisa em reabilitação renal. Os programas de exercícios
são indicados nas respectivas unidades de diálise, e cada
paciente inicia seu nível de acordo com sua capacidade
física e condição médica atual. O programa é desenvolvido
em 5 fases: fase I) Manuseio da dor – importantes para o
paciente administrar o stress e praticar relaxamento, exercícios de bola para fístula e exercícios de alongamento para
realizar em casa; fase II) Atividades da vida diária – focalizando o aumento da função em casa e adicionando exercícios de fortalecimento; fase III) Resistência cardiorrespiratória – adiciona-se a exercícios das outras fases um programa cíclico na unidade ou caminhadas, com número de
minutos por dia, aumentando o nível de resistência; fase
IV) Atividades independentes – incentivar atividades sociais/comunitárias complementando os exercícios dados
anteriormente; fase V) Realçar a saúde – este estágio é de
prevenção e trabalha-se com pacientes na pré-diálise, enfatizando a importância de fortalecer a saúde antes de necessitar da diálise.
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Os instrumentos de avaliação de qualidade de vida
mais utilizados pelos profissionais que compõem este
programa são: Child Health Questionnaire, Dartmouth
COOP Clinical Improvement System (genérico e específico), Duke Health Profile, Karnofsky Performance Scale
(genérico), Kidney Disease Quality of life (KDQ), Quali ty of life assessment instruments database, SF-36, SF-12
e SF-8, Perfil de impacto da enfermidade (SIP), Perfil de
saúde Nottingham, Índice de Campbell.
As principais conclusões deste estudo foram: a
reabilitação renal tem proporcionado uma relação entre
melhor qualidade de vida para o paciente e um melhor
controle de custo para o estado. Um aspecto que merece
comentário é que a melhora da função física e mental que
ocorre com a reabilitação produz uma economia de custo
na forma de diminuição da morbidade e mortalidade, e
diminuição da hospitalização e gastos com cuidados, e
altas taxas de pacientes que conseguem emprego/atividades produtivas. Os resultados do número de pacientes
atendidos ainda não foram divulgados.
Educational Programme
O Educational Programme 11 foi um estudo piloto,
follow-up, realizado na Suécia, que recrutou pacientes
com doença renal crônica independente da modalidade
de tratamento, do sexo e da idade. Diferentemente do
estudo acima, estes pacientes realizavam um curso em
sua residência e eram avaliados pré e pós-curso pela
comparação de dados. Utilizou-se instrumento genérico
(SF-36) e um questionário específico (KDQ). Uma equipe multiprofissional composta de enfermeiro, terapeutas
de reabilitação e psicólogo iam à residência do paciente
recrutado onde se realizava orientações e treinamento
dos mesmos, utilizando recursos do ambiente e respeitando a condição sócio-econômica de cada paciente
envolvido no programa. Abordou-se, no programa, atividades da vida diária, alimentação, exercícios, durante 1
mês, onde registrou-se melhora na atividade física, bem
estar geral e suporte nutricional, comparando pacientes
no pré e pós-curso. Sendo o objetivo primário do estudo
a mudança persistente do estilo de vida do paciente, os
resultados demonstraram, após 25 meses de seguimento,
efeitos favoráveis da intervenção praticada. Todos os
pacientes envolvidos persistiam na estabilidade emocional e capacidade funcional crescente. Cabe comentar
que o número de pacientes atendidos (vinte pacientes,
estando 60% destes em tratamento hemodiálitico) representa uma pequena amostra, necessitando, assim, de
implementação deste programa em populações maiores
para verificar os benefícios propostos e se o desenho do
projeto deve ser modificado.
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Life Readiness Program
O terceiro estudo a ser comentado nesta revisão é
o Life Readiness Program13, Programa de vida com boa
disposição, é um programa de reabilitação física para
pacientes em hemodiálise, conduzido pelo Departamento
de Nefrologia e Hipertensão de Chapel Hill, Carolina do
Norte, Estados Unidos. A proposta do estudo foi testar o
efeito do programa de reabilitação física em pacientes
renais crônicos submetidos à hemodiálise. A função física era medida pelo Questionário de qualidade de vida do
doente renal (KDQ). Foram incluídos 82 pacientes, randomizados, acompanhados por 6 meses de programa de
reabilitação, divididos no grupo de intervenção (n = 39) e
o grupo administrado somente com padrão clínico (n =
43). Os grupos foram equiparados por idade, sexo, etnia e
diabetes como causa da doença renal crônica. O desenho
empregado foi linear geral com mudança no escore de
função física, onde utilizou-se a análise multivariada. Os
resultados finais foram apresentados no conceituado periódico American Journal Kidney Disease13 e apresentaram aumento significativo da função física no grupo de
intervenção. O grupo controle relatou mais problemas
com o trabalho e funções diárias do que com problemas
emocionais (p ≤ 0,05). O programa do grupo de intervenção realiza uma bateria de exercícios físicos, os quais
são gradativamente crescentes, semelhantes às fases I, II
e III do LORAC. Em 6 meses de intervenção, o Programa
de vida com boa disposição apresentou benefícios terapêuticos quanto ao estilo de vida e resultados funcionais,
mostrados nas sub-escalas do questionário genérico de
qualidade de vida SF-36. Um importante aspecto deste
estudo foi verificar, também através do instrumento de
qualidade de vida relacionada à saúde (HRQOL) no grupo
de intervenção, a melhora do sono, a diminuição dos sintomas relacionados à diálise e as mudanças no estilo de
vida dos pacientes e cuidadores.
Exercício Para o Dialisado: Treino de Força e
Exercício Aeróbico Durante a Hemodiálise
Este estudo piloto20,23, apesar de realizado com
uma amostra pequena (22) de pacientes renais crônicos
em hemodiálise, é interessante por apresentar novos
parâmetros de atividades físicas, os quais servem como
indicadores para técnicas e estudos posteriores nesta
área20. A investigação consta da segurança e viabilidade
de treino de força muscular e exercícios aeróbicos para
avaliar o impacto na sua resistência cardíaca, força muscular e desempenho funcional. Os testes utilizados para
verificar a resistência cardíaca foram testes de tensão e
caminhadas, para avaliar a força muscular foi com o má-
Programas educacionais e de reabilitação para renais crônicos
ximo de repetição de extensão de joelho, e o desempenho
funcional foi quantificado através do questionário genérico de qualidade de vida SF-36 antes e após o treino dos
exercícios.O treinamento consistia de exercício com bicicleta ergométrica e trabalho de força com extensores de
joelho 2 a 3 vezes por semana, por 3 meses, durante a
hemodiálise. Os resultados foram que dezoito dos vinte e
dois pacientes completaram o treino. Quatro abandonaram com dor no joelho e complicações médicas não relacionadas ao exercício. Após o treino, o SF-36 apresentou
melhoras significativas nos componentes físico e mental.
De treze dos dezoito pacientes que concordaram e completaram o teste de resistência, cinco apresentaram melhora nos testes de tensão e oito nos testes de andar. Este
estudo mostra que um desenho bem programado durante
a hemodiálise pode dar segurança com supervisão adequada e educação do paciente, melhorando a força muscular, a função física e mental, e uma melhor resistência
cardiorrespiratória.
Um interessante aspecto foi a oportunidade de
avaliar a resistência física dos pacientes dentro das unidades de hemodiálise, desenhando um estudo específico
para esta população.
Todos os programas apresentados avaliaram pacientes renais crônicos em tratamento hemodiálitico e,
exceto o LORAC, que atinge uma população maior, os outros estudos deverão ser realizados com amostras maiores
para que se comprove sua eficácia e estimule novas análises em relação aos efeitos benéficos da reabilitação renal.
Estudos com programas educacionais que serviriam para
conscientizar os pacientes de sua real situação e, assim,
transformá-la, ainda são escassos na literatura. Novos estudos devem ser realizados para que torne-se imperativo alinhar práticas clínicas à melhor qualidade de vida.
Instrumentos de Qualidade de Vida que Contribuem
Para o Desenvolvimento dos Programas
Para que estes programas fossem realizados, foi
necessário avaliar a qualidade de vida dos pacientes, proporcionando importantes indicadores que não são detectados por exames clínicos convencionais15-17. Nos estudos
que avaliaram pacientes renais crônicos, os instrumentos
de qualidade de vida serviram para conceitualizar, medir
e avaliar os domínios mais comprometidos após a instalação da doença e, assim, contribuir para uma ação mais
direcionada por parte dos profissionais da saúde que
lidam com esta população.
Nos estudos que avaliaram a qualidade de vida de
pacientes renais crônicos em hemodiálise, os instrumentos psicométricos e genéricos foram os mais utilizados.
Os domínios de qualidade de vida mais freqüentemente
J Bras Nefrol Volume XXVI - nº 1 - Março de 2004
avaliados foram aspectos emocionais, aspectos sociais,
capacidade funcional e atividades físicas.
Atualmente, estudos de revisão de literatura estruturada são fontes importantes para profissionais que desejam utilizar um instrumento ou desenvolver um novo,
pois a literatura de qualidade de vida da doença renal
crônica e de outras doenças crônicas pode se beneficiar de
descrições mais rigorosas e que tenham a confiabilidade e
validade testadas.
Dentre os instrumentos genéricos mais utilizados,
encontrou-se o Questionário genérico de qualidade de
vida SF-36, o Perfil de impacto da enfermidade (Sickness
Impact Profile – SIP) e o índice de Campbell, testados de
modo correto na população renal.
O questionário genérico de qualidade de vida SF36 (Medical Study 36-Item Short-Form Health Survey),
unânime em todos os programas, trata-se de um instrumento genérico de avaliação de qualidade de vida relacionada à saúde, que foi desenvolvido com o objetivo de
medir genericamente o estado de saúde subjetivo. É de
fácil aplicação e composto por oito dimensões: capacidade funcional, aspectos físicos, dor, estado geral de
saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais e
saúde mental. É curto comparado a outros instrumentos e
tem demonstrado viabilidade de uso em estudos nacionais
e internacionais, tendo em vista propriedades satisfatórias
de confiabilidade e validade 15-17.
O instrumento específico mais utilizado para
pacientes renais crônicos em hemodiálise é o Questionário de doença renal (Kidney Disease Quality-of-life
questionnaire – KDQ)16.
É um questionário que foi desenvolvido para
pacientes em tratamento de hemodiálise, aplicado para
determinar quais aspectos de sua qualidade de vida foram
comprometidos pela doença. O questionário contém 26
questões divididas em cinco dimensões: sintomas físicos,
fadiga, depressão, relacionamento social e frustração.
Demonstrou-se de fácil aplicabilidade, e o uso de itens
específicos apresentou aumento na capacidade do questionário para detectar mudanças 8,11,13.
Muitos autores sugerem o uso de ambos (genéricos
e específicos)16,21 para que proporcionem dados e cruzem
informações relevantes para pacientes com doença renal e
seus cuidadores. Estes instrumentos são denominados
modulares, pois combinam os aspectos genéricos e
específicos da doença. A aplicação do SF-36 e do KDQ
tem obtido bons resultados 14-16.
Nos programas acima citados, estes instrumentos
oferecem parâmetros para que ocorra uma intevenção
49
com maior resolutividade8,10,12. A utilização destas medidas pelos programas foi avaliar aspectos da vida que os
indivíduos consideram importantes, e parece haver consenso de que é um fenômeno subjetivo e que muda ao
longo do tempo, havendo necessidade de incorporar os
valores e preferências dos pacientes no instrumento de
medida, porque é o que diferencia a qualidade de vida de
outras medidas de saúde 12,16.
CONCLUSÃO
Apesar de todos os senões e vieses aqui comentados, os efeitos dos programas de reabilitação para
pacientes renais crônicos trazem benefícios e estímulo
para que novos projetos sejam criados e implementados.
Sendo, na literatura, ainda escassos os trabalhos relacionados à educação preventiva, terapêutica e readaptativa desta população, é imperioso que o atendimento global
deste indivíduo seja realizado.
Por fim, os estudos apresentados mostraram que o
comprometimento da qualidade de vida destes pacientes
pode ser modificado através de atitude, respostas e ação
deles próprios, dos profissionais envolvidos, dos cuidadores e de políticas de saúde direcionadas aos renais crônicos, para que tenham a possibilidade de desenvolver
capacidades, habilidades e escolhas que não terminaram
concomitantemente com a função renal deles.
Neste processo de readaptação, a vida cotidiana, a
contínua ligação entre a teoria e a prática, assim como a
análise crítica do conteúdo da prática desenvolvida, são
capazes de operacionalizar conceitos teóricos, sendo esta
condição fundamental para fazer evoluir o processo de
reabilitação.
Embora os resultados desta atualização não possam ser estendidos a todos os portadores de doença renal,
eles podem colaborar para a compreensão da problemática desta população. A melhora na qualidade de vida
através das intervenções nos programas citados indica que
atuar na educação destes pacientes e cuidadores3,11,13 e na
reabilitação física e ocupacional8,10,12,20 é uma terapêutica
que tem resultados positivos. Porém, há que se considerar
que os resultados podem ter sido influenciados pelas características sócio-econômicas da população estudada e
pelo tipo de instituição onde foram coletados os dados,
mas é essencial ressaltar que a melhora da qualidade de
vida é meta comum, e que refletir sobre estas práticas com
objetivo de melhorá-las é um dos caminhos para a qualidade da assistência e um objetivo a ser alcançado.
50
Programas educacionais e de reabilitação para renais crônicos
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