UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ MARTA DE OLIVEIRA VIANA ARRUDA EFEITOS DA RISPERIDONA E DO HALOPERIDOL EM UM MODELO DE ESQUIZOFRENIA INDUZIDO PELA CETAMINA EM CAMUNDONGOS FORTALEZA-CE 0 2008 MARTA DE OLIVEIRA VIANA ARRUDA EFEITOS DA RISPERIDONA E DO HALOPERIDOL NO MODELO DE ESQUIZOFRENIA INDUZIDO PELA CETAMINA EM CAMUNDONGOS Dissertação submetida à coordenação do Curso de Mestrado Acadêmico em Ciências Fisiológicas do Centro de Ciências da Saúde da UECE, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências Fisiológicas Orientadora: Profª. Dra. Silvânia M. M. Vasconcelos FORTALEZA-CE 2008 1 A773e Arruda, Marta de Oliveira Viana Efeitos da risperidona e do haloperidol em um modelo de esquizofrenia induzido pela cetamina em camundongos / Marta de Oliveira Viana Arruda. Fortaleza, 2008. 132 p.; il. Orientadora: Profª. Dra. Silvânia M. M. Vasconcelos. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Ciências Fisiólogicas) – Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências da Saúde. 1. Neurolépticos – Experimento em animais. 2. Cetamina. 3. antipsicóticos;. 4. Camundogos. Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências da Saúde. CDD: 616.898 2 MARTA DE OLIVEIRA VIANA ARRUDA EFEITOS DA RISPERIDONA E DO HALOPERIDOL EM UM MODELO DE ESQUIZOFRENIA INDUZIDO PELA CETAMINA EM CAMUNDONGOS A citação de qualquer trecho desta tese é permitida, desde que seja de conformidade com as normas da ética científica. Dissertação submetida à Coordenação do Curso de Mestrado Acadêmico em Ciências Fisiológicas do Centro de Ciências da Saúde da UECE, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências Fisiológicas. Aprovada em __ / __ / __ BANCA EXAMINADORA _________________________________________________ Profª. Dra. Silvânia Maria Mendes Vasconcelos – UFC/UECE (Orientadora) _________________________________________________ Prof. Dr. Krishnamurti de Morais Carvalho - UECE _________________________________________________ Profª. Dra. Francisca Cléa Florenço de Sousa - UFC 3 “Quando passares pelas águas, eu estarei contigo, e passares pelos rios, eles não te arrastarão; e quando andares pelo fogo, não te queimarás, e a chama não te arderá; Porque eu sou o Senhor teu Deus...”. Isaías 46:2-3 4 "A verdadeira descoberta não consiste em procurar novas paisagens, mas em possuir novos olhos.” (Marcel Proust) 5 Aos meus pais, que me deram o bem mais valioso do mundo, a vida. Ao meu esposo, Júlio, aos meus filhos, Bruno e Júlio Jr., por todo o amor, carinho e compreensão. 6 AGRADECIMENTOS À minha orientadora, Profª Dra Silvânia Maria Mendes Vasconcelos, pelas lições, paciência, dedicação e acolhimento, tão importantes e necessários, sem os quais, jamais teria conseguido alcançar meu objetivo. A ela, a quem devo o enriquecimento deste estudo, permitindo-me construí-lo às luzes de sua valiosa orientação, e incentivo na minha formação científica, minha eterna gratidão. Ao Prof. Dr. Krishnamurti de Morais Carvalho, pelo apoio e por ter gentilmente aceitado participar da banca examinadora. À Profa. Dra. Francisca Cléa Florenço de Sousa, o meu sincero agradecimento por ter aceitado o convite para participar da banca examinadora. À Profa. Dra. Ana Maria Sampaio Assreuy pela colaboração e disposição para nos ajudar, muito obrigada pela atenção e valiosa ajuda. Aos alunos da graduação Jamile, Adelaide, Marcelo Andrade, Ítalo Hugo, Victor, Guilherme e Ana Luiza, e os da Pós-graduação Edna Camelo, José Eduardo, Paula Matiaz e Natália Celedônio pela ajuda e pela amizade. Às minhas amigas Celi Girão, Islene Victor e Ana Célia pelo incentivo e preciosa amizade. À minha chefe Telma Solange do Hospital Universitário Walter Cantídio e a todas as colegas que me ajudaram de uma forma ou de outra para que eu tivesse mais tempo para dedicar-me na conclusão desse trabalho. À minha irmã Márcia pelo carinho e disposição eterna para me ajudar. À Rosa e demais colaboradores que fazem o laboratório de toxinologia da UECE, pela calorosa convivência diária e ajuda ofertada. Aos professores Nilberto e Cláudia pela gentileza na liberação de espaço e equipamentos para realização de parte dos experimentos. 7 A todos os Professores e funcionários que fazem o Curso do Mestrado Acadêmico de Ciências Fisiológicas do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Estadual do Ceará UECE. À Coordenação do curso de Pós-Graduação e aos demais colegas de pós-graduação que me acompanharam durante esse período de realização do curso de mestrado. À Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FUNCAP, pelo apoio financeiro. 8 RESUMO Este estudo apresenta a ação dos antipsicóticos (APC) Risperidona (Risp) e haloperidol (Halo) sobre os efeitos comportamentais causados por Cetamina (Ceta), em camundongos, nos testes: Campo aberto (OF), Rota rod (RR), suspensão da calda (TS), Labirinto Cruz elevado -LCE (Tempo nos braços abertos - TBA; Tempo nos braços fechados -TBF), Placa furada (Tempo de mergulho -TM, Nº de mergulho -NM) e Interação social ativa (Tempo de Interação Social -TIS). Os animais usados foram camundongos swiss, machos, albinos (25-30 g). As drogas foram administradas, sozinhas (Risp: 0,1 ou 0,2 mg/kg, ip; Halo: 0,1 e 0,2 mg/kg, ip) ou 30 minutos antes de Ceta (10 mg/Kg, ip). Os resultados mostraram que Ceta aumentou (63,3 ± 4,2) e APC diminuíram a atividade locomotora quando comparada com o controle (25,5 ± 4,2). APC, em ambas as doses, bloqueram a hiperlocomoção causada por Ceta. No RR, Ceta diminuiu (15 ± 4,1) o tempo de permanência dos animais quando comparado ao controle (59 ± 0,6) e este efeito não foi observado com APC sozinhos. Prétratamento com APC reverteu o efeito de Ceta sozinha no RR. Ceta (17,3 ± 5,6) diminuiu o tempo de imobilidade, no teste TS, quando comparada com o controle (80.2 ± 10.2), e o prétratamento com APC reverteu esta mobilidade. No LCE Ceta aumentou (112,8±14) o TBA comparado com o Controle (30,5±12) e APC diminuíram (Halo 0,1: 16,9±4,5); Risp 0,1: 23±13,8); Risp 0,2: 0,9±0,6). Pré-tratamento diminuiu o TBA no grupo da Ceta, na dose mais alta (Halo 0,2+ Ceta: 33,6±21; Risp 0,2+ Ceta : 0±0). No grupo da Ceta (122,5±10,4) sozinha, o TBF comparado com o do Controle (223,7±14,5), foi reduzido, porém, pré-tratamento na dose mais alta (Halo 0,2+ Ceta: 233±24,3; Risp 0,2+ Ceta: 276,5±15,2), reverteu esse efeito. Ceta (10±1,2) diminuiu o TM quando comparado ao Controle (13,3±1,1). O NM da Ceta e dos APC não foi diferente do Controle (27,5±2,6). Ceta (16,8±2,8) diminuiu o TIS quando comparado com o Controle (46,6±6,5) e, pré-tratamento com APC não reverteu o efeito da Ceta sozinha nesse teste. A ação dos neurolépticos nesse modelo produziu bloqueio dos efeitos causados pela administração aguda de cetamina. Sugere-se que o mecanismo de ação da Cetamina envolve o sistema dopaminérgico. Palavras-chaves: Esquizofrenia; cetamina; antipsicóticos; camundongos. 9 ABSTRACT This study presents the actions of the antipsychotics (APC) risperidone (Risp) and haloperidol (Hal) on the behavioral effects elicited by Cetamine (Ceta), in mice in the following tests: Open-field (OF), Rota rod (RR) Tail suspension (TS), Elevated Plus-maze (EPM)- (Time in open arms-TOA; Time in closed arms -TCA), Hole Board (Time of head-dip -THD, number head-dips-NHD) and Active social interaction (Time social interaction -TSI). Thus, animals used were male Swiss albino mice (25-30 g). Drugs were administered alone (Risp: 0.1 or 0.2 mg/kg, ip; Hal: 0.1 and 0.2 mg/kg, ip) or thirty minutes before Ceta (10 mg/Kg, ip). The results showed that Ceta increase (Ceta: 63.3 ± 4.2) and APC decreased the locomotor activity as compared to control (25.5 ± 4.2). Mice pretreated with APC, at both doses, blocked hyperlocomotion caused for Ceta. In RR, Ceta decreased (Ceta: 15 ± 4.1) the permanence time of the animals as compared to control (Control: 59 ± 0.6) and this effect did not observed with APC alone. Pretreatment with APC reverted the effect of Ceta alone in the RR. While Ceta (17.3 ± 5.6) decreased the time of immobility, in the TS test, as compared to control (80.2 ± 10.2), the pretreatment with APC reverted this mobility. In EPM Ceta incresed (112.8±14) the TOA compared to Control (30.5±12), APC decresed TOA (Hal 0.1: 16.9±4.5; Risp 0.1: 23±13.8; Risp 0.2: 0.9±0.6), pretreatment at higher dose (Hal 0.2+Ceta: 33.6±21; Risp 0.2+Ceta : 0±0), reverted effect of the Ceta alone. The TCA of the Ceta alone (122.5±10.4) was shorter than Control Group (223.7±14.5), and this effect was reverted with pretreatment at higher dose (Hal 0.2+Ket: 233±24.3; Risp 0.2+Ceta: 276.5±15.2). APC as well as Ceta (10±1.2) decresed the THD compared at Control (13.3±1.1). APC and Ceta (16.8±2.8) decresed the TSI compared at Control (46.6±6.5) and pretreatment with APC not reverted the effect of the Ceta alone. The action of neuroleptics in this model has made blockade of effects caused by acute administration of Cetamine. Thus, we suggest that the mechanism of action of Cetamine involve the dopaminergic system. Keywords: Schizophrenia; cetamine; antipsychotics; mice. 10 SUMÁRIO LISTA DE QUADROS LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS LISTA DE ABREVIATURAS 1 INTRODUÇÃO 21 1.1. Apresentação e Caracterização 22 1.1.1. 22 O sistema dopaminérgico 1.1.1.1. Dopamina 22 1.1.1.2. Receptores dopaminérgicos 28 1.1.1.3. Gânglios da base 32 1.1.1.4. As vias dopaminérgicas no SNC 34 1.1.2. O Sistema Glutamatérgico 35 1.1.2.1. Glutamato 35 1.1.2.2. Receptores 38 1.1.2.3. Transportadores do Glutamato 42 1.1.2.4. Vias do Glutamato 44 1.1.3. Esquizofrenia 46 2.1.3.1. Histórico e Definição 46 2.1.3.2. Prevalência 47 2.1.3.3. Sintomatologia 47 2.1.3.4. Diagnóstico e Classificação 48 2.1.3.5. Teorias para esquizofrenia 52 2.1.4. Neurolépticos – tratamento padrão para esquizofrenia 59 3.1.4.1. Histórico 59 3.1.4.2. Classificação e estrutura química dos neurolépticos 61 3.1.4.3. Farmacocinética 63 3.1.4.4. Mecanismo de ação 65 11 3.1.4.5. Usos clínicos 68 3.1.4.6. Efeitos colaterais 68 3.1.5. Cetamina 72 1.1.5.2 Definição, estrutura química e farmacocinética 72 1.1.5.3 Mecanismo de ação 73 1.1.5.4 Uso clínico 74 1.1.5.5 Efeitos adversos 75 1.1.5.6 Cetamina no modelo de esquizofrenia 76 3.1.6. Importância do estudo 78 2 OBJETIVO GERAL 81 3 MATERIAIS E MÉTODOS 83 3.1 Animais 84 3.2 Tratamento dos animais 84 3.3 Testes comportamentais 85 3.3.1. Campo aberto - Avaliação da atividade locomotora; Grooming, 86 Rearing, Estereotipias; Andar em círculos e Ataxia. 3.3.2. Catalepsia 86 3.3.3. Rota rod 87 3.3.4. Suspensão da calda 87 3.3.5. Teste de interação social 88 3.3.6. Placa furada 88 3.3.7. Labirinto cruz elevado 89 3.3.8. Análise estatística 90 4 RESULTADOS 91 4.1 Avaliação da atividade locomotora 92 4.2 Catalepsia 101 4.3 Rota rod 103 4.4 Suspensão da calda 106 4.5 Teste de interação social 108 4.6 Placa Furada 110 12 4.7 Labirinto cruz elevado 113 5 DISCUSSÃO 120 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 134 7 CONCLUSÂO 137 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 139 13 LISTA DE FIGURAS Figura 1 Biossíntese da dopamina 23 Figura 2 Vias do metabolismo da dopamina 28 Figura 3 Sinalização dopaminérgica 31 Figura 4 Modelo estrutural do receptor dopaminérgico 32 Figura 5 Vista anterior de corte frontal do hemisfério 33 cerebral mostrando o corpo estriado e suas relações com outras estruturas encefálicas Figura 6 Vias dopaminérgicas 35 Figura 7 Estrutura Química do glutamato 35 Figura 8 Síntese do glutamato 36 Figura 9 Integração metabólica do glutamato no SNC 38 Figura 10 Subtipos de receptores do glutamato 40 Figura 11 Receptor NMDA 41 Figura 12 O Diagrama de uma sinapse glutamatérgica típica 44 Figura 13 Rotas do glutamato no cérebro 46 Figura 14 Estrutura química dos neurolépticos típicos 63 clorpromazina, haloperidol e supirida; e dos neurolépticos atípicos risperidona e clozapina Figura 15 Receptores dopamínicos e atividade dos 65 antipsicóticos Figura 16 Estrutura Química da Cetamina 72 Figura 17 Efeitos das drogas no teste do campo aberto em 94 camundongos Figura 18 Efeitos das drogas na atividade locomotora 96 vertical (rearing) em camundongos Figura 19 Efeitos das drogas na atividade de auto-limpeza (grooming) em camundongos. 14 97 Figura 20 Efeitos comportamentais haloperidol nos da Ceta camundongos: e do 99 Atividade estereotipada; Andar em círculo e Ataxia. Figura 21 Efeitos comportamentais da Ceta e da risperidona nos camundongos: Atividade 100 estereotipada; Andar em círculo e Ataxia. Figura 22 Atividade de catalepsia induzida por drogas em 102 camundongos. Figura 23 Efeitos das drogas na coordenação motora (tempo de permanência na barra) 104 dos camundongos no teste do Rota Rod Figura 24 Efeitos das drogas na coordenação motora 105 (número de quedas) dos camundongos no teste do Rota Rod Figura 25 Os efeitos das drogas no teste de suspensão da 107 cauda em camundongos Figura 26 Efeitos das drogas no teste de interação social em 109 camundongos Figura 27 Efeitos das drogas no teste da placa furada em 111 camundongos – Tempo de mergulho Figura 28 Efeitos das drogas no teste da placa furada em 112 camundongos- n° de mergulho Figura 29 Efeitos das drogas no teste do LCE em 114 camundongos (Tempo de permanência nos braços abertos) Figura 30 Efeitos das drogas no teste do LCE em camundongos (Número de entradas nos braços abertos) 15 114 Figura 31 Efeitos das drogas no teste do LCE em 116 camundongos (tempo de permanência nos Braços Fechados) Figura 32 Efeitos das drogas no teste do LCE em 117 camundongos (Número de entradas nos Braços Fechados) Figura 33 Atividade locomotora vertical rearing) dos camundongos no LCE 16 (número de 119 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Afinidade de drogas antipsicóticas risperidona e 67 haloperidol, para os receptores de neurotransmissores humanos Tabela 2 Curva dose resposta da Cetamina - Resultados dos testes comportamentais com camundongos, realizados preliminarmente, para definir dose da cetamina a ser utilizada nos experimentos posteriores 17 93 LISTA DE QUADROS Quadro 1 Classificação dos neurolépticos 64 Quadro 2 Tratamento agudo com cetamina 85 18 LISTA DE ABREVIATURAS HVA Ácido Homovanílico AC Adenilil Ciclase AMPc Adenosina 3,5-monofosfato cíclico ATP Adenosina Trifosfato AMPA Alfa-amino-3-hidroxi-5-metilisoxazol-4-propionato EAAT Aminoácido Ácido Excitatório ALE Atividade Locomotora Espontânea COMT Catecolamina O-metil-transferase Ceta Cetamina CPFm Córtex Pré-Frontal Medial DSM-IV-TR Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders Fourth Edition, "Text revision" LSD Dietilamida do Ácido Lisérgico DOPAC Diidroxifenilacético DA Dopamina EEP Efeito Colateral Extrapiramidal PCP Fenciclidina CSF Fluido Cerebrospinal Glu Glutamato GS Glutamina Sintetase GDP Guanosina Difosfato GTP Guanosina Trifosfato Halo Haloperidol LCE Labirinto em Cruz Elevado MAO Metabolizada pela monoamina oxidadase µM Micromolar 19 NMDA N-metil-D-aspartato NLP Neuroléptico (s) NQ Número de Quedas PET Positron Emission Tomography PPI Prepulse Inhibition of Acoustic Startle Risp Risperidona SPECT Single Photon Emission Computed Tomography SNC Sistema Nervoso Central TS Suspensão da Calda TP Tempo de Permanência TBF Tempo nos Braços Fechados TIS Teste de Interação Social TDA Transportador da Dopamina UECE Universidade Estadual do Ceará 20 INTRODUÇÃO 21 1 INTRODUÇÃO 1.1 Apresentação e Caracterização 1.1.2 O Sistema dopaminérgico 1.1.1.1 Dopamina A maioria das moléculas neurotransmissoras são (1) aminoácidos; (2) aminas derivadas de aminoácidos ou (3) Pepitídios construídos de aminoácidos. Não incluída nessa classificação, mas vale ser citada pelo seu importante papel como neurotransmissor, a acetilcolina é derivada da acetilcoenzima A, produto da respiração celular na mitocôndria, e colina, um lipídio. Reconhecida como neurotransmissor em 1959, a dopamina (DA) faz parte do grupo das aminas derivadas de aminoácidos, também denominadas de monoaminas devido a um grupo amino (NH2) presente em sua estrutura química (BEAR et al., 2002). As monoaminas incluem as catecolaminas (Dopamina, noradrenalina, adrenalina) e a 5-hidroxitriptamina (serotonina). Aquelas são denominadas de catecolaminas devido a um grupo catecol (um anel benzeno com dois grupos hidroxil adjacentes) nas suas estruturas químicas (HOFFMAN, 2006). Localização A maior parte do conteúdo de catecolaminas do sistema nervoso central (SNC) é DA, e quantidades extremamente grandes são encontradas no gânglio basal (especialmente o núcleo caudado), no acumbens, no tubérculo olfatório, no núcleo 22 central da amígdala, na eminência média, e em campos restritos do córtex frontal (BLOOM, 2006). Dopamina Dopamina β-hidroxilase Figura 2 - Biossíntese da dopamina. Adaptada de wikipédia.org/wiki/dopamine#biosynthesis 23 Funções A DA é um neurotransmissor predominante no cérebro de mamíferos onde controla uma variedade de funções incluindo atividade locomotora, cognitiva, reforço positivo, comportamento alimentar e regulação endócrina. Tem também várias funções na periferia, dentre elas: modulação da função cardiovascular, liberação de catecolaminas, tônus vascular, função renal e motilidade gastrointestinal. A DA tem sido o foco de muitas pesquisas, principalmente devido a sua ligação com patologias graves como a doença de Parkinson e a esquizofrenia (MISSALE et al., 1998). Síntese A síntese da DA demonstrada na Figura 1, segue a mesma via da noradrenalina, onde o precursor é o aminoácido aromático tirosina, presente nos líquidos orgânicos. São duas reações que transformam a tirosina em DA. A primeira reação é catalizada pela enzima citosólica tirosina hidroxilase, contida nos neurônios catecolaminérgicos, que converte a tirosina em um composto denominado L-DOPA (L-1,3-diihidroxifenilalanina). A segunda reação é a descarboxilação da L-dopa catalizada pela enzima dopa descarboxilase dando origem a dopamina (VALLONE et al, 2000). Neurônios Dopaminérgicos não produzem noradrenalina, pois carecem de dopamina β-hidroxilase. A primeira reação enzimática é a etapa limitante nesta via biossintética, de forma que a atividade da tirosina hidroxilase é determinante na velocidade de síntese de catecolaminas. Explicando melhor, a falta da enzima ou da sua ativação são fatores que levam à diminuição da DA nos neurônios (RANG et al., 2007). A tirosina-hidroxilase é ativada por fosforilação catalizada pela acetil-CoA carboxilase. A atividade da enzima é regulada por vários sinais no citosol do terminal axonal, como exemplo: a liberação de DA ocorre através de um mecanismo dependente de cálcio. De forma que, quando DA é liberada a uma taxa elevada, o 24 aumento da concentração de cálcio que acompanha a liberação de neurotransmissores conduz a um aumento na atividade da enzima, controlando dessa forma a produção de DA conforme o seu gasto. Além disso, períodos prolongados de estimulação causam um aumento na síntese de RNAm que codifica essa enzima. Por outro lado, liberação diminuída de dopamina no terminal provoca um aumento da concentração de DA no citosol inibindo assim a enzima – inibição pelo produto final (BEAR et al., 2002). Armazenamento e liberação Uma vez sintetizada moléculas de DA são incorporadas e concentradas em vesículas sinápticas que a transportam desde o corpo celular, ao longo do axónio até um terminal sináptico. Quando ocorre a estimulação neuronal (potencial de ação chega ao botão sináptico) a despolarização resultante abre canais de cálcio regulados por voltagem. A presença dessa alta concentração local dos ions cálcio, próximo as vesículas sinápticas, provavelmente causa uma alteração na membrana das vesículas, permitindo sua fusão com a membrana do botão sináptico e conseqüente esvasiamento do conteúdo dentro da fenda sináptica (mecanismo de exocitose). A DA se difundirá para membrana pós-sináptica onde se ligará a proteína G específica, incorporada ao receptor, resultando na transmissão do impulso (KINGSLEY, 2001). Recaptação e transportadores da dopamina Após liberada nas terminações nervosas DA tem que ser inativada para limitar a duração de sua influência. O transportador da dopamina (TDA) é uma proteína de transporte da membrana plasmática neuronal que se acredita ter o papel de controlar a concentração de dopamina extracelular, liberada durante o processo de neurotransmissão, através da recaptação da fenda sináptica para terminal nervoso. O TDA é um importante alvo para uma variedade de agentes terapêuticos e drogas de abuso. Transportadores dopaminérgicos e seu papel no terminal nervoso foram primeiro caracterizados em 1969. No início dos anos 80, através de estudos com 25 radiotraçadores houve uma melhor compreensão da distribuição, farmacologia e regulação do TDA. Em anos recentes, técnicas de neuroimagens têm permitido determinar a densidade dos TDA e sua ocupação in vivo. Além do exposto, técnicas de clonagem do TDA têm contribuído para uma melhor compreensão desta família de gene (BANNON et al., 2001). O TDA é membro de uma grande família de transportadores dependente de Na+/Cl-. O TDA utiliza gradiente iônico através da membrana plasmática como força movente para acumulação intracelular de neurotransmissor (LESTER et al.,1994; RUDNICK, 1997). O TDA exibe uma dependência iônica com uma aparente estequiometria de transporte de 2Na+:1Cl-:1DA, sugerindo que o transporte de DA seja um processo eletrogênico (BANNON et al., 2001). Análises eletrofisiológicas (SONDERS et al., 1997) têm confirmado a natureza eletrogênica da atividade do TDA e demonstraram um aumento na velocidade do TDA, na hiperpolarização. Em adição, estudos têm relatado que receptores DA localizado no terminal nervoso DA (auto-receptores DA) modulam a atividade do TDA. Dessa forma hiperpolarização mediada por auto-receptor DA poderia servir para simultaneamente diminuir a liberação de DA, e aumentar a remoção de DA extracelular, mediada pelo transportador. Dessa forma, algumas condições podem alterar a função do TDA, como exemplo, tratamento com drogas (BANNON et al., 2001). O TDA é um importante alvo para psico-estimulantes, tais como, cocaína e anfetamina. As propriedades destas drogas são fortemente correlacionadas com suas afinidades para o TDA, com evidências do envolvimento dos neurônios DA mesolímbicos nas drogas de abuso. A cocaína, por exemplo, se liga ao TDA e impede o transporte de DA (RITZ et al., 1987). As anfetaminas, por sua vez, conseguem acesso ao terminal nervoso DA por processo de difusão através da membrana plasmática e transporte mediado pelo TDA. No citosol, libera DA dos estoques vesículares provocando em seguida a liberação de DA (BANNON et al., 2001). Em ambas as situações acima, os psico-estimulantes elevam a concentração extracelular de DA, provavelmente prolongando a neurotransmissão, e causando 26 ativação comportamental (aumento da atividade locomotora e/ou comportamentos estereotipados) em animais experimentais. A confirmação destes fatos foi obtida pelo estudo em animais com TDA modificado geneticamente (knockout) (GIROS et al., 1996; JONES et al., 1998). Os roedores exibiam hiperatividade locomotora significativa (mas não estereotipias) Contudo, nenhuma ativação comportamental adicional ocorreu em resposta à cocaína ou a anfetamina. Na ausência de TDA, o tempo de remoção da DA do espaço extracelular foi significativamente prolongado e os estimulantes falharam em aumentar mais ainda a concentração extracellular de DA (BANNON et al., 2001). Degradação De volta ao terminal axonal a DA é transportada para dentro das vesículas para serem reutilizadas ou ser enzimaticamente degradada (BEAR et al., 2002). Como esquematizado na Figura 2, a DA é metabolizada pela monoamina oxidadase (MAO) e catecolamina O-metiltransferase (COMT) sendo seus principais produtos o ácido diidroxifenilacético (DOPAC), após a recaptação para o terminal axonal, e o ácido homovanílico (HVA) em locais extra-axonal. Em cérebros de roedores, o DOPAC é o metabólito mais encontrado, sendo que no homem o HVA é mais predominante. Estes são excretados na urina, e frequentemente utilizados como índice de renovação da DA nos seres humanos. Substâncias que provocam a liberação de DA aumentam a concentração de HVA, geralmente sem alterar a concentração de DA (RANG et al., 2007; COOPER, 1991). 27 Dopamina (DA) Catecolamina O-metiltransferase (COMT) Monoamina oxidase (MAO), Aldeído desidrogenase Ácido diidroxifenilacético (DOPAC) 3-Metoxidopamina Monoamina oxidase (MAO), Aldeído desidrogenase Catecolamina O-metiltransferase (COMT) Ácido homovanílico (HVA) Figura 3 - Vias do metabolismo da dopamina Fonte: Adaptada de wikipédia.org/wiki/dopamine#biosynthesis 1.1.1.2 Receptores dopaminérgicos Em 1978, os receptores de DA foram propostos, primeiro com base em evidências farmacológicas e bioquímicas, existir como duas populações distintas, uma acoplada positivamente à AC e outro independente do sistema da adenosina 3,5monofosfato cíclico (AMPc) (SPANO et al., 1978). Posteriormente, estudos bioquímicos demonstraram a primeira evidência da existência dos receptores de DA no SNC, onde se observou que a DA podia estimular a adenilil ciclase (AC) (KEBABIAN & CALNE, 1979). O estudo mostrou que DA na 28 pituitária inibia a secreção de prolactina, mas não estimulava a formação de AMPc (KEBABIAN & CALNE, 1979) e, embora o antipsicótico sulpirida fosse um antagonista da DA, quando testado na pituitaria anterior ele não era capaz de bloquear a AC (KEBABIAN & CALNE, 1979; SPANO et al., 1978). Em 1979, Kebabian & Calne resumiram essas observações e sugeriram chamar de D1 o receptor que estimulava AC, e D2 o que não era acoplado a este efetor (MISSALE et al, 1998). No final dos anos 70, concomitante com os estudos realizados com os receptores DA em níveis centrais, foi descoberto, através de testes funcionais (fluxo sanguíneo renal e medidas de aceleração cardíaca no cão), a existência dos receptores periféricos específicos para DA. Estes receptores foram nomeados DA1 e DA2 devido algumas propriedades farmacológicas que os distinguiam de seus congêneres centrais (GOLDBERG et al., 1978). As decobertas acima levaram a divergentes opniões sobre a identidade, ou não identidade, dos receptores centrais com os receptores periféricos, porém estudos bioquímicos e de biologia molecular nos tecidos periféricos, subseqüentes, apontaram grandes similaridades entre os receptores DA centrais e os periférico, de modo que a classificação DA1/ DA2 foi abandonada (ANDERSEN et al., 1990; MISSALE et al 1988). Esse conceito de duplo receptor da DA permaneceu por uma década quando pesquisas, envolvendo clonagem de gene que codifica receptores dopaminérgicos, revelaram um alto grau de complexidade do receptor que até então não se conhecia. Após a introdução de procedimentos com clonagen de genes, três novos subtípos dos receptores DA foram caracterizados e foram denominados D3, D4 e D5/D1b. Estudos estruturais, farmacológicos, e bioquímicos, indicaram que todos os subtipos do receptor de DA se enquadram em uma das duas categorias, inicialmente reconhecidas do receptor. Portanto, o conceito de classificação D1/D2 desenvolvido no final de 1970 é ainda válido, sendo que os receptors D1 e D5/D1b são classificados como subtipos do receptor D1-símile e D2, D3, e D4 como D2-símile. O receptor de mamífero nomeado originalmente D1b, baseado na sua alta homologia com o receptor D1, passou a ser denominado receptor D5 (MISSALE et al, 1998). 29 Resumindo, os receptores D1 e D5 ativam o AC (acopla à proteína Gs para estimular a adenilil ciclase e aumentar AMPc). Os pares dos receptores D2 acoplam aos múltiplos sistemas efetores, incluindo a inibição da AC (acopla a proteína Gi para inibir a adenilil ciclase e diminuir AMPc), a supressão de correntes de Ca2+ e a ativação de correntes de K+. Os sistemas efetores pelos quais receptores D3 e D4 estão associados não foram definidos claramente (GREENGARD, 2001). Um modelo de sinalização dopaminérgica pode ser observado na Figura 3. Foram identificados, inclusive, duas isoformas do receptor D2 que diferem no comprimento da terceira alça intracelular, D2 curto (D2S) e D2 longo (D2L) (NESTLER et al., 2001; COOPER et al., 2003). Na Figura 4, um modelo estrutural do receptor dopaminérgico é demonstrado. As diversas funções da dopamina são devido a sua capacidade de se ligar aos múltiplos receptores. Em nível celular, as ações da dopamina dependem da expressão do subtipo do receptor e das ações convergentes de outros transmissores para os mesmos neurônios alvo (BLOON, 2006). Os estudos de clonagem produziram uma rica informação a respeito da estrutura das proteínas receptoras, sendo capaz de definir a distribuição desses receptores no SNC e na periferia, além da expressão dos receptores nas células alvo. Possibilitou, dessa forma, caracterizar a farmacologia, além da avaliação de uma possível ligação dos genes do receptor para possíveis desordens. Contudo, a função de muitos desses receptores é ainda completamente desconhecida, revelando que há, ainda, uma grande lacuna entre biologia molecular e abordagem funcional (MISSALE et al, 1998). 30 DA DA Receptor D1 Proteína G estimulatória Adenilato ciclase GDP AMPc Receptor D2 GDP Proteína G Inibitória Figura 3 - Sinalização dopaminérgica - Estimulação e inibição da adenilato ciclase pelas diferentes famílias de receptores dopaminérgicos (D1 símile e D2 símile). DA (dopamina), ATP (adenosina trifosfato), AMPc (adenosina monofosfato cíclico), GTP (guanosina trifosfato),GDP (guanosina difosfato). Fonte: http://www.scielo.br/img/revistas/qn/v27n6/22286f3.gif.scielo..br Além dos receptores pós-sinápticos, como visto anteriormente, a DA liga-se também a receptores localizados na membrana pré-sináptica, denominados autoreceptores. Os auto-receptores dopaminérgicos do terminal pré-sináptico podem modificar a neurotransmissão inibindo tanto a síntese quanto a liberação de DA, podendo modificar, inclusive, a taxa de descarga desses neurônios, alterando a condutância dos canais de sódio e/ou potássio. Em adição, o receptor D2 é encontrado tanto pré quanto pós sinapticamente em neurônios no caldado-putâmen, núcleo acúmbens e tubérculo olfatório (POTTER & HOLLISTER, 2006). 31 Figura 4 - Modelo estrutual do receptor dopaminérgico. Menegatti, 2004 1.1.1.3 Gânglios da base Os gânglios ou núcleos da base são vários pares de núcleos subcorticais, cada membro do par em hemisférios opostos. O maior núcleo nos gânglios da base é o corpo estriado, formado pelo núcleo caudado e o núcleo lentiforme. Como mostrado na Figura 5, o núcleo lentiforme é formado pelo putâmen (parte lateral) e o globo pálido (parte medial) (Tortora, 1999). Embora o putâmen seja mais ligado topograficamente ao globo pálido, do ponto de vista filogenético, estrutural e funcional, suas afinidades são com o núcleo caudado. O corpo estriado é dividido em neoestriado (striatum) que corresponde ao caudado e ao putâmen, e paleoestriado (palidum) ao globo pálido. Aferências excitatórias do tálamo e córtex fazem contatos sinápticos nos gânglios basais, além das aferências excitatórias vindas do tronco encefálico. Essas conexões são importantes para a realização do importante papel dos núcleos da base na coordenação e regulação dos movimentos. Os gânglios basais estão organizados para facilitar os movimentos voluntários e inibir movimentos competitivos, que poderiam interferir no movimento adequado. A disfunção desses circuitos pode levar a distúrbios do 32 movimento caracterizados por movimentos voluntários descoordenados, presença de movimentos involuntários, ou ambos (MACHADO, 1999). Figura 5 - Vista anterior de corte frontal do hemisferio cerebral mostrando o corpo estriado (Núcleo caudado; Núcleo lentiforme: Putâmen e Globo pálido) e suas relações com outras estruturas encefálicas. Adaptado de http://pt.wikipedia.org/wiki/N%C3%BAcleos_da_base 1.1.1.4 As vias dopaminérgicas no SNC A idéia de que um neurônio tenha somente um neurotransmissor é geralmente denominada de princípio de Dale. No entanto muitos neurônios que contém peptídios 33 violam o princípio de Dale, uma vez que estas células liberam mais do que um neurotransmissor: um aminoácido, ou uma amina e um peptídio. Portanto, os aminoácidos e os neurotransmissores aminérgicos podem ser usados para agrupar a maioria dos neurônios em classes distintas, sendo por isso os neurônios que contêm aminoácidos e neurotransmissores aminérgicos, classificados conforme o neurotransmissor, como exemplo neurônios glutamatérgicos, dopaminérgicos, adrenérgicos etc (BEAR et al., 2002). Os neurônios dopaminérgicos formam três sistemas principais, conforme demonstrados na Figura 6: (1) Via nigroestriatal, responsável por 85% da dopamina no cérebro, consiste de corpos celulares situados na substância negra, cujas fibras se projetam para o corpo estriado; (2) Via mesolímbica/mesocortical, com corpos celulares no mesencéfalo que se projetam para partes do sistema límbico (núcleo acumbens, núcleo amigdalóide e córtex frontal) e; (3) sistema túbero hipofisário, formados por neurônios curtos que vão do hipotálamo ventral para eminência mediana e hipófise (RANG et al., 2007). As funções das vias dopaminérgicas, no SNC são divididas em (1) coordenação dos movimentos voluntários (sistema nigroestriatal); (2) relacionada ao comportamento (sistemas mesolímbicos e mesocortical); (3) controle endócrino (sistema túberoinfundibular) - liberação de dopamina por neurônios desse sistema inibe a prolactina. São reconhecidas ainda outras duas vias, a saber: via medularperiventricular, com projeções ainda não bem definidas e a via incerto-hipotalâmica, com conexões entre a zona incerta medial e o hipotálamo e a amigdala. (POTTER & HOLLISTER, 2005). 1 2 3 34 Figura 6: Vias dopaminérgicas ((1) Via nigroestriatal; (2) Via mesolímbica/mesocortical; (3) Via túbero-hipofisária). Adaptada de http://iibce.edu.uy/2000-11/index.html 1.1.3 O Sistema glutamatérgico 1.1.3.1 Glutamato O ácido L-glutâmico ou glutamato (Glu) é o maior neurotransmissor excitatório do sistema nervoso central dos mamíferos. É classificado como neurotransmissor do grupo do aminoácido ácido. É encontrado em altas concentrações no Figura 7 - Estrutura Química do Glutamato SNC (NICOLL, 2006). Pesquisas demonstram que a função do Glu é diversa, e bem mais complexa que a simples generalização de correntes excitatórias. Entre outras funções, o glutamato tem um papel importante no desenvolvimento cerebral (diferenciação neuronal, gênese axonal etc) (BALÁZS et al., 1988), e no sistema nervoso maduro, onde Glu é central para a plasticidade a qual está implicada intimamente na memória, e relacionada com funções cognitivas (COYLE et al., 2002). 35 O glutamato está envolvido, além do fisiológico, em diversos processos patológicos. A ativação persistente de canais iônicos dependente de glutamato pode causar degeneração neuronal (OLNEY et al., 1997), e dependendo das circunstâncias, esta ocorre por meio de necrose ou de apoptose (ANKARCRONA et al., 1995), fenômeno este conhecido como “excitotoxicidade''. Este fenômeno tem sido relacionado com o final de uma via comum de morte neuronal, em uma gama de desordens incluindo as doenças de Huntington e Alzheimer (COYLE et al., 2002). Síntese e armazenamento O Glu é um aminoácido natural utilizado pelos tecidos periféricos, principalmente, como substrato energético. Sendo um aminoácido não essencial, o organismo, caso necessário, pode produzir seu próprio Glu a partir de outras fontes protéicas, portanto este pode ser sintetizado a partir do cetoácido α-cetoglutarato, um intermediário do ciclo do ácido cítrico. A síntese deste aminoácido é uma reação de transaminação, ou seja, é sintetizado a partir da adição de amônia ao α-cetoglutarato, pela ação da glutamato desidrogenase. (BERG et al., 2004). α-cetoglutarato Glutamato Figura 8 - Síntese do glutamato O Glu tem passagem dificultada na barreira hematoencefálica e praticamente todo glutamato, utilizado em nível central, é gerado no próprio SNC (SILVEIRA, 2004). Após sintetetizado é armazenado nos terminais pré-sinápticos em vesículas e em forma livre. São liberados na fenda sináptica, após estímulo neuronal, onde vão estimular receptores glutamatérgicos (DIAS et al., 2000). 36 Recaptação do Glutamato A captação do glutamato conforme esquematizado na Figura 9 se dá principalmente pelos astrócitos através de transportadores, assim que é captado é convertido em glutamina pela ação da glutamina sintetase (GS) e liberada para o interstício onde é re-captada pelo neurônio pré-sináptico (BLÜML et al, 2002), e sob a ação da enzima glutaminase transforma-se em glutamato (BRADFORD & WARD, 1978). Astrócito Neurônio Glicose Piruvato Glicose Lactato Piruvato 37 Glutamato Glutamina Glutamato Neurônio Figura 9 - Integração metabólica no SNC. O glutamato liberado na fenda sináptica é captado principalmente pelos astrócitos e convertido em glutamina pela GS. A glutamina é recaptada para o neurônio que a reconverte em glutamato (adaptado de HERTZ et al., 2000). 1.1.3.2 Receptores O sistema glutamatérgico, como observado na Figura 10 inclui receptores ionotrópicos (iGluR) e metabotrópicos (mGluR). Os iGluR são ligados a um canal iônico, e classificados em NMDA (N-metil-D-aspartato) e Não NMDA. Os receptores não-NMDA, por sua vez, são subdivididos em Ampa (alfa-amino-3-hidroxi-5metilisoxazol-4-propionato) e Cainato (Ácido Kaínico). Os mGluR agem através de segundos mensageiros via ativação da proteína G (NICOLL, 2006). Em condições fisiológicas, a ativação de mGluRs via glutamato produz uma corrente pós-sináptica lenta. Estes são escontrados em toda a região do cérebro, sendo considerado um dos maiores moduladores de segundo mensageiros no SNC em mamíferos (BRESSAN & PILOWSKY, 2003). Os mGluRs formam uma classe de oito receptores (mGluR1-8) classificados em três grupos (I, II e III). Os receptores do grupo I (mGluR1 e mGluR5) são acoplados a proteína Gq que ativa cascatas de segundos mensageiros (fosfolipase C, etc.) promovendo a liberação de Ca2+ de 38 estoques intracelulares. Os receptores do grupo II (mGluR2 e mGluR3) e do grupo III (mGluR4, mGluR6, mGluR7 e mGluR8) são acoplados a proteína Gi, negativamente acoplada a adenilato ciclase inibindo a formação de AMPc. Os mGluRs parecem ter um papel importante que modula tanto pré-sinapticamente quanto pós-sinapticamente os efeitos do glutamato nas sinapses glutamatérgicas onde os iGluRs também são acopladas (COYLE et al., 2002). Os receptores AMPA e Cainato se localizam em regiões telencefálicas e medeiam a transmissão rápida em sinapses excitatórias. Quando ativados, estes receptores induzem uma despolarização rápida do neurônio pós-sináptico que dura alguns milisegundos. (BRESSAN & PIPLOWSKY, 2003). Os receptores AMPA são formados por subunidades GluR 1-4. Enquanto que os receptores cainato são formados por subunidades GluR 5-7 e KA1-2 (COYLE et al., 2002). O receptor NMDA, conforme ilustrado na Figura 11 é formado por diferentes subunidades (proteínas heteroméricas) denominadas NR1 (onde se liga a glicina), NR2A-D (onde se liga o Glu). Diferentes combinações de subunidades determinam especificidades na capacidade funcional de cada receptor, como, por exemplo, afinidade pelo glutamato e limiar para abertura do canal iônico (BRESSAN & PIPLOWSKY, 2003). 39 Figura 10: Subtipos de receptors do glutamato. São conhecidas três famílias dos receptores ionotrópicos do glutamato (N-metil-D-aspartato, AMPA, e Cainato), cada um deles é composto de subunidades distintas. Os receptores metabotrópicos aglomeram-se em três grupos, os membros de cada grupo compartilham características farmacológicas e estruturais. (Meador-Woodruff & Kleinman, 2002). O receptor NMDA, como o nome sugere, foi identificado pelos efeitos excitatórios do análogo sintético, o ácido N-metil-D-aspartato (HOLLMANN, 1994). Os receptores NMDA são canais iônicos que controlam a condutância de Na+ e K+ e em especial de Ca2+ através da membrana neuronal (BRESSAN & PIPLOWSKY, 2003). Para ocorrer o fluxo de íons através do canal iônico, alguns eventos prévios são necessários para permitir uma mudança na conformação alostérica do receptor, e dai a abertura do canal (BRESSAN & PIPLOWSKY, 2003). Esses eventos são: (1) despolarização da membrana neuronal - a atividade do receptor NMDA é voltagem dependente. No potencial de repouso da membrana o canal está bloqueado por magnésio, que é liberado quando ocorre a despolarização. (2) ocupação de um ligando no sítio de ligação, denominado de sítio modulatório da glicina (COYLE et al., 2002). Neste sítio de ligação, evidências indicam que além da glicina, a D-serina, sintetizada nos astrócitos, é um potente agonista endógeno desse sítio de ligação (WOLOSKER et 40 al., 1999). (3) O receptor NMDA possui alguns sítios modulatórios, entre os quais o zinco é um importante inibidor da condutância do receptor NMDA, especialmente àqueles que contêm a subunidade NR2A (FAYYAZUDDIN et al., 2000). O zinco é concentrado em alguns terminais glutamatérgicos e liberado junto com o glutamato (CHOI & KOH, 1998). Outro sítio modulador é o sítio de ligação para poliaminas, que quando ocupado, aumenta a condutância, pelo menos em parte, aumentando a afinidade do sítio modulatório da glicina no receptor NMDA (ROCK & MACDONALD, 1995). Finalmente, após ativação do canal NMDA e conseqüente abertura desse, ocorrerá a entrada de Ca2+, para o interior do neurônio pós sináptico permitindo a sinalização intracelular (COYLE et al., 2002 ). Figura 11 - Receptor NMDA. Os diversos sítios de ligação no receptor modulam a abertura do canal e consequentemente a neurotransmissão. Fonte: Adaptado de Bressan e Piplowsky, 2003. Dentro do canal do receptor NMDA há, inclusive, um sítio de ligação para anestésicos dissociativos tais como fenciclidina (PCP), MK-801 e cetamina, os quais 41 servem como inibidores não competitivos (JENTSCH & ROTH, 1999), pois não competem pelo mesmo sítio que o glutamato. Essas drogas exercem seus efeitos ao penetrar no canal aberto, bloqueando-o (NICOLL, 2006). 1.1.3.3 Transportadores do glutamato A descoberta que o glutamato era um neurotransmissor foi através da demonstração de um transporte do glutamato, de elevada afinidade sódio-dependente, em preparações sinaptossomal (DIVAC et al., 1977). Coyle et al., (2002) descrevem cinco transportadores do aminoácido ácido excitatório (EAAT) que são dependente de sódio e independente de cloro. EAAT 1 têm sua expressão mais elevada no cérebro, mas são encontrados também nos tecidos periféricos e na placenta. No cérebro, o cerebelo parece ter um nível mais elevado, dependendo da espécie. EAAT 2 é expressado primeiramente no cérebro, embora os níveis baixos foram relatados no pâncreas e na placenta; a expressão mais elevada ocorre no prosencéfalo, e mais baixa no cerebelo. Sua expressão é predominantemente, se não exclusivamente, nas células gliais (astrócitos). O transportador neuronal predominante é EAAT 3, que é expressado também no rim e uma menor extensão em outros tecidos periféricos. Além dos acima descritos, duas formas menores, foram identificadas: EAAT 4, que é expressado em células cerebelares de Purkinje; e o EAAT 5, que é limitado para a retina. Adicionalmente, EAAT 3, apesar de largamente distribuído no sistema neuronal glutamatérgicos no cérebro, não é expressado consistentemente em todos esses sistemas, e alguns sistemas não-glutamatérgicos expressam-no (ROTHSTEIN et al., 1994), portanto EAAT 3 parece não ser um marcador específico para os neurônios glutamatérgicos (COYLE et al., 2002). A inibição farmacológica do transportador do glutamato em modelos de cultura de tecido foi mostrada por promover excitotoxidade e neurodegeneração. (ROTHSTEIN et al., 1993), podendo indicar que o transporte defeituoso do 42 neurotransmissor glutamato pode esta relacionado com a fisiopatologia de algumas doenças. Glutamato e células gliais A ação neuroprotetora dos transportadores do glutamato expressado pelos astrócitos representa uma faceta do importante papel da astroglia em modular a neurotransmissão glutamatérgica (COYLE et al., 2002). Conforme dito anteriormente, glicina é um co-agonista obrigatório para que a neurotransmissão glutamatérgica ocorra. Os astrócitos expressam uma alta afinidade pelo transportador dependente de sódio para glicina GlyT-1 o qual mantém concentrações de glicina que são subsaturadas para seu sítio modulatório (Kd = 20 nM ) no receptor NMDA apesar de níveis micromolares (µM) no fluido cerebrospinal (CSF) (BERGERON et al., 1998). Além disso, astrócitos do prosencéfalo expressam serina racemase, a qual gera Dserina, um potente agonista do sítio modulatório da glicina (ROGERS et al., 1991). Na Figura 12 podemos observar um modelo típico de neurotransmissão glutamatérgica representando as três células principais, bem como os diversos receptores envolvidos no processo. 43 Figura 12 – O Diagrama de uma sinápse glutamatérgica típica. Evidências sugerem que a transmissão glutamatérgica requer três células: uma que libera o glutamato présináptico, uma célula glial pré-sináptica que libera o agonista endogenous para o “sítio modulatório da glicina”, e um neurônio pós-sináptico. (MEADOR-WOODRUFF & KLEINMAN, 2002). 1.1.3.4 Vias do glutamato Na Figura 13 observamos as vias glutamatérgicas sendo a via (1) uma das mais longas do cérebro. Nessa via os corpos celulares originam-se no córtex e os axônios descem pela cápsula interna (fenda entre o putamen e o caudado), e ao nível da ponte ramificam-se para esta e para o núcleo rubro no tronco cerebral, onde excitam os neurônios motores que controlam uma variedade de músculos. No tronco cerebral, esses axônios cruzam (decussação), para o lado contralateral e depois prosseguem para a medula espinhal. Em cada nível da espinha dorsal, eles excitam neurônios motores (contração muscular). Os neurônios da via (2) se originam no córtex e projetam-se 44 para o neoestriado (caudado e putamen) e são também importantes no controle do comportamento motor. A via (3) projeta-se do córtex pré-frontal para o estriado ventral; sendo fundamental para o sistema límbico e o comportamento relacionado aos estímulos de recompensa. A via (4) mostra uma “alça motora” excitatória entre o córtex e o tálamo, esses neurônios excitam-se uns aos outros, sendo que esse circuito fica ativo enquanto uma atividade motora contínua está sendo executada. A informação do hipocampo utiliza uma via do glutamato; esses axônios projetam-se através do fórnix para chegar ao corpo mamilar (5). Essa via é parte do chamado “circuito Papez”. Um grande número de neurônios do glutamato tem corpos celulares na oliva inferior do tronco cerebral (6), os quais se projetam para o cerebelo, e estão envolvidos na coordenação motora (SILVEIRA, 2004). 45 Figura 13: Rotas do glutamato no cérebro Fonte: http://www.psiquiatriageral.com.br/cerebro/neurotransmissores.htm 1.1.4 Esquizofrenia 1.1.4.1 Histórico e definição A esquizofrenia é uma crônica, e grave doença cerebral que se desenvolve em aproximadamente um por cento da população (KUMAMOTO et al., 2006). O transtorno se inicia por volta dos vinte e cinco anos de idade e persiste por toda a vida. É discutida como uma única doença, contudo compõe um grupo de transtornos com etiologias variadas. O problema clínico da esquizofrenia atraiu a atenção de figuras importantes da psiquiatria e da neurologia, entre os quais Benedict Morel (1809-1873), psiquiatra francês, definiu os conceitos de esquizofrenia e aplicou o termo démence précoce para pacientes deteriorados cuja doença havia se iniciado na adolescência. A 46 denominação démence précoce foi traduzido posteriormete por Emil Kraepelin (18561926) como dementia precox. Esse termo enfatizava o processo cognitivo distinto (dementia) e o início precoce (precox) da doença. Por sua vez, Eugen Bleuler (18571939) denominou-a de esquizofrenia, o termo dementia precox, na literatura. Bleuler escolheu o termo esquizofrenia para expressar a presença de cisões (schisms) entre pensamento, emoção e comportamento e enfatizou que ao contrário do conceito de Kraepelin, a esquizofrenia não necessariamente precisava ter curso deteriorante (SADOCK & SADOCK, 2005). 1.1.4.2 Prevalência A prevalência para toda a vida é de um por cento, sendo as taxas de incidência e prevalência aproximadamente iguais no mundo todo. É igualmente prevalente em homens e mulheres, porém difere quanto ao início e ao curso da doença, sendo o início mais precoce entre homens. As idades de pico do início são entre 10 e 25 anos para os homens e 25 e 35 para mulheres. O início da esquizofrenia antes dos 10 e após os 60 anos é bastante raro. A doença é encontrada em todas as classes sociais e áreas geográficas (SADOCK & SADOCK, 2005). 1.1.4.3 Sintomatologia Segundo Trimble (1996), a esquizofrenia não deve ser considerada uma doença, mas uma síndrome, reconhecida por um conjunto de sinais e sintomas. Os sintomas característicos da esquizofrenia são alucinações e delírios, transtorno do pensamento e fala, além de perturbação das emoções e do afeto, déficit cognitivo e volição (MAJ & SARTORIUS, 2005). As alucinações podem ser do tipo: visuais, auditivas, e táteis 47 (CUTTING, 1990). Straus et al. (1974), sugeriram a distinção de dois perfis de sintomas na esquizofrenia: sintomas positivos e sintomas negativos. Os sintomas positivos são definidos pela presença de características anormais como alucinações, delírios e pensamento desorganizado. Os sintomas negativos se caracterizam pela ausência de funções normais e por sintomas, tais como: afeto embotado, restrição emocional e déficits cognitivos. Uma classificação mais atual, quanto aos sintomas, é encontrada na literatura que descreve sintomas positivos (ex. ilusão, alucinação), negativos (isolamento social ou pobreza na interação social) e sintomas cognitivos (ex. Deficits na atenção e memória de trabalho, flexibilidade mental) (CORBET et al., 1993, WANG et al., 2007). Abi-Dargam, (2004) propõe que os sintomas positivos são causados por hiperestimulação dos receptors dopaminérgicos D2, em regiões subcorticais, especialmente áreas estriatais, enquanto que sintomas negativos e cognitivos são devidos à hipofunção dopaminérgica no córtex pré-frontal dorsolateral em pacientes esquizofrêncicos, uma área que corresponde ao córtex pré-frontal medial em roedores. O referido autor encontrou, utilizando técnicas de neuroimagem, uma up-regulation dos receptors D1 dopaminérgicos, e atribuiu a esse resultado a um efeito compensatório do déficit de dopamina nessa área. 1.1.4.4 Diagnóstico e classificação Não existe um exame laboratorial para o diagnóstico da esquizofrenia, porém este se baseia principalmente na história psiquiátrica e no exame do estado mental (SADOCK & SADOCK, 2005). Os critérios de diagnósticos, para esquizofrenia, dependem do sistema de diagnóstico adotado. O manual diagnóstico e estatístico de doenças mentais – IV Edição- Revisado (DSM-IV-TR - Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders - Fourth Edition, "Text revision") é a principal referência de diagnóstico 48 para os profissionais de saúde mental, utilizado nos Estados Unidos, inclusive no Brasil (WIKIPÉDIA, 2008). Esse manual define um quadro de sintomas e comportamentos que são utilizados como critérios para o diagnóstico da esquizofrenia. Abaixo estão relacionados dois dos critérios conforme o DSM-IV-TR, que são avaliados, ao ser realizado o diagnóstico da síndrome: Critério A Sintomas característicos: no mínimo dois dos seguintes quesitos, cada qual presente por uma porção significativa de tempo durante um período de um mês (ou menos se tratados com sucesso): (1) Delírios (2) alucinações (3) discurso desorganizado (i.e.,descarrilamento ou incoerência) (4) Comportamento acentuadamente desorganizado ou catatônico (5) Sintomas negativos (embotamento afetivo): Critério B Disfunção social / ocupacional: Por uma porção significativa do tempo desde o início da perturbação, uma ou mais áreas importantes do funcionamento, tais como trabalho, relações interpessoais ou cuidados pessoais, estão acentuadamente abaixo do nível alcançado antes do início (ou quando o início se dá na infância ou adolecência, incapacidade de atingir o nível esperado de realização interpessoal, acadêmica ou profissional). Conforme o DSM-IV-TR, a presença de alucinações ou delírios não é necessária para um diagnóstico da esquizofrenia, tendo em vista, que esses sintomas estão também presentes em outras doenças psicóticas. De um modo geral, o transtorno é diagnosticado como tal quando o paciente exibe dois dos sintomas de três a cinco do critério A (conforme acima). Para o diagnóstico outros critérios devem ser avaliados, 49 como exemplo o critério B requer que o funcionamento comprometido (acentuada diminuição de capacidade para trabalho ou interações sociais ) esteja presente durante a fase ativa da doença. Os sintomas devem persistir por pelo menos seis meses (podendo nesse período os sinais característicos serem manifestados apenas por sintomas negativos), e não deve haver diagnóstico de transtorno esquizoafetivo e transtorno do humor, bem como, devem ser excluídos também os pacientes cujos sintomas passam estar relacionados ao uso de drogas, ou a alguma doença física (SADOCK & SADOCK, 2005). O DSM-IV-TR classifica os subtipos de esquizofrenia como paranóide, desorganizada, catatônica, indiferenciada e residual, com base na apresentação clínica do paciente. Sadock & Sadock (2005) descreve os subtipos de esquizofrenia conforme abaixo: Tipo Paranóide Surge em torno dos 30 anos de idade. Caracteriza-se com a preocupação com um ou mais delírios ou alucinações auditivas freqüentes, classicamente delírios de perseguição ou grandeza. Os pacientes costumam ter seu primeiro episódio da doença em idade mais avançada que os tipos catatônicos e desoganizado. Tendem a serem tensos e deconfiados e às vezes podem apresentar-se hostis ou agressivos. Nos pacientes em que a esquizofrenia ocorre no final da segunda ou a terceira década de vida, geralmente possuem uma vida social já estabelecida que pode ajudá-los a enfrentar a doença. Em geral, demonstram menos regressão de suas faculdades mentais, respostas emocionais e comportamento do que nas outras formas da doença. Tipo Desoganizado Anteriormente denominado hebefrênico, caracteriza-se por regressão acentuada para um comportamento primitivo, desinibido e desorganizado. Seu início costuma ser precoce, antes dos vinte e cinco anos de idade. Os pacientes desorganizados, em geral, 50 são ativos, mas de uma forma não construtiva, sem objetivo. Com transtorno do pensamento pronunciado e seu contato com a realidade é pobre. Apresenta aparência pessoal desleixada e o comportamento social e as respostas emocionais são inadequadas. Tipo Catatônico Possui característica clássica uma pertubação acentuada da função motora, que pode envolver estupor, rigidez, excitação ou posturas bizarras. As características associadas encluem esteriotipias, maneirismos e flexibilidade cérea. O mutismo é comum. Tipo Indiferenciada DSM-IV-TR classifica, como indiferenciado, os pacientes claramente esquizofrênicos com dificuldade diagnóstica para um subtipo da esquizofrênia. Tipo Residual De acordo com o DSM-IV-TR, o tipo residual da esquizofrenia caracteriza-se por evidências contínuas de transtorno esquizofrênico na ausência de um conjunto de sintomas ativos ou de sintomas suficientes para satisfazer o diagnóstico de outro tipo de esquizofrenia. São comuns nesse tipo: Embotamento emocional, retraimento social, comportamento excêntrico, pensamento ilógico. Quando ocorrem delírios ou alucinações não são proemimentes. 1.1.4.5 Teorias para esquizofrenia Uma vez que a esquizofrenia é um transtorno complexo e multifatorial, foram desenvolvidas ao longo dos anos diversas investigações em várias áreas na tentativa de 51 compreender as causas para o desenvolvimento da patologia, surgindo então diversas teorias tentando explicar essa desordem. A causa da esquizofrenia ainda é obscura, e acredita-se que a doença envolve uma combinação de fatores genéticos e ambientais (LEWIS & LIEBERMAN, 2000). Estudos com gêmeos esquizofrênicos revelam uma incidência de 35 a 58% para gêmeos monozigóticos e de 6 a 26% em gêmeos dizigóticos (TRIMBLE, 1996). Podese então observar que a predisposição genética é um fator importante, devido à incidência familiar, porém não é causa determinante. Os resultados acima sugerem que fatores ambientais e psicossociais desconhecidos podem contribuir para o desenvolvimento do transtorno. Sadock & Sadock (2005) descrevem que alguns fatores ambientais, como exemplo sazonalidade ao nascimento ou alteração alimentar sazonal, têm sido relacionados para um maior risco de surgimento da doença e que esses fatores poderiam estar relacionados, indiretamente, com uma causa infecciosa. Os autores acima sugerem, ainda, que estressores sociais do contexto urbano, poderiam contribuir para o desenvolvimento da doença, haja vista que uma maior prevalência para a esquizofrenia foi encontrada em cidades com populações de mais de um milhão de pessoas, havendo uma correlação (prevalência x densidade populacional) mais fraca em cidades com menor número populacional. Esse efeito da densidade populacional é considerado consistente com a observação de que a incidência de esquizofrenia, em filhos de pais portadores do transtorno, chega a ser duas vezes mais alta em cidades do que em comunidades rurais. Além do exposto, acredita-se que há um componente no desenvolvimento que pode estar relacionado com à esquizofrenia (BROOME et al., 2005). O modelo postula que os genes envolvidos no neurodesenvolvimento (JONES et al., 1994) e/ou os insultos ambientais no início da vida conduzem o cérebro a uma alteração no desenvolvimento, que predispõe por sua vez ao posterior início de psicoses. (MURRAY E LEWIS, 1987; BULLMORE et al., 1998; MCDONALD et al., 1999). Outro modelo denominado “diátese-estresse” postula uma integração de fatores biológicos, psicossociais e ambientais, como exemplo uma pessoa pode ter uma 52 vulnerabilidade específica (diátese) que, quando influenciada por um estressor, permite que sintomas da esquizofrenia se desenvolvam. Preconiza-se que a diátese ou o estresse podem ser biológicos, ambientais ou ambos (SADOCK & SADOCK, 2005). Quanto à teoria neuroquímica, uma das mais estudadas atualmente, as pesquisas na tentativa de descobrir anormalidades, foram inicialmente frustrantes, não sendo encontrados marcadores bioquímicos em material cerebral póst-mortem ou amostras em pacientes vivos. Mais recente, estudos de imagem possibilitaram maiores descobertas com respeito às anormalidades neuroquímicas. Entre as teorias neuroquímicas, as principais centralizam-se na dopamina e no glutamato, embora outros mediadores como a serotonina tenha também merecido atenção (POTTER & HOLISTER, 2006) Inicialmente a idéia de que a disfunção da serotonina pudesse estar envolvida com a esquizofrenia foi baseada no fato de que o alucinógeno LSD (dietilamida do ácido lisérgico), agonista do receptor 5HT2, produz sintomas semelhantes à esquizofrenia (BUSATTO & KERWIN, 1997), sendo que essa idéia não foi bem aceita como única base para fisiopatologia da doença. Por outro lado, foi sugerido um papel para a serotonina nos transtornos psicóticos devido à utilidade clínica de fármacos antipsicóticos, como exemplo clozapina e risperidona, no tratamento da disfunção, os quais possuem atividade serotoninérgica (SADOCK & SADOCK, 2005). Entre os diversos sistemas de neurotransmissores implicados na fisiopatologia da esquizofrenia o sistema dopaminérgico foi um dos mais amplamente estudados (BRESSAN & PILOWSKV, 2003). Este modelo, que postula hiperfunção dopaminérgica, é baseado em diversas evidências: (1) sintomas psicóticos apresentados por pacientes usando droga que induz a liberação de dopamina nas terminações pré-sinápticas, como exemplo anfetamina. (2) a eficácia terapêutica de neurolépticos típicos, utilizados para tratar esquizofrenia, em muitos pacientes (DUNCAN et al., 1999), pelo bloqueio de receptores dopaminícos tipo D2 ( KAPUR & SEEMAN, 2001). (3) aumento do número de receptores dopaminícos póst-mortem no cérebro de pacientes esquizofrênicos que não havia sido tratados com antipsicóticos. (4) A tomografia por emissão de pósitrons (Positron emission tomography - PET) 53 mostrou um aumento no número de receptores dopamínicos tanto em esquizofrênicos tratados quanto os não tratados em comparação com exames de indivíduos não esquizofrênicos (POTTER & HOLISTER, 2006). Apesar dos diversos achados sugerindo aumento na atividade dopaminérgica, a teoria básica da dopamina não especifica se a hiperatividade decorre de liberação excessiva de dopamina, do excesso de receptores de dopamina, da hipersensibilidade destes à dopamina ou a uma combinação de tais mecanismos (SADOCK & SADOCK, 2005). Estudos de neuroimagem PET e SPECT (Single photon emission computed tomography) têm clareado a importância da ocupação dos receptores da dopamina como um preditor das respostas dos antipsicóticos (LIEBERMAN et al., 1998). Esses estudos demonstraram que os antipsicóticos requerem uma occupação do receptor estriatal D2 em torno de 65% a 70% para terem um efeito desejado sobre os sintomas da esquizofrenia (FARDE et al., 1992; KAPUR et al., 2000). Essa descoberta foi usada como um dos argumentos que contribuíram para o questionamento da hipótese dopaminérgica. Estando os receptores dopaminérgicos exclusivamente ligados a fisiopatologia da doença, a eficácia dos antipsicóticos típicos estaria relacionada a um maior grau de bloqueio do receptor dopaminérgico, diferente dos revelados pelos estudos de neuroimagem. Em adição, alguns antipsicóticos atípicos são eficientes no tratamento da esquizofrenia, embora bloqueiem um menor número de receptores da dopamina, como exemplo clozapina que ocupa o receptor D2 em cerca de 38%-63% e o D1 em torno de 38%-52% (FARDE & NORDSTROM, 1992; PILOWSKY et al., 1992). Estas evidências sugerem que além do receptor D2, outros sistemas de neurotansmissores podem estar envolvidos na psicofarmacologia da esquizofrenia (BRESSAN & PILOWSKY, 2003). Além do sistema dopaminérgico, pesquisas têm indicado que uma disfunção na neurotransmissão modulada pelo aminoácido excitatório glutamato, pode ter um papel principal na fisiopatologia da esquizofrenia (HERESCO-LEVY, 2003). 54 O primeiro estudo a respeito da hipótese glutamatérgica foi o realizado por Kim et al., (1980) o qual sugeriu que pacientes com esquizofrenia apresentavam diminuição na concentração de glutamato no líquido céfalo-raquidiano. Embora esse achado não tenha sido reproduzido consistentemente (BJERKENSTEDT et al., 1985: PERRY, 1982; TSAI et al., 1998), o estudo originou uma teoria sugerindo déficit de glutamato na esquizofrenia, o que estimulou pesquisadores a realizarem uma série de estudos na área. Contudo, essa teoria foi posteriormente modificada, devido a diversas evidências como as abaixo descritas. O sistema glutamatérgico, visto anteriormente, condensa uma série de receptores que são ativados pelo glutamato (COTMAN et al., 1995), entre os quais os receptors NMDA são especialmente importantes para compreensão da doença (BRESSAN & PILOWISKY, 2003). Como estudado, PCP é um antagonista não competitivo do receptor NMDA. A ligação dessa substância ao seu sítio no interior do canal bloqueia esse receptor e impede a neurotransmissão. Essa droga foi primeiramente desenvolvidada, na década de cinqüenta, para ser utilizada como anestésico, porém seu uso não foi aprovado tendo em vista seus efeitos psicotogênicos (delírios e agitação extrema), vivenciados por pacientes logo após o término dos efeitos anestésicos. Seus efeitos sedativos e anestésicos são similares a estados de transe e usuários dessa droga relatam experiências de saída do corpo e separação do meio ambiente, sendo por isso classificada como anestésico dissociativo (NIDA, 2008). Amplamente usada como droga de abuso, PCP é popularmente conhecida como “angel dust” ou pó dos anjos. Usuários dessa droga desenvolvem com grande freqüência sintomas psicóticos que muito se assemelham ao quadro esquizofrênico (LUBY et al, 1959). PCP induz um estado transiente em indivíduos normais, caracterizados por sintomas positivos e negativos e por disfunção cognitiva, que é geralmente observado em pacientes esquizofrênicos (LUBY et al., 1959; JAVITT, 1987; SIMPSON et al., 1991). Imagina-se que o mecanismo de psicose subjacente da PCP nos seres humanos é relevante para fisiopatologia da esquizofrenia (MORITA et al., 2000). 55 Em roedores, PCP induz diversas mudanças no comportamento que pode ser inibido pela administração aguda e crônica de drogas neurolépticas (MURRAY & HORITA, 1979; MORITA et al., 2000). Foi então sugerido que a administração de PCP em ratos pode ser um modelo animal da esquizofrenia com face e validade preditiva (JAVITT E ZUKIN, 1991; OGAWA et al., 1994; SAMS-DODD,1999). Adicionalmente, estudos controlados mostraram que inúmeros antagonistas do receptor NMDA agindo no mesmo sítio de ligação da PCP (Cetamina e MK801) ou no sítio de ligação do glutamato também induzem sintomas psicóticos (JAVITT & ZUKIN, 1991; OLNEY & FARBER, 1995). Foi sugerido que o modelo NMDA pode oferecer um modelo farmacológico mais convincente do que os modelos que mimetizam hiperfunção dopaminérgica (KEGELES et al., 2000). Os antagonistas NMDA induzem sintomas positivos (ex. delírios e alucinações) em voluntários sadios (KRYSTAL et al, 1994), além de sintomas negativos (ex. embotamento afetivo, retraimento emocional), e déficits cognitivos (ex: memória semântica e fluência verbal) (NEWCOMER et al., 1999). Alguns aspectos do modelo NMDA distinguem do monoaminérgico como exemplo os efeitos mediados por PCP e similares (MK 801, cetamina), não são na sua maior parte, mediados pelo aumento na transmissão dopaminérgica, portanto não são bloqueados por antipsicóticos típicos (GEYER & MOGHADDAM, 2002). Estudos em voluntários humanos os efeitos psicotomiméticos da cetamina não foram bloqueados por antipsicóticos típicos, mas foram reduzidos significativamente por antipsicóticos atípicos (MALHOTRA et al., 1997a). Alterações no comportamento social foi encontrado em modelos animais de esquizofrenia, como exemplo em ratos lesionados no hipocampo ventral (BECKER et al., 1999) ou após tratamento com PCP (SAMS DODD, 1999) porém esse comportamento não foi encontrado após administração com anfetamina (BECKER et al., 2003). O envolvimento do sistema dopaminérgico na fisiopatologia da esquizofrenia não foi descartado. Pesquisas têm sugerido que as vias neuronais envolvidas no modelo NMDA da esquizofrenia estão possivelmente integradas com as vias do 56 modelo dopaminérgico (MOORE et al, 1999). Estudos têm apontado para essa possibilidade sugerindo que a hipótese glutamatérgica estaria relacionada com uma hipofunção glutamatérgica em áreas frontocorticais a qual poderia então induzir a um aumento na função dopaminérgica. (OLNEY & FARBER, 1995; CARLSSON et al., 1999). A hipótese, acima descrita, é consistente com estudos de ligação em receptores glutamatérgicos, em ratos, que demonstrou diminuição da ligação do glutamato após tratamento subcrônico (cinco dias) com cetamina. Esse mesmo estudo revelou uma ligação aumentada no receptor D2 da dopamina no hipocampo e aumento dos transportadores da dopamina no estriado, porém não ficou claro se a alteração na ligação da dopamina foi conseqüência do antagonismo do receptor NMDA ou se cetamina bloqueou o transportador da dopamina (BECKER et al., 2003). Estudos de neuroimagem, realizados na tentativa de estabelecer uma relação entre o sistema dopaminérgico e o glutamatérgico, avaliaram o impacto de antagonistas não-competitivos do receptor NMDA no sistema dopaminérgico através de radiotraçadores para receptores D2 ([11C]-raclopride) e PET. Testes com cetamina produziram uma diminuição da ligação do radiotraçador em voluntários normais, indicando aumento na liberação de dopamina (BREIER et al., 1998; SMITH et al., 1998; VOLLENWEIDER et al., 2000). Em adição, estudo realizado acordo com Breier et al., (1998) mostrou uma correlação da diminuição da ligação do radiotraçador com a ocorrência de sintomas psicóticos induzidos pela cetamina. Adler et al., (1999) estenderam estes estudos para pacientes com esquizofrenia e verificaram que a cetamina induz liberação de dopamina ainda maior em pacientes com esquizofrenia do que em voluntários sadios. Na tentativa de explicar a patogênese da esquizofrenia, foi sugerido que o hipofuncionamento do córtex pré-frontal pode ser o responsável pelo desenvolvimento de sintomas negativos, enquanto os positivos poderiam ser atribuídos ao aumento da atividade dopaminérgica no sistema límbico (KHAN & DAVIS, 1995; KNABLE & WEINBERGER, 1997). Segundo Pietraszek (2003) estas áreas (cortical e subcortical) 57 estão funcionalmente integradas via sistema glutamatérgico sugerindo que disfunção nessa integração poderia precipitar sintomas psicóticos. Estudos de áreas cerebrais realizados por Tsai et al., (1995) encontraram dimuição da concentração do glutamato no hipocampo de pacientes com esquizofrenia quando comparado ao controle, porém outros autores sugerem uma deficiência na função do receptor glutamatérgico (DEUTSCH et al., 2001; OLNEY et al., 1999). Ambos os resutados são consistentes com a hipótese de hipofunção do sistema glutamatérgico. Entre os achados que dão sustentação a hipótese de deficiência do receptor, vale citar um estudo realizado por Mohn et al., (1999) que desenvolveram uma espécie de camundongo o qual expressava somente 5% dos níveis normais da subunidade NMDAR1, importante para a funcionalidade dos receptores NMDA. Esses animais apresentaram alterações de comportamento associadas tradicionalmente a modelos animais de esquizofrenia, como exemplo aumento da atividade motora, estereotipias, déficit em interações sociais e sexuais. Estes comportamentos foram revertidos com tratamento antipsicótico (haloperidol e clozapina). Outros receptores do sistema glutamatérgico além do receptor NMDA foram também descritos com um possível envolvimento na fisiopatologia da esquizofrenia como um estudo realizado com cérebro de esquizofrênico que revelou aumento nos iGLURs no córtex pré-frontal e diminuição no hipocampo (Deakin et al., 1989; Nishikawa & Takashima, 1983; Kerwin et al., 1988; Kerwin et al., 1990), porém o receptor NMDA tem sido o mais extensivamente estudado, possivelmente pelos diversos efeitos psicotogênicos relacionado ao antagonismo no sítio da fenciclidina. Evidências, como as acima descritas, levaram pesquisadores a proporem que a hipofunção dos receptores NMDA estaria envolvida na complexa fisiopatologia da esquizofrenia (BECKER et al., 2003; Bressan et al., 2001; Duncan et al., 2006). 1.1.5 Neurolépticos – tratamento padrão para esquizofrenia 58 A terapia medicamentosa sozinha dificilmente é suficiente para se obter melhora clínica adequada, sendo, portanto, utilizadas para o tratamento da esquizofrenia, além da abordagem medicamentosa, estratégias não farmacológicas tais como terapia individual, terapia de grupo e abordagens familiares. O uso combinado de antipsicóticos e tratamentos psicossociais têm sido realizados com sucesso na maioria pacientes com esquizofrenia (SADOCK & SADOCK, 2005). 1.1.5.1 Histórico Com relação ao tratamento medicamentoso, o uso de fármacos com eficácia comprovada em distúrbios psiquiátricos generalizou-se por volta da década de cinqüenta. A introdução de medicação antipsicóticas revolucionou estratégias de saúde no cuidado mental e conduziu-as à era do desinstitucionalização, um período em que os pacientes com esquizofrenia, e outras desordens psicóticas relacionadas, foram liberados dos hospitais para serem cuidados na comunidade (MIYAMOTO et al., 2002). No início dos anos 50 alguns dos efeitos antipsicóticos foram obtidos com extratos da planta de Rauwolfia, da qual foi estraída o princípio ativo da reserpina, que mais tarde foi sintetizada em laboratório. Embora a reserpina e os alcalóides relacionados exerçam efeitos antipsicóticos, estes são relativamente fracos e são associados com os efeitos colaterais severos, incluindo sedação, o hipotensão, diarréia e humor deprimido. Assim, a reserpina foi utilizada inicialmente para tratar hipertensão (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). O desejo de descobrir drogas que tivesse os efeitos sedativos similares ao da prometazina, um derivado fenotiazínico, conduziu pesquizadores entre 1949 a 1951, à síntese da clorpromazina. Sendo utilizada inicialmente por seu efeito sedativo na indução anestésica, observou-se a habilidades desse composto em produzir um efeito 59 calmante, diferente de uma mera sedação. Em meados da década de cinqüenta, fármacos fenotiazínicos foram introduzidos para o tratamento da esquizofrenia, os quais melhoraram consideravelmente o prognóstico desta e de outras desordens psicóticas (BALDESSARIN & TARAZI, 2007), antes tratadas com terapias agressivas, como exemplo o procedimento cirúrgico conhecido como lobotomia (MASIEIRO, 2003). As drogas utilizadas para tratar os distúrbios psiquiátricos são classificadas em três classes: (1) antipsicóticos ou neurolépticas – usados no tratamento de doenças psiquiátricas graves; (2) estabilizadores do humor (sais de lítio e alguns anticonvusivantes) e (3) antidepressivos – usados no tratamento de distúrbios afetivos e correlatos (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). O termo neuroléptico, introduzido para denotar os efeitos da clorpromazina e da reserpina nos pacientes psiquiátricos, visava diferenciar o efeito desses agentes daqueles dos depressors clássicos do SNC (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). Essas drogas foram as primeiras que demonstraram ser úteis na esquizofrenia, mudaram a história da psiquiatria, e tornou o pensamento psiquiátrico voltado para uma base mais biológica (POTTER & HOLLISTER, 2005). Em geral, os efeitos iniciais desses fármacos são lentidão na resposta a estímulos externos e sonolência, porém a pessoa é facilmente despertada. Tipicamente os pacientes usando antipsicóticos se tornam menos agitados, e aos poucos (em geral no transcorrer de alguns dias) os sintomas psicóticos de alucinação, delírio, e pensamento desorganizado ou incoerente tendem a desaparecer. (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). 1.1.5.2 Classificação e estrutura química dos neurolépticos Além dos derivados fenotiazínicos outras classes de antipsicóticos clássicos foram surgindo, tais como as butirofenonas, (haloperidol), e os tioxantenos (flupentixol), entre outros. Entretanto, estas “novas” classes de antipsicóticos clássicos 60 não representaram significativa inovação em relação ao tratamento com os fenotiazínicos, sendo muito semelhantes em suas propriedades (RANG et al., 2007). Em muitos pacientes com esquizofrenia, as drogas antipsicóticas clássicas (por exemplo, clorpromazina e haloperidol) foram largamente usadas devido à eficácia no tratamento dos sintomas positivos da esquizofrenia, e também por impedir a recaída do paciente, em relação aos sintomas psicóticos (KANE, 1989), porém, há muitas limitações no uso destes agentes, devido aos seus efeitos colaterais, tais como efeitos extrapiramidais (MIYAMOTO et al., 2002). Embora a clorpromazina ainda seja utilizada, com menor freqüência, no tratamento das psicoses, muitas das drogas pioneiras foram substituídas por novos fármacos (POTTER & HOLLISTER, 2005) Na busca de novos agentes antipsicóticos mais efetivos que aqueles classicamente empregados no tratamento da esquizofrenia, com menores efeitos colaterais, pesquisadores descobriram a clozapina em 1958 (MEYER & SIMPSON, 1997). A clozapina é um fármaco que apresenta muitas vantagens em relação aos antipsicóticos clássicos disponíveis até então, sendo efetivo no tratamento dos sintomas positivos e sobre os sintomas negativos (LIEBERMAN, 1993) e cognitivos dos esquizofrênicos (LIEBERMAN & KANE, 1989). Em comparação aos antipsicóticos clássicos, provoca menos hiperprolactinemia e efeitos extrapiramidais (LIEBERMAN & KANE, 1989), o que lhe conferiu a denominação de antipsicótico atípico (MEYER & SIMPSON, 1997). Contudo, o principal inconveniente no tratamento com a clozapina é o fato de produzir agranulocitose em cerca de 1-2% dos pacientes (RANG et al., 2007), sendo por esse motivo ter sido o seu uso suspenso nos estados Unidos e limitado em outros países. Considerada um protótipo atípico (MEYER & SIMPSON, 1997) a clozapina foi reintroduzida em 1990 devido às diversas vantagens apresentadas por esse antipsicótico, entre as quais se mostrou capaz de prevenir psicoses em pacientes refratários e intolerantes aos antipsicóticos clássicos (KANE et al., 1988). Uma característica distinta da clozapina em comparação com antipsicóticos convencionais é a afinidade relativamente elevada dessa droga para o receptor 5-HT2A. Foi proposto por Meltzer et al., (1989) que as ações antagônicas combinadas para os receptores 561 HT2A/D2, com potência relativamente maior para o receptor 5-HT2A, poderia ser fundamental em termos de aumentada eficácia e um reduzido efeito colateral extrapiramidal (EEP) (MIYAMOTO et al, 2002). O modelo teórico acima inspirou pesquisadores para o desenvolvimento da risperidona, na tentativa de imitar as afinidades, para os receptores HT2A/D2, da clozapina, embora risperidona tenha uma afinidade substancialmente mais elevada para ambos os receptores do que o clozapina (MIYAMOTO et al, 2002). Atualmente, as drogas neurolépticas são classificadas em típicas e atípicas, como exemplificadas no Quadro 1. Estes termos são amplamente usados, mas não claramente definidos, mas baseia-se na capacidade dos neurolépticos típicos em produzir EEP (ELLENBROEK et al., 1991, RANG et al., 2007), enquanto os atípicos promovem uma a ação antipsicótica com doses que não produzem, de modo significativo esses sintomas (especialmente discinesia tardia ou distonia) após administração crônica. Além disso, tem sido afirmado que os antipsicóticos atípicos produzem melhor resultados clínicos e qualidade de vida para o paciente que as drogas típicas (MELTZER, 1999), com menores taxas de recaídas e reinternação hospitalar (AYUSO-GUTIERREZ & DEL, 1997). As estruturas químicas dos neurolépticos típicos e atipicos foram demonstradas na Figura 14. 62 Figura 14 - Estrutura química dos neurolépticos típicos clorpromazina (1), haloperidol (2) e supirida (3) e dos neurolépticos atípicos risperidona (4) e clozapina (5). Fonte: Menegatti et al., 2004. 1.1.5.3 Farmacocinética Os fármacos antipsicóticos, em sua maioria sofre rápida absorção, porém incompleta. Muitas dessa drogas são submetidas a um metabolismo de primeira passagem. O haloperidol tende a ser menos metabolizado, tendo uma disponibilidade sistêmica média em torno de 65%. São em sua maioria altamente lipossolúveis e ligados às proteínas (92-99%). Tendem a ter grandes volumes de distribuição (habitualmente 7L/Kg). Tem uma duração de ação clínica muito prolongada, por provável seqüestro em compartimentos lipídicos do corpo e alta afinidade por receptores selecionados de neurotransmissores. (POTTER & HOLLISTER, 2005) São em sua maioria quase que totalmente metabolizados por uma variedade de processos. As principais vias metabólicas são os processo oxidativos mediados 63 sobretudo por enzimas microssomiais hepáticas e outras enzimas metabolizadoras de fármacos (POTTER & HOLLISTER, 2005). O haloperidol é metabolizado basicamente por uma reação de N-desalquilação e os fragmentos resultantes podem ser conjugados com àcido glicurônico. (POTTER & HOLLISTER, 2005; BALDESSARIN & TARAZI, 2007). Metabolizados quase totalmente a substâncias mais polares, são eliminados na urina e em certo grau na bile, quantidade muito pequena é excretada de forma inalterada. (POTTER & HOLLISTER, 2005). As concentrações plasmáticas do haloperidol encontrada na prática clínica são de aproximadamente 10 a 30ng/ml (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). Tipo Químico Principais Representantes Neurolépticos típicos (Clássicos) Fenotiazinas Clorpromazina, Flufenazina e Tioridazina Butirofenonas Haloperidol, Espiroperidol e Droperidol Tioxantinas Flupentixol, Clopentixol Neurolépticos atípicos Benzamida Sulpirida Difenilbutilpiperazina Pimozide Dibenzodiazepinas Clozapina Benzisoxazol Risperidona Tienobenzodiazepínico Onlanzapina Dibenzotiazepina Quetiapina Quadro 1. Classificação dos neurolépticos Adaptado de Rang et al., 2007 64 1.1.5.4 Mecanismo de ação O preciso mecanismo de ação psicótica dos neurolépticos é desconhecido, postula-se que seja, pelo menos em parte, pela capacidade dessa droga bloquear a dopamina nas vias mesolímbica e mesocortical (POTTER & HOLLISTER, 2005). Os neurolépticos possuem a propriedade comum de bloquear os receptores da dopamina, particularmente os D2 (MIYAMOTO et al, 2002). Além dos receptores dopaminérgicos, outros sistemas como o histaminérgico (H1), o noradrenérgico (α1, α2) e o colinérgico (m1), são também alvos de bloqueio por essas drogas. Acredita-se que o bloqueio destes últimos tenha maior relação com os efeitos colaterais do que com o efeito terapêutico (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). O bloqueio dos receptores D2 pelos antipsicóticos é demosntrado na Figura 15. Figura 15 – Receptores dopamínicos e atividade dos antipsicóticos Fonte: http://gballone.sites.uol.com.br/cursos/farmaco4.html 65 O grau de bloqueio sobre os receptores varia consideravemente entre as drogas. A potência das drogas antipsicóticas típicas são classificadas como: baixa, intermediária e alta. Essa classificação é baseada na afinidade da doga para o receptor dopaminérgico D2 e a dose média terapêutica comparada com a dose de 100 mg da clorpromazina. Como exemplo, o haloperidol considerado um neuroléptico típico, protótipo de alta potência, tem relativamente alta afinidade para receptor D2 e as doses de 2 a 4 mg é equivalente a aproximadamente 100 mg da clorpromazina. Drogas de baixa potência (exemplo: Tioridazina) tem dose terapêutica maior que 40 mg equivalente para os efeitos de 100 mg da clorpromazina. O haloperidol atua predominantemente bloqueando receptores D2 (VASCONCELOS et al., 2003), mas é um antagonista dopaminérgico não seletivo e bloqueia também os receptores da serotonina (5-HT2), os receptores da noradrenalina (α1), enquanto que efeitos desprezíveis são observados nos receptores D1 (POTTER & HOLLISTER, 2005). Além dos receptores da serotoniana e D2, risperidona é um antipsicótico com propriedades antagônicas para receptores adrenérgicos (MIYAMOTO et al, 2002), e receptores H1, sendo praticamente destituída de efeitos anticolinérgicos (OLIVEIRA, 2002). Apesar da afinidade relativamente alta da risperidona para receptores α1 e α2, o potencial terapêutico dessa droga para bloquear os receptores adrenérgicos é incerto (MIYAMOTO et al, 2002). A afinidade do haloperidol e da risperidona, bem como outros neurolépticos, para os vários receptores é demonstrada na Tabela 1. Todas as substâncias antipsicóticas inicialmente aumentam e depois diminuem a atividade elétrica dos neurônios dopaminérgicos do mesencéfalo na substância negra e no tegumento ventral e também a liberação de dopamina em regiões contendo terminações dopaminérgicas (O,DONNELL & GRACE, 1996), embora o bloqueio do receptor seja imediato, os antipsicóticos, como muitas drogas neuroativas, levam várias semanas para produzirem efeito, (RANG et al, 2007). Segundo Gorenstein & Scavone (1999) a latência de duas a três semanas entre o início do tratamento, e a resposta terapêutica de psicofármacos, é considerada uma 66 evidência de que são necessárias alterações na função neural para se obter um efeito terapêutico. Um exemplo de alterações que ocorre ao nível de receptores dopaminérgicos com o uso crônico de neurolépticos é o fenômeno da up-regulation demonstrada por Vasconcelos et al. (2003) após o tratamento de ratos com haloperidol por trinta dias, na área do estriado, fenômeno esse que desapareceu após quinze dias de supensão da medicação. Adicionalmente, pesquisadores encontraram um alargamento no estriado após tratamento cônico com neurolépticos convencionais, mas não com neurolépticos atípicos tanto em pacientes esquizofrênicos (CORSON et al., 1999) quanto em ratos (CHAKOS, et al., 1998). Estes dados sugerem que antipsicóticos convencional pode induzir mudanças plásticas a longo prazo que leva a alterações morfológicas no estriado, e que podem estar relacionados com a eficácia, e alguns efeitos colaterais das drogas típicas (MIYAMOTO et al, 2002). Tabela 1 - Afinidade de drogas antipsicóticas risperidona e haloperidol, para os receptores de neurotransmissores humanos (Ki, nM)a Receptor Clozapina Risperidona Olanzapina Ziprazidona a Os valores são medias geométricas de no mínimo três determinações. b Bovino. Adaptado de Duncan e Lieberman, 1999 a Os valores são medias geométricas de no mínimo três determinações. b Bovino. Adaptado de Duncan e Lieberman, 1999 67 Quetiapina Haloperidol 1.1.5.5 Usos clínicos Como salientado anteriormente, o principal uso clínico dos neurolépticos é no tratamento da esquizofrenia. O haloperidol é também usado na coréia de Huntington e síndrome de Tourette (RANG et al., 2007). Outras indicações são distúrbios esquizoafetivos (possui algumas características da esquizofrenia), os distúrbios afetivos, incluindo nos episódios maníaco do distúrbio afetivo bipolar e no controle dos distúrbios comportamentais em pacientes com demência senil do tipo Alzheimer. Esses medicamentos também são usados, em pequenas doses, para alívio da ansiedade em distúrbios emocionais. Foi sugerida, para o haloperidol, uma faxa terapêutica de 2 a 20 ng/mL (POTTER & HOLLISTER, 2005). A risperidona é utilizada principalmente na esquizofrenia na dose inicial de 1mg duas vezes ao dia, aumentando-se até 3 mg duas vezes, embora dose ótima encontre-se entre 4 e 6 mg, (OLIVEIRA, 2002), podendo ser bem tolerada na doença de Alzheimer (POTTER & HOLLISTER, 2005). Alguns pacientes podem não responder a um determinado tratamento, sendo assim refratários ao tratamento instituído, as vezes, sendo necessário, tentar várias drogas para encontar a mais eficaz para determinado paciente. Esse fenômeno, pode ser devido aos diferentes perfis de ações das drogas sobre os receptores (POTTER & HOLLISTER, 2005). 1.1.5.6 Efeitos colaterais Os agentes antipsicóticos compartilham muitos efeitos farmacológicos, sendo a clorpromazina e o haloperidol comumente usados como protótipos (RANG et al., 2007). Apresentam elevado índice terapêutico, sendo bastante seguros. Os efeitos colaterais são devidos a gama de ações farmacológicas, como as descritas 68 anteriormente, sendo as mais importantes aquelas sobre o SNC e sistema locomotor, sobre o sistema cardiovascular e sitema nervoso autônomo, funções endócrinas, além de efeitos comportamentais. Os Principais efeitos colaterais dos antipsicóticos, de um modo geral, são: Efeitos sobre o SNC /atividade motora: A sedação (efeito de pequena intensidade no caso do haloperidol) (BALDESSARIN & TARAZI, 2007) é um efeito imediato e ocorre com muitos antipsicóticos, tendendo a diminuir com o uso continuado. A atividade antihistamínica (H1) contribui para as propriedades sedativas (RANG et al, 2007). A maioria dos neurolépticos consegue diminuir a atividade motora espontânea em todas as espécies de animais estudadas, incluindo o homem. Podem ocorrer efeitos extrapiramidais tais como: parkinsonismo (tremor), acatisia (necessidade compulsiva de estar em movimento, sem, contudo demonstrar comportamento agitado), discinesia tardia (movimentos involuntários, anormais e repetitivos localizados principalmente na região orofacial, tronco e membros), distonias agudas (espasmos musculares, língua protusa, torcicolo, etc), além da síndrome neuroléptica malígna (caracterizada por contração muscular e febre alta). A discinesia tardia é uma desordem, freqüentemente irreversível e pode desenvolver-se com a o uso crônico de neurolépticos (após meses ou anos), sendo o principal problema da terapia antipsicótica clássica (RANG et al., 2007). Em doses elevadas, produzem imobilidade cataléptica típica que permite que o paciente seja colocado em posturas anormais persistentes. Parece que o corpo estriado é a principal estrutura responsável pela catalepsia induzida por neurolépticos (HARTGRAVES & KELLY, 1984). A imobilidade cataléptica dos animais tratados com neurolépticos lembra a catatonia de alguns pacientes psicóticos (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). A catalepsia é um modelo laboratorial de neurolépticos para estudar parkinsonismos em humanos. Hoffman & Donovan (1995) mostraram que a 69 catalepsia é vista como um importante modelo para prognosticar efeitos extrapiramidais induzidos por neurolépticos. Efeitos sobre o sistema nervoso autônomo e cardiovascular: Os neurolépticos apresentam vários efeitos colaterais, como: hipotensão postural que resulta em parte do bloqueio de α-adrenoceptores e em parte de uma ação vasodilatadora direta (principalmente as fenotiazinas) (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). Podem ser encontradas alterações, tais como alta freqüência cardíaca em repouso. Pressão arterial média e volume sistólico diminuídos. Alterações eletrocardiográficas, entre outras (POTTER & HOLLISTER, 2005). Efeitos endócrinos: Provocam alterações sobre o sistema endócrino, entre elas a mais freqüente é o aumento da secreção da prolactina podendo o paciente apresentar ginecomastia, galactorréia e mamas dolorosas, que é causada pelo bloqueio do efeito inibitório tônico da dopamina sobre a liberação da prolactina pela hipófise (POTTER & HOLLISTER, 2005). Efeitos comportamentais: Nos animais e seres humanos os efeitos principais dos neurolépticas típicos são semelhantes. Em doses baixas, o comportamento exploratório diminui e as respostas a vários estímulos são menores, mais lentas e em menor número, embora seja conservada a capacidade de discriminar os estímulos. Outros efeitos comportamentais como “pseudodepressão”, que se deve a acinesia, podem ocorrer (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). 70 Outros Efeitos: Outros efeitos incluem: O bloqueio sobre os receptores muscarínicos produz visão turva e pressão ocular aumentada, boca e olhos secos, constipação e retenção urinária. Pode ocorrer ganho de peso, reações cutâneas (urticária) e reações idiosincrásicas: Icterícia (clorpromazina) e agranulocitose (mais comum com a clozapina) (RANG et al, 2007). Os efeitos indesejáveis relatados para o haloperidol, especificamente, são principalmente autonômicos (sedação, hipotensão postural, etc.), reações extrapiramidais (distonia aguda, parkinsonismo medicamentoso, acatisia, síndrome neuroléptica maligna e discinesia tardia) (JOHANN & VAZ, 2006), além de ser considerado o agente causal mais freqüente da síndrome neuroléptica maligna (HANEL et al., 1998). Os EEP reduzidos são associados com o tratamento da risperidona em baixas doses (4 a 6 mg por dia), até mesmo em níveis elevados de ocupação do receptor D2, podem ser devido às propriedades antagônicas da droga para o receptor 5-HT2A (MELTZER et al., 1989; GERLACH, 1991). Entretanto, em doses mais elevadas, a risperidona produz EEP, indicando que o antagonismo do receptor 5-HT2A sozinho não pode completamente eliminar EEP associados com o bloqueio elevado do receptor D2 (MIYAMOTO et al, 2002). De acordo com Oliveira (2002) outros efeitos colaterais comuns à risperidona são insônia, agitação, sedação tontura, rinite, hipotensão, ganhos de peso e distúrbios mentruais, podendo estar presente galactorréia. Há relatos de síndrome neuroléptica malígna (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). Comparado com os neurolépticos típicos, risperidona possui maior especificidade para o sistema mesolímbico do que para o dopaminérgico estriatal sendo essa propriedade relacionada a uma menor incidência de efeitos extrapiramidais. Acredita-se que a atividade no receptor 5HT2A da serotonina resulta em maior atividade contra sintomas negativos da esquizofrenia. Estudos por meio de metanálise 71 demonstraram que a risperidona é superior ao haloperidol quanto à eficácia sobre os sintomas negativos (MARDER et al., 1997). Atualmente, tem-se investido em pesquisas na tentativa de se decobrir novos compostos antipisicóticos atípicos mais seletivos para o sistema mesolímbico com a finalidade de reduzir seus efeitos sobre o sistema extrapiramidais (POTTER & HOLLISTER, 2005). 1.1.6 Cetamina 1.1.6.1 Definição, estrutura química e farmacocinética O cloridrato de cetamina, 2-(o-clorofenil)-2(metilamino)-cicloexanona, é quimicamente relacionada à fenciclidina. A cetamina foi sintetizada em 1963, sendo usada pela primeira vez em humanos, em 1965 possui peso molecular de 238 daltons e pKa de 7,5 Figura 16 - Estrutura Química da Cetamina (CORSSEN & DOMINO, 1966; COHEN & TREVOR, 1974; REICH & SILVAY, 1989). Na anestesia é utilizada atualmente na forma racêmica ((±)-cetamina) ou como isômero (+)-cetamina. A (+)-cetamina é considerada três a quatro vezes mais potente que o isômero (-)-cetamina para alívio da dor em doses equianalgésicas. A forma racêmica e a (-)-cetamina produz mais alterações psíquicas e agitação que a (+)-cetamina (MARIETTA et al., 1977; RYDER et al., 1978; WHITE et al., 1985; SCHUTTLER et al., 1992). A (+)-cetamina é duas vezes mais potente que a forma racêmica para prevenir a sensibilização central da medula espinhal (JAKSCH et al., 2002). 72 Cetamina é tipicamente administrada por via intravenosa, podendo ser administrada por via intramuscular, oral e retal. As doses de indução são as seguintes: 0,5 a 1,5 mg/kg (intavenosa), 6 mg/kg (intramuscular), 4 a 10 mg/kg (retal) (WHITE et al., 1982). Cetamina é altamente biodisponível após a injeção intravenosa ou intramuscular. Doses orais não são bem absorvida devido ao metabolismo de primeira passagem (TREVOR & WHITE, 2006). Uma vez que cetamina é um fármaco altamente lipofílico, e com fraca ligação às proteínas plasmáticas (10-30%) (GARCIA, 2007), essa substância apresenta rápida distribuição nos órgãos ricamente perfundidos incluindo o cérebro, com redistribuição subseqüente para os tecidos de menor perfusão (TREVOR & WHITE, 2006). O metabolismo da cetamina é feito pelas enzimas microssomais hepáticas através de Ndesmetilação, formando norcetamina (um metabólito ativo). Esta, por sua vez, é hidroxilada a hidroxinorcetamina. Esses produtos são conjugados a derivados glicuronídeos hidrossolúveis e excretados na urina (WHITE et al., 1982: CORSSEN et al., 1988). É metabolizada também pelos rins, intestinos e pulmões. Seu clearance de eliminação é alto (1000 a 1600 mL.min.-1), o que corresponde a uma meia-vida de eliminação curta de 2 a 3 horas (GARCIA, 2007). Muito utilizada a via de administração intramuscular devido a concentração plasmática terapêutica ser alcançada mais rapidamente. Após a administração venosa de cetamina, o efeito máximo ocorre em 30 a 60 segundos e a meia-vida de distribuição é relativamente curta (11 a 16 minutos) (CLEMENTS & NIMMO, 1981). 1.1.6.2 Mecanismo de ação Da mesma forma que a fenciclidina a cetamina interage com o canal do Nmetil-D-aspartato (NMDA) (KRYSTAL et al., 1994), nessa interação com o canal, a droga se liga de forma não competitiva ao receptor da PCP e inibe a ativação do canal do glutamato (JAVITT & ZUKIN, 1991) Segundo Smith (1981) e Eide (1998), quanto 73 menor a dose da cetamina maior sua afinidade pelos receptores NMDA. A S(+) cetamina tem maior afinidade por esses receptores que a forma racêmica (LIU et al., 2006). Imaginava-se antigamente que os efeitos analgésicos promovidos pela cetamina fossem mediados por sua interação com receptores opióides, no entanto o uso de doses subanestésicas (EIDE et al., 1998) e a não reversão da analgesia por naloxona, um antagonista opióide (MIKKELSEN et al., 1999), descartou essa hipótese. Diferente do receptor NMDA encefálico, na medula espinhal, há dois pontos de ligação para a cetamina: um dentro do canal do receptor (que irá diminuir o tempo de abertura do canal) e outro na porção hidrofóbica do receptor (que irá diminuir a freqüência de abertura do canal). Quando usada em pequena dose (exemplo 1 mg.kg-1 em bolus por via venosa) a cetamina inibe de forma competitiva e não-competitiva os canais iônicos dos receptores NMDA (N-metil-D-aspartato) da membrana póssináptica dos neurônios do corno dorsal da medula espinhal. (SCHMID et al., 1999; FISHER et al., 2000; DICKENSON, 1995; ORSER 1997) bloqueando assim os efeitos excitatórios do neurotransmissor glutamato (TREVOR & WHITE, 2006). Além dos receptores NMDA, o principal sítio de ação terapêutica da cetamina, foi encontrado que essa droga age também sobre uma variedade de receptores, incluindo nicotínicos (SCHELLER et al., 1996), muscarínicos (HUSTVEIT et al., 1995), opióides µ, d e k (HUSTVEIT et al., 1995; SMITH et al., 1980; FINCK & NGAI, 1982) e altera os canais de sódio do sistema nervoso central e periférico (SCHELLER et al., 1996), os canais monoaminérgicos e os de cálcio voltagemdependentes (HIROTA & LAMBERT, 1996). 1.1.6.3 Uso clínico Cetamina é utilizada com finalidade anestésica, sendo descrita na literatura como anestésico dissociativo, devido a uma grande perda sensorial e analgesia, além 74 de amnésia e paralisia do movimento, sem perda real da consciência (SU et al., 2007; MORGAN et al., 2004). Usada em diversos procedimentos cirúrgicos, mas principalmente em procedimentos cirúrgicos traumatológicos em humanos e na clínica veterinária para induzir sedação em animais para cirurgias e eutanásia (WAGNER et al., 2002). A principal desvantagem da cetamina é a presença de delírios e comportamentos irracionais durante a recuperação (BARASHI et al, 1991), sendo por esse motivo que atualmente o seu uso clínico tem sido reduzido (FISHER et al.,2000). É utilizada com maior freqüência nas cirurgias pediáticas, tendo em vista que as reações psicomiméticas ocorrem com menor intensidade e freqüência que nos adultos (SUSSMAN et al., 1974). O uso do diazepan ou midazolan por via intravenosa antes da cetamina diminui a incidência desses efeitos (TREVOR & WHITE, 2006). Devido as suas propriedades psicoativas, cetamina tem sido utilizada como droga de abuso, conhecida entre outros nomes por Special-K. Os efeitos da droga ocorrem 30 a 45 min após a ingestão ou inalação da droga. Os usuários relatam experiências de saída ou flutuação do corpo, alucinações visuais e incoordenação motora entre outros. Muitos países incluem cetamina em suas legislações como substância controlada (SMITH et al, 2002). 1.1.6.4 Efeitos adversos Interação da cetamina com os diversos receptores, como visto anteriormente, produz alterações em diversos sistemas. Em relação ao sistema cardiovascular a droga causa estimulação cardiovascular através da excitação do sistema nervoso simpático central e, possivelmente inibição da recaptação da noradrenalina nas terminações nervosas simpáticas, aumentando a freqüência cardíaca, pressão arterial e débito cardíaco. Aumentos máximos dessa variação ocorrem de 2 a 4 minutos após injeção intravenosa (TREVOR & WHITE, 2006). 75 Devido as suas propriedades broncodilatadora e simpaticomimética, a cetamina tem papel importante na anestesia. Apresenta efeito mínimo sobre o sistema respiratório e raramente ocorre apnéia, após doses anestésicas de cetamina (2 mg.kg-1 por via venosa) (RAEDER & STENSETH, 2000). Na maioria dos pacientes, cetamina diminui a freqüência respiratória, entretanto o tônus muscular das vias aéreas superiores são bem mantidos e os reflexos das vias aéreas são geralmente preservados (TREVOR & WHITE, 2006). Entre outros efeitos adversos, cetamina aumenta acentuadamente o fluxo sangüíneo cerebral, consumo de oxigênio e a pressão intracraniana, sendo o seu uso perigoso em pacientes cuja pressão intracraniana está elevada (TREVOR & WHITE, 2006). Os efeitos psicológicos indesejáveis da cetamina lembram os da fenciclidina, ocorrendo principalmente no período pós-operatório, chamadas de reações emergenciais. Os mais comuns são: pesadelos, experiências extracorpóreas (sensação de flutuar fora do corpo) e ilusões. É descrito na literatura que a incidência desses efeitos varia de 5% a mais de 30% após doses utilizadas comumente utilizadas para indução anestésica. Alguns dos fatores que estão associados a essas alterações são a idade e o sexo. O efeito dissociativo produz nos pacientes um estado cataléptico, permanecendo com os olhos abertos e mantendo muitos reflexos (RAEDER & STENSETH, 2000). 1.1.5.5 Cetamina no modelo de esquizofrenia. Conforme visto anteriormente, diversas pesquisas têm utilizado PCP e MK 801 como modelo para estudar a esquizofrenia. Mais recentemente, estudos têm utilizado a cetamina como modelo para investigar aspectos dessa síndrome devido aos seguintes aspectos: (1) as diversas similaridades, em relação às alterações comportamentais, apresentadas na recuperação anestésica da cetamina com as exercidas pela PCP; (2) A cetamina induz sintomas psicóticos com doses subanestésica, que lembram os sintomas da esquizofrenia (BECKER et al., 2003). 76 Estudo realizado por Krystal et al, (1994) demonstrou efeitos similares aos sintomas positivos e negativos da esquizofrenia, utilizando cetamina em doses subanestésicas (0,1 ou 0,5 mg/Kg) em indivíduos saudáveis. Os efeitos comportamentais nos seres humanos saudáveis que imitam sintomas esquizofrênicos positivos, negativos e cognitivos foram também descrito por Lahti et al., (2001) e Malhotra et al., (1996). Pacientes com esquizofrenia usando cetamina apresentaram sintomas similares àqueles experimentado durante a fase ativa de sua doença (LAHTI et al., 1995; MALHOTRA et al., 1997b). Em roedores, doses subanestésicas de cetamina produzem diversas anormalidades comportamentais, entre as quais o aumento da atividade locomotora (JENTSCH & ROTH, 1999). Devido a esse efeito e tendo em vista a atividade locomotora está associada com a função límbico-estriatal, indução da hiperlocomoção pode estar indiretamente ligada à esquizofrenia, já que o aumento da atividade locomotora na esquizofrenia é geralmente associado com anormalidades límbicas (IMRE et al., 2006). Outra evidência da similaridade das alterações produzidas pelo uso da cetamina com as encontrada na patologia esquizofrênica foi demonstração de que doses subanestésicas repetidas induziu mudanças sutis na distribuição celular de proteínas sensoras de cálcio que, em parte, lembraram àquelas descritas em cérebro pós-mortem de pacientes esquizofrênicos (BERNSTEIN et al., 2003). Para o modelo glutamatérgico, a cetamina possui algumas vantagens em relação à PCP. Esta droga difere no potencial de neurotoxicidade em comparação à cetamina (OLNEY et al., 1989) e produz um forte bloqueio não competitivo dos canais de cálcio associados ao NMDA, enquanto cetamina é um bloquedor mais fraco desse canal. Tendo em vista que são requeridas doses subanestésicas da cetamina para induzir os sintomas da esquizofrenia, sugere-se que a ação da cetamina predomina sobre o receptor NMDA, ao invez de outros sistemas (DUNCAN et al., 1999). Contrariamente, uma vez que PCP requer uma maior dose para produzir o mesmo efeito que a Ceta, terá também maior interação com outros sistemas de neurotransmissores tais como dopamina, acetilcolina e GABA (BECKER et al., 2003). 77 1.1.7 Importância do estudo A esquizofrenia é caracterizada como um transtorno que tem grave deteriorização funcional (WALLACE E LIBERMAN, 1985; RABINOWITZ et al., 2007), Esta tem como causa principal o comprometimento cognitivo. Este promove déficits neuropsicológicos na atenção, na memória de trabalho, na aprendizagem verbal e na solução de problemas (SÁ JUNIOR & SOUZA, 2007). Tais déficits têm se refletido, como prejuízo, no comportamento social, na performance no trabalho e nas atividades da vida diária do indivíduo com esquizofrenia (MATZA et al., 2006). Os avanços farmacológicos no tratamento da esquizofrenia têm contribuído, efetivamente, no controle dos sintomas psicóticos, ocasionando, conseqüentemente, um melhor resultado clínico. Os atuais antipsicóticos apresentam melhores resultados em sintomas positivos, o que não acontece com os negativos. A presença destes sintomas negativos está relacionada a um maior comprometimento do funcionamento social e pessoal. Intervenções, que levem a uma melhora no desempenho social, como medidas comportamentais de reabilitação, ou novas medicações com maior eficácia para os sintomas negativos, devem ser consideradas como metas no tratamento de pacientes com esquizofrenia (SÁ JUNIOR & SOUZA, 2007). Os neurolépticos são drogas de uso bastante difundido para o tratamento de distúrbios psiquiátricos, mais especificamente a esquizofrenia. Pacientes que fazem uso destas, o fazem de forma crônica, o que acarreta efeitos colaterais indesejáveis, tais como: efeitos sobre a atividade locomotora, algumas vezes demonstrando acatisia, síndrome parkinsoniana, síndrome neuroléptica maligna, entre outros (BALDESSARIN & TARAZI, 2007). Partindo deste pressuposto, ao se tratar uma patologia como a esquizofrenia, com este tipo de droga, normalmente adquirem-se outras doenças, como é o caso da síndrome parkinsoniana. A esquizofrenia tem com freqüência um curso crônico e geralmente incapacitante, pois afeta pessoas jovens no auge do seu processo produtivo. Além 78 disso, os efeitos adversos dos medicamentos contribuem para não aderência ao tratamento e aumento nas taxas de recidiva dos sintomas e re-hospitalizações durante o curso da doênça (FLEISCHHACKER, 1995; BARNES & MCPHILLIPS, 1999). O suicídio que pode ocorrer em até dez por cento dos casos é outro fator complicador (RANG et al, 2007). Considerando que a neuropatologia e psicopatologia da esquizofrenia são ainda pouco compreendidas (BECKER et al., 2003). Pode-se concluir que pesquisas nessa área são de fundamental importância, o que poderá traduzir, no futuro, em possibilidade de cura e/ou uma melhor qualidade de vida para os pacientes com indicação de submeter-se a terapia neuroléptica A investigação dos efeitos dos neurolépticos no modelo NMDA é importante para compreender a fisiopatologia da esquizofrenia, bem como para o entendimento do mecanismo de ação dessas drogas. Portanto, um estudo mais detalhado dos eventos comportamentais induzidos por estas drogas se faz necessário. Para os testes foi utilizada uma droga típica (haloperidol) e outra atípica (risperidona). Neste trabalho foi proposto o estudo da atividade locomotora, que é prejudicada com o uso dos neurolépticos, No teste de labirinto e placa furada procurou-se saber como estas drogas interferem com a ansiedade dos animais. No teste de interação social, por sua vez, avaliou-se os efeitos das drogas sobre o comportamento social do animal. O estudo das alterações comportamentais induzidas pelos neurolépticos é importante, pois pouco se sabe sobre a fisiopatologia da esquizofrenia, o que dificulta o tratamento e o desenvolvimento de drogas mais eficazes na terapêutica esquizofrênica. Outro ponto relevante é que a descoberta dos verdadeiros mecanismos (visto que não estão totalmente elucidados), pelos quais essas drogas causam efeitos colaterais comportamentais, permitirá o desenvolvimento de drogas possivelmente mais seletivas, para seus alvos receptores, com menores efeitos indesejados. Vasconcelos et al. (2005) relata sobre a importância do uso de modelos animais com a finalidade de compreender os mecanismos da esquizofrenia e conseqüentemente o possível desenvolvimento de novas drogas para o tratamento deste transtorno. Como visto, pesquisas têm apontados para uma disfunção na integração entre sistemas de 79 neurotransmissores. Para compreender a interação entre os sistemas dopaminérgicos e glutamatérgicos, e seu possível envolvimento na fisiopatologia dessa síndrome, no presente trabalho, nós analisamos os efeitos da risperidona e do haloperidol em um modelo comportamental induzido pela cetamina em camundongos. 80 OBJETIVO GERAL 81 2 OBJETIVO GERAL Estudar os efeitos de neurolépticos típico (haloperidol) e atípico (risperidona), nas alterações comportamentais induzidos pela Cetamina (modelo de esquizofrenia), bem como avaliar a interação entre os sistemas de neurotransmissores dopaminérgicos e glutamatérgicos e as suas relações com a esquizofrenia. 82 MATERIAIS E MÉTODOS 83 3 MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 Animais Foram utilizados camundongos Swiss machos com peso entre e 25-30g. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética para o uso de animais da Universidade Estadual da Ceará (UECE), protocolo nº 07465201-0. 3.2 Tratamento dos animais Os animais foram tratados com os neurolépticos haloperidol (0,1 e 0,2 mg/Kg i.p), ou risperidona (0,1 e 0,2 mg/Kg i.p). Ambas as drogas foram administradas sozinhas ou após pré-tratamento com cetamina 10 mg/kg (i.p). No pré-tratamento os neurolépticos foram administrados 30 minutos antes da aplicação da cetamina. Imediatamente após a administração da cetamina ou água, os testes foram realizados. O Quadro 2 mostra o esquema de tratamento utilizado no estudo. As drogas foram preparadas a partir de comprimidos (risperidona) ou ampolas (haloperidol e cetamina) adquiridos em farmácia local. Os controles receberam uma quantidade equivalente de água destilada (ip). Os animais foram mantidos a uma temperatura (± 26º C), com ciclo claro / escuro de 12 horas, com água e comida livres. 84 Quadro 2 – Tratamento agudo com cetamina Drogas testes ou Àgua Haloperidol (o,1 ou 0,2 mg/Kg) Risperidona (0,1 ou 0,2 mg/Kg) 30 min. Cetamina (10 mg) ou Água Imediatamente Testes Comportamentais (Campo aberto, Catalepsia, Rota rod, suspensão da cauda), ou ( Interação social, Placa furada, Labirinto cruz elevado) 3.3 Testes comportamentais Para minimizar o estresse do animal, para todos os testes, os camundongos foram pesados uma hora antes do experimento. Os animais foram divididos em dois grupos, sendo que cada grupo foi submetido a diferentes baterias de testes. O grupo um foi submetido aos testes do campo aberto, catalepsia, rota rod e suspensão da cauda, nesta ordem. O grupo dois foi submetido aos testes de interação social seguido pelo teste da placa furada e posteriormente o do labirinto cruz elevado. Para a escolha da dose da cetamina que reproduzia o modelo de psicose foram realizados os seguintes testes preliminares: campo aberto, catalepsia, rota rod e 85 suspensão da calda com grupos de dez animais utilizando cetamina nas doses de 5, 10, 15 e 20 mg. 3.3.1 Campo aberto - Avaliação da atividade locomotora; Grooming, Rearing, Estereotipias; Andar em círculos e Ataxia. Ao colocar o animal em um novo ambiente, a tendência dele é explorá-lo apesar do estresse provocado pelo novo. (MONTGOMERY, 1955). Para avaliar essa atividade exploratória o teste foi realizado em uma sala atenuada de sons, e com pouca luminosidade. Os camudongos foram colocados em um campo aberto, com área de 30 x 30 X 15 cm que foi feito de acrílico com paredes transparentes e fundo preto, dividida em nove quadrados de áreas iguais. Os animais foram previamente habituados durante um minuto nesse aparelho e, logo em seguida iniciado o teste. O observador colocou individualmente cada animal nesse campo e registrou o número de travessias de um quadrante para outro, número de auto-limpeza (grooming) e atividade vertical (rearing) durante 3 minutos. Estudos mostram que alterações nestes parâmetros têm correlação com a ansiedade do homem (MASUR, 1972). Este teste também vem sendo muito utilizado para avaliação da atividade locomotora em modelos de esquizofrenia (JENTSCH & ROTH, 1999; IMRE et. al., 2006). Outros parâmetros avaliados no aparelho do campo aberto foram alterações comportamentais tais como comportamento esteriotipado (comportamento incomum como balanço da cabeça de um lado para outro, andar para trás rapidamente; perseverações que inclui movimentos repetidos e exagerados), andar em círculo e ataxia (incoordenação motora). Esteriotipia é um parâmetro comportamental que tem sido avaliado em modelos experimentais de esquizofrenia (SALGADO et al., 2006). 3.3.2 Catalepsia 86 O teste fundamenta-se no fato de que alguns roedores, incluindo camudongos, quando sob efeito de uma droga neuroléptica, apresentam intensa rigidez muscular. Dessa forma quando são colocados com suas patas dianteiras apoiadas em uma barra horizontal, permanecem nessa posição por período significativo. Os animais foram colocados em uma barra horizontal com 0,5 cm de diâmetro e cinco cm de altura onde foram habituados por sessenta segundos com suas patas dianteiras na barra e, então se registrou o tempo que o animal passou nesta posição (máximo 180s). Foram realizadas no máximo até três tentativas, quando o animal caia da barra (CARLINI , 1973; PIRES et al., 1998). 3.3.3 Rota rod A coordenação motora é um parâmetro importante na investigação dos efeitos gerais de uma droga especialmente das depressoras. O teste da barra giratória foi proposto por Dunham & Miya, 1957. Avalia o efeito de relaxamento muscular ou de incoordenação motora produzido por uma droga. O animal foi colocado com as quatro patas sobre uma barra giratória de 2,5 cm de diâmetro, elevada a 25 cm do piso, com 12 rotações por minuto (RPM), onde foram registrados: o nº de quedas (NQ) e o tempo de permanência (TP) na barra. O teste foi realizado por período máximo de um minuto sendo o animal recolocado após a queda por até três tentativas. Foram realizada uma seleção de treinamentos prévios, evitando assim o uso de animais incapazes de permanecer sobre a barra giratória. (CARLINI & BURGOS, 1979) 3.3.4 Suspensão da cauda 87 Descrito por Porsolt et al. (1987) este teste é utilizado na avaliação de drogas antidepressivas. O modelo baseia-se no fato de que camundongos suspensos pela cauda demonstram um padrão temporal de movimentação para fugir, seguido de imobilidade. Uma diminuição no tempo de imobilidade em relação ao grupo controle sugere ação antidepressiva. Para o teste os animais foram suspensos 58 cm acima de uma mesa com um esparadrapo fixado cerca de um cm na ponta da cauda, sendo a duração da imobilidade registrada por no máximo cinco minutos. 3.3.5 Teste de interação social O modelo foi adaptado de File (1993) que postulou inicialmente como modelo de ansiedade. Hoje sendo muito utilizado para avaliação de drogas neurolépticas, como modelo de sintomatologia negativa da esquizofrenia (RUNG et al., 2005). O teste foi realizado numa caixa aberta (100X100X40 cm) com altura de 25 cm. Os animais foram observados aos pares, e foi medido com auxílio de um cronômetro, o tempo de interação social ativa tais como: seguir, cheirar, limpar um ao outro, subir em cima do outro, durante um período de 10 minutos. Para o teste os camundongos não se conheciam previamente. Foi realizada, uma hora antes do teste, uma habituação durante cinco minutos, para que os animais pudessem se familiarizar com a arena. A habituação foi realizada com pares de animais que estavam anteriormente na mesma gaiola. 3.3.6 Placa furada Colocar os animais em ambientes estranho gera alterações comportamentais acompanhadas de desvios fisiológicos (BLANCHARD et al., 1993). Esse teste reproduz nos animais um estado semelhante à ansiedade no homem medida através de 88 sinais como a atividade exploratória (LEITE & SIQUEIRA, 2006). O aparelho consiste de uma caixa quadrada (50 X50 X 50 cm), confeccionada com acrílico transparente com 16 orifícios de dois centímetros de diâmetro eqüidistantes uns dos outros e das bordas. Trinta minutos após o tratamento o animal foi colocado na região central permitindo que o animal explorasse livremente o aparelho por 5 minutos. Foram contados o número de mergulho e o tempo de mergulho realizado por cada animal nesse período. 3.3.7 Labirinto cruz elevado O labirinto em cruz elevado (LCE) (Lister, 1987) consiste de dois braços abertos opostos (30 x 5 x 25 cm) e dois fechados (30 x 5 x 25 cm), também opostos, em forma de cruz. Os braços abertos e fechados estão conectados por uma plataforma central (5 x 5 cm). O aparelho foi confeccionado em acrílico transparente e o chão em acrílico preto, e possui uma altura de 45 cm do nível do chão. Após o tratamento com as drogas ou água, os animais foram colocados no centro do aparelho com a cabeça voltada para um dos braços fechados e o seu comportamento observado por 5 min. As medidas comportamentais registradas no LCE foram: freqüência de entradas e o tempo despendido nos braços abertos e nos fechados. A freqüência total de entradas foi obtida pela soma simples das freqüências de entradas nos braços abertos e nos fechados. Um aumento seletivo nos parâmetros correspondentes aos braços abertos revela um efeito ansiolítico (PELOW et al. 1985), entre outros achados. Neste teste, cuidados foram realizados para evitar a queda do animal ao chão, ficando o observador próximo do animal durante o teste. 89 3.3.8 Análise Estatística Todas as análises foram realizadas usando one-way análise de variância (ANOVA) em um programa de computador Prisma, versão 3.0. Quando os resultados foram significantes, múltiplas comparações foram feitas usando teste Tukey como o teste post hoct. Os resultados foram considerados significantes no p < 0,05, e apresentados como mean + E.P.M. 90 RESULTADOS 91 4 RESULTADOS Os valores encontrados, quando da utilização de cetamina para escolha da dose a ser utilizada no modelo experimental de psicose, foram demostrados em uma curva dose resposta na Tabela 2. A dose de 10 mg foi escolhida devido a um aumento da atividade locomotora em relação ao controle que foi significantivo. 4.1 Avaliação da atividade locomotora Os animais tratados com cetamina (10 mg/Kg, i.p.) apresentaram um aumento na ALE (63,3 ± 4,2) quando comparado ao grupo controle (25,5 ± 4,2). Por outro lado, os animais que receberam neurolépticos apresentaram efeito oposto, com uma diminuição deste comportamento. Neste trabalho, a hipermotilidade induzida pela Ceta foi diminuída significativamente pelo pré-tratamento com neurolépticos [Hal 0,1 + Ceta: 5,9 ± 2,8; Halo 0,2 + Ceta: 2,2 ± 0,8; Risp 0,1 + Ceta: 29,9 ± 6,3; Risp 0,2 + Ceta: 2,2 ± 0,8]. Entretanto, os animais que receberam Ceta e foram pré-tratratados com risperidona 0,1 mg apresentaram uma redução na motilidade semelhante ao grupo controle [ F(9,105) = 39,09; p < 0,0001)], como mostrado na Figura 17. 92 Tabela 2 - Curva dose resposta da Cetamina - Resultados dos testes comportamentais com camundongos, realizados preliminarmente, para definir dose da cetamina a ser utilizada nos experimentos posteriores. Para a realização dos testes, foi seguido o mesmo protocolo utilizado na metodologia. Suspensão da cauda * * * * * * * * Os valores estão representados como média ± EPM do número de animais em parênteses. * = P < 0,05 quando comparado ao controle. (ANOVA e Tukey post hoc). 93 Figura 17 - Efeitos das drogas no teste do campo aberto em camundongos. A haloperidol sozinho e em associação com Ceta. B - Risperidona sozinha e em prétratamento com Ceta. A figura mostra a atividade locomotora (número de travessias), contadas em três minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n = 10 a 14). a and b (p<0.05) quando comparado ao controle ou Cetamina, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. A Figura 18 mostrou que o grupo que recebeu Ceta (1,1 ± 0,7), assim como, os grupos que receberam neurolépticos (Hal 0,1: 5,1 ± 1,4; Hal 0,2: 0,7 ± 0,2; Risp 0,1: 0,7 ± 0,4; Risp 0,2: 1,6 ± 0,6) diminuíram o número de rearing em comparação com o grupo controle (13,45 ± 1,6) [ F(9,106) = 30,69; p < 0,0001]. Um efeito similar foi observado no pré-tratamento (Hal + Ceta ou Risp + Ceta). Na Figura 19 observa-se que todas as drogas diminuíram o número de grooming em comparação ao controle (3,3 ± 0,3), exceto o haloperidol (2,3 ± 0,4) na menor dose [F(9, 107) = 19,26; p < 0,0001]. A Nº atividade vertical 20 Controle Ceta 10mg Halo0,1 Halo 0,1+Ceta10 Halo0,2 Halo 0,2+Ceta10 10 a,b a a,c a,c a 0 B Nº Atividade vertical 20 Controle Ceta 10mg Risp 0,1 Risp 0,1+Ceta10 Risp0,2 Risp 0,2+Ceta10 10 a 0 a a a a Figura 18 - Efeitos das drogas na atividade locomotora vertical (rearing) em camundongos. A - haloperidol sozinho e em associação com Ceta. B - Risperidona sozinha e em pré-tratamento com Ceta. A figura mostra o número de rearing, contados em três minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n = 10 a 14). a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. A n° de auto limpeza 4 3 Controle Ceta 10mg Halo 0,1 Halo 0,1+Ceta10 Halo 0,2 Halo 0,2+Ceta10 b 2 a,c 1 a,c a a 0 B n° de auto limpeza 4 Controle Ceta 10mg Risp 0,1 Risp 0,1+Ceta10 Risp 0,2 Risp 0,2+Ceta10 3 2 a a 1 a a a 0 Figura 19 - Efeitos das drogas na atividade de autolimpeza (grooming) em camundongos. A - haloperidol sozinho e em associação com Ceta. B - Risperidona sozinha e em pré-tratamento com Ceta. A figura mostra o número de grooming, contados em três minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n = 10 a 14). a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. Ainda no Campo aberto foram avaliados os efeitos da Cetamina no comportamento estereotipado (Ceta: 2,7 ± 0,6, F(9,99) = 9,299, p < 0,0001) (Figura 20A), no comportamento de andar em círculo (Ceta: 3 ± 0,6. F(9,99) = 12,54, p < 0,0001) (Figura 20B), bem como ataxia (Ceta: 3,1 ± 1 F(9,99) = 9.045, p < 0,0001) (Figura 20C). Tais efeitos não foram apresentados pelo grupo controle (0,0 ± 0,0). Risp na dose 0,1 mg/Kg mostrou uma reversão da atividade esteriotipada (Risp 0,1 + Ceta: 0,2 ± 0,2) (Figura 21A) e ataxia (Risp 0,1 + Ceta: 0,3 ± 0,2) quando comparada o grupo da ceta sozinha (Figura 21C), porém não reverteu o comportamento de andar em círculo (Figura 21B). A atividade esteriotipada/ 3min 5 4 Controle Ceta 10 Halo 0,1 Halo 0,1+Ceta Halo 0,2 Halo 0,2 + Ceta a 3 2 1 b b 0 b b Andar em círculos/ 3min B 5 4 Controle Ceta10 Halo 0,1 Halo 0,1+ Ceta Halo 0,2 Halo 0,2 + Ceta a 3 2 b 1 b b b 0 Total de ataxia / 3min. C 5 4 Controle Ceta10 Halo 0,1 Halo 0,1+Ceta Halo 0,2 Halo 0,2 + Ceta a 3 2 1 b b 0 b b Figura 20 - Efeitos comportamentais da Ceta e do haloperidol nos camundongos: (A) atividade esteriotipada (B) andar em círculos, e (C) ataxia nos camundongos. A figura representa número de vezes que os animais demonstraram o comportamento no aparelho do teste do campo aberto por três min. Os resultados são apresentados com a média + EPM. n = 10. a and b (p<0.05) quando comparado ao controle ou Cetamina, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. A atividade esteriotipada/ 3min 5 4 Controle Ceta 10 Risp 0,1 Risp 0,1 + Ceta Risp 0,2 Risp 0,2 + Ceta a 3 a,e 2 1 b 0 b b B Andar em círculos / 3min 5 4 Controle Ceta10 Risp 0,1 Risp 0,1 + Ceta Risp 0,2 Risp 0,2 + Ceta a,c a 3 2 1 b b 0 b,d C Total score of ataxia/3min. 5 Controle Ceta10 Risp 0,1 Risp 0,1 + Ceta Risp 0,2 Risp 0,2 + Ceta a 4 3 2 1 b b 0 b b Figura 21 - Efeitos comportamentais da Ceta e da risperidona nos camundongos: (A) atividade esteriotipada (B) andar em círculos, e (C) ataxia nos camundongos. A figura representa o número de vezes que os animais que demonstraram o comportamento no aparelho do teste do campo aberto por três minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. n = 10. a, b, c, d e e (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta, Risp 0,1, Risp 0,1 + Ceta e Risp 0,2 respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. 4.2 Catalepsia Como podemos observar na Figura 22, no grupo que recebeu haloperidol na dose 0,1 mg/Kg e o da cetamina, o efeito da catalepsia não foi significativamente diferente do controle, porém o grupo do haloperidol 0,2 mg/dl foi significativamente diferente, quando comparado ao controle. Os animais que fizeram uso de risperidona em ambas as doses, não apresentaram catalepsia. atividade cataléptica (s) A 100 a 75 50 25 0 Controle Ceta 10mg Halo 0,1 Halo 0,1 +Ceta10 Halo0,2 Halo 0,2+Ceta10 atividade cataléptica (s) B 5 4 3 2 Controle Ceta 10mg Risp 0,1 Risp 0,1+Ceta10 Risp 0,2 Risp 0,2+Ceta10 1 0 Figura 22 – Atividade de catalepsia induzida por drogas em camundongos. A figura mostra o tempo que o animal permaneceu na barra, sem expressar movimento, contado após um minuto de habituação. (A) O grupo do haloperidol 0,2 mg apresentou catalepsia significativa em relação ao controle. (B) Os grupos que receberam Risperidona não apresentaram catalepsia. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n = 10 a 14). a (p<0.05) quando comparado ao controle. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. 4.3 Rota rod No teste Rota Rod (Figura 23) Ceta (15,06 ± 4,1) diminuiu significativamente o tempo de permanência dos animais na barra em comparação ao controle (59,01 ± 0,6). Os neurolépticos sozinhos não foram diferentes do controle. Entretanto, no grupo dos animais que receberam Ceta e foram pré-tratados com haloperidol na dose 0,2 mg (Hal 0,2 + Ket: 41 ± 5,5) ou risperidona na dose 0,1 mg (Risp 0,1 + Ceta: 42,8 ± 6,3) houve um aumento no tempo de permanência na barra em comparação ao grupo da Ceta sozinha [ F(9,110) = 9.101; p < 0,0001]. Cetamina (2,9 ± 0,1) aumentou o número de quedas (Figura 24) dos animais quando comparados com o grupo controle (0,14 ± 0,01), este efeito não foi modificado no pré-tratamento com neurolépticos [F(9,120) = 12,15; p < 0,0001]. Figura 23 – Efeitos das drogas na coordenação motora (tempo de permanência na barra) dos camundongos no teste do Rota Rod (n= 10 a 14 por grupo). A - Halo sozinho e em pré-tratamento com Ceta. B - Risp sozinha e em pré-tratamento com Ceta. Os resultados são apresentados com a média + EPM. a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. . Figura 24 – Efeitos das drogas na coordenação motora (número de quedas) dos camundongos no teste do Rota Rod (n= 10 a 14 por grupo). A - Halo sozinho e em pré-tratamento com Ceta. B - Risp sozinha e em associação com Ceta. Os resultados são apresentados com a média + EPM. a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. 4.4 Suspensão da cauda No Teste de Suspensão da Cauda (Figura 25), o grupo da Ceta (17.3 ± 5.6) diminuiu significativamente o tempo de imobilidade dos camundongos, quando comparado ao grupo controle (80.2 ± 10.2). Contudo, o pré-tratamento com neurolépticos, em ambas as doses, bloqueou o efeito da Ceta. Haloperidol na maior dose (Hal 0.2: 176.1 ± 8) assim com risperidona em ambas as doses (Risp 0.1: 189.7 ± 19); Risp 0.2: (175.2 ± 12) aumentaram significativamente o tempo de imobilidade quando comparados ao grupo controle [F(9,123) = 19.96; p < 0001]. Tempo de imobilidade (s) A 300 a,b,c 200 a,b,c 100 a,b Controle Ceta 10mg Hal 0.1 Hal 0.1 + Ceta Hal 0.2 Hal 0.2 + Ceta a,b Controle Ceta 10mg Risp 0.1 Risp 0.1 +Ceta Risp 0.2 Risp 0.2 +Ceta b a 0 Tempo de imobilidade (s) B 300 a,b a,b 200 b,c 100 a 0 Figura 25 - Os efeitos das drogas no teste de suspensão da cauda em camundongos. A - Haloperidol sozinho e em associação com Ceta. B - Risperidone sozinho e em prétratamento com Ceta. A figura mostra o tempo de imobilidade em cinco minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n=10 a 14). a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1 (em A) ou Risp 0,1(em B) respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. 4.5 Teste de interação social No teste de interação social (TIS) (Figura 26) o grupo de animais que receberam Ceta (16,8 ± 2,8), assim como o grupo dos que receberam neurolépticos (Hal 0,1: 28,3 ± 3,6; Hal 0,2: 15,2 ± 3,5; Risp 0,1: 12,7 ± 2,9; Risp 0,2: 8 ± 2,5), diminuíram o TIS comparado com o grupo controle (46,6 ± 6,5). O pré-tratamento com neurolépticos não reverteu os efeitos da Ceta sozinha [F(9,92)= 15.52; p< 0.0001]. Tempo Interação social ativa (s) A 75 Controle Ceta 10 Halo 0,1 Halo 0,1 +Ceta10 Halo 0,2 Halo 0,2+Ceta10 50 a 25 a a a a 0 Tempo Interação social ativa (s) B 75 Controle Ceta 10 Risp 0,1 Risp 0,1+Ceta10 Risp 0,2 Risp 0,2+Ceta10 50 25 a a a a a 0 Figura 26 – Efeitos das drogas no teste de interação social em camundongos. A Haloperidol sozinho ou em associação com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em pré-tratamento com cetamina. A figura mostra o tempo de interação social ativa entre os pares de camundongos por 10 min. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n=10 pares). a (p<0.05) quando comparado ao controle. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. 4.6 Placa furada Na placa furada (Figura 27) o grupo da Ceta (10 ± 1,2) , assim como, o grupo dos neurolépticos (Hal 0,1: 7,9 ± 0,8; Hal 0,2: 2 ± 0,3; Risp 0,1: 2,7 ± 0,4; Risp 0,2: 1,9 ± 0,3) diminuíram o tempo de mergulho quando comparado ao grupo controle (13,3 ± 1,1). Nos grupos pré-tratatados com neurolépticos (Hal 0,1+ Ceta: 5,3 ± 0,8; Hal 0,2 + Ceta: 2,9 ± 0,6; Risp 0,1 + Ceta: 3,3 ± 0,6; Risp 0,2 + Ceta: 0,9 ± 0,2) observou-se redução do tempo de mergulho quando comparado com o grupo da Ceta sozinha [F(9,187) = 35.11; p < 0,0001]. O Nº de Mergulho (Figura 28) do grupo da Ceta (23,2 ± 2) não foi diferente do grupo controle (27,5 ± 2,6), enquanto os grupos dos neurolépticos sozinhos, bem como, os grupos dos que receberam Ceta e foram pré-tratados com neuroléptico (Hal 0,1+ Ceta: 9,3 ± 1,4; Hal 0,2 + Ceta: 4,2 ± 0,8; Risp 0,1 + Ceta: 5,8 ± 1,2; Risp 0,2 + Ceta: 1,5 ± 0,4) reduziram o nº de mergulho [F(9,193) = 37.32; p < 0,0001]. A Controle Ceta 10 Halo 0,1 Halo 0,1 +Ceta10 Halo 0,2 Halo 0,2+Ceta10 Tempo de mergulho (s) 20 15 a 10 a a,b 5 a,b,c a,b 0 B 20 Tempo de mergulho (s) Controle Ceta 10 Risp 0,1 Risp 0,1+Ceta10 Risp 0,2 Risp 0,2+Ceta10 15 a 10 5 a,b a,b a,b a,b 0 Figura 27 – Efeitos das drogas no teste da placa furada em camundongos. A Haloperidol sozinho ou em associação com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em pré-tratamento com cetamina. A figura mostra o tempo de mergulho dos camundongos registrado durante 5 minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n=20). P < 0.05. a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. A Nº Mergulho 40 Controle Ceta 10 Halo 0,1 Halo 0,1 +Ceta10 Halo 0,2 Halo 0,2+Ceta10 30 20 a,b a,b 10 a,b,c a,b 0 B Nº Mergulho 40 Controle Ceta 10 Risp 0,1 Risp 0,1+Ceta10 Risp 0,2 Risp 0,2+Ceta10 30 20 10 a,b a,b a,b a,b 0 Figura 28 – Efeitos das drogas no teste da placa furada em camundongos. A Haloperidol sozinho ou em associação com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em pré-tratamento com cetamina. A figura mostra o número de mergulho dos camundongos contados em 5 minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n=20). a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. 4.7 Labirinto cruz elevado Braços Abertos – Tempo de permanência: No Labirinto em Cruz Elevado (Figura 29) o grupo tratado com Ceta aumentou (Ceta: 112,8 ± 14), enquanto os grupos dos neurolépticos diminuíram o tempo de permanência nos braços abertos (Hal 0,1: 16,9 ± 4,5; Risp 0,1: 23 ± 13,8; Risp 0,2: 0,9±0,6) quando comparados com o do grupo controle (30,5 ± 12). Os grupos que receberam Ceta, e foram pré-tratados com neurolépticos, diminuíram o tempo de permanência nos braços abertos, na dose mais alta (Hal 0,2+ Ceta: 33,6 ± 21; Risp 0,2 + Ceta: 0 ± 0), quando comparados ao grupo da Ceta sozinha [F(9,193) = 4.767; p < 0,0001]. Braços Abertos – Número de entradas: O grupo de animais tratados com Ceta aumentou (Ceta: 6,9 ± 0,7), e o grupo dos neurtolépticos diminuíram (Hal 0,1: 1 ± 0,2; Hal 0,2: 0,7 ± 0,3; Risp 0,1: 0,4 ± 0,2; Risp 0,2: 0,1±0,1) o número de entradas nos braços abertos quando comparado ao grupo controle (4,6 ±0,7). Os grupos que receberam Ceta, e foram pré-tratados, com ambas as doses de neurolépticos, diminuíram o nº de entrada nos braços abertos (Hal 0,1+ Ceta: 1 ± 0,2; Hal 0,2+ Ceta: 0,5 ± 0,2; Risp 0,1 + Ceta: 1 ± 0,2; Risp 0,2 + Ceta: 0 ± 0), quando comparados ao grupo da Ceta sozinha [F(9,197) = 40.68; p < 0,0001)] (Figura 30). A Controle a 120 80 b Ceta 10 Halo 0,1 Halo 0,1 +Ceta10 Halo 0,2 Halo 0,2+Ceta10 10 ada Braços Abertos Braços Abertos (s) A 8 6 4 a Controle Ceta 10 Halo 0,1 Halo 0,1 +Ceta10 Halo 0,2 Halo 0,2+Ceta10 Figura 29 – Efeitos das drogas no teste do LCE em camundongos. A Haloperidol sozinho ou em associação com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em pré-tratamento com cetamina. A figura mostra o tempo de permanência dos camundongos nos braços abertos contados em 5 minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM (n= 20). a, b e d (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Risp 0,1 + Ceta 10, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. Figura 30 – Efeitos das drogas no teste do LCE em camundongos. A Haloperidol sozinho ou em associação com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em pré-tratamento com cetamina. A figura mostra o número de entradas dos camundongos nos braços abertos contados em 5 minutos. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n=20). a e b (p<0.05) quando comparado ao controle e Ceta respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. Braços Fechados – Tempo de permanência: No grupo da Ceta (122,5 ± 10,4) sozinha, o tempo de permanência nos braços fechados (Figura 31) comparado com o do Controle (223,7 ± 14,5), foi reduzido, porém, no grupo pré-tratatado com neurolépticos na dose mais alta (Hal 0,2+ Ceta: 233 ± 24,3; Risp 0,2 + Ceta: 276,5 ± 15,2), reverteu esse efeito. Com os grupos que receberam drogas neurolépticas sozinhas, o tempo nos braços fechados (Hal 0,1: 244,9 ± 11,5; Risp 0,1: 223 ± 24; Risp 0,2: 294 ± 2,3) não diferiu do controle, exceto o grupo do haloperidol 0,2 mg (148 ± 31,5) que foi reduzido [F(9,194) = 6.734; p < 0.0001]. Braços Fechados – Número de entradas: O número de entradas nos braços fechados (Figura 32), dos animais que receberam Ceta sozinha (6,7 ± 0,8), não diferiu do grupo controle (5,4 ± 0,5). Esse parâmetro foi reduzido para os grupos dos animais que receberam neurolépticos sozinhos (Hal 0,1: 2,4 ± 0,3; Hal 0,2: 0,7 ± 0,2) Risp 0,1: 1,9 ± 0,3; Risp 0,2: 1,6 ± 0,2). Os grupos que receberam Ceta e foram pré-tratados com neurolépticos (Hal 0,1+ Ceta: 2,3 ± 0,4; Hal 0,2 + Ceta: 1,8 ± 0,4; Risp 0,1 + Ceta: 2,4 ± 0,4; Risp 0,2 + Ceta: 1,1 ± 0,1) diminuíram o nº de entradas nos braços fechados, significativamente, em todas as doses, quando comparados ao grupo da ceta sozinha [F(9,195) = 24.03; p < 0.0001]. Figura 31 – Efeitos das drogas no teste do LCE em camundongos. A - Haloperidol sozinho ou em associação com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em prétratamento com cetamina. A figura mostra o tempo de permanência dos camundongos nos Braços Fechados contados em 5 min. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n=20). a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. Figura 32 – Efeitos das drogas no teste do LCE em camundongos. A - Haloperidol sozinho ou em associação com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em prétratamento com cetamina. A figura mostra o número de entradas dos camundongos nos Braços Fechados contados em 5 min. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n=20). a e b (p<0.05) quando comparado ao controle e Ceta, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. No LCE foi avaliado também o parâmetro nº de Rearing (Figura 33), onde se observou uma redução dessa atividade com o grupo da Ceta (9,4 ± 1,4) quando comparado com o controle (15,3 ± 1,5). Neurolépticos sozinhos e Ceta pré-tratados com neurolépticos (Hal 0,1+ Ceta: 4,2 ± 0,9; Hal 0,2+ Ceta: 0,4 ± 0,2; Risp 0,1 + Ceta: 1,6 ± 0,6; Risp 0,2 + Ceta: 0,1 ± 0,1) apresentaram também uma redução no nº de Rearing [F(9,189) = 32.07; p < 0,0001]. A Nº Rearing no LCE 20 Controle Ceta 10 Halo 0,1 Halo 0,1 +Ceta10 Halo 0,2 Halo 0,2+Ceta10 15 a 10 a a,b 5 a,b,c a,b 0 B Nº Rearing no LCE 20 Controle Ceta 10 Risp 0,1 Risp 0,1+Ceta10 Risp 0,2 Risp 0,2+Ceta10 15 a 10 5 a,b a,b a,b a,b 0 Figura 33 – Mostra a atividade locomotora vertical (número de rearing) dos camundongos no LCE por 5 min A - Haloperidol sozinho ou em pré-tratamento com cetamina. B – Risperidona sozinha ou em pré-tratamento com cetamina. Os resultados são apresentados com a média + EPM. (n= 20). a, b e c (p<0.05) quando comparado ao controle, Ceta e Halo 0,1, respectivamente. Análise de variância e teste post-hoc de Tukey. DISCUSSÃO 5 DISCUSSÃO Pesquisas farmacológicas demonstraram que doses subanestésicas de Cetamina induzem sintomas da esquizofrenia nos seres humanos (LAHTI et al., 1995; KRYSTAL et al, 1994; NEWCOMER et al., 1999) assim como ativação comportamental (como exemplo aumento na atividade locomotora) em animais experimentais (LIU et al., 2006). O mecanismo exato desta ativação funcional é desconhecido. Duncan et al., (1998b) sugeriram que doses relativamente baixas de cetamina produz uma gama de efeitos excitatórios após a administração sistêmica, e tais efeitos podem resultar tanto de ações desinibitórias (por exemplo: atividade reduzida de neurônios inibitórios), ou quebra do regulamento de feedback negativo dos neurônios que secretam aminoácidos excitatórios. Estudos encontraram alterações que apontam para uma disfunção no sistema glutamatérgico. Estudo em cérebros de pacientes esquizofrênicos revelou uma baixa densidade dos receptores glutamatérgicos (MOGHADDAM, 1994; TSAI et al., 1998). Pesquisa mais recente, com animais tratados subcrônicamente com cetamina, mostrou, duas semanas após completar o tratamento, diminuíção da ligação do glutamato no córtex frontal, e esse achado se correlacionou com aumento da atividade locomotora dos animais, após uso de antagonista NMDA (MK 801), em dose a qual sozinha, não alterou a ALE dos animais (BECKER et al., 2003) mostrando com isso além da disfunção, uma sensibilização do sistema glutamatérgico. Becker et al., (2003) encontrou, inclusive, um aumento na ligação dos receptores D2 no hipocampo e aumento na densidade dos transportadores da dopamina no estriado dos animais tratados com Ceta. Sobre esse achado o autor refere que não está claro se essa alteração na ligação da dopamina é uma conseqüência do antagonismo do receptor NMDA ou devido ao bloqueio do transportador da dopamina pela cetamina. No presente trabalho, foi demonstrado que cetamina administrada de forma aguda em doses subanestésicas (5, 10 e 15 mg/Kg, i.p), em camundongos, induz a uma hiperatividade, observada no teste do campo aberto. É conhecido que os mecanismos dopaminérgicos têm um papel importante em mediar à atividade locomotora, e a cetamina, com sua ação através de múltiplos mecanismos, pode exercer uma influência sobre a transmissão dopaminérgica e receptores (MANDRYK et al., 2005). Têm sido sugeridas algumas hipóteses para explicar esse aumento da atividade locomotora em animais por antagonistas NMDA entre as quais foi proposto o bloqueio da influência inibitória tônica de neurônios gabaérgicos sobre uma projeção excitatória para o córtex pré-frontal medial por essa classe de droga (KRYSTAL et al., 2003; LORRAIN et al., 2003). JODO et al., (2005) sugerem que entradas excitatórias provenientes do hipocampo ventral para o córtex pré-frontal medial pode desencadear o desenvolvimento de anormalidades comportamentais. Tem sido descrito um forte aumento na neurotransmissão dopaminérgica com administração aguda de cetamina e PCP no prosencéfalo (HERTEL et al. 1996; VERMA & MOGHADDAM 1996; JENTSCH et al. 1997a), enquanto que a administração a longo prazo de PCP reduz neurotransmissão dopaminérgica frontal (JENTSCH et al. 1997b), o que pode indicar que essas alterações na transmissão dopaminérgica pode variar dependendo do estágio em que se encontra a doença. A ativação locomotora apresentada pelos animais neste estudo pode estar relacionada a uma redução na função do sistema glutamatérgico de inibição da liberação de dopamina em animais tratados com cetamina, o que pode explicar uma liberação aumentada de dopamina com o uso de antagonistas dopaminérgicos (ADAMS & MOGHADDAM, 1998; MATHÉ et al., 1999; SCHMIDT & FADAYEL, 1996). Adicionalmente, sugere-se que o bloqueio dos transportadores dopaminérgicos no estriado (BECKER et al., 2003), por cetamina, pode contribuir para exarcebação desse efeito. Estudos realizados utilizando camundongos geneticamente modificados, os quais apresentavam uma reduzida expressão do subtipo do receptor NMDA R1 (NR1) exibiam um fenótipo alterado que incluía aumento da atividade locomotora (MOHN et al., 1999), reduzida atividade metabólica no córtex pré-frontal medial, córtex cingulado anterior e hipocampo (DUNCAN et al., 2002), déficits na interação social (DUNCAN et al,. 2004; MOHN et al., 1999) e déficits em testes de memória (PPI prepulse inhibition of acoustic startle) (DUNCAN et al., 2006). No modelo estudado por Duncan et al., (2006) somente antipsicótico atípico onlanzapina reverteu o aumento da atividade locomotora dos camundongos modificados geneticamente, o mesmo efeito não foi observado com haloperidol. Duncan et al., (2006) referem que há uma diferença entre efeitos metabólicos cerebrais produzidos por administração aguda de antagonista NMDA daqueles que resultam da redução crônica da função do receptor no camundongo modificado geneticamente. Antagonistas NMDA produz uma marcada ativação de certas regiões cerebrais enquanto que o modelo modificado geneticamente produz redução seletiva neuroanatomicamente na atividade metabólica cerebral (DUNCAN et al., 2002). Portanto, estado fisiológico induzido por déficit crônico na função do receptor NMDA difere do induzido por administração aguda de antagonistas NMDA, sendo este um modelo de exarcebação psicótica aguda (DUNCAN et al., 2006). Ao contrário do trabalho descrito por Duncan et al., (2006), neste estudo o aumento na atividade locomotora, induzida por antagonista NMDA, foi revertido pelos neurolépticos típico e atípico em todas as doses. Pode-se sugerir que mecanismos de ação de antipsicóticos atípicos podem estar envolvidos com mecanismos fisiopatológicos da doença na fase crônica, enquanto que neuroléptcos clássicos, cuja ação antipscótica está possivelmente relacionada ao antagonismo D2, tenha uma eficácia maior na sintomatologia aguda da psicose. Corroborando com essa idéia, estudos têm demonstrado que neurolépticos atípicos (risperidona) têm uma melhor resposta para tratar pacientes refratários à terapia neurolépticas do que neurolépticos convencionais (haloperidol) (MARDER & MEIBACH, 1994; WIRSHING et al,. 1999). Essas diferentes respostas podem estar relacionadas a diferentes graus de afinidades para os receptores principalmente para os serotoninérgicos, como discutiremos adiante. Tem sido descrito que propriedades psicotogênicas da cetamina estão relacionadas a um estado hipoglutamatérgico com conseqüente deficiência para receptores da dopamina e da serotonina (SWERDLOW et al., 1996). A cetamina utilizada em nosso estudo foi a (+)-cetamina, a qual foi descrita possuir maior afinidade pelo receptor NMDA do que a (±)-cetamina (LIU et al., 2006). Uma vez que foram utilizadas em nosso estudo doses subanestésicas de cetamina, é possível que propriedades antagônicas para o receptor NMDA predominem, e seja esse mecanismo responsável pelo aumento da atividade locomotora e esteriotipias apresentadas pelos animais, tendo em vista que baixas doses da Ceta podem não exercer maior efeito sobre outros receptores. Devido às várias evidências, como as acima discutidas, foi sugerido que a cetamina pode ter uma atividade agonista dopaminérgica indireta, e que a estimulação comportamental induzida pela cetamina, portanto está conectada com o sistema dopaminérgico (IRIFUNE et al., 1991). Contrariamente, um estudo sugeriu que a cetamina pode não ser seletiva para o receptor NMDA, e que a cetamina teria uma alta afinidade para o receptor dopaminérgico D2 e para o sítio de ação da serotonina, e dessa forma age como agonista parcial no receptor D2 (KAPUR & SEEMAN, 2002), entretanto, estes resultados não foram reproduzidos por Liu et al., (2006). Estudo realizado por Aalto et al., (2002) encontrou que cetamina não alterou a ligação do [11C]-raclopride (um potente ligante dos receptores D2) no estriado quando a cetamina induziu efeitos comportamentais típicos tais como alucinações, levantando a possibilidade de que os efeitos da cetamina não estavam correlacionados com a substituição da ligação do [11C]-raclopride. Resultados similares foram observados com o receptor 5-HT2A, onde cetamina não mostrou afinidade apreciável para os receptores de 5-HT2A ocupados por [3H]ketanserin (RABIN et al, 2000). Segundo Liu et al., (2006), não está claro que cetamina ocupa diretamente o receptor D2 da dopamina e da serotonina (5-HT2), sendo necessários estudos adicionais para conclusões definitivas. Em relação aos neurolépticos, uma diminuição da atividade locomotora em camundongos mostrou um efeito depressivo agudo desta classe de droga. A hipomotilidade causada por neurolépticos pode ser resultado de uma reduzida excitabilidade do sistema nervoso central ou sedação (POYARES et al., 2006). Várias drogas antipsicóticas, incluindo as de baixa potência, tem um proeminente efeito sedativo. Este efeito ocorre principalmente no início do tratamento, e geralmente o paciente desenvolve tolerância (BALDESSARINI & TARASI, 2007). Entre os grupos pré-tratados com neurolépticos, o grupo da risperidona 0,1 mg + Ceta, reverteu a atividade locomotora para níveis próximos do controle. Risperidona, um antipsicótico com propriedades antagônicas para os receptores D2, serotoninérgicos 5HT2A, tem sido o foco de diversos estudos clínicos (JESTE et al., 2000; KEEFE et al., 2006; WANG et al., 2007). Estudo realizado por Su et al. (2006) usando MK-801 (antagonista NMDA semelhante a cetamina) mostrou que risperidona tem um efeito inibitório sobre a hiperatividade induzida por MK-801 em camundongos nas doses (0,03 mg/Kg) que quando administrada sozinha não alterou a atividade locomotora espontânea. Foi também sugerido por eles que esta inibição foi provavelmente causada pelo bloqueio dos receptores serotoninérgicos 5-HT2A pela risperidona. Conforme visto anteriormente, risperidona possui uma afinidade significativamente alta para o receptor da serotonina 5-HT2A (Ki: 0,29 nM) (DUNCAN & LIEBERMAN, 1999). Tem sido descrito o envolvimento da serotonina na fisiopatologia da esquizofrenia. Foi encontrado que em esquizofrênicos, sítios de ligação 5-HT2A estavam diminuídos no córtex parietal e frontal (LARUELLE et al., 2000; CANAL et al., 2001). O mecanismo pelo qual um antagonista do receptor da serotonina 5-HT2A inibe hiperlocomoção induzida por um antagonista NMDA não está completamente esclarecido (Su et al. 2006). Estudos neuroquímicos têm demonstrado que antagonistas NMDA aumentam a liberação de serotonina, que por sua vez aumenta a atividade de receptores serotoninérgicos 5-HT2A sobre neurônios glutamatérgicos no córtex para liberar glutamato (ADAMS & MOGHADDAM, 2001; AGHAJANIAN & MAREK, 1999). Glutamato liberado atuaria sobre receptores AMPA e Cainato causando mudanças comportamentais e induzindo mudanças neuropatológicas que podem ocorrer com a exposição de antagonistas NMDA (MOGHANDDAM et., al (1997); Olney et al., 1999). Risperidona inibe a liberação de glutamato induzida por antagonista NMDA no córtex pré-frontal medial por bloquear receptores da serotonina 5-HT2A sobre terminais glutamatérgicos levando a uma atenuação da atividade cortical e subcortical dos neurônios glutamatérgicos, o que diminui a hiperlocomoção (SU et al. 2007). Não se pode descartar também o envolvimento de outros mecanismos. Como descrito anteriormente risperidona não bloqueia somente o receptor 5-HT2A, mas também os receptores dopaminérgicos D2, receptores histamínicos H1 e adrenérgicos α1. Tem sido descrito que o antagonista adrenoreceptor prazosin reduz hiperlocomoção induzida por antagonista NMDA (HARKIN et al., 2001). Com relação ao rearing e grooming, os animais tratados com cetamina e neurolépticos, exceto o grupo do haloperidol 0,1 mg (grooming), mostraram uma diminuição desses comportamentos quando comparado ao controle, sendo que esse efeito, em animais tratados com cetamina sozinha, foi, possivelmente, causado pela ataxia mostrada nestes grupos (MANDRYK et al., 2005). Em camundongos tratados com neurolépticos sozinhos, a redução desse comportamento evidenciou um efeito depressivo agudo dessas drogas, caracterizado por intensa hipomotilidade nesses grupos, demonstrada no teste do campo aberto, por provável sedação (MATTEI & FRANÇA, 2006). Diversas drogas antipsicóticas têm sido utilizadas para produzir sedação, sendo utilizadas para tratar pacientes esquizofrênicos com insônia aguda ou para tratar comportamento de agitação. O efeito colateral da sedação pode está relacionado ao bloqueio dos receptores α1 centrais e periféricos, além do bloqueio de receptores H1 (POYARES et al., 2006). Curiosamente, no grupo haloperidol 0,1 mg o número de grooming não diferiu do controle Entre os efeitos neurofarmacológicos adversos da cetamina, os psicomiméticos são causados, provavelmente, pelo bloqueio da função do receptor NMDA (JAVITT & ZUKIN, 1991). Tais respostas comportamentais consistem de locomoção cabaleante e movimentos repetidos de balanço da cabeça (DUNCAN et al., 1998a; DUNCAN et al., 1998b). Igualmente, pacientes esquizofrênicos exibem com freqüência comportamentos esteriotipados ou repetidos, embora não sejam tipicamente hiperativos (GEYER & MOGHADDAM, 2002). Resultados semelhantes, em nossos experimentos, que após injeção de Ceta 10 mg o animal mostrou comportamento esteriotipado (comportamento incomum como balanço da cabeça de um lado para outro, andar para trás rapidamente; perseverações que inclui movimentos repetidos e exagerados), incluindo ataxia (marcha descoordenada) e andar em círculos. Tais comportamentos no grupo da Ceta 10 mg foram significantes quando comparado ao grupo controle. A despeito dessas alterações motoras causadas pela cetamina, estudos em humanos têm demonstrado déficits motores, similares aos da disfunção estriatal primária, em pacientes com esquizofrenia que ainda não iniciaram tratamento com neurolépticos, sugerindo um envolvimento desses sinais no processo da esquizofrenia (CALIGUIRI et al., 1993; CHATTERJEE et al., 1995). A ataxia foi revertida pelas duas classes dos neurolépticos, contudo levando em consideração que esses parâmetos são comportamentos avaliados com o animal em movimento, e nesse caso tendo risperidona (risp 0,1 mg + Ceta) demonstrado atividade locomotora para níveis próximos do controle, pode-se concluir que reversão da ataxia e do comportamento estereopado foi melhor observado no grupo risperidona 0,1 mg + ceta. Não obstante, riperidona 0,1 mg não reverteu o comportamento de andar em círculos. Resultados no teste Rota rod mostraram uma redução no tempo de permanência dos animais na barra, bem como, aumento do número de quedas no grupo dos animais que receberam cetamina, possivelmente devido a um comprometimento da coordenação motora apresentada por esse grupo, evidenciada no teste da ataxia. Neste estudo, risperidona na menor dose e haloperidol na maior dose aumentou o tempo dos animais sobre a barra. Estudos têm demonstrado diferentes respostas entre neurolépticos típicos e atípicos. Estudo duplo-cego controlado tem sugerido que risperidona entre outros antipsicóticos atípicos parece ser mais efetivo do que o haloperidol em tratar sintomas positivos e negativos da esquizofrenia (MARKOWITZ et al., 1999). Meltzer et al., (1989) sugeriram que combinadas ações antagônicas nos receptores 5-HT2A/D2 com maior potencia relativa para o receptor-HT2A poderia ser críticas para a atipicidade do fármaco, em termos de eficácia aumentada e reduzida capacidade de produzir sintomas extrapiramidais. É possível que essa ação combinada da risperidona sobre receptores D2 e serotoninérgicos tenha contribuído para atenuar alterações motores, tendo em vista uma melhora desse efeito nos camundongos com a menor dose de risperidona. Apesar da alta potência do haloperidol sobre receptores D2 ela somente reverteu a incoordenação motora dos animais que receberam Ceta quando utilizada a maior dose. Esse último resultado pode ser explicado pela baixa afinidade, do haloperidol, por receptores 5-HT2A (DUNCAN & LIEBERMAN, 1999). Efeitos colaterais com doses mais elevadas da risperidona (SU et al. 2006) pode ter contribuído para não eficácia dessa droga, na maior dose (Risp 0,2 mg + Ceta), em reverter a incoordenação motora desses animais no teste do Rota rod. O déficit motor (ataxia) apresentado pelos animais que fizeram uso de cetamina pode estar relacionado com alterações agudas no sistema dopaminérgico no estriado, uma vez que essa área anatômica é em grande parte responsável pelo comportamento motor (MACHADO, 1999), e/ou circuitos cerebelares, os quais são responsáveis pelo equilíbrio postural (ALMEIDA & OLIVEIRA, 2006). Outras drogas, além da cetamina, antagonistas do receptor NMDA têm sido descritas por desenvolver esse comportamento em animais, tais como dizocilpina (MK 801) (SU et al. 2006) e fenciclidina (PCP) (CASTELLANI & ADAMS, 1981) indicando o envolvimento primário do sistema glutamatérgico. O tempo de permanência na barra dos animais, que receberam simples dose de neurolépticos, não foi diferente do grupo controle, apesar do efeito sedativo agudo dessas drogas conforme comentado anteriormente. Interessante notar que, embora o grupo de animais que receberam Halo 0,2 mg/Kg tenha apresentado catalepsia significativa, em relação aos demais grupos, com relação ao parâmetro “tempo de permanência na barra” mostrou-se semelhante ao grupo controle. Catalepsia é um dos efeitos colaterais produzidos por neurolépticos típicos em animais de laboratório (MANDHANE et al., 1997), e imagina-se que esse efeito seja devido ao bloqueio dos receptores D2 a nível central, principalmente em áreas estriatais. Vasconcelos et al. (2003) encontrou catalepsia em roedores após trinta dias em uso de halo, e este efeito se correlacionou com uma reduzida atividade locomotora. Estes efeitos desapareceram após três dias de suspensão da droga. Após sete dias de suspensão desta, observou-se um aumento (up regulation) de receptores D2 no estriado. Os autores referem que esses fenômenos se devem ao bloqueio dos receptores D2, porém outros mecanismos podem também estar envolvidos. Os animais que fizeram uso da risperidona não apresentaram catalepsia, pois apesar da forte afinidade pelos receptores D2 (DUNCAN & LIEBERMAN, 1999), em baixas doses (4 a 6 mg por dia) não costuma causar efeitos extrapiramidais em humanos (MELTZER et al., 1989). Acredita-se que aumentada atividade dopaminérgica no estriado contribui para reduzido efeito colateral extrapiramidal (MELTZER & STAHL, 1976; DAVIS & KAHN, 1991). Jakab & Goldman-Rakic (1998) propuseram que os receptors 5-HT2A nos neurônios corticais piramidais podem ter um papel crucial na psicose em virtude de sua habilidade para modular neurotransmissão glutamatergica intracortical e córtico-subcortical, o que pode contribuir para habilidade dos antagonistas 5-HT2A de atenuar alguns dos efeitos comportamentais da cetamina (MIYAMOTO et al., 2002). No teste de suspensão da cauda, o qual analisa efeito antidepresivo de drogas em animais, o grupo da cetamina apresentou um tempo de imobilidade reduzido, podendo revelar um efeito antidepressivo ou excitante para o SNC. Esta imobilidade foi revertida pelos neuroléticos em todas as doses. Contrariamente os neurolépticos mostraram efeito depressor para o SNC. Bressan et al., (2002) relataram uma correlação positiva entre a taxa de ocupação de receptores D2 no estriado e a intensidade de sintomas depressivos em pacientes esquizofrênicos estáveis. Indivíduos com taxa de ocupação superior a 78% tiveram maior chance de apresentar sintomas depressivos. Tendo em vista que risperidona ocupa os receptores D2 em torno de 75% ou mais (FARDE et al., 1994; BUSATTO et al., 1993), quando a dose supera 4 mg/kg e, haloperidol ocupa os receptores D2 em taxas superiores a 78% no estriado em humanos (KAPUR et al., 2000). No presente estudo, além do efeito sedativo comentado anteriormente, é possível que o bloqueio dos receptores D2, tenha sido um dos mecanismos pelo qual os animais apresentaram hipomotilidade no teste da suspensão da cauda. É importante ressaltar que a esquizofrenia é caracterizada por sintomas, positivos (ilusão, alucinação), sintomas negativos (interação social reduzida) e cognitivos (déficits na atenção e memória). A maioria destes sintomas está relacionada com alteração dopaminérgica (WANG et al., 2007). Acredita-se que sintomas positivos estejam relacionados à hiperestimulação subcortical de receptores D2 e sintomas negativos à hipoestimulação subcortical dos receptores D1 no córtex préfrontal (ABI-DARGHAM, 2004). Estudos recentes (SU et al., 2007; WANG el al, 2007) têm demonstrado que antagonismos no receptor NMDA produzem efeitos semelhantes ao sintomas negativos da esquizofrenia, tais como déficits cognitivos e pobreza no comportamento social, e esses sintomas são revertidos por neurolépticos atípicos. Neste estudo foi demonstrada uma redução na interação social dos camundongos após dose aguda de cetamina, porém não revertida pelos neuroléticos risperidona e haloperidol nas doses dadas. Trabalhos têm mostrado a eficácia da risperidona sobre sintomas negativos da esquizofrenia, sendo descrito que a ação antagônica da risperidona sobre os receptores 5-HT2A pode resultar em uma maior efetividade para tratar esses sintomas (VAN KAMMEN & MARDER, 2005). Wang et al. 2007 relatam que risperidona é efetivo para os sintomas negativos, porém devido aos seus efeitos colaterais, essa eficácia é limitada, sendo necessárias drogas coadjuvantes ou novas estratégias de tratamento. Estudos demonstraram déficit em receptores colinérgicos no córtex pré-frontal de pacientes esquizofrênicos (ARNOLD et al. 2004; DEUTSCH et al., 2005). Baseando-se nesses resultados Wang et al. (2007) realizaram estudo em camundongos o qual demonstrou prejuízo na interação social, após doses sub-crônicas de antagonista NMDA, não revertida após risperidona 0,5 mg. Contudo, esse efeito foi revertido quando Risp 0,5 mg foi associada com galantamine (um modulador alostérico do receptor nicotínico da acetilcolina - RnAch). Concluiu, então, que esse prejuízo na interação social estaria associado com hipofunção de receptores D1 no córtex préfrontal medial, e galatamine atuaria em sinergismo com a risperidona, aumentando a liberação de dopamina no Córtex pré-frontal medial (CPFm), através de ativação dos receptores RnAch. Esta ativação promove a liberação de DA, sendo que galatamine aumenta a liberação de DA por potencializar alostericamente esse receptor. Consistente com o estudo acima, há relatos de que as funções dopaminérgicas estriatais e límbicas estão sob o controle inibitório do córtex pré-frontal, e lesões dos terminais dopaminérgicos no CPFm conduzem à liberação aumentada da dopamina no núcleo accumbens (mesolimbico) e em outros núcleos dos gânglio basais (MITCHELL & GRATTON, 1992; PYCOCK et al., 1980). Hipofunção dos receptores D1 no córtex foi demonstrada também por AbiDargham, (2004) que encontrou uma up-regulation dos receptores D1 no córtex préfrontal dorsolateral, uma área envolvida na memória de trabalho, em pacientes com esquizofrenia. O autor concluiu que este resultado pode representar um efeito compensatório do déficit de dopamina no córtex, e fornece a evidência para um desequilíbrio cortical/subcortical no cérebro esquizofrênico. Interessante observar que pesquisa em macacos indicou que a exposição crônica com neurolépticos resulta na densidade cortical pré-frontal diminuída do receptor D1 após seis meses de tratamento (LIDOW & ELSWORTH, 1997); e o tratamento com um agonista D1 reverteu os déficits na memória de trabalho associados aos neurolépticos (CASTNER et al., 2000). Estes resultados sugerem que déficits cognitivos, bem como déficit na interação social podem estar relacionados ao uso crônico de neurolépticos, e/ou alterações primárias de receptores a nível cortical, o que poderia causar uma hipofunção de receptores D1. Os testes labirinto cruz elevado e placa furada são testes clássicos de avaliação de ansiedade em camundongos (BAKSHI & KALIN, 2002). O grupo de animais que recebeu Ceta sozinha, no LCE, permaneceu maior tempo nos braços abertos, com um maior nº de entradas para essa área do labirinto do que o grupo controle, o que poderia indicar um efeito ansiolítico da Cetamina. Contudo, esse efeito de ansiedade não foi confirmado no teste da placa furada onde o nº de mergulho não diferiu do grupo controle, além do reduzido tempo de mergulho do grupo da Ceta, comparado ao controle. Considerando os dados apresentados, pode-se concluir que, nas condições experimentais do presente trabalho, Ceta 10 mg, não apresentou efeito ansiolítico, sendo que essas alterações comportamentais, apresentadas por esse grupo de animais, podem estar relacionadas à hiperestimulação do SNC causada pela cetamina, descrito por Kapur & Seeman, (2002) como o resultado de uma perturbação neuroquímica multissistêmica. Becker et al., (2003) não encontrou alteração no grupo da cetamina (doses subcrônicas) em relação ao controle, mesmo sob condições estressantes (maior nível de luminosidade) no teste do LCE. É provável que a diferença entre essas alterações comportamentais com o uso da cetamina na forma aguda e crônica esteja relacionada ao fenômeno da tolerância. Sintomas depressivos são comuns durante todos os estágios da esquizofrênia e estão associados com pobreza de resultado (como exemplo déficit de cognição), recaída e suicídio (BIRCHWOOD et al., 1993; ROY et al., 1983; TOLLEFSON et al., 1999). Estudo duplo-cego demonstrou a eficácia da risperidona em reduzir ansiedade e depressão (CONLEY & MAHMOUD, 2000). Pode-se concluir, portanto, que resposta “ansiogênica” apresentada pelos neurolépticos sozinhos, caracterizada pelo maior tempo dos animais nos braços fechados, pode ser devido a efeitos agudos da risperidona e do haloperidol, podendo estar relacionado a efeito sedativo que é freqüente no início do tratamento com essas drogas, conforme comentado anteriormente. Os grupos de animais que receberam cetamina, e foram pré-tratados com neurolépticos na maior dose, permaneceram maior tempo nos braços fechados (TBF) em relação a ceta sozinha. Pode-se observar também um menor nº de entrada para os braços fechados (Nº EBF), o que pode indicar que ambos os fenômenos (maior TBF e menor Nº EBF) podem confirmar o efeito sedativo dessas drogas quando administradas agudamente. Igualmente, no teste da placa furada, os animais que receberam Ceta e foram pré-tratados com neurolépticos, exceto haloperidol 0,1mg, diminuíram o tempo de mergulho em relação a Ceta sozinha. De qualquer forma podese concluir que os neurolépticos reverteram a hiperexcitabilidade (no teste do LCE) causada pela Ceta e produziu uma hipomotilidade nos animais no teste da placa furada. Os achados do presente trabalho concordam com estudos clínicos, sugerindo que efeitos comportamentais (CORBETT et al., 1995; HOFFMAN, 1992) dos antagonistas NMDA, como cetamina, são bloqueados por drogas antipsicóticas (DUNCAN et al., 1998b) como haloperidol e risperidona. A ação dos antipsicóticos neste modelo bloqueou os efeitos causados pela administração aguda da cetamina. CONSIDERAÇÕES FINAIS 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS • Cetamina administrada agudamente em doses subanestésicas, em camundongos, induz a uma hiperatividade locomotora nos teste de comportamento, sugerindo um aumento da ação dopaminérgica a nível de córtex pré-frontal. • Este aumento da atividade locomotora produzido pela Ceta foi revertido pelos neurolépticos haloperidol e risperidona, provavelmente por antagonizar os receptores D2 e/ou serotoninérgicos. • Neurolépticos administrados sozinhos causaram um efeito depressor do SNC ou sedação demonstrada por redução da atividade locomotora no teste do campo aberto, diminuído rearing e grooming, maior tempo de imobilidade no teste de suspensão da cauda. • Cetamina causa esteriotipias e ataxia em camundongos sendo esse comportamento revertido pelos neurolépticos. • Não se sabe o exato mecanismo pelo qual os animais apresentam esteriotipias, porém é possível que as propriedades antagônicas da cetamina para o receptor NMDA, sejam o responsável pelas propriedades psicotogênicas da droga. • Cetamina causou uma incoordenação motora no animal, no teste do Rota rod, e esse efeito foi revertido pela menor dose da risperidona e maior do haloperidol, o que pode revelar melhor resposta dos neurolépticos atípicos para alterações motoras comportamentais. • Ao contrário do haloperidol, os animais que fizeram uso da risperidona não apresentaram catalepsia, possivelmente pela maior afinidade dessa droga para o receptor da serotonina 5-HT2A. • Cetamina diminuiu tempo de interação social ativa dos animais, porém esse efeito não foi revertido pelos neurolépticos talvez devido aos efeitos colaterais agudos dessas drogas, tais como: sedação e hipomotilidade. • No teste de suspensão da cauda, o tempo de imobilidade foi reduzido pela cetamina e revertido pelos neuroléticos. Essa mobilidade pode ser devido a uma hiperexcitabilidade causada pela cetamina. Esse efeito pode ter sido o responsável pelo maior tempo dos animais nos braços abertos no LCE. Neurolépticos reverteram essa hiperexcitabilidade, aumentando o tempo dos animais nos braços fechados. • Apesar da hiperexcitabilidade causada pela cetamina, o tempo de mergulho no teste da placa furada foi reduzido em relação ao controle, possivelmente devido à incoordenação motora presente nesse grupo de animais. Devido ao efeito depressor do SNC, os neurolépticos não foram capazes, nesse teste, de reverter esse efeito. CONCLUSÃO 7 CONCLUSÃO A ação dos neurolépticos neste modelo comportamental produziu um bloqueio dos sintomas causados pela administração aguda da cetamina. Mais estudos, incluindo dosagens de monoaminas, serão necessários para confirmar o envolvimento do mecanismo de ação da cetamina no sistema dopaminérgico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AALTO, S. et al. 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