DISTRIBUIÇÃO DE VETORES DA DOENÇA DE CHAGAS EM

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ISSN 1678-6343
Instituto de geografia
ufu
programa de pós -graduação em geografia
DISTRIBUIÇÃO DE VETORES DA DOENÇA DE CHAGAS EM NÍVEL
DOMICILIAR: UM ESTUDO NA ZONA RURAL DE UBERLÂNDIA (MG) 1
Hélica Silva Macêdo
Pós-Graduação em Imunologia e Parasitologia Aplicadas - UFU
Oswaldo Marçal Junior
Professor Adjunto, Instituto de Biologia – UFU
e-mail: [email protected]
RESUMO
A doença de Chagas é uma doença transmitida por vetor que afeta 18 a 25 milhões de pessoas
no Continente Americano. Esta pesquisa avaliou a distribuição de vetores da doença de
Chagas, em nível domiciliar, na região de Olhos d'Água, município de Uberlândia, MG. Foram
investigados sítios e fazendas das seguintes localidades: Pindaíba, Mangue, d'água de Olhos e
Tenda. Todas as casas foram investigadas, no intradomicílio e no peridomicílio. A captura de
vetores (triatomíneos) foi realizada manualmente, utilizando pinças e frascos de coletores.
Foram pesquisados 82 domicílios, dos quais 6,1%. tinham triatomíneos (Triatoma sordida e
Rhodnius neglectus). Esses barbeiros foram encontrados dentro e fora das residências. Isto
pode estar relacionado com a intensa fragmentação de matas da região, produzindo falta de
recursos alimentares e de abrigo para os triatomíneos. Além disso, o combate bem sucedido de
T. infestans. pode ter conduzido T. sordida e R. neglectus a expandir sua distribuição. O
grande número de animais domésticos nas residências examinadas sugere que os mesmos
possam ser hospedeiros alternativos dos barbeiros. Nossos resultados confirmam a ocorrência
de triatomíneos em d´Água de Olhos e mostram a sua capacidade para explorar o ambiente
humano na área estudada.
Palavras-Chave : Doença transmitida por vetores, Barbeiros, Geografia de doenças.
Triatoma sordida, Rhodnius neglectus.
DISTRIBUTION OF VECTORS OF THE CHAGAS´ DISEASE AT THE
DOMICILIARY LEVEL: A STUDY IN THE RURAL ZONE OF THE
MUNICIPALITY OF UBERLÂNDIA, STATE OF MINAS GERAIS
ABSTRACT
Chagas’ disease is a vector-borne disease that affects 18 to 25 million of people in the
American Continent. This research evaluated the distribution of Chagas´s vectors at the
domiciliary level in the region of Olhos d’Água, municipality of Uberlândia, State of Minas
Gerais. Small and large farms were investigated in the following localities: Pindaíba,
Mangue, Olhos d’água and Tenda. All houses were investigated, inside and outside. The
capture of the vectors (triatomine bugs) was made manually, using tweezers and colector
flasks. We searched 82 residences, of which 6.1% had triatomine bugs (Triatoma sordida
and Rhodnius neglectus). These bugs were founded inside and outside the residences. This
may be related to the intensive habitat fragmentation, producing a lack of food resources
and shelter to triatomine bugs. In addition, the sucessfull control of T. infestans, may have
allowed Triatoma sordida and Rhodnius neglectus to expand its distribution. The great
number of animals in the examined residences suggests that those animals can be
1
Recebido em: 02/04/2004
Aceito para publicação em: 25/04/2004
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
Página 50
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alternative hosts to triatomine bugs. Our results confirm the occurrence of the triatomine
bugs in Olhos d´Água and show their capacity to explore the human environment in the
studied area.
Key-Word: Vector-borne disease, Triatomine bugs, Geography of diseases, Triatoma
sordida, Rhodnius neglectus.
infecção em todo o mundo. Contudo,
INTRODUÇÃO
esses mesmos autores ressaltam que tal
A
Doença
de
Tripanossomíase
Chagas
(DC)
Americana
ou
está
restrita ao Continente Americano, mas
mesmo assim é considerada uma das
principais doenças tropicais do mundo,
perdendo em importância apenas para
malária
e
esquistossomose
(WHO,
estimativa pode não refletir a real
situação mundial da doença, face às
dificuldades encontradas na obtenção de
registros nos serviços de vigilância e/ou
atendimento e a baixa procura por
atendimento médico pela população
acometida.
1996). Passados 90 anos desde a sua
descoberta, essa enfermidade ainda se
Segundo GONTIJO et al. (1999), no
destaca
grandes
Brasil existem 3 milhões de chagásicos.
problemas dos países latino-americanos
Entretanto, estima-se que esse número
(AMATO-NETO, 1999). A endemia
possa chegar a 6,34 milhões de pessoas,
pode ser colocada no mesmo patamar de
com cerca de 220.000 novos casos
enfermidades
registrados a cada ano (HAYES &
como
tuberculose,
um
dos
mundiais
desnutrição
como
e
a
doenças
SCHOFIELD,
1990).
A
de
veiculadas pela água, especialmente
inquérito
pelo fato de estar restrita a países em
entre 1975 e 1980, CAMARGO et al.
desenvolvimento, que são precários na
(1984) demonstraram que os estados
disponibilidade de recursos (DIAS &
com maior prevalência para DC no país
DIAS, 1979). De acordo com HAYES
eram: Rio Grande do Sul (8,84%),
& SCHOFIELD (1990), estimativas
Minas Gerais (8,83%), Goiás (7,40%),
recentes indicam que existam entre 18 e
Sergipe (5,97%) e Bahia (5,44%);
25 milhões de portadores, 90 a 100
enquanto
as
menores
prevalências
milhões de pessoas vivam sob risco
estavam
em
Roraima
(0,31%)
imediato de infecção e que ocorram
Maranhão (0,12%). No período 1975-
anualmente 810.000 novos casos da
1983,
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
epidemiológico
partir
levantamento
realizado
sorológico
e
e
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Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
Hélica Silva Macêdo
Oswaldo Marçal Junior
entomoló gico nacional indicou uma
de infectados, com uma média anual de
prevalência
cerca de 90.000 óbitos, no período
de
4,2%
da
endemia
chagásica em áreas rurais do país.
1978-1989 (GONTIJO & DIAS, 1994).
Dados
inquéritos
Existem diversas vias de transmissão da
sorológicos (1989-1997) entre escolares
DC, incluindo a vetorial, transfusões
de 7-14 anos em 842 municípios
sangüíneas, a rota congênita e a trans-
brasileiros revelaram uma positividade
mamária,
de 0,14%. Entre as internações no
laboratório e da via alimentar (REY,
período de 1984-1997, tivemos um total
1991).
de 21.578 com 922 no ano de 1997. Os
(1981), a partir de estudos realizados
últimos dados sobre óbitos (1996)
em São Paulo, sugeriu a inclusão dos
revelaram 5373 mortes por DC no país
transplantes de rim como uma no va
(SILVEIRA & VINHAES, 1998).
modalidade de transmissão da DC, uma
Em Minas Gerais, os maiores índices de
vez
infecção são observados no Triângulo
demonstrada em quatro dos 537 casos
Mineiro e na região Norte do estado
estudos por aquele autor.
(CAMARGO et al., 1984). Para o
Originalmente a DC era considerada
estado, estima-se uma prevalência de
uma enzootia associada a mamíferos e a
8,8%, com aproximadamente 1.177.264
marsupiais silvestres, sendo transmitida
casos. No inquérito sorológico de 1989-
por triatomíneos (Insecta: Hemiptera)
1997 realizado entre escolares de 7-14
que ocupavam o mesmo ecótopo desses
anos, dados preliminares para 130
vertebrados. Esses insetos hematófagos
municípios revelaram uma positividade
são representados por cerca de 98
de 0,07%. No período de 1990-1997,
espécies em todo o mundo, com oito
foram
de
complexos de subespécies pertencentes
Minas
a 15 gêneros. A partir da domiciliação
preliminares
registrados
internação
por
de
2316
DC
casos
em
além
dos
acidentes
Recentemente,
que
esta
de
CHOCAIR
possibilidade
foi
(SILVEIRA & VINHAES, 1998). A
desses
doença pode ser considerada um grave
transformou em uma zoonose, passando
problema para todo o estado, uma vez
a
que 70% dos municípios mineiros
peridomésticos, domésticos e o Homem
apresentam
parasito,
(BARUFFA, 1986; NASCIMENTO et
estimando-se em um milhão o número
al., 1997). Desse modo, a transmissão
vetores
do
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
vetores,
incluir
no
a
seu
parasitose
ciclo
se
animais
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Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
vetorial
é
considerada
importante,
sobretudo
Hélica Silva Macêdo
Oswaldo Marçal Junior
a
mais
América do Sul até a América Central
nas
áreas
(DIAS, 1994a).
endêmicas rurais, onde se encontra a
No Brasil, a área correspondente à
maioria dos chagásicos da América
distribuição de triatomíneos se refere
Latina (DIAS, 1994c, 1999).
principalmente
A distribuição da DC depende da
paisagísticos
distribuição
uma
ambientes abertos tais como cerrado e
determinada área. A maioria deles tem
caatinga (FORATTINI, 1980; DIAS,
papel
ao
1999). Existem 42 espécies descritas,
homem pelos seguintes motivos: vivem
mas apenas algumas são consideradas
exclusivamente no meio silvestre, são
importantes na transmissão de T. cruzi,
menos antropofílicos ou raramente são
em função do seu nível de domiciliação.
encontrados infectados por T. cruzi
As de maior interesse epidemiológico
(SILVEIRA et al., 1984).
são Triatoma infestans, Panstrongylus
Triatoma infestans apresenta o maior
megistus, T. brasiliensis, T. sordida e T.
grau de associação com o ambiente
pseudomaculata (SILVEIRA et al.,
humano, razão pela qual é a espécie
1984;
mais
distribuída,
1993), Contudo, nos últimos anos, tem
complexo
sido dada grande atenção aos chamados
de
reduzido
vetores
na
em
transmissão
amplamente
ocorrendo
no
chamado
aos
domínios
correspondentes
BARUFFA,
1986;
COURA,
chaco/cerrado/caatinga, que se estende
vetores
desde parte do Nordeste do Chile e
geniculatus, T. tibiamaculata, Rhodnius
Argentina ao Nordeste do Brasil. Os
prolixus, R. domesticus e T. vitticeps,
outros vetores de importância são:
em função do processo de domiciliação
Triatoma sordida, cuja distribuição
vivido
inclui a Argentina, a Bolívia e o cerrado
(NASCIMENTO et al., 1997).
do Brasil; Panstrongylus megistus, que
Na microrregião de Uberlândia, que
ocorre na Mata Atlântica do Brasil;
inclui Araguari, Araporã, Canápolis,
Triatoma brasiliensis, encontrado nas
Cascalho
regiões áridas do Nordeste brasileiro;
Indianópolis, Monte Alegre de Minas,
Rhodnius prolixus, que se distribui da
Prata, Tupaciguara e Uberlândia (IBGE,
Colômbia
e Triatoma
1992), segundo os dados referentes a
dimidiata, presente desde o norte da
inquérito entomológico (1975-1983), as
ao
México
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
secundários
a
por
como,
essas
Rico,
P.
espécies
Centralina,
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Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
espécies
de
existentes
bem como seus fatores determinantes,
eram: T. infestans, T. sordida, P.
permite compreender a sua transmissão.
megistus
A distribuição dos triatomíneos é um
e
triatomíneos
Hélica Silva Macêdo
Oswaldo Marçal Junior
Rhodnius
neglectus.
Somente no município de Cascalho
dos
Rico não se detectou esta última espécie
epidemiológica
(SILVEIRA et al., 1984).
relacionada com fatores geográficos,
Triatomíneos
estão
associados
aspectos
principais
da
na
DC,
cadeia
estando
ecológicos e sociais. Como pontuam
principalmente a ninhos de vertebrados,
NASCIMENTO et
pelo que se acredita tenham habitado
Doença de Chagas é doença de espaços
originalmente
ambientes
abertos naturais ou decorrentes de ação
naturais, no Brasil (FORATTINI, 1980;
antrópica, e é doença produzida pela
ARAGÃO, 1975). Nesse sentido, a
pobreza".
domiciliação (ou domesticação) pode
No Triângulo Mineiro, a DC aguda não
ser entendida como a colonização de
tem sido notificada e a sorologia
construções ou moradias e envolve
positiva em crianças é baixa, o que
vários fatores, entre os quais mudanças
sugere que a transmissão via vetorial
comportamentais,
e
tenha sido interrompida (DIOTAIUTI et
alimentares; ciclos biológicos; ritmos
al, 1988). Em Uberlândia, já foram
circadianos e
(ÁVILA-
identificadas as presenças (SILVEIRA
PIRES, 1995). Para DIAS & DIAS
et al., 1984; MACHADO, 1999). de T.
(1979), os principais determinantes
infestans, T.sordida, P. megistus e R.
desse processo são o desequilíbrio de
neglectus, mas as pesquisas de vetores
sistemas naturais e os problemas sócio-
sofreram
econômicos.
descontinuidade nos últimos anos. A
Quando analisamos a distribuição de
situação da DC em Uberlândia mostra
uma
em
um quadro no qual a notificação de
consideração todos os seus aspectos
casos tem sido considerável, tomando-
determinantes.
ocasiões,
se por base os registros do Hospital de
estes fatores são ignorados, embora
Clínicas da Universidade Federal de
devessem
mais
Uberlândia, o que sugere que a endemia
profunda e minuciosa das análises.
se mantenha ativa na região. A despeito
Reconhecer a história de uma doença,
disso, as campanhas de controle de
doença,
ser
apenas
reprodutivas
estacionais
devemos
Em
várias
submetidos
levar
à
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
uma
al.
(1997):
"A
acentudada
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Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
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vetores sofreram descontinuidade de
(BACCARO, 1990).
vários anos em Uberlândia, impedindo
A
uma avaliação mais objetiva do quadro
estimada,
epidemiológico desta parasitose. Desse
habitantes (98% na zona urbana). A
modo, a realização do presente estudo
econômica está centrada na indústria de
se coloca como uma iniciativa que
transformação, na construção civil e na
melhor compreensão da situação da
produção agropecuária (soja, milho,
endemia
Nesse
laranja e criação de gado leiteiro) e a
contexto, o objetivo deste trabalho foi
diversidade de produção voltada para
investigar a ocorrência e distribuição de
uma integração campo/cidade, seguindo
triatomíneos,
e
modelo observado nas demais regiões
peridomiciliar, na região de Olhos
do Triângulo Mineiro e de Minas
d’Água, zona rural do município de
Gerais: pequenas propriedades em uma
Uberlândia (MG).
faixa exígua de terra e um grupo menor
O
em
nosso
em
município
meio.
nível
de
intra
Uberlândia
está
população
em
de
Uberlândia
1999,
em
foi
491.097
com grandes propriedades (SOARES et
localizado no Extremo-Oeste do Estado
al, 1988).
de Minas Gerais, no "Domínio dos
A região de Olhos d’Água situa-se ao
Planaltos
norte do município, próxima ao Vale do
e
Chapadas
da
Bacia
2
Sedimentar do Paraná" (4.040 Km ).
Rio Araguari e apresenta uma paisagem
Apresenta uma altitude entre 850 a 970
com relevo fortemente ondulado (500 a
metros, sob as coordenadas geográficas
700 m de altitude), com manchas de
de 180 55'23" Latitude Sul e 480 17'19"
solos bastante férteis, entrecortadas por
Longitude Oeste. O clima é tropical
fragmentos de matas. Trata-se de uma
chuvoso,
A
extensa área rural, considerada um dos
precipitação média anual é de 1500-
principais centros de abastecimento
1600mm, com forte concentração de
alimentar da cidade. Entre as atividades
chuvas nos meses de dezembro a
desenvolvidas na região, destacam-se: a
fevereiro. A temperatura média mensal
horticultura, a plantação de milho e a
com
0
inverno
seco.
0
varia de 20,9 C a 23,1 C e o período
pecuária. A região é dividida em
mais quente do ano se estende de
localidades, de acordo com os córregos
outubro a março. A vegetação é típica
que a atravessam e que lhe dão nomes.
de cerrado e a hidrografia bastante rica
No presente trabalho foram investigadas
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domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
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as seguintes localidades: Olhos d'Água,
Nas situações em que os moradores
Tenda (incluindo Lajem e Cocal),
relatavam a ocorrência de “barbeiros”
Mangue e Pindaíba.
na casa, mas a pesquisa de vetores
foi
resultava negativa, foram fornecidos
avaliada no período de março a outubro
frascos coletores para que os próprios
de 1999. Todas as propriedades rurais
moradores procedessem à colheita,
(sedes) localizadas na área de estudo
sendo considerados somente aqueles
foram investigadas, sendo realizada
espécimes capturados durante o período
uma única inspeção em cada sede. As
de realização do trabalho.
pesquisas foram realizadas nas casas
Para efeito de análise, as moradias
(intradomicílio) e em anexos como
foram classificadas de acordo com o
galinheiros,
currais,
tipo de construção, como se segue:
outros
TIPO 1 - construção de alvenaria, com
A
ocorrência
de
triatomíneos
chiqueiros,
depósitos,
paióis,
entre
(peridomicílio).
paredes rebocadas, contra-piso e piso,
Para captura dos insetos, utilizou-se o
com forro e teto com telhas de barro ou
método seletivo - busca manual com
fibrocimento; TIPO 2 - construção de
pinça (SUCAM, 1980), mas sem a
alvenaria ou de madeira, com ou sem
utilização
paredes
de
desalojante
químico.
rebocadas
ou
chapiscadas,
Exemplares vivos ou mortos e ecsúvias
contra-piso ou piso, sem forro e teto de
foram colhidos, sendo acondicionados
telhas de barro ou fibrocimento; TIPO 3
em
devidamente
- casa de madeira, palha ou sapé; sem
rotulados (local, data, hora, coletor) e
piso; sem forro; teto de zinco, palha ou
remetidos aos Laboratórios de Zoologia
outros.
e de Parasitologia da Universidade
Foram investigadas 82 sedes (fazendas e
Federal
sítios),
frascos
coletores,
de
Uberlândia
para
totalizando
domiciliares
foi conduzido por uma equipe de quatro
anexos). Os principais anexos observados
investigadores,
todos
foram depósitos, entulhos, galinheiros,
treinados.
proteção
Para
individual
domicílios
unidades
identificação específica. Esse trabalho
devidamente
(82
464
e
382
chiqueiros e currais (Tabela 1).
foram observadas normas gerais de
Chiqueiros, galinheiros e paióis são
biossegurança (uso de botas, luvas,
considerados
os
principais
anexos
pinças, etc.).
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domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
colonizados
por
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triatomíneos.
hábitats para a população de vetores da
CARNEIRO et al. (1986), em trabalho
Doença de Chagas. Para DIAS & DIAS
realizado
(1982),
em
Douradoqua ra
(MG),
tais
anexos,
especialmente
verificaram que esses mesmos anexos
aqueles utilizados para armazenamento
eram os mais freqüentes na localidade.
e proteção de equipamento, fornecem
De acordo com SERVICE (1991), a
esconderijos
manutenção
insetos.
de
currais
nas
favoráveis
a
muitos
proximidades do domicílio propicia
Tabela 1
Unidades domiciliares pesquisadas para presença de triatomíneos, segundo localidades
rurais da região de Olhos d’Água (Uberlândia, 1999)
Unidades Domiciliares
Mangue
CASAS (Sub-Total)
13
Chiqueiro
Curral/Cocheira/Estrebaria
Depósito
Entulhos(2)
Galinheiro/Ninho de galinha
Garagem
Paiol
Outros(3)
(Sub-Total)
Total
(1)
(2)
Tenda, Lajen e Cocal.;
Telhas, tijolos,
porão (6), lavanderia (4), palmeira (2).
Olhos
d’água
04
06
07
17
10
09
03
04
03
59
72
madeiras, etc;
Localidades
Pindaíba
Tenda(1)
Total
48
82
17
03
11
02
09
01
17
04
12
03
10
01
03
02
06
02
07
18
75
22
92
(3)
Outros: Casa anexa e/ou
40
60
16
34
56
91
38
64
44
66
11
18
17
29
08
20
230
382
278
464
em construção (8),
Foram identificados cinco domicílios
1,7%. Segundo MACHADO et al.
infestados por triatomíneos, o que
(1999), as sedes positivas naquele
resulta em um índice de infestação de
estudo incluíram algumas das áreas por
6,1%. Esse valor pode ser considerado
nós pesquisadas, particularmente
elevado para a região, já que em
Córrego
trabalho realizado pela CEMIG (1998),
(equivalentes ao Mangue), tendo havido
envolvendo
concordância também em relação às
371
sedes
rurais,
foi
verificado um índice de infestação de
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essas
das
espécies
Viúvas
de
e
o
Cocal
triatomíneos
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encontradas: T. sordida e R. neglectus
neglectus, tendo encontrado essa última
(Tabela 2).
espécie em alta densidade e ampla
Em Uberlândia, T. infestans, T.sordida,
distribuição. Segundo SILVEIRA &
P. megistus e R. neglectus foram
VINHAES (1998), no ano de 1997, T.
consideradas
sordida
as
espécies
mais
foi
o
triatomíneo
mais
importantes para o período 1975/1983
capturado, em todo o Brasil, sendo que
(SILVEIRA
et
1984).
Minas Gerais foi o Estado com maior
Posteriormente,
MACHADO
(1999)
número de capturas, no período 1993-
al.,
confirmou a presença de T. sordida e R.
1997.
Tabela 2
Triatomíneos capturados, segundo locais de captura, número de exemplares
e formas de vida na região de Olhos d’Água (Uberlândia, 1999)
Área
Capturas
Intradomicílio
Peridomicílio
Parede
Chão
Garagem
Casa anexa
Mangue
(-)
(+)
(-)
(-)
Mangue
(-)
(-)
(-)
Mangue
(-)
(-)
Tenda
(+)
Tenda
Triatomíneos
Formas de Crescimento
Espécimes
Ninfa
Adulto
Ecsúvia
01
(-)
(+)
(-)
(+)
01
(-)
(+)
(-)
(+)
(-)
01
(-)
(-)
(+)
(-)
(-)
(-)
01
(-)
(+)
(-)
(+)
(-)
(-)
(-)
02
(-)
(+)
(-)
Olhos
dÁgua
(-)
(-)
(-)
(-)
00
(-)
(-)
(-)
Pindaíba
(-)
(-)
(-)
(-)
00
(-)
(-)
(-)
Espécie
Triatoma
sordida
Rhodnius
neglectus
sp1
Rhodnius
neglectus
Triatoma
sordida
-
(+) = presença, (-) = ausência; sp1 = espécie triatomínica não identificada.
Para FORATTINI (1980), o centro de
intradomicílio (COURA, 1993). Em
endemismo de T. sordida seria o
1997, T. sordida foi o triatomíneo mais
cerrado. T. sordida tem seu ecótopo
capturado,
silvestre nas cascas secas de árvores,
(SILVEIRA & VINHAES, 1998). Já R.
mas já é considerada uma espécie semi-
neglectus
é
tipicamente
silvestre,
domicilar, dada a frequência com que
habitando
principalmente
palmeiras
tem sido encontrada no peri e no
(SCHOFIELD & DUJARDIN, 1997),
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em
todo
o
Brasil
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domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
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mas também pode estar presente no
sordida foi Minas Gerais, para o
intra e no peridomicílio, que geralmente
período 1993-1997. FERNANDES et
alcança através do vôo. (ARAGÃO,
al. (1995) demonstraram claramente o
1981;
al., 1979).
perfil de ocupação de vazios ecológicos
Encontros ocasionais de triatomíneos
no município de Porteirinha (MG),
adultos no peri ou intradomicílio na
onde, em 1979, as espécies mais
região Amazônica foram atribuídos à
encontradas eram T. infestans (10368),
atração
ou
T. sordida (1606) e P. megistus (284) e
habitação
após borrifação de 10921 casas e 11332
mecanicamente através de lenhas ou
anexos, foram capturados apenas 8
folhas de palmeiras (COURA, 1990). O
exemplares de T. infestans, em 1991,
mesmo pode ser admitido para as
contra 3085 espécimens de T. sordida e
espécies
2 T. pseudomaculata, em 1993.
FORATTINI
dos
conduzidos
et
insetos
até
pela
a
identificadas
luz
no
presente
estudo, uma vez que a construção de
Convém
anexos de madeira com cobertura de
domicílios
infestados
folhas de palmeiras, bem como a
pesquisa,
apresentaram
utilização de lenha para o fogão são
espécies
práticas bastante comuns na região de
intradomicílio. Na região de Porteirinha
Olhos d’Água., no qual a espécie se
e Serra do Ramalho (MG), DIOTAIUTI
abrigaria em cascas de árvores secas
et al. (1995) demonstraram que T.
(ecótopo silvestre).
sordida já se encontra adaptada ao
Em Minas Gerais, a recolonização de
peridomicílio, tendo galinhas como
áreas originalmente ocupadas por T.
principal fonte alimentar. Esses mesmos
infestans,
autores
secundárias
por
espécies
de
em
60%
na
presente
ambas
triatomíneos
ressaltam
que
T.
dos
as
no
sordida
encontra uma certa dificuldade na
com
formação de colônias intradomiciliares,
SILVEIRA & VINHAES (1998), no
o que pode justificar o fato de terem
ano de 1997, a espécie de triatomíneo
sido encontrados apenas exemplares
mais capturada em todo o Brasil foi T.
isolados
sordida, seguido por T. brasiliensis e T.
pesquisa.
pseudomaculata, sendo que o Estado
A maioria das casas pesquisadas era do
com maior número de capturas de T.
Tipo 2 ou do Tipo 1 (84,2% e 13,4%,
De
triatomíneos
que
é
preocupante.
de
outras
notar
acordo
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
da
espécie
na
presente
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Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
Hélica Silva Macêdo
Oswaldo Marçal Junior
respectivamente), resultado, à primeira
cria
vista, paradoxal, por se tratarem das
alguns
melhores habitações. COURA (1993),
deslocamento de outros. De fato, existe
entretanto, ressalta que triatomíneos
uma tendência de adaptação de vetores
podem invadir casas que apresentam os
a espaços de vegetação mais aberta
melhores padrões, uma vez que essas
(devastadas), o que possibilita sua
invasões dependerão exclusivamente da
chegada
forma como a população se comporta.
(WALSH et al., 1993). Além disso, o
Assim, mesmo casas de ótimo padrão
desalojamento de espécies vertebradas
podem ser atingidas, se o morador não
silvestres provoca uma forte pressão
possuir hábitos de higiene suficientes
sobre a fauna triatomínica silvestre, no
para evitá- las. Por isso mesmo, nem
sentido
condomínios e prédios de alto nível
alternativas de alimentação, encontradas
estão fora do alcance da população de
no intra e no peridomicílio (COURA,
triatomíneos, uma vez que esta invasão
1990).
está relacionada ao encontro de abrigos
O controle de T. infestans tem sido bem
propícios e não necessariamente às
sucedido, mas os resultados não são tão
características da construção.
animadores, quando se considera que o
Fatores
altitude,
do
ambiente
temperatura
desempenham
físico,
e
importante
como
umidade
papel
na
novas
“vazio
condições,
insetos
às
de
e
favorecendo
permitindo
habitações
se
adaptar
ecológico”
o
humanas
à
fontes
produzido
pela
erradicação dessa espécie possibilita a
recolonização
por
demonstrado
fatores sociais (ação antrópica) tem
brasileiras (DIAS, 1994b; SCHOFIELD
caráter determinante na manutenção da
& DUJARDIN, 1997; SILVEIRA &
endemia (DIAS, 1994a). A intensa
VINHAES, 1998). Em São Paulo, onde
atividade agropecuária vem provocando
T.
uma drástica diminuição das áreas
referentes ao município de Guaíra
naturais em quase todo o Triângulo
(período
Mineiro, onde o Cerrado já sofreu
elevado potencial de domiciliação para
redução da ordem 70% (MACHADO et
T. sordida e R. neglectus (FORATTINI
al, 1998). Segundo SERVICE (1991), o
et al., 1979). FERNANDES et al.
desmatamento para propósitos agrícolas
(1995)
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
de
várias
fato
epidemiologia da DC; no entanto, os
infestans
em
outras,
regiões
foi erradicada, dados
1972-1978)
indicaram
demonstraram claramente o
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Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
Hélica Silva Macêdo
Oswaldo Marçal Junior
perfil de ocupação de vazios ecológicos
humanos (BARRETO, 1963). Assim, de
no município de Porteirinha (MG), com
todas
a substituição de T. infestans por T.
reservatórios,
sordida e T. pseudomaculata. Como
representam os de maior importância na
não houve qualquer registro de T.
manutenção da endemia (BARUFFA,
infestans em Olhos d’Água, embora os
1986). No caso dos gatos, mesmo
moradores rela tassem sua ocorrência no
apresentando baixas taxas de infecção, a
passado, acreditamos a ocorrência de T.
sua associação com o ciclo domiciliar
sordida e
está principalmente relacionada com
de
R neglectus esteja
as
espécies
o
de
cão
mamíferos
e
o
gato
associada também a essa ausência.
seus hábitos errantes (WISNIVESKY-
Entre os animais criados nas propriedades
COLLI et al., 1987).
pesquisadas,
A criação de porcos e aves também foi
destacaram-se
cães,
galinhas, porcos e gatos (Tabela 3).
significativa
na
área
rural,
sendo
mantidos quase que exclusivamente no
peridomicílio.
Tabela 3
Segundo
BARRETO
(1963), a infecção natural do porco já
Tipos de animais criados pelo grupo
pesquisado (Uberlândia, 1999)
TIPO DE
PROPRIEDADES
CRIAÇÃO
RURAIS
Cachorro
66
Galinha
69
Gato
26
Papagaio
03
Pombo
0
Porco
44
Outros**
10
Nenhum
04
*
Respostas múltiplas
**
Angola, canário, cavalo, codorna, ganso, pato,
peru
havia sido detectada em 1940, mas seu
papel como reservatório doméstico
precisava
ser
Atualmente,
demonstrou
melhor
estudado.
VALENTE
a
colonização
(1999)
de
P.
geniculatus em chiqueiros na área de
várzea no município de Muaná (PA),
onde
três
examinados)
porcos
(2,85%
apresentavam
dos
infecção
natural por T. cruzi. De acordo com
Desde os primeiros trabalhos de Carlos
Chagas, já havia sido ressaltada a
importância epidemiológica do cão e do
gato, principalmente, pela transmissão
do T. cruzi pelo T. infestans que
também
convive
nos
domicílios
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
SERVICE (1991), em rebanhos de
suínos, caprinos, bovinos e eqüinos,
geralmente a proporção de repasto
sangüíneo é pequena (< 1 – 10%), onde
na maioria das vezes é raro que estes
animais estejam infectados por T. cruzi.
Página 61
Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
Por
outro
que
em Olhos d’Água, o que demonstra o
triatomíneos se alimentem de aves em
impacto positivo desse controle na área.
especial as galinhas, que são animais
Por outro lado, tem sido amplamente
com susceptibilidade à infecção pelo
demonstrado
protozoário.
possibilita a ocupação do “nicho vago”
A grande quantidade de aves da zona
por outros triatomíneos (FORATTINI et
rural pode ser outro fator propício à
al., 1979; DIAS, 1994b; FERNANDES
infestação dos domicílios, em especial
et
para
DUJARDIN,
1997;
SILVEIRA
&
alimentar são as aves. Como a fauna
VINHAES,
1998).
Quanto
ao
triatomínica local tem sofrido grande
desmatamento, deve ser ressaltado que a
pressão provocada pela destruição de
atividade agropecuária vem provocando
seu hábitat natural, bem como redução
uma drástica diminuição das áreas
de suas fontes alimentares silvestres, é
naturais em quase todo o Triângulo
possível que a abundância de recurso
Mineiro, o que tende a promover
alimentar representado pelas criações de
desalojamento de espécies vertebradas
animais
silvestres,
T.
lado,
é
sordida,
no
freqüente
Hélica Silva Macêdo
Oswaldo Marçal Junior
cuja
preferência
peridomicílio
esteja
que
al.,1995;
essa
ausência
SCHOFIELD
provocando
uma
&
forte
dos
pressão sobre a fauna triatomínica
triatomíneos às habitações humanas.
silvestre, no sentido da sua adaptação à
Segundo DIAS & DIAS (1982), a
fontes
presença de animais constitui um fator
encontradas no intra e no peridomicílio
epidemiológico importante devido à
(COURA, 1990).
capacidade que alguns possuem em
Os resultados confirmam a ocorrência de
albergar o T. cruzi.
T. sordida e R. neglectus em Olhos
favorecendo
esta
aproximação
alternativas
de
alimentação,
e o
d’Água (Uberlândia, MG), sendo que a
desmatamento são outros fatores que
taxa de infestação observada (6,1%) e o
acreditamos estejam concorrendo para a
encontro
presença de triatomíneos nos domicílios
peridomicílio como no intradomicílio,
investigados. Apesar das campanhas de
demonstram
combate aos vetores da DC não estarem
exploração do ambiente humano, que
sendo feitas há mais de três anos, não
vem sendo favorecida
houve qualquer registro de T. infestans
ocupação do solo desenvolvida na região.
O controle de T.
infestans
Caminhos de Geografia 3(12)50-66, Jun/2004
desses
vetores,
sua
tanto
capacidade
no
de
pelo tipo de
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Distribuição de vetores da doença de chagas em nível
domiciliar: um estudo na zona rural de Uberlândia (MG)
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