TÍTULO: ESTUDO COMPORTAMENTAL DE GEOCHELONE CARBONARIA E GEOCHELONE DENTICULATA EM CATIVEIRO NO PARQUE ECOLOGICO VOTURUÁ DE SÃO VICENTE - SP CATEGORIA: CONCLUÍDO ÁREA: CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SAÚDE SUBÁREA: CIÊNCIAS BIOLÓGICAS INSTITUIÇÃO: UNIVERSIDADE SANTA CECÍLIA AUTOR(ES): MURILO SIMÕES SÁ BARRETO ORIENTADOR(ES): CARLA CRISTINA CAVALCANTE CERQUEIRA, JOÃO ALBERTO PASCHOA DOS SANTOS RESUMO Com o objetivo de estudar o comportamento de duas espécies de quelônios brasileiros em ambiente cativo, o Geochelone carbonaria e o Geochelone denticulata, foram coletadas 40 horas de observações, distribuidas entre os métodos de Ad Libitum e Scan. Os espécimes encontram-se no Parque Ecológico Voturuá de São Vicente – SP, em recinto de exposição. Foi encontrado que o tempo gasto pelos individuos cativos em determinados comportamentos, como repouso (71% em cativeiro), é maior que o observado no animal de vida livre (cerca de 50%), e outros comportamentos, como forrageio (21% do tempo em vida livre), são menos frequentes em cativeiro (cerca de 7%). Os resultados revelam que os espécimes tem seu comportamento natural alterado devido a falta de estímulos naturais do cativeiro e evidencia a necessidade de aplicações de técnicas como enriquecimento ambiental, em prol do bem estar dos animais. INTRODUÇÃO O comportamento é uma das propriedades mais importantes da vida animal e tem papel fundamental nas adaptações e funções biológicas. O comportamento representa a parte de um organismo através da qual ele interage com o ambiente, sendo seu estudo fundamental para o conhecimento das espécies. A beleza de um animal inclui seus atributos comportamentais (SNOWDON, 1999) Animais criados em cativeiros podem apresentar comportamentos diferentes àqueles apresentados na natureza, já que é oferecido a eles um ambiente diferente do qual estão adaptados; onde deixam de enfrentar desafios diários como obter alimentos, fugir de possiveis predadores e a busca de parceiros para acasalar. A perda de tais desafios pode comprometer o bem-estar do animal, que fica sem estímulos físicos e mentais, apresentando comportamento inapropriado ou mostrando-se entediado. Isso ocorre porque estes animais, uma vez em cativeiro, são submetidos a um ambiente artificial, onde na maior parte das vezes não conseguem suprir suas necessidades fisiológicas, psíquicas e comportamentais (BOSSO, 2008). Os zoológicos, ao terem o conhecimento do comportamento atípico do animal, tentam melhorar ao máximo os sintomas desse estresse. O enriquecimento ambiental é um processo muito utilizado nesses casos há algum tempo, e tem obtido resultados positivos ao redor do mundo (CELOTTI, 1990). Sua aplicação consiste em enriquecer o recinto do animal, a fim de proporcionar situações parecidas com as quais viveria em um ambiente natural, amenizando o comportamento de cativeiro (BUMP, citado por OEHLMEYER e SANTOS, 2006). O jabuti pertence ao filo Chordata, classe Reptilia, ordem Chordata, subordem Cryptodira, família Testudinidae gênero Geochelone (HOFLING et al, 1995). A maioria dos Testudinideos são herbívoros e comem flores, sementes, frutos e folhagem. As espécies aqui estudadas são os Geochelone carbonaria e Geochelone denticulata, que são onívoras oportunistas, comendo qualquer coisa que achem no chão da floresta (Zug, 2001; Vitt, 2001; Caldwell, 2001). São popularmente conhecido como Jabuti-tinga (Geochelone denticulata) e Jabutipiranga ou jabuti-das-patas-vermelhas (Geochelone carbonaria), por possuir escamas vermelhas na cabeça e nas patas (FARIA, 2000). Os quelônios, popularmente conhecidos como tartarugas, tem características muito particulares que os diferenciam dos demais répteis. Encontram-se cobertos por uma carapaça muito dura, dentro da qual, podem a maioria deles recolher seus membros e cabeça (BIANCO et al, 1959). Segundo Zug, Vitt e Caldwell (2001), as espécies a serem abordadas vivem preferencialmente em florestas úmidas. Auffenberg (1969) descreve estes animais como ausentes de padrão social definido, principalmente em populações com baixa densidade. Também descreve habito noturno gregário, momento quando descansam, sem locais ou posição de grupo definidas. Fora do agregamento noturno e do nicho de alimentação que compartilham, a interação entre os indivíduos do grupo parece estar limitada a comportamentos e rituais relacionados a corte. Fêmeas e jovens são bem ativos, ao passo que os machos são pouco ativos fora do período de reprodução (Moskovits e Kiester, 1987). De acordo com Auffenberg (1977), a comunicação se da principalmente através de toque, sinais visuais e sinais químicos, demonstrando assim, o variado repertório comunicativo das espécies. OBJETIVOS Geral Estudar o comportamento dos Geochelone denticulata e Geochelone carbonaria em cativeiro. Específico Identificar diferenças entre seu comportamento na natureza e seu compartamento cativo. METODOLOGIA Local de estudo: Os animais a serem estudados se encontram no Zoológico do Parque Ecológico Voturuá, cidade de São Vicente - SP, em recinto de exposição. São ao todo 20 animais, sendo 18 da espécie Geochelone carbonaria, (6 machos , 12 fêmeas) e 2 da espécie Geochelone denticulata (1 macho e 1 fêmea). Todos os animais do recinto são adultos, possuem peso médio de 6,6 Kg e comprimento médio do casco de 44,4 cm. O recinto possui disposição triangular com uma área de 38,52 m² que conta com comedouro, fonte de água, uma área de 8 m² do recinto é coberta por telhado. Coleta de dados: Ao longo do trabalho foram utilizados dois métodos de observação: o Ad libitum, método util para observações preliminares (Altmann, 1974), pois permite o conhecimento prévio do repertório comportamental de um grupo de animais, e o scan, onde foram quantificados os comportamentos encontrados nas coletas preliminares, útil para estudar grupos grandes de animais (Crokett, 1996), o intervalo de tempo usado entre os registros durante o scan foi de 1 minuto. DESENVOLVIMENTO Foram coletadas um total de 40 horas de observação, 20 por Ad Libitum e 20 por Scan. As coletas Ad Libitum foram realizadas entre Janeiro e Fevereiro. Nos dias que foram realizadas observações, o período de coleta foi de 30 minutos. As coletas por Scan foram realizadas do período de Abril até Julho Nos dias que foram realizadas observações, o período de coleta foi de 20 minutos. Segundo Crokett (1996), o horário a ser observado varia de acordo com o interesse do estudo. As observações foram realizadas em período diurno, espaço de tempo identificado como pico de atividade, no horário de maior interesse para as observações. Devido a característica de alta sensibilidade do metabolismo dos répteis em relação a temperatura, se fez necessário o cuidado de observá-los em dias com temperaturas diferentes, mantendo-se uma proporção o mais igual possivel entre os mesmos. Durante os meses de coleta não foram aplicados enriquecimentos ambientais. RESULTADOS Nas coletas preliminares (Ad Libitum) foram encontrados os comportamentos presentes nos indivíduos, Movimentação/Locomoção, que Agressão, foram Forrageio, postos em 5 Corte/Reprodução, classes: Repouso (tabela1). Tabela 1 – Classificação dos diferentes comportamentos observados nos individuos G. carbonaria e G. denticulata durante Ad Libitum. Movimentação/Locomoção Agressão Forrageio Corte/reprodução Repouso Movimentos como se mover para frente, para tras e para os lados, bem como movimentos de esticar ou recolher cabeça e membros. Empurrar, mexer cabeça para cima e para baixo (intimidação entre machos), bater casco frontalmente e lateralmente em outro individuo, morder (cabeça e membros) Comer, beber água, buscar e manipular alimentos Perseguir, vocalizar, balançar cabeça para os lados, montar, apoiar e raspar plastrão num individuo fêmea, bater casco levemente, morder (macho mordendo fêmea na cabeça, membros e cloaca), postura de ovos, cavar, relaxar patas traseiras para fora do casco (fêmea aceita macho) Animal imóvel com membros relaxados ou contraídos, que não está em interação com nenhum outro. No scan (coleta quantitativa) foi encontrado que os animais passaram cerca de 71% do tempo em repouso, 15% do tempo se locomovendo, 7% do tempo forrageando, 5% do tempo em comportamento reprodutivo e 2% do tempo em comportamentos de agressão (figura 1). O tempo em repouso é maior que o observado em espécimes de vida livre, que é cerca de 50%, segundo Moskovits e Kiester (1987). O tempo gasto forrageando e se movimentando, mesmo com a grande maioria dos individuos sendo fêmea (que são mais ativas que os machos) também se apresentou abaixo do esperado. Estes 21% de tempo a mais em repouso deveria estar preenchido principalmente por forrageio e locomoção. Essas diferenças se devem muito provavelmente ao ambiente de cativeiro. Uma vez que não há desafios naturais, como por exemplo, procura intensa por alimento, a necessidade de se defender de um predador ou a longa perseguição de um macho por uma fêmea até sua aceitação ou rejeição, o tempo que seria gasto por estes animais em atividades produtivas é convertido em ociosidade. Corte reprodução 5% agressão 2% Proporção de comportamentos em 20 horas locomoção/ Movimentação 15% Forrageio 7% Repouso 71% Figura 1 –Proporção de tempo gasto em cada comportamento observados. CONSIDERAÇÕES FINAIS É possivel perceber que os animais estudados sofrem alterações comportamentais com a falta de estímulos do ambientais, ainda que seu nível de atividade em natureza seja baixo. Deve-se ter muita atenção a essas alterações comportamentais em animais cativos, tais resultados podem informar que o animal esta sob estresse. Os resultados demonstram a grande importância do uso de técnicas como o enriquecimento ambiental para a atenuação destas diferenças entre cativeiro e ambiente natural, em prol do bem estar animal. FONTES CONSULTADAS ALTMANN, J. 1974. Observational study of behavior. Behavior 49: 227-67, P.L. AUFFENBERG, W. 1969. Social behavior of Geochelone denticulata. Q. J. Fla Acad. Sci. 32: 50-58. AUFFENBERG, W. 1977. Display Behavior in Tortoises. American Soiety of Zoologists 17, 241-250. BIANCO, E.R. et al. Tratado elemental de zoologia. México: Editorial Científica Latino Americana Lários, 1959. 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