É DE PEQUENO QUE SE APRENDE? Promoção da alimentação saudável na Educação Infantil. Organizadoras: Ingrid Wilza Leal Bezerra Maria de Fátima Araújo Michelle Medeiros Vera Lucia Xavier Pinto É DE PEQUENO QUE SE APRENDE? Promoção da alimentação saudável na Educação Infantil. Organizadoras: Vera Lucia Xavier Pinto Maria de Fátima Araújo Ingrid Wilza Leal Bezerra Michelle Cristine Medeiros da Silva Natal, 2009 Àqueles que vivem na doce alegria, num ingênuo folgar. Para essas crianças, estas linhas e muitas tardes fagueiras à sombra de pomares com suculentos frutos. AGRADECIMENTOS Assim como “um galo sozinho não tece uma manhã”, a tecitura deste livro só foi possível pela soma de esforços de um grupo que, a exemplo do galo de que nos fala o poeta, apanhou o seu canto e o lançou a tantos outros. “Os fios de sol de seus gritos” deu o tom e enlaçou o coração das diretoras do NEI Antônia Fernanda Jalles e Judite Borges dos Santos a quem queremos agradecer pelo apoio e carinho dedicados à realização do Projeto. Teceu teias de cooperação e apoio traduzidos nas ações das coordenadoras pedagógicas Nayde Solange Garcia Fonseca e Suzana Maria Brito de Medeiros, na participação efetiva dos professores, no envolvimento dos funcionários e pais que fazem parte desta grande família que é o NEI. Como no canto do galo que “se encorpou em tela, entre todos”, encontramos no Departamento de Nutrição, na Coordenação do curso e nas alunas e alunos os sons e tons, conjunto de coros que afinou/refinou esse canto, preenchendo em musicalidade os nossos dias. E para que “se erguesse em tenda” o nosso sonho, agradecemos por fim àqueles que acreditaram e, pelo seu fomento, tornaram possível essa “manhã”: O conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq; a Pró-reitoria de Pesquisa da UFRN - PROPESQ; e a Pró-reitoria de Extensão da UFRN – PROEX. SUMÁRIO PREFÁCIO 06 APRESENTAÇÃO 08 Parte I A ESCOLA A ESCOLA: NUTRIENTE DOS INFANTES 09 PROMOVER A ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NAS ESCOLAS É LEGAL! Célia Márcia Medeiros de Morais Aretha Alves de Almeida Vera Lucia Xavier Pinto 11 ANTROPOSÓFICAS IMAGENS – OU OUTRAS FORMAS DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR 19 Rachel Tellechea Inda Parte II A PESQUISA A PESQUISA: TEMPO DE PLANTAR 32 EDUCAÇÃO ALIMENTAR E NUTRICIONAL: A FAMÍLIA NÃO É MERA COADJUVANTE Maria Heloísa Medeiros Menezes Genykléa Silva de Oliveira Ana Vládia Bandeira Moreira Maria de Fátima Araújo Vera Lucia Xavier Pinto 34 LANCHEIRAS: PERFIL QUALITATIVO E EVIDÊNCIAS DE RISCOS HIGIÊNCOS SANITÁRIOS Maria Verônica de Morais Oliveira Ana Luíza Araújo do Nascimento Rejane Guedes Pedroza Ingrid Wilza Leal Bezerra 51 A SAÚDE PODE SER MEDIDA E A MEDIDA PODE SER SAÚDE Camilla Lucana Dourado Vieira Luiza Andrade de França Railene França do Rego Emília Carla de Almeida Alcides 65 CRIANÇAS COM NECESSIDADES ESPECIAIS: UM CASO DE TODOS Hayanne Monick Gomes Dantas Lussandra Thais Farias dos Santos Sandra Maria Nunes Monteiro 76 EDUCAÇÃO E NUTRIÇÃO: PERSPECTIVA INCLUSIVA Lívia Maria Rodrigues de Pontes Maria de Fátima Araújo Vera Lucia Xavier Pinto 90 EDUCAÇÃO NUTRICIONAL NA INFÂNCIA: RETALHOS DE VIVÊNCIAS Ivone da Silva Martins Paula Lima Galvão Gomes Kília Lorena da Silva Freitas Maria de Fátima Araújo Rachel Telechea Inda Vera Lucia Xavier Pinto 106 Parte III A ESCOLA E A PESQUISA A ESCOLA E A PESQUISA: TEMPO DE COLHER 144 PLANTANDO SABORES, COLHENDO SABERES. Priscilla Pereira Machado Guimarães Vera Lucia Xavier Pinto Ingrid Wilza Leal Bezerra 145 VIDA, MEMÓRIA E COMENSALIDADE: FRUTOS DE UMA EDUCAÇÃO ALIMENTAR NA ESCOLA. Maria de Fátima Araújo Gilka Silva Pimentel Uiliete Márcia Silva de Mendonça Fernanda Jalles 160 POSFÁCIO 171 REFERÊNCIAS 173 PREFÁCIO Memórias, palavras, gestos e cuidados N a sociedade dos indivíduos, tornou-se usual a estratégia de insinuarse nas histórias de vida de cada um, para tomar parte delas, desde a mais tenra idade. Personalizam-se os anúncios. E os designs milionários de alimentos, de bebidas e guloseimas invadem o cotidiano como mediadores simbólicos da sedução alimentar. Como ajudar a resistir, desde pequeno, ao que é nocivo à saúde? Contra sedução astuciosa, educação cuidadosa! Este livro problematiza com carinho os cuidados e os descuidos com a educação nutricional e focaliza sua relevância na construção de uma identidade alimentar. Por onde começa a aventura do cuidado com a construção de si? Quando se inicia? Onde? Com quem? Essas são questões que, misturadas com sabores, aromas e cores, constroem o enredo da história de um projeto de pesquisa que põe seus primeiros frutos à mesa. Seus personagens-atores-autores vão tecendo em suas reflexões os laços entre as ciências (da educação e da nutrição) e as culturas (escolar, familiar), para abordar as relações que o humano estabelece com os alimentos e evidenciar como a alimentação, na sociedade (de produção e consumo), dá forma, transforma, deforma a identidade ao longo da vida. O momento escolhido para a pesquisa-ação-formação é a infância. O lugar é a escola. Os participantes dos rituais de iniciação da fabulosa aventura da vida alimentar são, aqui, os pais, os professores, os profissionais de saúde. Mas, os heróis da história são as crianças. É com elas que trocam falas, discutem experiências e contam como fizeram os gestos necessários para partilhar o pão e o passo na caminhada em busca do prazer de aprender a se alimentar, desde pequeno, e levar os cuidadores a tomar consciência do processo alimentar como fator determinante na construção de si. 7 As autobiografias alimentares, aqui estudadas, revelam a importância do “tempero da ternura” para realçar o gosto, aroma e textura dos alimentos tatuados na memória. Quem não tem sua “madeleine”? Os cheiros de manteiga da terra... de queijo do reino... de bolo no forno... despertam lembranças sonolentas que insistem em guiar a escolha do prato preferido. Se nós continuamos a comer memórias ao longo da vida, este livro nos ajuda a pensar o desafio pedagógico da educação nutricional e o importante papel da escola, desde a educação infantil, a ajudar a criança, com o apoio dos pais, a construir boas lembranças da mesa. O projeto de pesquisa, desenvolvido no Núcleo Educacional Infantil da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, já não pertence aos seus criadores. Doravante, ele vai fazer carreira sozinho, gerar outros projetos, outras práticas, cumprindo a sua função social de partilhar saberes sobre uma questão que preocupa a todos: a obesidade, considerada como epidemia mundial pela Organização Mundial de Saúde. Foi, portanto, com muito prazer que recebi o convite, e que hoje tenho a honra de prefaciar este livro, que nasceu de um projeto desenvolvido em colaboração com pesquisadores, professores e alunos da UFRN em diferentes instâncias institucionais. Ele retraça as pistas que foram sendo construídas no caminho e traz contribuições notáveis para se pensar, no interior das instituições escolares, a operacionalização da parceria entre os Ministérios da Educação e da Saúde na tarefa conjunta de promover em âmbito nacional a alimentação saudável na escola. Desejamos que a aventura continue e que bons ventos conduzam seus navegantes. São Paulo, 03 de outubro de 2009 Maria da Conceição Passeggi Professora do Departamento de Educação da UFRN Grupo Interdisciplinar de Pesquisa, Formação e Representações Sociais – GRIFARS 8 APRESENTAÇÃO Este trabalho foi fruto de muitas mãos, cabeças e corações. Construído a partir do sonho de abraçar - gesto complexo e atrevido quando se trata de ciência -, foi permeado por uma tecitura que religa saberes, em especial aqueles que fundamentam e alimentam a Pedagogia e a Nutrição. Professores destes dois âmbitos do conhecimento se entregaram à provocação lançada pelos Ministérios da Saúde e da Educação de promover alimentação saudável nas escolas. O bordado em tecido branco foi germinando enquanto nos entregávamos ao pensar e ao fazer, sem contarmos com linhas pré-fabricadas como rota. Fizemos tateando, tirando e colocando cores, perfumes e sabores. O cenário foi a Educação Infantil, porque a interrogação primeira foi: onde começa a aventura de trazer para a construção de si o que há de melhor para alimentar o mundo? Alguém pode guiá-la? Quem? As crianças foram mais que pequenos seres a permear nosso mundo com perguntas. Foram respostas. Muitas. Pensamentos. Inúmeros deles. E, mais que nada, foram artífices da ESPERANÇA ao tatuarem em nós a certeza de que é mesmo desde pequeno, que não somente se aprende, mas também se ensina. O livro que aqui apresentamos é um pequeno recorte do que fizemos. Há muito por dizer, mas somos perseguidos também pela sensação de que já dissemos tudo que devíamos; há também que silenciar, deixar um espaço “morto”, ou adormecido talvez, para que brotem curiosidades, idéias, críticas e reflexões; fatores indispensáveis para a manutenção do diálogo e este livro, nada mais se propõe do que ser uma fala que deseja encontrar o aconchego de outra. Dividimos este trabalho em três momentos: A escola, A pesquisa 9 e A escola e a pesquisa. Em A Escola, procuramos enaltecer o significado deste espaço para aqueles que se iniciam no mundo; sendo ela um nutriente dos infantes pode (e deve) mediar a promoção da alimentação saudável. Nesta parte enfocamos mais especificamente dois aspectos para educar com e para a saúde. O primeiro é revelado no texto Promover a alimentação saudável na escola é legal!. Nele apresentamos uma breve revisão do que dispõe a legislação brasileira sobre o assunto, rememorando desde as primeiras iniciativas municipais e estaduais que manifestaram a preocupação com o tema, até aquelas dos Ministérios da Saúde e Educação que resultaram na portaria 1.010 e no PSE. O outro aspecto abordado nesta seção foi a busca de contribuições a esta temática que já vinham sendo realizadas no cenário da tradição. Encontramos referências a isto na antroposofia e nas práticas realizadas nas escolas Waldorf, apresentadas em Antroposóficas imagens – ou outras formas de alimentação escolar. Em A pesquisa, além de situarmos o cenário e os fundamentos teóricos-filosóficos nos quais foi concebida, apresentamos os principais resultados obtidos nos estudos realizados. Em Educação alimentar e nutricional: a família não é mera coadjuvante estão expostos os resultados de conversas com professores, nas quais esses refletiram sobre as maiores influências na formação alimentar de cada um, e com as famílias apresentando o perfil do seu consumo alimentar. Lancheiras: perfil qualitativo e evidências de riscos higiênico-sanitários, por sua vez, mostra os resultados de investigações que almejavam a observação do caráter qualitativo dos lanches trazidos pelas crianças, bem como a evidência de riscos alimentares devido à utilização ou higienização inadequados. A saúde pode ser medida e a medida pode ser saúde, apresenta o resultado da avaliação antropométrica realizada com as crianças da instituição. Em crianças com necessidades especiais: um caso de todos, discutimos dois estudos realizados com crianças cujo quadro clínico pode favorecer um agravo nutricional. Em Educação e Nutrição: perspectiva incusiva, buscamos compreender como se constrói a competência para o trabalho com pessoas com necessidades especiais. Educação 10 nutricional na infância: retalhos de vivências, traz a análise da Proposta Curricular da escola e os Temas de Pesquisa trabalhados pelos professores do NEI, com contribuições dos nutricionistas para a ampliação de atividades que promovam a alimentação saudável. Finalmente, em A Escola e a Pesquisa apresentamos o bordado quase concluído (como no tecer de Penélope de Ítaca, este trabalho não se finalizará se mãos apaixonadas tiverem a coragem de fazer e desfazer, compreendendo o tempo e a espera como elementos imprescindíveis na chegada do ideal, que, às vezes, pode ser reconhecido pelas cicatrizes). Plantando sabores, colhendo saberes e Vida, memória e comensalidade: por uma educação alimentar na escola se complementam para contar o significado do que foi dito, feito, aprendido, sentido, transformado, a partir de um simples gesto, realizado por professores e nutricionistas de nutrir seus corpos em um abraço. Desejamos uma boa leitura. Vera Lucia Xavier Pinto. Professora do DNUT-UFRN Maria de Fátima Araújo. Professora do NEI-UFRN Coordenadoras do projeto de pesquisa. 11 A ESCOLA 9 A ESCOLA: NUTRIENTE DOS INFANTES. Além da escola ser, como no dizer de Freire, “o local onde se faz amigos”, é também o espaço que abriga, por longo período, aqueles que se iniciam no mundo, acompanhando seu crescimento e desenvolvimento. Ela é uma das mais importantes instituições sociais por promover, a exemplo de outras, a mediação indivíduo-sociedade. Transmissora de cultura, modelos e valores, a escola viabiliza a humanização das crianças, apoiando-as para cultivarem-se, socializarem-se, noutras palavras, educarem-se. Neste caminho, o desenvolvimento da autonomia vai sendo trilhado à medida que elas apropriam-se dos ensinamentos transmitidos pelo mundo que as rodeia. O Núcleo de Educação Infantil (NEI) tem um papel relevante no processo do desenvolvimento infantil, como mediador-dinamizador das experiências e conhecimentos da criança, bem como daqueles acumulados histórica e socialmente pela humanidade. Para assumir este papel, foi definido um conjunto de princípios teóricos a partir dos quais são estruturadas as atividades curriculares: A criança é um ser histórico-concreto, com características, sensibilidade e lógica próprias; O desenvolvimento infantil – em todos os seus aspectos – é um processo construído, dialético, implicando evoluções, involuções e interdependências; O desenvolvimento cognitivo – em todas as suas manifestações: pensamento, linguagem, relações lógicas e topológicas, conceitos e operações – é um processo construído internamente, mediante experiências, interações e ações significativas da criança. Entender melhor como desenvolver a relação escola-vida-saúde em meio a esses princípios foi o propósito deste encontro entre pedagogos e nutricionistas, cujos convidados de honra foram todos aqueles que transitam por este espaço de sonhos e realizações chamado “Escola”, que agora partilhamos com vocês. 11 PROMOVER A ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NAS ESCOLAS É LEGAL! Célia Márcia Medeiros de Morais Aretha Alves de Almeida Vera Lucia Xavier Pinto A educação é, sabidamente, condicionante de modos de vida saudáveis e, tratando-se de alimentação, a escola representa um espaço privilegiado para não somente a formação de hábitos salutares, mas também para a consolidação de identidades culturais alimentares, pedagogicamente construídas (BRASIL, 2006c). Visando identificar os documentos que estabelecem ou dispõem sobre ações e práticas relativas à promoção da alimentação saudável nas escolas, realizamos um estudo de caráter exploratório sobre a legislação pertinente, em âmbito nacional, estadual e municipal, utilizando-se ferramentas da internet, portal “google brasil” (www.google.com.br), utilizando-se como palavra-chave o termo “legislação” e como filtro a expressão “promoção da alimentação saudável nas escolas”. A promoção da alimentação saudável, conforme o Guia Alimentar para a População Brasileira (BRASIL, 2006), tem como pressupostos a ampliação e o fomento da autonomia decisória dos indivíduos e grupos, os quais podem ser favorecidos pelo acesso à informação sobre a escolha e a adoção de práticas alimentares saudáveis, gradualmente construídas desde a mais tenra infância, envolvendo valores culturais, sociais, afetivos, emocionais e comportamentais, portanto, em caráter mais amplo que somente subsidiar as pessoas com informações adequadas, corretas e consistentes sobre alimentos, alimentação e prevenção de problemas nutricionais. Como alerta Santos (2005), auxiliar indivíduos e grupos para a tomada de decisões exige mais que a lógica tradicional da educação baseada na transmissão, centrada nos conteúdos e na construção de mensagens coerentes e aparentemente 12 apropiadas. Os Parâmetros Curriculares Nacionais consideram que é papel preponderante da escola propiciar o domínio dos recursos capazes de levar à discussão de temas transversais como o cuidado com o próprio corpo e à saúde, valorizando e adotando hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida e agindo com responsabilidade em relação à sua saúde e à saúde coletiva (BRASIL, 2004). Nesses cenário e perspectiva, em âmbito federal, surgiu, no ano de 2006, uma publicação conjunta dos Ministérios da Saúde e da Educação, na forma de uma Portaria Interministerial (nº 1.010, de 8 de maio de 2006), que institui as diretrizes para a promoção da alimentação saudável nas escolas de educação infantil, fundamental e nível médio das redes públicas e privada do Brasil, a fim de favorecer o desenvolvimento de ações que promovam e garantam a adoção de práticas alimentares mais saudáveis no ambiente escolar (BRASIL, 2006c). Esse regulamento define alguns eixos prioritários: I ações de educação alimentar e nutricional, considerando os hábitos alimentares como expressão de manifestações culturais regionais e nacionais; II - estímulo à produção de hortas escolares para a realização de atividades com os alunos e a utilização dos alimentos produzidos na alimentação ofertada na escola; III - estímulo à implantação de boas práticas de manipulação de alimentos nos locais de produção e fornecimento de serviços de alimentação do ambiente escolar; IV - restrição ao comércio e à promoção comercial no ambiente escolar de alimentos e preparações com altos teores de gordura saturada, gordura trans, açúcar livre e sal e incentivo ao consumo de frutas, legumes e verduras; e V - monitoramento da situação nutricional dos escolares. Entretanto, o próprio regulamento destaca que urge a efetivação de estratégias e ações relacionadas ao favorececimento de escolhas saudáveis, como aquelas relacionadas à formação dos atores e estruturação dos cenários que protagonizam e ambientam a cena escolar e familiar. A incorporação do tema alimentação saudável no projeto político pedagógico da escola, perpassando todas as áreas de estudo e propiciando experiências no 13 cotidiano das atividades escolares, certamente viabilizará outras ações previstas como: a sensibilização e capacitação dos profissionais envolvidos com alimentação na escola para produzir e oferecer alimentos mais saudáveis – acreditamos que isso significa mais que cozinheiro/merendeiro/nutricionista ou cantineiro/cozinheiro/nutricionista; o desenvolvimento de estratégias de informação às famílias, enfatizando sua co-responsabilidade e a importância de sua participação neste processo – isso, certamente, não significa somente reuniões com os pais e panfletos informativos; a adequação dos locais de produção e fornecimento de refeições às boas práticas para serviços de alimentação, considerando a importância do uso da água potável para consumo – não somente um manual de boas práticas de manipulação e contratação de um responsável técnico; restrição de alimentos com alto teor de gordura, gordura saturada, gordura trans, açúcar livre e sal, devendo desenvolver opções de alimentos e refeições saudáveis na escola – não se trata de um “não” aos alimentos industrializados, pois algumas preparações habituais também podem representar riscos à saúde; promover o consumo de frutas, legumes e verduras – de maneira estimulante, atrativa, prazerosa, compreensiva, educativa. Portanto, a “dez dez” apresenta estratégias que favorecem um ambiente escolar de valorização da cultura alimentar, permitindo a oferta de alimentos mais saudáveis e propiciando a crianças e jovens, pedagogicamente, modos de vida mais saudáveis e mais sustentáveis (BRASIL, 2006c). O Ministério da Saúde e o Ministério da Educação estão trabalhando para fornecer materiais de apoio voltados a profissionais que atuem junto à comunidade escolar, capacitar os profissionais para a implantação, acompanhamento e avaliação de ações e articular parcerias com outras instâncias para o monitoramento das medidas e cumprimento das diretrizes previstas na portaria. Os conselhos locais de saúde, de alimentação escolar e de segurança alimentar e nutricional são parceiros importantes no acompanhamento e controle das medidas propostas pelo documento (BRASIL, 2006b). 14 Constata-se sincronia e complementariedade no que tange à política governamental e de Estado, no que se refere ao fortalecimento e promoção da alimentação saudável nas escolas. Em dezembro de 2007, por decreto presidencial (BRASIL, 2007a), foi instituído o Programa de Saúde na Escola (PSE) objetivando: I - contribuir para a formação integral dos estudantes da rede pública de educação básica por meio de ações de prevenção, promoção e atenção à saúde; II - promover a saúde e a cultura da paz, reforçando a prevenção de agravos à saúde, bem como fortalecer a relação entre as redes públicas de saúde e de educação; III - articular as ações do Sistema Único de Saúde (SUS) às ações das redes de educação básica pública, de forma a ampliar o alcance e o impacto de suas ações relativas aos estudantes e suas famílias, otimizando a utilização dos espaços, equipamentos e recursos disponíveis; IV - contribuir para a constituição de condições para a formação integral de educandos; V - contribuir para a construção de sistema de atenção social, com foco na promoção da cidadania e nos direitos humanos; VI - fortalecer o enfrentamento das vulnerabilidades, no campo da saúde, que possam comprometer o pleno desenvolvimento escolar; VII - promover a comunicação entre escolas e unidades de saúde, assegurando a troca de informações sobre as condições de saúde dos estudantes; e VIII - fortalecer a participação comunitária nas políticas de educação básica e saúde, nos três níveis de governo. O PSE apresenta uma estrutura metodológica definida em quatro blocos: I - Avaliação das condições de saúde, envolvendo estado nutricional, incidência precoce de hipertensão e diabetes, saúde bucal (controle de cárie), acuidade visual e auditiva e, ainda, avaliação psicológica do estudante; II Promoção da saúde e prevenção, abordadando as dimensões da construção de uma cultura de paz e combate às diferentes expressões de violência, consumo de álcool, tabaco e outras drogas, além da abordagem à educação sexual e reprodutiva, e estímulo à atividade física e práticas corporais; III Desenvolvimento de ações de educação permanente e capacitação de profissionais e de jovens; e IV - Monitoramento e a avaliação da saúde dos 15 estudantes por intermédio da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (Pense), em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e do Encarte Saúde no Censo Escolar (Censo da Educação Básica), elaborado e aplicado no contexto do Projeto Saúde e Prevenção nas Escolas (SPE) desde 2005 (BRASIL, 2007a). Em paralelo, o Ministério da Saúde do Brasil, por meio da Portaria nº 3.181 de 12 de dezembro de 2007, define recursos financeiros do Programa Alimentação Saudável para incentivar a estruturação e a implementação dessas ações no âmbito das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, com base na Política Nacional de Alimentação e Nutrição, considerando-se a necessidade de implementar as ações de alimentação e nutrição no âmbito da atenção básica à saúde voltadas à promoção da alimentação saudável, ao apoio e ao monitoramento da situação alimentar e nutricional da população e ao apoio às ações de prevenção e controle da desnutrição e da implementação dos Programas Nacionais de Suplementação de Ferro e Vitamina A (BRASIL, 2007b). Independentemente da regulamentação em âmbito federal, diversas iniciativas estaduais haviam sido registradas, especialmente na região centro-sul do país, incluindo os estados de Rio de Janeiro, Minas Gerais, Distrito Federal, Santa Catarina e Paraná (BRASIL, 2007). Esses regulamentos enfatizam a restrição da comercialização de alimentos com alto teor de açúcar, gordura e sal (PASSOS et al., 2006). A legislação mais antiga encontrada foi a do município de Florianópolis que, em 2001, estabeleceu princípios para incentivar a alimentação saudável nas escolas, por meio da Lei nº 5.853, de 4 de junho de 2001. Posteriormente, com a publicação da Lei Estadual nº 12.061 de 18 de dezembro de 2001, estende os princípios para todo o Estado de Santa Catarina. Além de proibir a venda de alimentos calóricos com baixo teor nutricional, ainda estabeleceu a obrigatoriedade de as cantinas escolares colocarem à disposição dos alunos pelo menos dois tipos de frutas sazonais 16 (PASSOS et al., 2006). O Rio de Janeiro é o único município que possui legislação por iniciativa do Poder Executivo. O Decreto nº 21.217, de 1º de abril de 2002, proíbe, no âmbito das unidades escolares da rede municipal de ensino, adquirir, confeccionar, distribuir e consumir balas, doces à base de goma, gomas de mascar, pirulitos, caramelos, pó para preparo de refresco, bebidas alcoólicas e alimentos ricos em colesterol, sódio e corantes artificiais, destacando a proibição da propaganda desses produtos em âmbito municipal (PASSOS et al., 2006). O Estado do Rio de Janeiro, em 2005, sancionou norma jurídica similar, Lei nº 4.508, de 11 de janeiro de 2005, que proíbe a comercialização, aquisição, confecção e distribuição de produtos que colaborem para a obesidade infantil em bares e cantinas instalados em escolas públicas e privadas situadas no Estado. Os alimentos sem rotulagem, composição nutricional e prazo de validade estão incluídos no rol dos produtos “não permitidos”, vedando igualmente a publicidade desses produtos (PASSOS et al., 2006). A Lei nº 8.650 25 de setembro de 2003, da cidade de Belo Horizonte, estabelece a proibição de escolas da rede pública municipal de ensino, de adquirir, confeccionar, distribuir e comercializar produtos nocivos à saúde infantil. O texto original foi passível de diversos vetos, justificados por razões tais como: seria “papel da escola intervir na liberdade dos pais no direcionamento da formação dos seus filhos”? é possível o impedimento genérico de utilização de corantes, conservantes ou antioxidantes artificiais, já que “alguns conservantes apresentam funções importantes na segurança sanitária do alimento e ainda não existem substitutos igualmente eficientes”? (PASSOS et al., 2006). O Estado do Paraná dispõe de dois regulamentos legais relacionados à alimentação saudável no âmbito escolar: a Lei nº 14.423, de 2 de junho de 2004, que relaciona os alimentos proibidos nos serviços de 17 lanches das unidades educacionais públicas e privadas e estabelece a necessidade de um mural para a divulgação de informações pertinentes à alimentação; a Lei nº 14.855, de 19 de outubro de 2005, além de relacionar os alimentos proibidos, também enumera os produtos liberados para o consumo e estabelece as penalidades para o estabelecimento infrator (PASSOS et al., 2006). Em Brasília, a Lei nº 3.695, de 8 de novembro de 2005, determina a proibição da comercialização de alimentos calóricos pelas cantinas escolares e ambulantes localizados nos arredores das escolas. Ainda proíbe, no ambiente escolar, a publicidade de produtos cuja comercialização seja proibida por essa lei, abrangendo as modalidades de publicidade por meio de patrocínio de atividades escolares, inclusive extracurriculares (PASSOS et al., 2006). Na nossa cidade Natal, a Lei Municipal nº 245, de 16 de agosto de 2006, regula a promoção da alimentação saudável no âmbito das escolas de educação infantil e de ensino fundamental e médio das redes pública e privada do Município do Natal e dispõe sobre padrões técnicos de qualidade nutricional, a serem seguidos pelas lanchonetes e similares, instaladas nas referidas escolas. Proíbe, nesses estabelecimentos, a comercialização, aquisição, confecção e distribuição de produtos que colaborem para a obesidade infantil, incluindo salgadinhos, balas, chocolates, doces a base de goma, goma de mascar, pirulito, caramelo, refresco de pó industrializado, refrigerantes, bebidas alcoólicas, entre outros. Estabelece ainda a proibição de: alimentos contendo mais de 160 (cento e sessenta) mg de sódio em 100 (cem) kcal do produto; alimentos que não apresentam rótulo, ausência de informação nutricional e de prazo de validade. Ainda proíbe a propaganda de quaisquer produtos nas dependências das escolas. O texto legal apresenta equívocos relacionados ao critério de definição de alimento rico em gorduras, pois restringe a oferta e comercialização de alimentos que contenham 03 (três) gramas de gordura em 100 (cem) kcal do produto. Também requer correção no item que trata da proibição de alimentos que contenham corantes, 18 conservantes ou antioxidantes, mesmo que oficiais. Por fim, entendemos que é legal e providencial o respaldo da Lei. Entretanto, implementá-la requer o envolvimento de todos que possam refletir e contribuir sobre a necessária responsabilização, para que a adoção de práticas saudáveis seja um discurso comum nos espaços nos quais a criança circula para aprender, “comer, beber e viver”. 19 ANTROPOSÓFICAS IMAGENS – OU OUTRAS FORMAS DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR. Rachel Tellechea Inda. Para entender a promoção da alimentação saudável nas escolas dentro de uma perspectiva aberta, complexa, não limitante, como era o intuito de nossa pesquisa, buscamos também considerar experiências que já vinham sendo realizadas neste âmbito, dentro de espaços educativos que nutrem uma relação estreita com saberes da tradição. Em especial, abordaremos aqui a interface que pode ser estabelecida entre a educação alimentar e a antroposofia, visando mais que nada, demonstrar respeito pelos vieses não “oficializantes” do educar e interesse por toda prática que possa resultar encantadora para os infantes, que depositam nas suas fadas-professoras seus sonhos mais pueris, seus gostos mais sutis, paladares mais delicados. Não pretendemos aqui (e esperamos que o leitor também não) realizar juízos de valores sobre esta pedagogia, nem adentramos nas discussões teórico-pedagógicas-filosóficas sobre ela. Nosso exercício foi apresentar uma linha pedagógica que se preocupou, (e temos que reconhecer que antes das políticas públicas, da própia Nutrição e ainda da pedagogia) com o fato de que as práticas cotidanas realizadas na escola refelissem a idéia de é necessário nutrir o todo (corpo-alma) e que esta, a escola, deveria ser um espaço onde efetivamente a promoção da alimentação saudável se edificasse. Cremos que só este fato, já nos convida a ler este texto com aquela necessária “suspenção de crenças” de que nos fala David Bohm (2005), para que o diálogo seja realmente rico e humano. Lembrando ainda este autor, diálogo não pressupõe fechamento de idéias; entre as duas partes que dialogam não há vencidos e vencedores (como no debate ou discussão), mas oportunidade de enriquecimento que só experimentamos ao ouvir sem pretensão de julgar. Realizamos este exercício e as idéias da antroposofia presentes neste livro, são um convite. Aberto, como todos aqueles que pretendem ser 20 inclusivos. “Boca livre!”. Antroposofia e a escola Waldoff A antroposofia é uma linha filosófica inaugurada por Rudolf Steiner, no início do século XX. Steiner foi influenciado por Franz Brentano e Wilhelm Dilthey. Tentou, em seu trabalho, superar a ruptura sujeito-objeto. Sua obra consta de cerca de 350 livros e mais de 6.000 palestras que foram estenografadas. As idéias de Steiner foram difundidas em vários ramos do conhecimento, e como não poderia deixar de ser, na área de Educação. A linha pedagógica introduzida por ele em 1919, baseada na sua filosofia, foi chamada Pedagogia Waldorf e foi vivenciada primeiramente em Stuttgart, Alemanha, em uma escola para os filhos dos operários da fábrica de cigarros Waldorf-Astória, o que deu origem a seu nome. Desde o início, destacou-se por ideais e métodos pedagógicos diferenciados e, paulatinamente, contou (e vem contando) com a adesão de pedagogos. As escolas Waldorf foram proibidas no leste europeu até o fim dos regimes comunistas. Atualmente há cerca de mil escolas no mundo inteiro (aí excluídos os jardins de infância Waldorf que existem). Palataicos ensinamentos, diversificados sabores. Por considerar a nutrição educativa e a educação nutritiva, sem concebê-las - educação e nutrição - em separado, a antroposofia enaltece alguns aspectos que abordaremos neste texto. Partem os adeptos de tal abordagem, da perspectiva de que a criança ao ser concebida já inicia seu percurso “palataico” no mundo. Para eles, ao iniciar sua estada aqui, a criança se relaciona com a mãe, seu universo interior, seus ruídos e movimentos. Estar no mundo é alimentar-se, olhar, sentir, ter, não - ter, receber com afeto, com ou sem 21 vínculo. Algumas indagações que permeiam os fazeres dos professores Waldorf são: Há ou não há amor por trás do tempero que chega? Pode-se aprender a alimentar doze sentidos em uma criança? Vale saber que temperamento tem o adulto que conduz e/ou a criança que é conduzida? Existe relação entre uma rotina ritmitizada, a saúde das pessoas e a força de adaptação? A repetição fortalece a vontade? Há funcionalidade nutritiva na poesia, na música, no tricô, na aquarela, no desenho? Deve-se evitar a intelectualização antes da hora? Brincar nutre os sentidos inferiores? Considerando a problemática que gera a necessidade de uma Educação Alimentar e Nutricional e o desenvolvimento de uma Pedagogia repleta de práticas saudáveis promotoras da dignidade e do desenvolvimento integral da pessoa humana, abordadas neste livro; e atentando para o consumo desenfreado de alimentos, de toda ordem, indesejáveis na infância e adolescência, que vem se delineando como imposição cultural, gerando uma “pandemia juvenil” que gesta obesidade, materialismo, erotização, publicidade exacerbada e manipuladora, os educadores antroposóficos buscam desenvolver uma pedagogia com arte, artesanato, cultivadora do que não é imediato, do ato comensal, do bordado, contado, cantado, pintado, esculpido, talhado, tecido, tramado e florido na alma, no corpo e espírito pela música, literatura, teatro e escultura. Este também tem sido o espírito e objeto de estudo de diversificadas pesquisas (TELLECHEA, 2009; FREITAS, 2009; MARTINS, 2009) que foram gestadas nas longas conversas e desejos alimentados pelo aroma deste projeto. Educação dos Sentidos A “boca” para o universo da alimentação Para Steiner, “a organização dos sentidos e dos nervos (ORGANIZAÇÃO NEURO SENSORIAL) forma um sistema unitário dentro do 22 organismo humano. Seu centro é na cabeça, mas se estende por todo o corpo”. Os 12 sentidos nos relacionam com o mundo de 12 maneiras diferentes. Nossos sentidos é que nos dão a percepção do mundo circundante. Estas percepções podem ser organizadas em três domínios da experiência do homem: Percepção do próprio corpo. Percepção da natureza exterior, do mundo. Percepção do nosso próximo, do homem como um ser humano e não como um mero ente natural. Nutrir o TODO, contribuindo para a organização dos seres, implica compreender a linguagem a partir de uma unidade, uma teia, construída entre o físico, o anímico e o espiritual (KÖNIG, 1985, p.78.). Para cada área da percepção existem quatro sentidos formando três grupos: Inferiores, ou Volitivos; Médios, ou Emotivos; Superiores, ou Intelectivos. Nutrir os sentidos inferiores é a principal atividade pedagógica à qual o professor deveria dedicar-se na Educação infantil, segundo a orientação da Antroposofia. Os Sentidos inferiores (Tato, Vital, Cinestésico e Equilíbrio) são os sentidos que agem sobre a vontade e a percepção do próprio corpo relacionando o indivíduo com ele mesmo. É traço comum a estes sentidos “perceberem” os processos que se desenvolvem e se manifestam dentro do próprio corpo. Há interação da vontade e dos impulsos do querer com o mundo circundante. Os processos de percepção deste grupo de sentidos atuam a nível subconsciente. O sentido do TATO propicia: autopercepção junto ao limite corporal, por meio do toque. Segurança pelo contato corporal e confiança. Para o cultivo do sentido do tato na criança é indicado aos pais conseguirem a alternância entre períodos de solidão e proteção; intensificarem o contato corporal carinhoso e a entrega tranqüila do bebê a si mesmo; lembrarem-se de que saber soltar é tão importante quanto carregar no colo amorosamente. Pode ser nocivo para o desenvolvimento do sentido do TATO cuidar-se 23 exteriormente sem verdadeira dedicação interior; permitir-se ao bebê excesso de proteção ou excesso de solidão e que o toque seja realizado mais em função do próprio prazer do que por amor à criança. O tempo de nutrir o sentido do tato nunca se acaba, mas é mais intenso no “império do querer”, quando instintivamente as crianças rolam, rastejam, engatinham, andam tosco (de um jeito livre) e depois cruzado até definirem a lateralidade. O natural e arquetipicamente saudável é que as crianças vivenciem intensamente com seus corpos todos esses contatos corporais com o ambiente em liberdade e com atenção amorosa, essencial propriedade nutritiva para sua vida enfrente. O sentido VITAL, relaciona-se com o aconchego, vivência de harmonia e a sensação de que os processos estão relacionados entre si. Para cultivá-lo é indispensável observar e nutrir o transcurso rítmico do dia, mantendo certa rotina estruturada. A disposição de vida plena de confiança. A vivência da medida certa e do momento certo, isto é, de disposições relacionadas entre si. É essencial proporcionar alegria às refeições. Os educadores antroposóficos consideram desaconselhável ao salutar desenvolvimento do sentido vital que a criança vivencie em seu ambiente educativo situações de brigas, violência, amedrontamento. A pressa e o susto também seriam indigestos, como o descontentamento constante, a falta de medidas (limites), o nervosismo e a falta de reciprocidade no desenrolar dos acontecimentos. O sentido do MOVIMENTO PRÓPRIO - CINESTÉSICO é referente à percepção do próprio movimento, vivência de liberdade e sentimento de autodomínio na execução. Para que este sentido amadureça adequadamente, importa permitir que as próprias crianças se tornem ativas. Arrumar o quarto das crianças de tal modo que tudo possa ser tocado e que possibilite a brincadeira livre. Dificulta a nutrição do sentido do movimento seguir cada passo da criança com proibições; deixar de incentivar sua atividade devido à passividade ou ausência de modelos, bem como a imobilidade diante 24 da tela; o uso de brinquedos automáticos, eletrônicos, fazem dela mero expectador. O sentido do EQUILÍBRIO é a própria vivência do mesmo, da compensação, dos pontos de repouso e da autoconfiança. Para alimentá-lo é indicado brincadeiras de movimento, balançar, andar com pernas- de- pau, saltar e outras atividades similares. É imprescindível conduzir a criança com calma e segurança; é tarefa do adulto almejar e buscar um equilíbrio interno, num sentido de entalhar com próprio punho a autocoerência. É desaconselhável para a criança vivenciar pobreza de movimentos, agitação interior, depressão, resignação, vida entediada, inquietação e dilaceramento interno. Alimento, vincul (ação) e afeto Comida feita em casa A antroposofia aconselha, na educação escolar e familiar, a alimentação mais natural possível; o consumo de frutas típicas, frescas e naturais, aproveitando sempre o que está disponível e mais próximo para compor a alimentação da criança. Outro aspecto importante é que a alimentação seja feita em casa, preferencialmente pela mãe. Para os adeptos desta linha de pensamento, o envolvimento da mãe, no preparo do alimento, possibilita a doação de sua “alma”, pois mobiliza os sentimentos que ela nutre em relação ao seu filho. Para a antroposofia, o indivíduo é concebido como um ser trimembrado: a cabeça relaciona-se com o pensar; o tronco com o sentir; e os membros com o querer. Desta forma, a alimentação também deveria respeitar tal princípio. O consumo de algumas classes de alimentos, para eles, está relacionado com cada parte do corpo. Assim, a cabeça se relaciona com o consumo de raízes; o tronco com o consumo de caules e folhas; e os membros com o consumo de flores e frutos. Segundo eles, esta trimembração na escolha dos alimentos proporciona um equilíbrio. Afirmam que, atualmente, muitas crianças são alimentadas unilateralmente e que é indesejável que qualquer 25 alimento, mesmo sendo saudável e natural, seja consumido dessa forma. Outro aspecto considerado importante, para Steiner, em relação à oferta de alimentos às crianças é a observação de seu temperamento. Para ele, “a noção de temperamento é um das pontes desta [da] interação entre saberes pedagógicos e saberes sobre o corpo” (MUTARELLI, 2006, p. 112). Steiner define quatro tipos de temperamento: colérico, sanguíneo, melancólico e fleumático. O primeiro é próprio daquele que “quer impor o seu eu em todas as circunstâncias; o sanguíneo é volúvel, inconstante e emocional. fleumático, O por sua vez, é aquele indivíduo que “não tem interesse pelas coisas do mundo. Não quer sair do seu interior”. Os melancólicos, “não conseguem dominar o corpo” e são “muito facilmente tocados dolorosa e sofregamente pela vida”. Desta forma, os alimentos ofertados deveriam levar em conta cada uma destas características. Por exemplo: devia-se evitar oferecer alimentos calóricos e excitantes a uma criança cujo temperamento fosse colérico”; os fleumáticos poderiam ser beneficiados pelo consumo de alimentos apimentados, e os melancólicos pelas frutas, por estas amadurecerem em contato intenso com o calor do sol. (STEINER apud MUTARELLI, 2006, p. 68 - 112). Cultivando ritmos Conhecendo ciclos Outro aspecto também abordado pelos pedagogos antroposóficos é a necessidade da alimentação ocorrer de acordo com os ritmos do dia, o que se relaciona à luz; ao amanhecer e entardecer; aos ritmos metabólicos do corpo e do planeta (de acordo com o hemisfério e demais particularidades e variações rítmicas). A escola que segue uma linha antroposófica, trabalha o fato da natureza e o homem se relacionarem por meio dos ritmos, conforme as estações do ano, a sucessão do dia e da noite e as múltiplas trajetórias dos planetas. Todos os ritmos e as relações numéricas regulados pelos trajetos dos planetas em nosso sistema solar são reencontrados nos processos vitais dos 26 vegetais, dos animais e dos homens, revelando a origem comum e a relação de vida. A recompensa, segundo esta linha pedagógica, pelo cultivo familiar desses ritmos diário, semanal, mensal e anual, estruturadamente, em sua cultura interna, é a maior estabilidade da saúde das crianças, bem como uma oportunidade de melhorar a capacidade de adaptação das mesmas. Na nutrição do todo, é indispensável a observância e o cultivo de ritmos, uma vez que os processos vitais estão ligados a certos ritmos e estruturas temporais. No lactente, por exemplo, a organização rítmica das funções é rudimentar e precisa ser estimulada e formada. Do mesmo modo, ao longo da primeira infância vai-se maturando tais funções. O cultivo consciente dos ritmos mais importantes pode preparar, e consolidar, a capacidade do organismo de agüentar as exigências de acordo com as condições de vida. A respiração é uma imagem arquetípica de ritmo. Os ritmos, para esses pedagogos, são base de qualquer processo de adaptação. Qualquer repetição rítmica nunca se iguala exatamente à primeira, mas sempre representa uma folga sutil em torno de um valor médio. Os processos rítmicos têm como característica uma adaptabilidade flexível. Em comparação, um compasso rígido seria totalmente inflexível, sem qualquer capacidade de compensação, de integração. Ritmo substitui força. Tudo que ocorre ritmicamente tem um gasto de energia menor do que acontecendo numa atuação única, fora do tempo habitual ou das circunstâncias habituais. Regularidade e ritmicidade levam à formação de hábitos, estrutura sobre a qual se fundamenta a formação da personalidade e caráter. Quem se habituou a cuidar de horários regulares para comer e dormir; quem está habituado a dividir o dia com sensatez (trabalho e descanso; tensão e relaxamento), atento ao respirar em cada um destes momentos, tem condições de suportar com segurança e eficiência os compromissos da vida cotidiana. Ao nos conduzirmos por tendências momentâneas, sem um ritmo próprio, nos superestimamos e nos esgotamos. Assim, careceremos de flexibilidade para adaptação, força necessária para perseverar e de sensatez para adotar medidas sadias na vida. 27 Qualquer repetição feita conscientemente fortalece a vontade, e assim a prontidão para o bom desempenho. A vida se passa no tempo e no espaço, num ciclo diário de vigília e sono, desde o nascimento até a morte. Vigília é o tempo da vida diurna, ativa, na presença do Sol. O sono é a vida mais passiva, noturna, de cerca de oito horas sem o Sol, mas na presença da Lua e de todo o firmamento. O sono não possibilita percepções sensoriais, sentimentos ou pensamentos; assim ele recupera do cansaço para um novo dia. Papel da escola: alimentos indispensáveis A história A contação de histórias, nas escolas antroposóficas, no final da aula, todos os dias, é nutrimento ofertado pelos professores às suas crianças. Alimento anímico (para a alma), com temperos naturais, e adequados em beleza e tudo o que há de bom no mundo. É alimentação primordial, que sustenta, que oportuniza sustentação, dá “sustança” (sustentabilidade e substância). Uma classe que ouve histórias dificilmente será indisciplinada porque a história tranqüiliza e dá segurança. Contar história requer respeito ao momento da criança, tal qual ela entende e sente o mundo. Ela precisa receber muito a partir desse véu do mundo, que é belo, e através da arte, a contação enfatiza o belo em tudo o que existe na Terra, e eles também se acalmam com tudo isso. As narrativas, na pedagogia antroposófica, são feitas de acordo com a faixa etária, dentro de uma perspectiva muito própria. Por exemplo, dos sete aos nove anos eles estão junto com o mundo, o mundo é animado, as plantas falam, tudo se move. Se a história não for contada tal qual eles entendem o mundo, eles não ficarão quietos, mas apresentarão um comportamento inadequado, porque a vivência da narrativa tem um conteúdo 28 que é inadequado, não é palatável para eles; não nutre e pode ser indigesto. Escutar narrativas possibilita contatar com seqüências de fatos correlacionados, recontá-los oralmente nas retrospectivas do dia seguinte, e/ou escutar os colegas rememorando (uma prática cotidiana na Pedagogia Waldorf) para depois registrar por escrito, desenhando ou aquarelando, dependendo da época, projeto ou proposta planejada. Estas vivências estruturam a maturação de uma escrita clara, coerente e coesa. Inicialmente é a memória que é conclamada, mas essa prática é promotora, para estes educadores, de um caminho para um discurso e escrita organizados. Inicialmente, a criança ouve, aprende a escutar, reconta oralmente, de memória auditiva, utilizando-se da seqüência semântica da história escutada. Lê e conta para ser ouvido, para finalmente escrever. Esses pedagogos são orientados a ter sempre em mente que todo o caminho tem que ser feito com muita dedicação, entendimento e profundidade por aquele que conduz, para surtir efeito e criar elos. A mescla aluno, conteúdo, professor, bem, mal, belo, feio, certo e errado, precisa ser trabalhada com muito zelo, cuidado e delicadeza. Conduzir alguém é algo muito importante. O objetivo da narração de contos de fadas nos primeiros sete anos, entre outros, é ensinar a criança, por meio da imaginação e de maneira lenta, repetitiva, porém progressiva, a representar as imagens conceituais. (PASSERINI, 1998, p.138). Não trata-se de encher um campo vazio, mas de acender um fogo livre, como disse Heráclito. Tesouros espirituais da humanidade, frutos de vivências primordiais da existência humana, os contos de fada e sua atuação têm um efeito inconsciente na alma, pois resgatam, por meio de imagens significativas, o longo percurso do amadurecimento humano na Terra. Não sendo limitados a reproduzir eventos individuais, sua narrativa relata imageticamente o suceder de fatos comuns a todos os homens, descrevendo ricamente sagas que cada 29 um pode reconhecer inconscientemente como sua própria. Nas escolas antroposóficas há a compreensão de que, ligados ao “encanto” de tais narrações, estão o adormecer e o despertar humanos, a alternância rítmica entre sono e vigília; por esse motivo pessoas de todas as épocas e continentes - especialmente as crianças -, sempre reconheceram neles, embora de modo inconsciente, algo afim com sua própria alma. Como autêntico alimento anímico, o conto de fadas sacia a fome interior durante a vida inteira, conferindo vitalidade às imagens anímicas mais recôntidas. Reis, princesas, anões, gigantes – todas essas representações correspondem a profundas realidades interiores do homem; saber interpretá-las requer conhecimento, profundidade de observação e bases na ciência espiritual. A mera intelectualização é perigoso recurso dissecador, capaz de cristalizar a radiante porta ensolarada aberta, ampla e ventilada por essas ricas narrativas. Educar uma criança, contribuindo para seu desenvolvimento integral, implica possibilitar-lhe desabrochar, do âmago do seu ser, suas possibilidades em germe; é, antes de mais nada, respeitar, amar e nutrir seu temperamento. Para conduzir um temperamento precisa-se respeitar o princípio fundamental de que é preciso contar sempre com o que existe e não com aquilo que gostaríamos que existisse. Quando é atiçado na criança o interesse e o amor por uma pessoa pode acontecer, verdadeiramente, um milagre. Uma relação pedagógica fundada em tais bases, acreditam os adeptos da pedagogia Waldorf, pode curar um temperamento unilateral de uma criança. Para a Antroposofia, o adulto, ou seja, aquele que conduz, sempre pode tomar a auto-educação em suas mãos. Compreender os temperamentos com profundidade pode ajudar o professor a decifrar o enigma que cada criança traz. É importante estar preparado para cultivar a harmonia com ela, exercitar a manifestação sincera e verdadeira da compreensão imediata, e não a partir de sermões, exortações, discursos moralistas ou 30 julgadores. Assim não se poderia conhecer o outro. A Antroposofia tem como fundamento a idéia de que cada ser humano deve conhecer um outro ser humano criando na relação constituída a base para o mais belo objeto do propósito da aproximação entre dois seres: o verdadeiro e legítimo amor. Como foi observado, na tradição antroposófica, a educação alimentar assume um papel preponderante nas práticas pedagógicas cotidianas. Buscam estes educadores nutrir o TODO em sintonia com cheiros, ciclos, tempos, climas, almas, ritos e paladares. Segundo esse pensamento, o importante é alimentar. Não somente com alimentos que ofertam nutrientes biologicamente necessários, mas também com aqueles que promovem a existência social. Assim, as cores, a música, os poemas, o pular corda, os desafios verbais, os ritmos corporais, as recitações de somas mnemônicas, e tantas outras vivências perpassam o cotidiano dessa pedagogia nutritiva, que pretende ser a Waldorf. Esperamos que o resumido material aqui apresentado, que reuniu as principais práticas que movimentam o fazer pedagógico desses professores, tentando evidenciar como essas escolas vêm, há muitos anos, promovendo vida saudável, resulte numa provocação. A idéia é promover a reflexão sobre a possibilidade de ampliação do nosso fazer, buscando o enlace entre o tradicional e o moderno, o científico e o popular, o gosto e o valor nutricional, o alimento do corpo e a nutrição da alma, delineados a partir de uma construção pedagógica totalizadora. Minimamente poderemos, a partir desses aspectos aqui abordados, repensar a conjugação de elementos fragmentados em nossa cultura, e falar de nutrição e de promoção da alimentação saudável nas escolas, sensibilizados por uma diet(ética) polifônica (PINTO, 2000), que, para ser alimentada, clama pela abertura a uma perspectiva complexa. 31 A PESQUISA 32 A PESQUISA: TEMPO DE PLANTAR A pesquisa que realizamos foi norteada pelas idéias da complexidade, que têm como ideal o abraço entre as ciências naturais e as ciências do humano. […] a inteligência que só sabe separar fragmenta o complexo do mundo em pedaços separados, fraciona os problemas, unidimensionaliza o multidimensional. Atrofia as possibilidades de compreensão e de reflexão, eliminando assim as oportunidades de um julgamento corretivo ou de uma visão em longo prazo. Sua insuficiência para tratar nossos problemas mais graves constitui um dos maiores graves problemas que enfrentamos. (MORIN, 2003, p. 14) Tratou-se, portanto, de uma pesquisa na qual pesquisadores de diversas áreas trabalham conjuntamente, dentro de uma perspectiva transdisciplinar, visando “tocar” da maneira mais abrangente possível a realidade que nos interessava conhecer e modificar. Quanto aos fins, podemos dizer que foi uma pesquisa de intervenção, que “é aquela cujo principal objetivo é interferir na realidade estudada para modificá-la” (TOBAR; YALOUR, 2001, p. 71), uma vez que desejamos não somente propor a solução de problemas, mas apoiarmos o espaço escolar na sua resolução, efetivamente e participativamente. Quanto aos meios, tomamos a definição de Michel Thiollent (2008) de pesquisa-ação e a utilizamos como parâmetro para nossa investigação, uma vez que reconhecemos que havia um problema a ser estudado e que nós, pesquisadores, deveríamos ter um papel ativo na realidade observada. Ainda em consonância com o conceito de pesquisa-ação, desejamos que as ferramentas e os modelos de solução dos problemas, surjissem a partir da estratégia de problematização. A comunidade escolar foi 33 convocada para discutir os achados, tornando-se protagonista na resolução dos problemas que afetavam aquele espaço educativo. A pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética. O sigilo foi garantido, logo todos os nomes utilizados no texto que agora apresentamos são fictícios. A metodologia foi diversificada, constando de aferição de peso e altura; aplicação de Questionário de Freqüência Alimentar (QFA), registro de 24 horas, observação direta e registro fotográfico das lancheiras, entrevistas biográficas semidirigidas, construção de relatos autobiográficos, preenchimento de formulários, utilização da Escala de Envolvimento da Criança e realização de sessões dialógicas, tendo sido feitas análises quantitativas e qualitativas de acordo com as necessidades de cada metodologia empregada. O Núcleo Educacional Infantil (NEI) é uma escola pública federal fundada em 1979, vinculada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). É uma Unidade Suplementar ligada administrativamente ao Centro de Ciências Sociais Aplicadas e, pedagogicamente, ao departamento de Educação da UFRN. Seu corpo docente em 2007 estava constituído de 32 professores, atendendo neste ano a 255 alunos distribuídos nos turnos matutino e vespertino. A escola objetiva a educação infantil, desenvolvendo ações de ensino, pesquisa e extensão. Apresenta uma clientela formada por crianças em nível pré-escolar e escolar, filhos de pessoas membros da comunidade universitária (professores, estudantes e funcionários). Além disto, trata-se de uma escola inclusiva, uma vez que recebe alunos portadores de necessidades especiais. 34 EDUCAÇÃO ALIMENTAR E NUTRICIONAL: A FAMÍLIA NÃO É MERA COADJUVANTE. Vera Lucia Xavier Pinto Maria Heloísa Medeiros Menezes Genykléa Silva de Oliveira Ana Vládia Bandeira Moreira Maria de Fátima Araújo O primeiro momento da nossa investigação foi o contato com os professores, junto aos quais investigamos quais instituições eram mais relevantes na formação alimentar das pessoas. Em um momento subseqüente, norteado pelos primeiros achados, interessamo-nos em conhecer que alimentos faziam parte da mesa das famílias do NEI. No primeiro contato, o interesse primordial foi discutir a formação alimentar, a primazia do aprendente na elaboração de um saber sobre sua formação, e as suas aprendizagens. Foi abordado o conceito de comportamento alimentar (MOTA; BOOG, 1988) a partir do qual três eixos de análise foram determinados (cognitivo, situacional e afetivo). Esta etapa terminou com a identificação, pelos participantes, de quanto cada instituição que fez parte das suas vidas incidiu sobre estes eixos para a formação do comportamento alimentar. Em um segundo momento os participantes elaboraram suas autobiografias alimentares, visando entrar em contato com sua formação alimentar a partir dos elementos antes trabalhados: o cognitivo, o situacional e o afetivo. A análise qualitativa dos dados foi feita de acordo com a proposta de Schütze (2002). Instituições formadoras de comportamento alimentar: a família como elemento relevante. O comportamento alimentar (MOTA; FABERBOOG, 1988) é um conjunto de todas as ações praticadas em torno da alimentação e vários fatores o influenciam, como o psicológico, sociocultural, educacional e 35 econômico. Estes podem ser estudados esquematizando o comportamento alimentar em três componentes: cognitivo, afetivo e situacional. O componente cognitivo está relacionado com aquilo que o indivíduo sabe sobre alimentos e nutrição, podendo estes saberes ser oriundos da academia ou da tradição. O afetivo corresponde àquilo que sentimos sobre os alimentos e as práticas alimentares; e o situacional diz respeito às condições econômicas, às normas da sociedade em que o indivíduo vive e também à segurança alimentar e nutricional. Ao analisarmos a influência exercida pelas instituições junto aos professores, verificou-se que a “igreja” foi citada como uma instituição que em nada influenciou no comportamento alimentar. A “escola”, paradoxalmente, foi citada como uma instituição que pouco influenciou no componente cognitivo, verificando-se que ela, para estas professoras, não trabalhou pedagogicamente o tema alimentação de modo esperado. Estas afirmações estão similares àquelas encontradas por Pinto (2006), quando analisou as autobiografias alimentares de oitenta e uma estudantes de nutrição, nas quais apenas uma delas afirmou haver se interessado por esta ciência a partir de um trabalho realizado em sua escola. Não pensemos, por isso, que a escola não influencia no comportamento alimentar. Deve-se ressaltar que a merenda escolar, que anteriormente provinha do lar, passou a ser trocada pelas frituras, guloseimas e salgadinhos após a inclusão das cantinas nas escolas. É provável que o trabalho dos professores não tenha contemplado o desenvolvimento de hábitos alimentares pautados em escolhas salutares ou mesmo difundidos conhecimentos acerca dos alimentos, mas as cantinas, dentro dessas escolas, interferiram de maneira negativa nas opções e desejos alimentares dos que passaram por ela. Por esse motivo, devemos ressaltar a importância de um trabalho pedagógico nas escolas tendo a alimentação e nutrição como tema relevante, a fim de tentar constituir ações que promovam e garantam a adoção de práticas alimentares mais saudáveis no ambiente escolar. 36 A família, por sua vez, foi a instituição que influenciou expressivamente todos os componentes do comportamento alimentar – cognitivo, situacional e afetivo. Foi um elemento relevante na “vida alimentar” das professoras, sendo enaltecida em muitos relatos. Ela é apontada como elemento-chave não apenas para a "sobrevivência" dos indivíduos, mas também para a proteção e a socialização de seus componentes, transmissão da cultura, do capital econômico, e das relações de gênero e de solidariedade entre gerações (CARVALHO; ALMEIDA, 2003). Professoras, suas vidas, suas histórias: outra vez a família Autobiografia corresponde a um relato oral ou escrito de toda uma história de vida de um indivíduo, que a desenvolve descrevendo acontecimentos, ações, experiências, sentimentos e emoções. É uma espécie de viagem que o indivíduo faz no interior do seu próprio eu, de modo que haja uma auto-observação crítica e reflexiva. A reflexão envolve o (re)pensar de atitudes, sendo simultaneamente um processo lógico e psicológico, que une cognição e afetividade (ALARCÃO, 1996). Deve ser realizada permanentemente, de modo que o sujeito possa (re)definir o caminho a seguir e, desta forma, assuma um novo modo de agir. Segundo Novoa (1988, p.116), Gaston Pineau considera as histórias de vida um método de investigação-ação, que busca estimular a autoformação, na medida em que o esforço pessoal de explicitação de uma dada trajetória de vida contribui para uma tomada de consciência individual e coletiva. As trajetórias das professoras evidenciaram o quanto as autobiografias são opulentas em se tratando de contextos alimentares, comprovando que a alimentação vai além do ato de conduzir o alimento à boca. Essa é contextualizada pelas crenças, sentimentos, situações, e está relacionada à história de vida de cada ser, e, conseqüentemente às pessoas que ajudaram a construir cada narrativa: “cada hábito alimentar compõe um 37 minúsculo cruzamento de histórias” (CERTEAU; GIARD; MAYOL; 1995, p. 234). Ao observar as trajetórias alimentares das entrevistadas, não foi difícil perceber a importância dada às instituições que fizeram parte das suas vidas. Como escreveu Lahire (2004, p. 44), “falar de si mesmo e do seu passado, é falar das pessoas ou grupos que freqüentaram, das instituições pelas quais se passou e que deixaram marcas subjetivas” (tradução nossa). A família foi a instituição mais evidenciada nas autobiografias, assim como foram no movimento anterior, de preenchimento dos formulários que indagavam quais delas incidiram expressivamente na vida das professoras quando o assunto era formação alimentar. Ela apareceu de forma relevante na construção do comportamento alimentar das professoras, uma vez que operou como espaço de cultivo e difusão de pautas e práticas culturais, bem como aquela organização responsável pela existência de seus integrantes, produzindo, acumulando e difundindo recursos para a satisfação de suas necessidades básicas (CARVALHO; ALMEIDA, 2003). A família foi citada como primordial na construção da comensalidade, na transmissão e perpetuação das tradições alimentares e na relação humana com os outros elementos da natureza. A família e a comensalidade “A célula social básica, a família, provavelmente se estabeleceu no dia em que um homem dividiu o animal que tivesse caçado com uma determinada mulher e seus filhos” (ISHIGE, 1987, p.18); talvez tenha sido assim que esse passou a ser o primeiro grupo com o qual os seres humanos partilham suas refeições. Há cerca de 500 mil anos a.C., a coletivização do fogo, usado diariamente pelo homem para cozer os alimentos, favorecia o consumo comunal e foi provavelmente aí que a função social das refeições e o desenvolvimento da comensalidade tiveram seu início (FLANDRIN; 38 MONTANARI, 1996, p.34). A família é a primeira instituição que imprime fortes marcas no que será o futuro comportamento alimentar de um indivíduo. Os seus membros adultos são responsáveis tanto pela aquisição de alimentos - que pode se dar pela compra, ou extração do meio ambiente -, quanto pelo posterior preparo desses nas casas. Carla, ao falar sobre seus hábitos alimentares remete a este ensinamento familiar: “Meus pais sempre me incentivaram muito a comer saladas, legumes e frutas, coisas que nunca faltavam no cardápio da família”. Desta forma, os integrantes dos núcleos familiares, transmitem, em suas ações cotidianas, seus hábitos alimentares às crianças (GAMBARDELLA; FRUTUOSO; FRANCH, 1999). Segundo Pinto (2006), desde os primórdios os homens caçavam em grupo e a caça era partilhada; plantavam, colhiam e o fruto deste trabalho também era dividido, estando o prazer de fazer e degustar junto sempre presente, desde a obtenção até a preparação do alimento. Os seres humanos não são seres solitários, há uma grande necessidade de se relacionar, constituir vínculos afetivos, ter relações de amizade, viver em sociedade. De acordo com Certeau, Giard e Mayol (1996, p. 250) “comer serve não só para manter a máquina biológica do nosso corpo, mas também para concretizar um dos modos de relação entre as pessoas e o mundo”. Mais importante do que os alimentos que compõem a refeição em si, é a partilha existente no ato de comer junto. É a doação, a participação e a expressão básica da solidariedade recíproca entre cada comensal. Bleil (1998) diz que é crescente a percepção de que há uma grande diferença entre comer, um ato social, e nutrir-se uma atividade biológica. Ampliando o tema em questão, Savarin (1995) elucida a diferença entre o prazer de comer e o prazer de estar à mesa. Enquanto o prazer de comer está envolvido com a necessidade, a fome e o apetite; o prazer da mesa é a sensação refletida que nasce das diversas circunstâncias de fatos, lugares, coisas e personagens que acompanham a refeição; supõe cuidados preliminares com o seu preparo, com 39 a escolha do local e a reunião dos convidados. A família se fez presente nas autobiografias como lócus primeiro da comensalidade: “Na minha infância tínhamos o costume de sentarmos juntos à mesa e nos deliciar com as comidinhas gostosas da mamãe” (Joana). Natália lembra os momentos de comensalidade vivenciados: “Até os 19 anos vivi com meus pais, nesse ambiente as três refeições sempre foram muito valorizadas. Esses momentos, além de ter a função de alimentar, serviam também com o intuito de reunir a família”. Como no dizer de Certeau, Giard e Mayol (1995, p. 266), “a mesa é uma grande máquina social complicada, mas também eficaz: ela faz falar”. O ato de comer junto, além de ter a função de alimentar e nutrir, também é social, é a hora do diálogo, da partilha de experiências; momento no qual se fortalecem os laços familiares e, como não poderia deixar de ser, está permeado por emoções. Vontade, desejo, ansiedade, recordação, todas essas palavras foram encontradas nas autobiografias relacionando-as aos alimentos. A afetividade alimentar, segundo Pinto (2006), se refere à intencionalidade de despertar sentimentos positivos e amorosos através da alimentação. Os mimos alimentares são presentes ofertados que expressam gentileza de um para com o outro, é uma forma de demonstrar carinho, afeição e cuidado. Para Clélia o pai trazia as guloseimas, num ato que demonstrava afetividade para com os filhos: “era com grande prazer que ele, ao chegar em casa batia nos bolsos; esse era o sinal de que tinha algo para nós”. Como diz Silva [2000?], além da necessidade de comer, outras necessidades, fisiológicas e psicológicas solicitam também o interesse e esforço em busca do alimento, não só para o desejo de sobreviver, mas também outros desejos: os físicos e os afetivos. Foi especialmente relatado o papel que as mães exercem na construção do comportamento alimentar e como operadoras da integração da família em torno do ato de comer. O evento inicial de ser amamentado também foi primordial nos 40 relatos. A amamentação é um ato de amor de grande importância para o estreitamento da relação mãe-filho, garantindo assim, as necessidades afetivas, a segurança e o bem-estar do bebê. Não é por acaso que Todorov (1996, p. 73-74) apud Pinto (2000) nos lembra que “a primeira distância em que o bebê pode focalizar seu olhar não é apenas dois centímetros, onde se encontra o seio que deseja sugar, mas de vinte centímetros, onde encontra o olhar da mãe”, evidenciando a necessidade humana de “existir e não apenas de viver [...] [pois] a necessidade de ser confortado não substitui a necessidade de ser alimentado”. O leite humano contém praticamente todos os nutrientes nas quantidades ideais para o lactente nos seus primeiros meses de vida, apresenta um expressivo poder imunológico, mas sua maior qualidade é a capacidade de conjugar alimento biológico e social em um mesmo ato. O desmame precoce, situação na qual o aleitamento materno era substituído pela ingestão de leites de outras procedências explicadas pelo fato da mãe “não possuir leite suficiente” foi muito presente nas histórias, o que demonstra a necessidade de continuar investindo no esclarecimento de aspectos relacionados ao aleitamento materno, sendo a escola um local importante para este fim, uma vez que nela circulam homens e mulheres, inclusive desde crianças, o que pode fortalecer desde cedo a convicção de que este é o melhor caminho para alimentar uma criança.. Tradicionalmente é a mãe quem reconhece e satisfaz cada necessidade do filho, é a mãe quem o amamenta e conforta, quem se mostra atenta às mudanças mais sutis em seu ânimo e bem-estar físico (COWAN, 1987, p.55). A mãe apareceu como protagonista no cuidado com a alimentação de seus filhos se mostrando muito importante na formação alimentar das professoras. “Minha mãe foi muito marcante na minha infância. Apesar da pobreza não nos deixava passar fome. Pescava com as amigas nos rios, fazia farinha, criava e tinha muitas plantações em casa” (Larissa). Tradicionalmente era ela quem estava sempre à frente das preparações culinárias, quem sempre se apresentava com a preocupação e com o zelo em relação à alimentação da família: “Todos os dias pela manhã ela sempre teve o cuidado de fazer tudo 41 fresquinho, na hora. E quando ia pra escola também sempre se preocupou em mandar um lanche saudável” (Andressa). “É a mulher quem tenta responder mais globalmente às necessidades primárias da criança, [...] se responsabiliza pelo cuidado com a higiene [...] e principalmente preocupando-se em proporcionar carinho, agasalho e oportunidade de distração” (DIAS, 1991, p.24). As mães, desde a amamentação, aparecem nas autobiografias como as protagonistas no incentivo aos atos alimentares. Lisete lembra com carinho o fato de sua progenitora sempre ter se apresentado “muito preocupada com a nossa alimentação, em nos apresentar alimentos que nos possibilitassem uma alimentação de qualidade, rica em nutrientes e vitaminas”. Culturalmente, a mulher também sempre esteve mais associada à adequação de preparações culinárias tendo em vista a satisfação das necessidades fisiológicas; tanto das pessoas da família, quanto dos convidados eventuais. Por desfrutar de uma maior intimidade com os filhos, assume, em grande parte, a educação, a formação de costumes, crenças e cosmovisão (DIAS, 1991). De acordo com Certeau; Giard; Mayol (1995, p. 249), “comemos o que nossa mãe nos ensinou a comer, comemos nossas lembranças, as mais seguras, temperadas de ternura e de ritos, que marcaram a nossa primeira infância”. Apesar da inserção da mulher no mundo do trabalho, é ela que ainda assume, na maior parte das famílias, a responsabilidade de cuidar da casa e educar os filhos, cumprindo dupla jornada de trabalho. Segundo Arnaiz (1996, p. 19) “a perspectiva inter-cultural que oferecem alguns estudos antropológicos demonstram que mulheres de todas as sociedades assumem trabalhos dentro e fora do âmbito doméstico” (tradução nossa). A ação de comer junto com outras pessoas não satisfaz apenas a necessidade biológica, mas preenche necessidades simbólicas e sociais (RAMALHO; SAUNDERS, 2000). A comensalidade permeia as relações sociais nas diferentes classes de uma mesma sociedade apresentando sempre uma 42 dimensão cultural (DANIEL; CRAVO, 2005). No seio familiar, a migração no sentido rural-urbano e a escassez de tempo, devido ao trabalho feminino, influenciaram significativamente a maneira de se alimentar dos indivíduos entrevistados, a exemplo da dinâmica ocorrida no Brasil nos últimos 30 anos. A indústria de alimentos foi se aliando a este cenário “facilitando” a vida das pessoas, reduzindo no cotidiano as oportunidades de alimentação em família. Variações outras no estilo de vida desenharam modificações nos hábitos alimentares das professoras, tanto de forma negativa, quanto positiva. A mudança de cidade A mudança de hábito ocorreu também com a professora Larissa que trocou totalmente a alimentação natural que tinha numa pequena cidade do interior por uma alimentação industrializada: “Somente vim ter acesso a produtos industrializados a partir dos onze anos quando fui tirada dos meus pais e fui viver na cidade para trabalhar em casa de outras famílias. Fiquei alucinada quando conheci coca-cola, biscoitos, bolos, pães”. A conseqüência dessa mudança repentina foi imediatamente percebida por ela: “Me sentia péssima, fiquei enorme de gorda”. Esse fragmento mostra como a ingestão de produtos industrializados além de trazer conseqüências indesejáveis para a saúde física das pessoas, interfere na auto-estima dos indivíduos. A família e a tradição alimentar O núcelo famíliar representa para a criança o seu primeiro grupo social. Outras pessoas, paulatinamente, vão adentrando no seu universo (irmãos, parentes, amigos, professores, orientadores espirituais). À medida que esses contatos são estabelecidos ela vai se reconhecendo como constituinte de determinado grupo social, cujas normas e costumes passa, paulatinamente, a assimilar (GRINBERG; LANGER; RODRIGUÉ, 1976). Expressar adesão a um determinado gosto passa a assumir, também, um pertencimento identitário: “Sou um dos membros de uma típica família nordestina, daquelas bem ligadas aos costumes e aos valores do sertão. Meus avôs e, por conseqüência, meus 43 pais, eram donos de propriedades rurais no interior do estado, portanto, é característica nossa preservar à nossa mesa as comidas regionais” (Lisete). Assumir tal pertencimento significa também para Lisete adequar-se a normas e regras, que “servem como rituais instaurados de disciplinas, de técnicas de autocontrole que vigiam a mais insidiosa, diuturna e permanente tentação” (CARNEIRO, 2003, p. 119). “O refrigerante só era liberado aos domingos” (Lisete). Aqui, as regras impostas por alguém da família tinham que ser obedecidas. Pelo fato de os homens não se alimentarem de nutrientes naturais, de princípios dietéticos puros, mas de alimentos culturalizados, [...] os alimentos e os manjares se ordenam em cada região segundo um código detalhado de valores, de regras e de símbolos (LÉVI-STRAUSS, 1968 apud CERTEAU; GIARD; MAYOL, 1996, p. 232), ainda que as tradições alimentares estejam fortemente ligadas à história natural de cada sociedade, isto é, às condições climáticas do local, às espécies vegetais e animais e ao tipo de solo cultivado. A tradição alimentar é dada pela presença de preparo ou consumo de alimentos baseados na força dos hábitos pertinentes a um grupo. Nas autobiografias também foram encontrados alimentos e costumes típicos da região de cada professora, alguns se expressando de forma mais enfática e em outras vezes mais amenas. “Nas nossas férias íamos para o sítio. Comíamos tudo feito na casa da minha tia (cuscuz, bolo, batata doce, macaxeira, coalhada, leite de vaca). Neste discurso, Juliana cita alguns alimentos e preparações que são típicos do nordeste. “Os hábitos e tradições alimentares constituem uma herança cultural [...] que permanecerá tanto no nível consciente das prerrogativas religiosas ou dietéticas como no nível inconsciente das mentalidades e dos gostos coletivos” (CARNEIRO, 2003, p. 122). Muitas vezes a ingestão deste ou daquele alimento está relacionado às crenças que foram construídas por uma sociedade ao longo de sua história, as quais nem sempre estão de acordo com a ciência ou a razão (BLEIL, 1998). A formação do gosto nas diferentes culturas, o status, o prestígio, 44 a pressão publicitária, o aspecto religioso, são alguns dos inúmeros aspectos que orientam as escolhas alimentares. A inserção em novos ambientes é sempre acompanhada do desafio de escolher entre a manutenção dos hábitos arraigados ou a abertura ao novo. A adesão a determinados gostos, discursos e símbolos vai permitindo ao indivíduo uma certa localização e esse posicionamento vai construindo um lugar a partir do qual ele vai falar e ao falar assume uma determinada posição histórica e cultural (PINTO, 2006, p. 240). “Na adolescência passei a freqüentar as casas de amigos da igreja e adquiri outros costumes como comer strogonoff, pizza e engordei bastante” (Juliana). O ingresso no ensino superior, para algumas das professoras foi um momento de mudança de suas práticas alimentares: “Já na adolescência comecei a mudar meus hábitos alimentares, principalmente quando entrei para a faculdade e comecei a comer todos os dias salgados cheios de frituras e refrigerantes ao invés de suco” (Andressa). A inserção no mundo do trabalho também foi um dos elementos apresentados como determinantes no aumento do consumo de produtos industrializados (prontos e semi-prontos) e de rápido preparo. Por outro lado, o casamento e o pertencimento a um grupo religioso foram aspectos citados por algumas professoras como aqueles que contribuíram para a conscientização e mudanças de hábitos, levando a um maior consumo de frutas e legumes e à consciência de evitar os alimentos que podem trazer malefícios à saúde se consumidos em excesso. No caso de Lisete, a enfermidade que a avó adquiriu foi a principal causa para a modificação da alimentação de toda a família: “Depois que descobrimos que minha avó era diabética, possuindo também as taxas de colesterol elevadas, as nossas refeições adquiriram outro olhar, é tudo magrinho, com o mínimo de gordura possível [...]”. A mudança de hábitos alimentares, ocorrida na família de Lisete, pode ter sido imprescindível para a adesão ao tratamento de sua avó, pois o pertencimento grupal é um forte elemento que compõe o momento 45 da alimentação. A família cultural e a cósmica Segundo Leonardo Boff (1997), através de uma visão mais abrangente é possível se pensar em uma “carteira de identidade do ser humano” que confere uma quádrupla identidade: a cósmica, pois somos feitos de partículas elementares que têm a idade do universo; a terrenal, que nos localiza há 3,8 bilhões de anos como formas primitivas de vida que foram se complexificando até nos tornarmos homo sapiens; a cultural, criada a partir de intervenções feitas pelo homem sobre si mesmo e sobre a natureza, e a pessoal, porque cada um possui um nome próprio, representa um ponto onde termina e começa o processo evolutivo. Este pertencimento identitário conscientemente ampliado permite uma maior integração e responsabilização dos seres humanos com a vida. A natureza e os alimentos retirados dela sempre foram muito importantes para a manutenção da vida da Terra. Contudo, é evidente que a utilização desses recursos não está sendo aproveitada de forma cautelosa e inteligente pelos seres humanos. Pinto (2006, p.232) nos lembra que os outros animais garantem sua sobrevivência a partir da utilização dos recursos encontrados, numa simbiose e cooperação que não compromete o estoque à sua disposição. “O homem, ao contrário, mesmo dispondo do conhecimento que permite projetar o fim dos fatores naturais disponíveis, destrói a relação de “parasitismo mútuo”, essencial para a sua permanência na Terra”. A relação entre a alimentação humana e o meio ambiente sempre foi fundamental para a sobrevivência da espécia. No paleolítico, a subsistência era garantida com a coleta de frutos e raízes, a caça e a pesca. No entanto, nem sempre o meio natural era propício ao desenvolvimento dessas atividades: a escassez de alimentos ou a hostilidade do meio levaram grupos humanos à condição de nômades em busca de melhores condições (VICENTINO, 1997). De acordo com Flandrin (1996), foi a partir da era paleolítica inferior, 46 principalmente na Europa, que a caça e o consumo de carne tiveram um aumento significativo. Segundo Vicentino (1997), transformações ambientais ocorridas no paleolítico promoveram a sedentarização de vários grupos. A abundância de alguns vegetais em determinados locais, especialmente aveia, trigo e cevada, impulsinou o desenvolvimento da agricultura.Talvez tenha sido a permanência em uma dessas áreas por tempo suficiente para observar vários ciclos de reprodução que tenha permitido aos seres humanos domesticar os vegetais e iniciar uma produção agrícola controlada e planejada. Mesmo sendo capazes de raciocinar e de saber o seu destino final (a morte), os seres humanos destroem o seu próprio lar de forma catastrófica. A Terra está passando por um processo de aquecimento global, que trará conseqüências graves para o planeta, como a extinção de alguns animais e o aumento do nível do mar, retirando, dessa forma, a harmonia existente entre os seus habitantes os seus recursos naturais. O cuidado com a Terra diminuiu diante da ganância pelo aumento de lucros e pela perversidade do poder humano sobre a natureza, desrespeitando a biodiversidade existente. A integração com o meio ambiente é um elemento importante para a construção da relação humana com os alimentos (Pinto, 2006). Larissa foi a professora que mais experienciou e evidenciou essa ligação com a natureza, como está descrito em sua autobiografia alimentar: “Éramos muito pobres, nossa casa era de taipa, fogão de barro e água de pote, mas tínhamos acesso a coisas muito especiais coletadas na floresta e nos quintais (castanhado-pará, cupuaçu, açaí, pupunha, uxi, mari)”. Na sua puerícia, esta professora vivenciou uma experiência hoje pouco provada pelas crianças das grandes cidades, as quais possuem o computador, a televisão e o videogame como as principais formas de diversão. Assim como ela, Ingrid também contemplou o prazer de ter alimentos procedidos da agricultura famíliar: “Recordo de minha vivência alimentar onde eram priorizados os alimentos naturais da própria plantação da família”. E Juliana afirma ter sentido o prazer de poder “tirar as 47 frutas nos pés (manga, caju, pitomba, goiaba, mangaba, azeitona” (Juliana). As crianças contemporâneas, muitas vezes acreditam que as frutas, hortaliças, as carnes, o leite, entre outros alimentos são provenientes do supermercado. Larissa teve o privilégio de ter a agricultura como forma de subsistência de sua família, sendo esta prática a responsável por produzir alimentos suficientes para alimentá-la. Os alimentos eram retirados diretamente da natureza, frescos e, conseqüentemente riquíssimos nutricionalmente. É irônico afirmar que a agricultura de subsistência, sempre sendo considerada como prática de camponeses, indivíduos pobres e miseráveis, é, e na verdade sempre foi uma fonte de riquezas nutricionais. Entre as várias propostas para promover a Segurança Alimentar e nutricional, a III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional propõe a promoção de agricultura urbana e o fortalecimento de programas de ações relacionadas à aqüicultura e pesca para se tentar buscar melhorias na alimentação do povo brasileiro. Sendo a família o primeiro grupo ao qual a criança pertence, sua importância consiste primordialmente no fato de que é nela que os seres humanos constróem os primeiros vínculos sociais (GRINBERG; LANGER; RODRIGUÉ, 1976). A função da família é transmitir e gerar o afeto, a proteção e a integração, assumindo a responsabilidade de repassar a cultura, os valores, as crenças e a linguagem. Dada a importância desta instituição para a formação das pessoas, fica clara a importância de se fazer uma ação de educação alimentar e nutricional na escola em consonância com ogrupo familiar, pois somente estas duas instâncias conjugadas – família e escola -, podem proporcionar à criança a junção de elementos racionais e afetivos que conformam a alimentação humana. O “Elo Natureza e cultura” foi enfatizado, principalmente pelas pessoas que tiveram, quando crianças, a oportunidade de contatar com outros elementos da natureza, constituindo-se esta vivência como um importante elemento de ampliação do capital cognitivo. Os alimentos ainda tidos como importantes e consumidos atualmente pelas famílias destas professoras são os mesmos cujo hábito de consumo se estabeleceu na infância, quando 48 provinham diretamente da floresta, dos rios e da horta familiar. Isto nos mostra a relevância no cuidado com o meio ambiente para a preservação da dieta tradicional e que este pode ser um caminho importante para a segurança alimentar e nutricional das pessoas. A mesa da família NEI Dada a relevância da família, explicitada nos encontros com as professoras, buscou-se conhecer a freqüência das refeições realizadas pelas famílias das crianças do NEI e os alimentos que integram, normalmente, essas refeições, solicitando aos pais o relato livre dos alimentos ou preparações que, normalmente, constituem as refeições (café da manhã, lanche da manhã, almoço, lanche da tarde, jantar e lanche da noite) que realizam. Os alimentos ou preparações foram relacionados por ordem decrescente de freqüência e distribuídos por grupos alimentares, conforme proposto pela pirâmide alimentar brasileira (P H I L I P P I , 1 9 9 9 ) . Considerando-se os indicadores positivos da alimentação saudável, especialmente no que se refere ao consumo habitual de frutas, legumes e verduras, observa-se que as frutas foram citadas em todas as refeições, com participação importante nos lanches: café-da-manhã (15,6%), lanche da manhã (46,7%), almoço (5%), lanche da tarde (29%), jantar (4%), lanche da noite (26,6%); o consumo de legumes e verduras foi relatado no almoço (18,7%) e jantar (9,7%). Há constatações de que no Brasil, em especial no Nordeste, há maior dificuldade de inclusão de legumes e verduras no cotidiano alimentar das pessoas. Sobre o grupo de leguminosas, o feijão esteve presente nas refeições tipo almoço de 66,2% das famílias, reafirmando este alimento como típico da alimentação brasileira. O guia alimentar para a população brasileira preconiza o estímulo ao consumo de uma porção diária de feijões para favorecer o aporte protéico e de fibras (BRASIL, 2006). 49 Em relação ao grupo de cereais, registra-se a inclusão de alimentos regionais, de grande importância nutricional, no que se refere aos carboidratos complexos e fibras, como cuscuz (18,2% e 45,5%) e tapioca (16,9% e 19,5%), presentes no café da manhã e jantar, respectivamente. No jantar, ainda aparecem outros alimentos regionais, como macaxeira (15,6%), arroz de leite (13%) e inhame (9,1%). Entretanto, observa-se alta freqüência de alimentos fontes de açúcares livres e gorduras saturadas e trans, identificados, particularmente, nas refeições tipo lanches, com predominância de bolos, bolachas, biscoitos e pão, produtos refinados e de alto valor calórico. Alimentos do grupo de açúcares e doces são citados nas seis refeições do dia. O refrigerante aparece no almoço, lanche da tarde, jantar e lanche da noite. Biscoitos recheados e achocolatados são freqüentes no desjejum e lanches. Há evidências convincentes da interrelação entre este tipo de prática alimentar e risco de obesidade e doenças crônicas não transmissíveis como diabetes, doenças cardiovasculares e câncer (WHO, 2006). A família e a escola Na educação infantil é comum que os responsáveis pelas crianças e professoras tenham uma comunicação freqüente em torno do aprendiz que se encontra na escola. Como já foi comentado, a família é o primeiro grupo social do qual o ser humano faz parte e a escola o segundo. Segundo Bassedas, Teresa e Solé (1999, p. 283), “a entrada na escola supõe uma ampliação importantíssima do meio da criança; graças a tal ampliação, pode aceder a novas relações, a novas emoções e a novos conhecimentos”. O envolvimento da família com a escola é significante para o aprendizado dos alunos e um dos grandes desafios das instituições de ensino é a promoção deste enlace, numa perspectivia dialógica na qual se estabeleça uma relação de confiança na qual as trocas proporcionem o compartilhamento das ações de cuidado e educação (FARACHE, 2007). A integração da família 50 com a escola deve promover a possibilidade de um conhecimento maior acerca da criança, de sua vida, de seu comportamento e de como é orientada em diferentes meios, ficando clara as possibilidades e limites de cada instituição em sua educação e o enriquecimento que ocorre quando ambas estabelecem um vínculo. Para a manutenção desse vínculo é necessário que a família participe ativamente da vida da escola, empenhando-se na resolução de seus problemas, sendo colaboradora, opinando acerca das decisões a serem tomadas coletivamente e sendo capaz de apresentar propostas que constribuam para a construção de uma escola melhor. (GUERRA, 2002). López (2002, p. 82) afirma que “a eficácia da educação escolar depende do grau de implicação, ou seja, do grau de participação dos pais”. As práticas alimentares instituídas desde a infância são um pontochave para o entendimento da condição nutricional dos indivíduos adultos. Nesse estudo as professoras demonstraram que a família foi a grande mentora da formação alimentar. Acreditamos ser essencial que a educação alimentar e nutricional nas escolas seja realizada dentro de um processo de coresponsabilização. Ambos ambientes, nos quais a criança recebe ensinamentos, devem promover hábitos alimentares saudáveis. Os pais são os principais atores na formação alimentar dos filhos e a participação, não como coadjuvante, mas como protagonista na cena escolar é essencial para a concretização da educação e do aprendizado dos infantes. Infelizmente, são poucos os pais que colaboram e participam efetivamente nesse processo de integração. Descobrir como a educação alimentar e nutricional pode se constituir em um elemento importante para a aproximação escola-família pode ser um relevante propósito para ações e investigações futuras. Ação! 51 LANCHEIRAS: PERFIL QUALITATIVO E EVIDÊNCIAS DE RISCOS HIGIÊNICO-SANITÁRIOS Maria Verônica de Morais Oliveira Ana Luíza Araújo do Nascimento Rejane Guedes Pedroza Ingrid Wilza Leal Bezerra Entendendo a importância da boa alimentação na infância, desenvolvemos esse estudo com a finalidade de descrever o perfil qualitativo dos lanches consumidos pelos alunos do NEI baseando-nos nas pesquisas de Phillippi et al. desenvolvidas em 1999 e 2003, que apresentam a pirâmide alimentar adaptada para a população brasileira e a pirâmide alimentar para a população brasileira infantil. Propusemo-nos também pôr em evidência os riscos alimentares quanto aos aspectos higiênico-sanitários das lancheiras, visando contribuir para o consumo de um alimento de boa qualidade pelas crianças. A coleta dos dados ocorreu por meio da observação direta e registro fotográfico dos lanches consumidos pelas crianças - cujos responsáveis aceitaram e autorizaram por escrito a participação do aluno - nos dias 17, 18 e 23 de outubro de 2007, proporcionando-nos a elaboração de um panorama geral (painel) dos alimentos trazidos nesses dias pelos alunos, como o lanche nos turnos matutino e vespertino e seus perigos potenciais, bem como os perigos relacionados às formas de acondicionamento e às condições higiênicas dos recipientes e das lancheiras. Realizamos o trabalho com 32 crianças, proporcionalmente distribuídas entre as turmas do NEI de acordo com a faixa-etária e usamos os resultados descritos como ilustrações e subsídios nas discussões subseqüentes com a comunidade escolar, buscando assim, cooperar para o avanço do conhecimento no que diz respeito à educação alimentar e nutricional no âmbito escolar. É consenso entre os Nutricionistas e Pediatras que a alimentação na escola é importante para a criança, pois garante energia para o período de aula, proporcionando-lhe maior capacidade de concentração e memória. Ainda segundo 52 as recomendações dos especialistas e estudiosos no assunto, os lanches escolares devem ser simples, práticos e higiênicos, além de completos em termos nutricionais. Não devem conter excesso de calorias, especialmente aquelas a base de açúcares simples e gorduras saturadas, pois representam refeições intermediárias, que não devem sobrecarregar o processo digestório. Se o lanche oferecido for excessivamente calórico poderá comprometer a aceitação das refeições posteriores, como o almoço ou jantar, dependendo do horário de estudo. No entanto, pesquisas vêm demonstrando que, atualmente, o ambiente escolar contribui de forma sistemática para a adoção de práticas alimentares consideradas não saudáveis para as crianças. A maioria dos lanches vendidos e/ou preparados nas cantinas escolares encontra-se com baixo teor de nutrientes e com alto teor de açúcar, gordura e sódio. (BRASIL, 2007) Os lanches escolares merecem ainda maior atenção quando se trata de sua forma de acondicionamento, principalmente quando os alimentos passam muito tempo expostos a temperatura ambiente, favorecendo riscos de contaminação por agentes químicos (resíduos de substâncias tóxicas), físicos (pêlos, pedaços de vidro, plástico, etc.) ou de proliferação de microrganismos (bactérias, vírus e parasitas), o que pode trazer conseqüências adversas à saúde da criança. Portanto, devemos ter a garantia de que o alimento estará seguro para o consumo na hora do lanche. Quando a criança socializa-se na experiência escolar, o meio em que ela está envolvida, seja na creche ou na escola, influenciará sua forma de lidar e escolher a composição das refeições. Assim sendo, essas crianças precisam receber estímulos positivos no sentido de acostumarem-se com refeições consideradas saudáveis e nutritivas, limitando o consumo de guloseimas a ocasiões eventuais. É necessário também que entendam a importância do lanche para que sejam evitados longos períodos de jejum durante o tempo de permanência na escola, o que poderia prejudicar seu rendimento físico e cognitivo. Dessa forma, é importante que os grupos de alimentos estejam contemplados de modo harmonioso para compor uma refeição saudável, inclusive o lanche escolar. Assim, os guias alimentares apresentam-se como instrumentos para 53 auxiliar nas escolhas mais adequadas, devendo-se atentar para suas limitações. Segundo Barbosa et al. (2005) o estabelecimento de guias alimentares tem a finalidade de orientar a população quanto à seleção, à forma e à quantidade de alimentos a serem consumidos. Para esses autores, a avaliação do consumo alimentar de crianças por meio da pirâmide alimentar desenvolvida por Philippi et al. (1999) poderá servir como guia prático de orientação para nós: pais, educadores e profissionais de saúde, na condução da alimentação infantil de maneira mais conveniente. O que encontramos Analisando os dados coletados percebemos que as idades das crianças variavam de 2 a 8 anos, distribuídas em turmas do nível I ao V, nos turnos matutino e vespertino, como mostra o quadro 01: Quadro 01: Distribuição das crianças do Núcleo de Educação Infantil (NEI) por faixa-etária de acordo com o nível escolar a que pertencem - Natal/ RN, 2007. Faixa etária 2 a 3 anos N° total de crianças 19 Nº de crianças sorteadas 5 3 a 4 anos 30 7 4 a 5 anos 16 4 Nº de crianças sorteadas/ Nível 3 - turma 1 (manhã) 2 - turma 1 (tarde) 1 - turma 1 (tarde) 2 2 2 2 - turma 2A (manhã)* - turma 2B (manhã) - turma 2 (tarde - turma 3 (manhã) 2 - turma 3 (tarde) 3 - turma 4 (manhã) 5 a 6 anos 32 8 6 a 7 anos 23 6 7 a 8 anos 7 2 TOTAL 127 32 2 - turma 4A (tarde) 3 - turma 4B (tarde) 2 - turma 5A (manhã) 2 - turma 5B (manhã) 2 - turma 5 (tarde) 1 - turma 5A (manhã) 1 - turma 5 (tarde) 32 * O registro fotográfico dessas duas amostras foi extraviado do banco de dados. 54 Os tipos de alimentos que mais encontramos foram os industrializados, dentre os quais destacam-se: achocolatados (8,5%), biscoitos recheados (8,5%), bolachas doces (7,0%) e salgadas (7,0%) salgadinhos (6,0%), bebidas lácteas (5,0%) e outros tipos de guloseimas (7,0%). Não houve a presença de refrigerante em nenhuma lancheira que analisamos, enquanto os sucos a base de fruta tiveram um percentual de 23%. Observamos também a presença da fruta in natura (6,0%) e, em menor proporção, alimentos como pão, queijo, bolos, barra de cereal, cereal matinal, doces caseiros, sucos industrializados e água de coco (22%). Corroborando com os estudos que apontam para a mudança do perfil alimentar das crianças e a transição nutricional na contemporaneidade, verificamos que o perfil qualitativo dos lanches consumidos pelos alunos do NEI segue essa tendência atualmente observada, uma vez que há alto consumo de alimentos industrializados. Os estudos de Barreto e Cyrillo (2001); Farias Junior e Osório (2005); Rotenberg e Vargas (2004) e Traebert et al. (2004) mostram a crescente substituição dos alimentos in natura ricos em fibras, vitaminas e minerais, por produtos industrialmente elaborados. Surpreendentemente não encontramos refrigerantes nos lanches analisados, contrariando as referidas pesquisas nesse sentido. Por outro lado, percebemos em quase todas as lancheiras a presença de sucos à base de fruta, porém nem sempre foi possível identificar os que eram feitos com frutas naturais ou com polpa industrializada. Ressaltamos que esses sucos, industrialmente elaborados, também trazem em sua composição uma quantidade excessiva de aditivos químicos e carboidratos simples. O fato de algumas turmas do NEI estarem trabalhando o tema alimentação e as atividades sobre alimentação saudável do projeto “É de pequeno que se aprende?” pode ter contribuído para o não aparecimento dos refrigerantes nos lanches dos alunos. 55 Verificamos ainda a presença de um produto diet (iogurte). Vale destacar que esse tipo de alimento não é o mais indicado para crianças, pois não contém os nutrientes essenciais às necessidades infantis, uma vez que estas se encontram em fase de crescimento. A presença considerável de achocolatados, salgadinhos, bolachas doces e salgadas, biscoitos recheados e outras guloseimas no lanche das crianças do NEI constitui aspecto preocupante, visto que são fatores favoráveis ao desenvolvimento de sobrepeso e obesidade por apresentarem excesso de sódio, açúcares refinados e gorduras hidrogenadas. Pesquisas realizadas em algumas cidades brasileiras apontam que o sobrepeso e a obesidade já atingem 30% ou mais das crianças e adolescentes, como em Recife, alcançando 35% dos escolares avaliados (BALABAN; SILVA, 2001). Dados semelhantes podem ser verificados em um estudo realizado na cidade de Santos, estado de São Paulo, com toda a população de escolares da rede pública e privada, de 7 a 10 anos de idade, em que 15,7% e 18,0% apresentavam sobrepeso e obesidade, respectivamente, sendo os maiores índices verificados em escolares de instituições privadas (OLIVEIRA; FISBERG, 2003). Um fato interessante que verificamos, foi que apenas as crianças menores - compreendidas nas faixas-etárias de 2 a 3 anos, 3 a 4 anos e 4 a 5 anos trouxeram a fruta in natura como opção de lanche, trazendo também suco à base de fruta, o que possivelmente mostra a determinação dos pais na escolha do alimento que compõe o lanche dessas crianças. De acordo com Pipitone et al. (2003) as crianças possuem hábitos de consumo bastante influenciados pela família, contudo, as crianças maiores já experimentaram algum conflito com relação a eles. São notadamente influenciados pelos comerciais, pelo apelo do fast-food e pelos hábitos alimentares ditados pelo grupo de amigos. Assim, provavelmente o momento do lanche como elemento de socialização, de trocas e a influência exercida pelos colegas, além daquela fornecida pela publicidade, podem estar relacionados ao fato de não haver frutas no lanche das crianças maiores, uma vez que estas passam a compartilhar e escolher seu alimento com maior autonomia. 56 Analisando os lanches dos turnos matutino e vespertino separadamente notamos que as lancheiras da manhã eram melhor elaboradas que as da tarde, visto que traziam no mesmo lanche uma maior variedade de alimentos, sendo melhor distribuídos com relação aos grupos de alimentos, apresentando ainda maior qualidade nutricional. Podemos supor vários motivos para explicar tal situação, dentre eles, o fato de que no turno vespertino as crianças já teriam realizado uma grande refeição (o almoço) e por isso possivelmente exista uma menor preocupação com a elaboração de seus lanches; ou ainda pode haver uma certa acomodação por parte da pessoa que prepara o lanche da criança, visto que provavelmente já teve uma manhã de trabalho, muitas vezes cozinhando, manipulando alimentos. Enfim, são várias as suposições, mas seria necessária uma maior investigação junto aos pais para se saber ao certo os reais motivos que justifiquem a situação descrita. Percebemos também que no lanche da tarde predominavam os alimentos doces, enquanto que no lanche da manhã havia maior presença de alimentos salgados. Assim, a maioria das crianças que trouxeram salgadinhos e bolachas salgadas pertencia ao turno matutino; já as bolachas doces (sem recheio), os biscoitos recheados, bem como os doces industrializados e caseiros foram mais frequentes nas lancheiras das crianças do turno vespertino. Os sucos à base de fruta apareceram em maior proporção no lanche da tarde. Por outro lado, a fruta in natura esteve mais presente nas lancheiras da manhã, sendo visto vários tipos de frutas compondo um mesmo lanche. Todas as crianças que trouxeram queijo pertenciam ao turno matutino e o achocolatado também foi melhor visualizado nesse turno. Com relação à análise referente aos grupos de alimentos, baseada na pirâmide de Philippi, Cruz e Colucci (2003), vimos que nos lanches apareceram mais o grupo das frutas (31%), seguido pelo grupo dos cereais (23%), açúcares e doces (20%), alimentos lácteos (17%), óleos e gorduras (7%) e apenas um alimento (suco de soja) foi classificado no grupo dos feijões (2,0%). Não encontramos nenhum alimento do grupo das carnes e ovos, assim como no grupo das verduras e legumes. Vale ressaltar que todos os sucos foram considerados no grupo das frutas, mesmo 57 aqueles que possivelmente eram feitos de polpa industrializada, mas a maioria eram visivelmente elaborados com a fruta natural. Segundo Lanzillotti, Couto e Afonso (2005) a pirâmide elaborada por Philippi apresenta uma série de limitações, uma vez que concentra as gorduras saturadas e insaturadas no mesmo grupo e sugere sua restrição, já que estão alocadas no topo da pirâmide. Além disso, não faz distinção entre os cereais refinados e integrais, alocando-os no mesmo grupo na base da pirâmide; e ainda não subdivide o grupo dos cereais, tubérculos e raízes, o que leva a crer sobre a desatenção dispensada às gorduras hidrogenadas presentes em bolos, biscoitos e outros produtos de panificação. Para os autores esses aspectos são relevantes, uma vez que o consumo de carboidratos refinados, mesmo que moderadamente, pode elevar os níveis de glicose no sangue, estando associados a alto risco de doenças cardiovasculares; enquanto que o processo de hidrogenação pode gerar os ácidos graxos trans que também vêm sendo associados ao alto risco de doenças cardiovasculares por contribuírem com a formação de placas de ateroma no lúmen das artérias. Considerando esses aspectos, acreditamos que existe certa dificuldade em encontrar uma representação que seja de domínio público, o qual tenha potencialmente o poder comunicativo daquilo que se quer transmitir. De fato, a pirâmide não é uma figura muito freqüente no imaginário do povo brasileiro e talvez seja por esse motivo que muitos não a compreendem. Percebemos que há uma dificuldade enorme em entender a argumentação de que os alimentos menos indicados estão no topo, quando a lógica, amplamente difundida nas representações piramidais de extrato social, apresentam os melhores em cima, no topo. Assim, na tentativa de buscar representações mais significativas com relação à alimentação saudável, voltadas ao imaginário infantil, neste trabalho procuramos agrupar as informações obtidas na pesquisa em outras formas geométricas. Fizemos uma representação em forma de prato, contendo os diversos alimentos encontrados nos lanches das crianças. Os alimentos foram organizados de acordo com o grupo alimentar a que pertenciam. O prato foi escolhido, pois nas 58 sociedades ocidentais esse é o utensílio básico utilizado para servir as refeições. Também propusemos representações em forma de lancheiras, por se tratar de um utensílio destinado a alimentação do infante escolar. As representações nas lancheiras oferecem modelos para a elaboração de lanches nutricionalmente equilibrados, a partir dos próprios alimentos observados no momento do registro fotográfico, visto que estes foram agrupados de forma mais adequada. Numa destas lancheiras visualiza-se um lanche composto por bebida láctea fermentada, fruta e biscoito salgado; na outra lancheira pode ser visto o bolo, a bebida láctea e a fruta; já o terceiro lanche proposto é composto de suco de fruta, frutas e pão com queijo. Disponibilizamos todas estas representações para a comunidade escolar em questão, com o intuito de que tais figuras servissem como recursos suplementares para discussões na escola. Quanto à forma de acondicionamento na lancheira observamos vários episódios preocupantes durante a pesquisa como, por exemplo, lancheiras rasgadas, sujas, com presença de formigas, além de algumas delas, apresentarem alimentos acondicionados de forma inadequada. Uma quantidade maior dos alimentos do grupo de cereais e do grupo das frutas estava acondicionada em recipientes plásticos para uso doméstico, enquanto que os alimentos do grupo dos produtos lácteos e dos demais grupos apresentaram, em sua maioria, o acondicionamento em embalagem individual tetrapack ou plástico, confeccionada pelo próprio fabricante. Vimos também que em todos os grupos analisados, os alimentos se encontravam em temperatura ambiente. Analisando mais detalhadamente os riscos alimentares apresentados pelo acondicionamento, percebemos que apesar da maioria dos alimentos pertencentes ao grupo cereais apresentarem a porção acondicionada em recipiente plástico, verificou-se que alguns deles eram acondicionados direto na lancheira, como por exemplo, barra de cereal, biscoitos salgados, bolinhos industrializados. Entretanto, este fato não compromete a qualidade dos alimentos em questão, uma vez que os mesmos possuíam proteção de embalagem externa oriunda do processo de fabricação. Podemos afirmar segundo Azeredo, Faria e Azeredo (2000) que 59 “tradicionalmente, os materiais de embalagens têm sido selecionados no sentido de ter mínima interação com o alimento que acondicionam, constituindo assim barreiras inertes”. É entendido que uma embalagem aumenta a segurança do alimento contra possíveis contaminações, através de mecanismos como “barreiras a contaminações (microbiológicas e químicas) e prevenção de migração de seus próprios componentes para o alimento”. Vale ressaltar, porém, que se os alimentos forem retirados de suas embalagens originais e porcionados em recipientes plásticos sem a adequada higienização podem de alguma maneira representar um perigo biológico para as crianças que os consumirem. É imprescindível lembrar que apesar dos alimentos enquadrados no grupo cereais serem considerados não-perecíveis, portanto, classificados como “estáveis em sua composição, podendo ser armazenados em temperatura ambiente [...]”, é preciso manipulá-los de maneira correta, evitando possíveis contaminações (SILVA JUNIOR, 2002, p. 85). Em relação à apresentação dos alimentos do grupo lácteos (leite fermentado, iogurtes e achocolatados), e do grupo caracterizado como outros alimentos (frituras, sucos industrializados, achocolatados, sanduíches prontos, vitamina de fruta, salgadinhos industrializados e refrigerantes), as porções encontravam-se ou em embalagens individuais (embalagem própria do fabricante) ou em recipientes domésticos (garrafas térmicas infantis ou vasilhames plásticos), o que poderia representar proteção quanto a sua embalagem, já que supomos que os depósitos que esses alimentos estavam armazenados eram previamente higienizados, não oferecendo nenhum risco a criança. Porém, durante o registro fotográfico, observamos a presença de sujidades em algumas lancheiras, bem como em alguns recipientes, comprometendo assim a qualidade do alimento, já que a sujeira representa um risco alimentar, pois a probabilidade da ocorrência de um perigo biológico é elevada. A maioria das porções dos alimentos pertencentes ao grupo das frutas apresentava-se em porções cortadas, que facilita o consumo pela criança, mas que entretanto, aumenta os riscos devido aos perigos de uma manipulação indevida. Pressupomos que os depósitos utilizados para armazená-las, tenham sido 60 previamente higienizados, evitando possíveis contaminações. No que se refere à forma de acondicionamento de sucos na lancheira, a maior parte desses estavam em recipientes aparentemente térmicos. Esses alimentos, por serem considerados perecíveis e propícios à proliferação de microrganismos, precisam estar armazenados em recipientes que preservem a refrigeração numa temperatura estável. Como não foi possível verificar a temperatura dos alimentos que deveriam estar sob refrigeração não podemos afirmar que esses alimentos estavam em temperatura adequada à conservação de seu conteúdo. Durante o registro fotográfico não realizamos a aferição da temperatura das garrafas térmicas que comportavam os líquidos como sucos e achocolatados. Conseqüentemente podemos assegurar que esses líquidos apresentavam temperatura de refrigeração adequada, visto que, as garrafas assim como as lancheiras térmicas poderiam não apresentar eficácia quanto a sua conservação. De acordo com Murmann, Mallmann e Dilkin (2005), “o armazenamento de alimentos em temperatura adequada é imprescindível para mantê-los por períodos prolongados”. Neste estudo verificamos que, os sucos de fruta natural, preparados pelos responsáveis da criança e mantidos fora de uma temperatura de refrigeração adequada, foram os alimentos que apresentaram maiores riscos de contaminação por perigo biológico. É necessário, pois, alertar que em decorrência de suas propriedades físicas e químicas os sucos e produtos derivados de frutas, em geral, possuem uma alta perecibilidade devido a uma maior atividade de água. Santos e Ribeiro (2006) referem que os sucos de fruta natural apresentam o conteúdo de carboidratos bastante elevado, além de terem uma composição rica em ácidos orgânicos e pH entre 2,0 e 4,5, proporcionando uma possível multiplicação de microrganismos deteriorantes, como bactérias ácidoláticas, bolores e leveduras, se não forem acondicionados adequadamente. Mesmo alimentos bem ácidos como sucos de laranja podem apresentar contaminação microbiológica por falha no processamento. Entretanto, a sua elevada acidez oferece um ambiente inóspito e seletivo para um grande número de patógenos 61 (OLIVEIRA et al., 2006). Além das questões apresentadas acima, observamos também os aspectos relacionados às condições higiênicas dos recipientes, onde percebemos a presença de sujidades, principalmente nos gargalos das garrafas, bem como nas tampas. Uma observação que merece destaque foi a visualização “a olho nu” da presença de bolores em alguns recipientes, revelando as condições de higiene precárias dos mesmos e apresentando risco evidente de contaminação por perigo biológico. Para Piragine (2005, p.2), num estudo sobre os aspectos higiênicos e sanitários do preparo da merenda escolar na rede estadual de ensino de Curitiba, “a incidência de doenças transmitidas pelos alimentos é alta em todo o mundo e onde há dados disponíveis torna-se imediatamente evidente que a maioria dos incidentes ocorre em estabelecimentos de serviços alimentares e nas residências”. Portanto, o cuidado com a higienização dos alimentos preparados em casa deve ser rigoroso, evitando assim, a ocorrência de algum dano à saúde das crianças. Observamos ainda os aspectos gerais das lancheiras quanto à higiene e às condições de conservação. Vimos que muitas delas deixavam a desejar quanto à questão higiênica. Verificamos também que algumas lancheiras encontravam-se quebradas e/ou rasgadas, favorecendo a entrada ou o abrigo de insetos, os quais representam perigos físicos e ainda podem evidenciar o risco de contaminação por perigos biológicos. As lancheiras rasgadas, por exemplo, evidenciam o risco de contaminação por perigo físico para a criança, já que o plástico pode ser considerado um risco para a saúde, no momento em que se supõe que aquele plástico possa ser ingerido acidentalmente por alguma criança. Os perigos biológicos possivelmente podem ser encontrados nessas lancheiras, visto que em que muitas delas continham alimentos perecíveis e armazenados de forma inadequada, como exemplo, os sucos de frutas naturais, que se encontravam em temperatura ambiente, ou seja, condição bastante favorável para o desenvolvimento de microrganismos como bactérias e fungos. Outra constatação bem interessante foi a presença de alimentos lácteos expostos a temperatura ambiente, representando 62 assim um risco a saúde, já que, esses alimentos são bastantes perecíveis. O perigo químico foi visualmente o menos perceptível, não significando que ele estaria isento nos alimentos contidos nas lancheiras, pois muitos deles podem receber aditivos químicos acima do normal, como também agrotóxicos e fertilizantes. Roque e Castro (2008) enfatizam que dentre os perigos apresentados os que mais necessitam atenção, principalmente nas residências, são os perigos biológicos devido não serem de fácil diagnóstico, especialmente no início da disseminação microbiana. Isto faz com que o consumidor não perceba e nem tome uma atitude para minimizar o seu efeito. De acordo com Franco (1996) a identificação da qualidade de um alimento utiliza diversos parâmetros, em que as características microbiológicas, sem dúvida, apresentam uma grande importância. “A avaliação da qualidade microbiológica de um produto fornece informação que permite avaliá-lo quanto às condições de processamento, armazenamento e distribuição para o consumo, sua vida útil e quanto ao risco à saúde da população” (FRANCO, 1996, p.149). Assim, a partir dos resultados analisados, concluimos que as lancheiras fotografadas na pesquisa apresentaram várias evidências de risco de contaminação por perigos alimentares, com destaque para os perigos físicos e biológicos. Diante disso, reconhecemos a importância de realizar uma orientação aos pais e responsáveis pelas crianças, sobre o cuidado com o preparo e o acondicionamento dos lanches, pois, sabmos que alimentos contaminados podem causar doenças de origem alimentar, provocando sintomas extremamente desagradáveis, além de comprometer a saúde dessas crianças. Algumas constatações e reflexões Nesta pesquisa podemos notar a prevalência de produtos industrializados nos lanches dos alunos do NEI, com destaque para os achocolatados, salgadinhos, biscoitos com e sem recheio e bebidas lácteas; existindo também a presença de alimentos naturais, como frutas e sucos à base de frutas. Além disso, também encontramos alimentos importantes - fontes de proteínas 63 e cereais - como queijo, iogurte, pão e cereal matinal. Um achado satisfatório e surpreendente foi a ausência de refrigerantes nos lanches das crianças, contrariando as pesquisas atualmente divulgadas. Verificamos também que o padrão de lanche do turno matutino é nutricionalmente melhor que o do turno vespertino, visto que mostra uma maior variedade com relação aos grupos de alimentos. Outro aspecto observado foi que à tarde prevalecem os alimentos doces; enquanto que pela manhã os salgados foram melhor visualizados. Ao se pesquisarmos evidências de riscos para perigos alimentares, observamos que as lancheiras estudadas provavelmente apresentavam um potencial de risco, já que todos os tipos de alimentos encontravam-se em temperatura ambiente, sendo os sucos de fruta naturais e os achocolatados, os alimentos que apresentaram maior risco de contaminação por perigo biológico. Não vimos problemas maiores em relação ao armazenamento em temperatura ambiente dos alimentos referentes ao grupo de cereais, e aos grupos que comportam os doces e salgados, visto que estes são classificados como não-perecíveis, porém é preciso manter condições higiênicas satisfatórias, para minimizar e/ou evitar prováveis contaminações. Observamos ainda a presença de sujidades em algumas lancheiras e recipientes, além de percebermos condições precárias de uso em algumas lancheiras, evidenciando o risco de contaminação por perigos físicos e biológicos, podendo afetar a saúde das crianças. Diante disso, é necessário que apontemos a importância da continuidade do processo de discussão sobre lanche saudável na escola. A Portaria Interministerial MEC/MS 1010, que institui as diretrizes para a promoção da alimentação saudável nas escolas de educação infantil em âmbito nacional, vem a ser o respaldo institucional das ações que devem ser desenvolvidas no ambiente escolar. Iniciativas, como a adoção da alimentação escolar, também podem colaborar com a promoção de uma alimentação segura e saudável nas escolas, ressaltando que é preciso um bom relacionamento entre pais (família), equipe 64 escolar e crianças, recorrendo a inúmeras metodologias que estimulem escolhas cada vez mais nutritivas. O olhar qualitativo da composição dos lanches destinados aos alunos do NEI, aliado ao olhar atento em busca dos riscos potenciais das lancheiras através do registro fotográfico possibilitou inúmeras reflexões que puderam ser coletivizadas nas reuniões e encontros com professores, pais e pesquisadores, resultando em iniciativas individuais e coletivas. Temos que reconhecer, no entanto, que esta foi apenas uma etapa de outras tantas que evidenciaram um recorte de história, fazendo parte de uma linha temporal maior na qual é preciso, permanentemente, evidenciar o tema alimentação saudável e alimentação segura, uma vez que a instituição de ensino modifica anualmente seu quadro de alunos. Portanto, o estado atento dos olhares sobre os riscos que envolvem as refeições no ambiente escolar precisa ser cada vez mais valorizado por todos: pais, crianças, professores e colaboradores. 65 A SAÚDE PODE SER MEDIDA E A MEDIDA PODE SER SAÚDE Camilla Lucana Dourado Vieira Clélia de Oliveira Lyra Luiza Andrade de França Railene França do Rego Emília Carla de Almeida Alcides A Transição Nutricional se caracteriza por uma mudança epidemiológica na qual a redução da desnutrição ocorre em paralelo ao aumento do sobrepeso e obesidade. Sendo esta definida como o acúmulo excessivo de gordura corporal que acarreta prejuízos à saúde dos indivíduos, tais como dificuldades respiratórias, problemas dermatológicos e distúrbios do aparelho locomotor, além de favorecer ao surgimento de enfermidades potencialmente letais como dislipidemias, doenças cardiovasculares, Diabetes Não-Insulino-Dependente (Diabetes Tipo II) e certos tipos de câncer (MONTEIRO, 1997 apud PINHEIRO; FREITAS; CORSO, 2004). É difícil definir exatamente a sua etiologia, uma vez que esta é multi-fatorial envolvendo aspectos ambientais e genéticos. No Brasil, a obesidade já é um fenômeno preocupante e requer ações imediatas para a detenção de seu avanço. A elevação desses índices parece estar relacionada ao fenômeno da urbanização. A alimentação mais tranqüila, no lar, junto à família, agora dá espaço a preparações mais práticas e de rápido consumo. Neste panorama, o sanduíche e os refrigerantes ganham prioridade e a publicidade favorece à formação de novos hábitos. Segundo Bleil (1998), as expectativas deste consumo, orientado por um novo estilo de vida, são menos satisfatórias ao paladar e ao aporte nutritivo que o padrão anterior. A popularização de alimentos industrializados é um dos aspectos que conduz à obesidade, pois mesmo em situações nas quais não há ingestão excessiva, a alta densidade energética destes produtos pode acarretar aumento da gordura corporal, apresentando relação direta com uma série de fatores de risco para o aparecimento ou agravamento de condições desfavoráveis para a saúde. O entendimento claro de todos os fatores que contribuem para a 66 obesidade requer uma análise cuidadosa de atitudes, crenças e comportamento da população; a disponibilidade e acessibilidade à informação e a natureza e extensão da influência exercida pelo aspecto sociocultural, econômico e político (GREEN; KREUTER, 1991, tradução nossa). Conter seu avanço requer a elaboração de estratégias e estas devem estar apoiadas em estudos diagnósticos. A utilização das medidas antropométricas para a avaliação do estado nutricional, seja de uma determinada população, de um grupo de indivíduos ou de uma única pessoa, tem se mostrado relevante ao favorecer as decisões mais cabíveis a serem tomadas em relação à situação encontrada. A antropometria relaciona-se com a medição das variações nas dimensões físicas e na composição global do corpo humano em diferentes idades e em distintos graus de nutrição (VASCONCELOS, 2000). “Até o presente momento, a antropometria segue sendo o melhor indicador para avaliação do estado nutricional” (FAGUNDES; OLIVA; FAGUNDES-NETO, 2002, p. 384) por possuir baixo custo e ser de fácil aplicação (GRACIA; VIEIRA; FERREIRA; 2004). Nesta pesquisa a aferição do peso de adultos e crianças foi realizada utilizando-se uma balança eletrônica, marca Filizola, com capacidade de 150 kg e precisão de 100 g, estando a criança descalça e usando o mínimo possível de roupas, procedendo-se o registro do peso em quilos e gramas. Para a medida da estatura foi utilizada uma fita métrica com marcações em centímetros, afixada a uma parede de superfície plana, sem rodapé e em ângulo de 90º com o chão. A medição foi realizada duas vezes com o auxílio de um esquadro colocado acima da cabeça da pessoa, que estava descalça, com os pés juntos, as mãos nos quadris, as nádegas e os calcanhares encostados à parede e com a cabeça mantida no plano de Frankfurt (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1995). As medidas das professoras Estávamos trabalhando com 10 professoras e não consideramos necessários fazer uma abordagem estatística. O cálculo do IMC (Índice de Massa Corporal) foi realizado com elas para desencadear a reflexão sobre saúde e nutrição, por ser um índice de baixo custo operacional e fácil obtenção (COSTA, 67 2001). Foram avaliadas por este índice nove professoras, com idades entre 24 e 58 anos. Todas as medidas foram coletadas durante o horário escolar pela equipe de pesquisa. Foram registradas em formulário próprio a idade e o sexo do pesquisado e coletados peso e altura conforme descrição abaixo: Tabela 5: Variáveis antropométricas das professoras do NEI, Natal-RN Idade Peso Altura IMC Lisete 25 60,8 1,60 23,75 Clélia 34 55,9 1,52 24,19 Rafaela 58 60,9 1,54 25,68 Joana 24 57,1 1,57 23,17 Ingrid 43 80,2 1,55 33,38 Juliana 45 59,0 1,55 24,56 Carla 27 72,9 1,66 26,20 Larissa 41 71,2 1,61 27,47 Andressa 25 65,0 1,59 25,71 Natália Obs. Uma das professoras não pôde ser pesada, pois no período da coleta desses dados a mesma se encontrava de licença maternidade. Seguindo as orientações da World Health Organization (1995) para a classificação do estado nutricional considerando o IMC 1 foi observado que quatro das participantes estavam eutróficas, quatro apresentavam sobrepeso e uma obesidade, ou seja, a maior parte delas encontra-se com o valor do IMC acima do considerado normal, em consonância com a transição alimentar e nutricional existente no nosso país, na qual se verifica a tendência do sobrepeso e obesidade na população brasileira. As medida das crianças Os primeiros anos de vida de uma pessoa exigem, além de um maior cuidado, muito carinho, atenção, participação e sensibilidade dos seus cuidadores, sejam estes familiares ou professores. As crianças ao longo do tempo vão aprendendo a explorar seus sentidos e desafiam a si próprias, passando a se 1 O Índice de Massa Corporal (IMC) é definido como o Peso do indivíduo dividido por sua altura ao quadrado. O resultado encontrado é classificado como baixo peso (abaixo de 18,5); eutrófico (entre 18,5 e 24,9), sobrepeso (entre 25 e 29,9) e obesidade (acima 30). 68 perceberem e a perceberem “o outro”. Na infância é onde se despertam curiosidades e se afinam as habilidades. Especificamente na fase pré-escolar há um avanço no seu desenvolvimento motor e cognitivo e uma diminuição na velocidade de crescimento, o que pode ocasionar uma diminuição do apetite da criança, gerando preocupação aos pais. Estes têm a consciência do significado de uma boa alimentação para seu filho, mas muitas vezes não sabem como lidar com tal situação. Assim, a nutrição pode se revelar por meio do ambiente escolar, promovendo práticas educativas, auxiliando os responsáveis por estas crianças e proporcionando-lhes melhor qualidade de vida. O diagnóstico da situação nutricional tem sido um importante instrumento para se verificar a situação de saúde da população infantil. As medidas antropométricas, embora com limitações, se constituem no modo mais prático e de menor custo para a análise e monitoramento de tendências do estado nutricional de crianças. A má nutrição na infância, seja ela ocasionada pela escassez de nutrientes na dieta ou pelo excesso de alimentos calóricos, traz conseqüências graves que podem repercutir pelo resto da vida. Assim, é inadmissível esperar que as crianças adoeçam para que sejam providenciadas medidas cabíveis à recuperação das mesmas. Tanto a desnutrição quanto a obesidade são problemas de saúde pública e merecem atenção para o desenvolvimento de ações preventivas que possibilitem o envolvimento de toda comunidade escolar, das famílias e das próprias crianças nas práticas da alimentação saudável. Nisso, o diagnóstico nutricional é o primeiro passo para o desenvolvimento de práticas educativas efetivas em nutrição. Estas favorecem a aquisição de conhecimentos sobre alimentação saudável e envolve tanto crianças quanto adultos, sejam estes pais ou professores. A nutrição adequada na infância é essencial para o bom crescimento e desenvolvimento da criança, e serve como um fator de proteção, evitando o surgimento de algumas doenças na vida adulta, sendo estas oriundas tanto da carência, ocasionando a desnutrição, quanto do excesso, causando a obesidade. 69 O crescimento do ser humano constitui-se em um processo dinâmico e contínuo, que ocorre na infância e caracteriza-se pelo aumento dos ossos, músculos, pele e órgãos, sendo os alimentos fornecedores de substâncias necessárias para que o organismo desempenhe essas funções (BRASIL, 2001). O aumento do tamanho corporal cessa com o término do aumento da altura (crescimento linear). Neste sentido, Vitolo (2003) ressaltou que “o crescimento infantil não se restringe ao aumento do peso e da altura”. Também sofre influência de fatores genéticos, ambientais e psicológicos. Já o desenvolvimento, se caracteriza pelo processo de maturação progressiva do sistema nervoso central. Para tanto, se faz necessária a existência de estímulos ambientais que suscitem respostas da criança e a capacitem a adquirir e aprimorar habilidades funcionais (VITOLO, 2003). Salienta-se ainda que quanto mais jovem a criança, mais dependente e vulnerável se encontra em relação ao ambiente. Assim as condições favoráveis ao adequado crescimento e desenvolvimento infantil não são apenas relacionadas aos recursos materiais institucionais com que a criança possui a disposição (alimentação, moradia, saneamento, serviços de saúde, creches e pré-escolas), mas também dos cuidados gerais, como o tempo, a atenção, o afeto que a mãe, a família e a sociedade como um todo lhe dedicam (BRASIL, 2002). Monteiro et al (1993) e Lessa, Devincenzi e Sigulem (2003) reforçaram ainda que o estado nutricional da criança não depende apenas de sua alimentação, mas também do seu estado de saúde. Este possui relação direta com a condição socioeconômica da família, que condiciona a disponibilidade de alimentos no domicílio, a salubridade do ambiente e os cuidados adequados dispensados à criança, podendo inclusive ser modulada através da oferta de serviços públicos de saúde, saneamento e educação. Não obstante, “o acompanhamento da situação nutricional das crianças de um país ou região constitui um instrumento essencial para a aferição das condições de saúde da população infantil” (MASON, 1984 apud FERNANDES; GALLO; ADVÍNCULA, 2006). Nesse contexto, a escola pode contribuir de forma salutar para o adequado crescimento e desenvolvimento da criança, sendo reflexo 70 de seu estado nutricional. O diagnóstico nutricional de crianças detecta e possibilita ações que permitem suprir algumas carências nutricionais, tanto nos casos de desnutrição, evitando retardo no crescimento e o comprometimento do desenvolvimento, quanto nos casos de obesidade, no que diz respeito à fome oculta e ao surgimento de doenças e agravos não transmissíveis, proporcionando então uma vida saudável na fase adulta. Taddei et al. (2002, p.37), afirmou que “a antropometria vem sendo utilizada com sucesso em todo o mundo para avaliar riscos para a saúde e nutrição, especialmente em crianças”. “Ao avaliar o estado nutricional da criança, o profissional de saúde tem diferentes técnicas e instrumentos. As maiores dificuldades residem na escolha do critério a ser utilizado e na interpretação dos resultados” (VITOLO, 2003, p. 98). As medidas antropométricas mais utilizadas na avaliação nutricional infantil são o peso e a estatura. É importante frisar que as medidas antropométricas isoladamente não permitem uma avaliação precisa. Dessa forma, lançamos mãos de índices e indicadores antropométricos (COSTA; KAC, 2003, p. 264), Assim, define-se pontos de corte que classificam a criança dentro de uma faixa aceita como normal, de acordo com a referência de crescimento utilizada. Assim, é fundamental distinguir referência antropométrica de padrão, visto que normalmente são utilizados como sinônimo equivocadamente: Considera-se como Padrão de Crescimento de uma população aquele construído, segundo a metodologia definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), com amostragem representativa de indivíduos saudáveis da referida população. Quando se utiliza um conjunto de dados construído com indivíduos de outra população se diz que é um Referencial. A OMS adotou como referência internacional, o padrão construído pelo National Center of Health Statistics – NCHS (1977/1978) (BRASIL, 2002) (Grifo do autor). As tabelas do NCHS abrangem a faixa etária de 0 a 36 meses e de 2 anos e meio a 18 anos de idade e incluem: peso/idade, altura/idade, peso/altura e circunferência cefálica/idade, por sexo (EUCLYDES, 2000). Cada indicador por sua vez possui um significado: o peso/idade (P/I) expressa a massa corporal para a 71 idade cronológica da criança; a altura/idade (A/I) reflete o crescimento linear, no qual seus déficits indicam comprometimento de longo prazo no crescimento e na altura da criança; já o peso/altura (P/A) expressa a harmonia do crescimento em relação à altura (COSTA & KAC, 2003; BRASIL, 2002, p. 40; ENGSTROM, 2002) De acordo com Costa e Kac (2003, p. 266), os índices antropométricos podem ser expressos segundo três sistemas: percentil, escore-Z e % de adequação da mediana. O presente trabalho enfatizou o escore-Z, considerando como critério selecionado para o desenvolvimento do estudo. O Escore-Z ou múltiplo de desvio padrão “é uma medida de dispersão ou variabilidade de um grupo de dados. O desvio-padrão indica, aproximadamente, quanto, em média, um valor encontra-se afastado da média ou mediana do grupo de dados a que pertence” (Grifo nosso). A medida de escore-z é calculada através da seguinte fórmula: Escore Z = VALOR OBSERVADO – VALOR MEDIANO DE REFERÊNCIA DESVIO-PADRÃO DA POPULAÇÃO DE REFERÊNCIA Vitolo (2003) ressaltou que o escore-Z é bem aceito na literatura científica e é um excelente método para estudos de grupos populacionais devido constituir-se em um critério mais utilizado do ponto de vista estatístico. A World Health Organization (1995) classificou como baixo peso para a idade, para a altura e baixa estatura para idade as crianças cujos índices P/I, P/A e A/I, respectivamente, encontrarem-se abaixo de –2Z, e sobrepeso/obesidade aquelas com índices P/I e P/A acima de +2Z. O perfil antropométrico dos alunos pré-escolares e escolares do Núcleo de Educação Infantil (NEI) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte veio a corroborar com as tendências evolutivas no cenário nutricional do Brasil e do mundo, nas quais a Transição Nutricional se apresenta como maior protagonista. Das 259 crianças existentes na escola no ano de 2007, tendo estas 72 entre 2 e 6 anos, 120 (46,3%) participaram da pesquisa. Destas 41,7% (n=50) eram do gênero masculino e 58,3% (n=70) do feminino. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (2003, p. 64), 25% da amostra já é considerado um valor representativo para a pesquisa. Na tabela 1 é possível observar a distribuição por idade e gênero das crianças avaliadas. Tabela 1. Distribuição por idade e gênero das crianças avaliadas no NEIUFRN, Natal/RN, 2007. Masculino Feminino Idade (anos) n % n % 2├ 3anos 8 6,66 11 9,16 3├ 4 anos 15 12,5 12 10 4├ 5 anos 7 5,83 9 7,5 5├ 6 anos 12 10 21 17,5 6├ 7 anos 8 6,66 17 14,16 50 41,7 70 58,3 TOTAL O perfil antropométrico2 dos alunos avaliados foi apresentado considerando-se os indicadores P/I e P/A, uma vez que para o indicador A/I todas as crianças apresentaram-se com altura adequada para a idade. Fator bastante positivo, semelhante aos resultados de Fernandes, Gallo e Advíncula (2006) nos quais 94,8% das crianças foram classificadas como eutróficas e; contrário aos de Oliveira et al. (2007), ao estudar preditores do retardo de crescimento linear em 3.746 pré-escolares, sendo 2.733 de dez municípios do Estado da Bahia e 1.013 de cinco municípios do Estado de São Paulo. Destes, as maiores prevalências de déficit 2 Para classificação do estado nutricional Foram adotados os critérios propostos pela WHO (1995), sendo utilizados os indicadores antropométricos de Peso/Altura (P/A), Peso/Idade (P/I) e Altura/Idade (A/I), segundo o Escore – Z. O padrão antropométrico utilizado foi o National Center for Health Statistic (NCHS, 1977/1978). Serão consideradas baixo peso para a idade, para a altura e baixa estatura para idade os alunos cujos índices P/I, P/A e A/I, respectivamente, encontrarem-se abaixo de – 2 Escore - Z, e sobrepeso/obesidade aqueles com índices P/I e P/A acima de +2 Escore - Z. A consolidação dos resultados foi realizada por meio de freqüências pontuais e relativas. 73 de crescimento linear (A/I) foram observadas nos municípios baianos, alcançando mais de 10% em sua maioria. Um resultado importante observado foi a ausência de déficits antropométricos em relação aos três indicadores nutricionais. Por outro lado, foi constatada, em relação aos indicadores P/I e P/A, a prevalência de sobrepeso/obesidade de 10% e 10,8%, respectivamente, fato este também verificado no estudo de Guimarães e Barros (2001) ao estudarem pré-escolares de rede pública do município de Cosmópolis, São Paulo. A ocorrência de sobrepeso/obesidade segundo o indicador peso/idade foi maior se comparado ao estudo realizado por Castro et al .(2005) e Tuma, Costa e Schimitz (2005) em que ambos apresentaram valores idênticos (6,9%), ao avaliar crianças pré-escolares de creches municipais de Viçosa, MG e de Brasília, DF, respectivamente. Quanto ao sobrepeso/obesidade no que se refere a peso/altura, os valores aqui encontrados superaram a média de outros estudos: Monteiro e Conde (2000) constataram 4% na cidade de São Paulo, SP; Guimarães e Barros (2001) e Castro et al. (2005) ao estudarem crianças pré-escolares de creches municipais 5,7%; Tuma, Costa e Schimitz (2005) 6,1%; Taddei et al. (2002), comparando as prevalências de obesidade entre os inquéritos da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN/1989) e da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS/1996), encontrou entre as diferentes regiões do país um aumento acentuado na região Nordeste, de 1,6% para 2,6%, em crianças maiores de dois e menores de cinco anos de idade, demonstrando uma mudança relevante numa das regiões brasileiras menos desenvolvidas. Foi possível perceber que houve maior prevalência de sobrepeso/obesidade entre os meninos do que entre as meninas. O indicador P/I foi o que apresentou maior diferença entre meninos (14%) e meninas (7%). Em contrapartida, o estudo de Oliveira et al. (2003, p. 148) salienta que “a maioria das pesquisas demonstra ser a prevalência da obesidade infantil e adulta maior no gênero feminino”. De acordo com dados divulgados pela Organização Mundial de Saúde para o Brasil, a prevalência de sobrepeso encontrada foi de 4,9%, em relação 74 ao indicador peso/altura, sendo 5,1% para o sexo feminino e 4,7% para o sexo masculino (CORSO et al., 2003). Já Barreto, Brasil e Maranhão (2007) obtiveram valores equivalentes entre meninos e meninas em relação à ocorrência do sobrepeso/obesidade ao avaliarem pré-escolares de Natal, RN, numa pesquisa realizada em 20 escolas e creches públicas e 20 escolas privadas. Tais autores afirmam que o “gênero, portanto, não é um fator de risco comprovado para o desenvolvimento da obesidade em pré-escolares”. Isso se explica porque nessa fase, “os hormônios sexuais ainda não se encontram em níveis de determinar maior acúmulo de tecido adiposo nas meninas e maior incremento de massa magra nos meninos”, o que só vem a acontecer na fase pré-púbere e adolescente (Oliveira et al., 2003, p. 148). Mundialmente, podemos citar os estudos de Ogden et al. (2002, p. 1772), Strauss e Pollack (2001) e World Health Organization (1997). Estes revelam que a prevalência crescente da obesidade em crianças vem se tornando um problema de saúde pública significante e alarmante. Também no palco brasileiro, segundo Batista Filho e Rissin (2003, p. 84), “a projeção dos resultados de estudos efetuados nas últimas três décadas é indicativa de um comportamento claramente epidêmico do problema”. O mesmo autor expõe que, somente a partir de 1975, os grandes inquéritos da situação nutricional como um todo tiveram início nas diferentes macrorregiões do nosso país, apesar dos restritos dados antropométricos, possibilitando com satisfatória segurança analisar o quadro das transformações nutricionais brasileiras. Medidas a serem tomadas Por meio do perfil antropométrico diagnosticado na pesquisa realizada no NEI, foi possível perceber neste trabalho as duas faces inerentes à transição nutricional: a ausência de déficits nutricionais e a prevalência de excesso de peso. Esta se mostrou elevada em comparação a outros estudos nacionais e apresentou valores equivalentes entre ambos os sexos, como também mais evidente entre as crianças de 3 anos. Outro ponto observado foi a escassez de pesquisas no Rio Grande do Norte que contemplem a antropometria em pré-escolares. 75 Os resultados tornaram explícita a necessidade de ser traçada uma nova agenda nutricional na comunidade escolar no tocante às prioridades em saúde, para promover estilos de vida e hábitos alimentares mais saudáveis, prevenindo as doenças crônicas não transmissíveis e os transtornos alimentares. A presença do profissional nutricionista pode ser relevante nessa construção, ao desenvolver estratégias nutricionais educativas permanentes que possibilitem auxiliar a equipe escolar, a família das crianças e elas próprias, tornando-as autônomas na aquisição de boas escolhas para sua saúde. A fim de alcançar tais metas a Portaria Interministerial MEC/MS 1010 (BRASIL, 2006c), que institui as diretrizes para a Promoção da Alimentação Saudável nas Escolas de educação infantil em âmbito nacional, vem a ser o respaldo institucional das ações que devem ser desenvolvidas nas escolas em relação à alimentação saudável. 76 CRIANÇAS COM NECESSIDADES ESPECIAIS: UM CASO DE TODOS Hayanne Monick Gomes Dantas Lussandra Thais Farias dos Santos Sandra Maria Nunes Monteiro Educação inclusiva e necessidades especiais em crianças Crianças com necessidades especiais são aquelas que apresentam necessidades diferentes e próprias, requerem atenção individual e específica. Estas apresentam características físicas, sensoriais ou intelectuais bastante diferenciadas, que podem ser decorrentes de fatores inatos ou adquiridos, de caráter permanente que acarretam dificuldades como a interação social (RAIMUNDO et al., 2007). De acordo com o Censo de 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 24,5 milhões de brasileiros apresentam algum tipo de deficiência, dentre os quais, 22,9% apresentam deficiência motora, caracterizada por comprometimento permanente da capacidade motora considerada normal para a espécie humana (FERRAZ et al., 2004). Macedo (2005) afirma numa reflexão sobre a percepção da educação especial pelos docentes que “é importante assumirmos o preconceito, a nossa dificuldade, o nosso medo, a nossa impotência, porque só assim vamos poder, pouco a pouco, assumir, de fato, uma formação que promova a educação inclusiva”. Segundo o SICORDE (2006), 70% das escolas públicas ou particulares do Rio Grande do Norte estão inseridas no contexto da inclusão escolar, ultrapassando a média brasileira que é de 40%. A intervenção nutricional nas escolas, contemplando os alunos com necessidades especiais, é de fundamental importância. Tal afirmação visa garantir aos menos um estado nutricional favorável e construir com os pais o apoio necessário para a efetivação do cuidado nutricional de seus filhos, já que é inquestionável a necessidade da oferta de cuidados específicos para com essas 77 crianças além de muito carinho, amor, paciência e dedicação. Um exemplo da aplicação destes cuidados é direcionado às pessoas com deficiências motoras e paralisia cerebral. As crianças com paralisia cerebral possuem risco de desnutrição, o que pode ser atribuído em parte, segundo Dziedzic, Slowik e Szczudlik (2008), à imunodeficiência que estas em geral, apresentam, sendo de fundamental importância a ingestão de uma alimentação saudável por essas crianças tanto na escola quanto em seus domicílios. À família cabe a parte da paciência, para que não desista na primeira tentativa frustrada. É com essa inter-relação entre a escola, a família e a equipe multiprofissional de saúde que acompanha essa criança que será possível promover uma vida mais saudável e sem riscos de agravos nutricionais. Entre os diversos problemas que podem levar a uma deficiência motora pode-se citar a atrofia muscular espinhal (AME), que tem origem genética e caracteriza-se pela atrofia muscular secundária à degeneração de neurônios motores. Na atrofia espinhal intermediária as alterações motoras surgem entre seis meses e dois anos de idade, suas principais características clínicas são hipotonia, incapacidade na manutenção da postura bípede, fasciculações na língua e dificuldade de locomoção. Destacamos a dificuldade de mastigação/deglutição, uma das principais causas dos freqüentes agravos nutricionais presentes nos indivíduos com essa doença (ZATZ, 2002; CORRÊA; RIBEIRO; CARVALHO, 2006). Diante desses dados e sabendo que a educação inclusiva tende a se ampliar, é indispensável que incluamos o diagnóstico de nutrição, e possível intervenção nutricional nas escolas contemplando os alunos com necessidades especiais, visando à garantia de um estado nutricional favorável e à construção, com os pais, do apoio necessário para a efetivação do cuidado nutricional de seus filhos. Investigamos o perfil nutricional de duas crianças com necessidades especiais: uma com atrofia muscular espinhal e outra com paralisia cerebral, com o objetivo de detectar possíveis agravos nutricionais. Analisamos a prática e duração de amamentação das crianças; a percepção da mãe/responsável e professor em relação a uma alimentação saudável; e avaliamos o estado nutricional da criança. Para a participação na pesquisa, os pais/responsáveis pelas crianças, bem como 78 seus professores, assinaram termos de consentimento livre e esclarecido. Realizamos entrevistas semi-estruturadas com os pais/responsáveis pelas crianças. No primeiro momento, abordamos com a mãe/responsável questões relacionadas à amamentação, alimentação domiciliar e na escola; no momento posterior, questionamos os aspectos específicos relatados na primeira entrevista, além da sua percepção quanto à influência da alimentação como determinante do estado de saúde e nutrição. No diálogo com a professora conversamos sobre alimentação da criança na escola, acerca do tipo de alimento que a criança costumava levar à escola, possíveis dificuldades de mastigação ou deglutição, apetite, assim como a percepção da mesma do que é uma alimentação saudável. As entrevistas tiveram duração de 20 e 40 minutos, sendo gravadas com o consentimento dos entrevistados. Avaliação Nutricional das crianças Realizamos a avaliação nutricional das crianças através da aferição da estatura e peso e do cálculo do Índice de Massa Corpórea (IMC). Coletamos todas as medidas durante o horário escolar, registrando os dados em formulário próprio, segundo a idade e o gênero do pesquisado. Para a classificação do estado nutricional analisamos os dados referentes às crianças estudadas, através dos índices antropométricos peso/estatura (P/E), peso/idade (P/I), Estatura/idade (E/I) e IMC/idade. O padrão antropométrico que utilizamos foi o do National Center for Health Statistic (NCHS), e a classificação pela World Health Organization (2007). Utilizamos outro indicador, a área muscular do braço, calculada a partir da circuferência do braço (cm) e a dobra cutânea do tríceps de acordo com Gurney e Jelliffe (1973). Caracterizamos o perfil alimentar das crianças através de dois métodos: o Registro de 24 horas e a Frequência Alimentar. Realizamos o registro de 24 horas utilizando um formulário no qual anotamos o horário das refeições, os alimentos consumidos, as quantidades oferecidas e consumidas pela criança, em medidas caseiras e medidas de volume. Os dados foram digitados no programa Excel 2003 (Microsoft Corporation – New York) com o auxílio das referências de Tomita e 79 Cardoso (2002) para transformação das medidas caseiras para a gramatura; e da tabela de composição de alimentos (PHILIPPI, 2002), para obtermos os valores de macro e micronutrientes. Em seguida, analisamos as quantidades destes nutrientes de acordo com as Dietary References Intakes do Institute of Medicine (2002a, 2002b, 1999, 2002c, 1989), segundo o gênero e a faixa etária. Realizamos a análise do consumo alimentar através da sugestão de pirâmide alimentar para crianças de 4 a 6 anos, da Sociedade Brasileira de Pediatria (2006) adaptado da Pirâmide Alimentar para crianças de 2 a 3 anos de idade: Guia para escolha dos alimentos (PHILIPPI; CRUZ; COLUCCI, 2003) e do Guia alimentar para crianças menores de dois anos (BRASIL, 2002). O caso de Iuri Ao investigarmos na literatura a relação entre motricidade e alimentação em pessoas com paralisia cerebral percebemos que estas podem desenvolver agravos nutricionais, como a desnutrição, podendo apresentar déficit estatural. Para Borges e Mello (2004), os principais problemas desenvolvidos pelas crianças com paralisia cerebral são: o controle oral-motor deficiente, maturação neurológica anormal (mecanismo de engolir não-coordenado, morder tônico, reflexo hiperativo) e má postura durante a refeição por não poderem sustentar o tronco, o que predispõe à disfagia, regurgitação freqüente, tosse e sufocamento durante a alimentação, vômitos, refluxo gastroesofágico, aspiração, hipertonicidade da língua. Tais anormalidades podem limitar a ingestão, por falta de controle motor e salivar da boca. Sendo assim, o manejo dietético e não-dietético são necessários para otimizar a nutrição desses pacientes, melhorando seu estado nutricional. No entanto, existe limitação na avaliação do estado nutricional quanto à falta de métodos validados e específicos para essa população. Há pouca informação disponível quanto às necessidades de nutrientes e energia em pacientes neurodebilitados. Kong e Wong (2005) indicam que as necessidades nutricionais devem ser determinadas na avaliação antropométrica, utilizando a dobra cutânea do tríceps, determinando massa muscular do braço e desconsidera a atrofia muscular da perna. 80 Após o nascimento de Iuri, foi diagnosticada a paralisia cerebral. Em entrevista, a mãe da criança relatou-nos que “[...] a amamentação foi uma experiência maravilhosa, e que a sucção da criança era muito boa chegando a ser melhor do que a de outras crianças sem necessidades especiais”. A duração da amamentação foi de 1 ano, sendo exclusiva até quase que nesta totalidade. A criança recebeu amamentação exclusivamente até o primeiro ano de vida. O Ministério da Saúde (BRASIL, 2002) preconiza que, a partir dos seis meses, o uso exclusivo do leite materno não supre todas as necessidades nutricionais da criança, sendo necessária a introdução de alimentos complementares. Outro ponto que observamos foi a percepção da mãe em relação a uma alimentação saudável, sendo assim definida por ela: “uma alimentação natural com um pouco de tudo, carboidratos, proteínas e vitaminas”. Observamos a real preocupação da mãe em proporcionar ao seu filho uma alimentação adequada, priorizando os sucos de frutas naturais e comidas caseiras. Na entrevista com a professora, a observação em relação à preocupação que a mãe de Iuri tem acerca de sua alimentação foi mais uma vez enfatizada. A professora relatou que a criança e sua família eram tidas como destaque na escola devido a essa preocupação. Outro ponto realçado pela professora foi o de que a família oferecia à criança somente lanches e porções que a mesma pudesse consumir, proporcionando independência ao se alimentar. Entretanto, esta independência não era obtida em sua totalidade, pois Iuri apresentava dificuldade de manter o copo de suco consigo, por não conseguir levantar pesos consideráveis. Para solucionar esta limitação, a professora colocava o suco em pequenas quantidades permitindo a criança levá-lo até a boca, exercendo a independência para alimentar-se. Quanto à percepção da professora acerca de uma alimentação saudável, a mesma, acredita ser composta por alimentos naturais, sem corantes e sem gordura. Atualmente Iuri encontra-se em tratamento médico e fisioterapêutico e foi possível observar, de uma maneira geral, a preocupação da mãe em proporcionar e manter o bem-estar do seu filho sem medir esforços para isso. Durante o exame físico observamos aspectos em relação a pele, 81 cabelos, olhos, gordura subcutânea e abdômen. A criança apresentava-se com tônus muscular preservado, normocorada e sem sinais de ressecamento ou palidez; os cabelos eram brilhantes, com textura e cor normais; a esclerótica apresentava-se com aspecto normal, gordura subcutânea visível e abdome flácido, não-distendido e simétrico. Sendo assim, a partir das características acima relatadas podemos afirmar que a criança não apresentou nenhum sinal físico aparente de carência nutricional. A avaliação nutricional de Iuri apresentou os seguintes resultados: Tabela 1: Medidas antropométricas de Iuri. MEDIDAS ANTROPOMÉTRICAS Estatura Massa corpórea Circunferência braquial Prega cutânea tricipital Área muscular do braço RESULTADOS 102 cm 15,6 kg 17 cm 8 mm 17 cm² Diante dos dados antropométricos analisados através da tabela do NCHS e classificação da World Health Organization (2006), classificamos a criança como eutrófica nos parâmetros peso/idade, peso/estatura e IMC/idade. Entretanto, no parâmetro estatura/idade, Iuri apresentou um déficit estatural, o que pode indicar que apresentou algum tipo de agravo nutricional ou desnutrição durante a fase inicial da infância, já que este indicador avalia o estado nutricional retrospectivo da criança. Vale a pena mencionar o fato da amamentação exclusiva prolongada, sem a complementação alimentar acima de 6 meses de vida de Iuri. Quanto à avaliação da ingestão alimentar temos os seguintes dados. Tabela 2: Adequação de macronutrientes (2002). RECOMENDAÇÃO Nutrientes (%) d Kcal/d VCT 1752 Proteínas 4,4 76 Lipídios 25-35 438 – 613,2 Carboidratos 50-60 876 – 1051,2 consumidos por Iuri, segundo as DRI’S CONSUMIDO (%) d Kcal/d 1806 13 234 32,4 585 54,7 987 ADEQUAÇÃO % 103,1 308 - 82 Tabela 3: Adequação de vitaminas e minerais consumidos por Iuri RECOMENDAÇÃO NUTRIENTE CONSUMIDO COMENTÁRIOS EAR/ RDA / UL Vitamina A (µg) 275 / 400 / 900 705,4 Possivelmente adequado Vitamina C (mg) 22 / 25 / 650 100,7 Possivelmente adequado Vitamina E (mg) 6 / 7 / 300 11,5 Possivelmente adequado Vitamina B1 (mg) 0,5 / 0,6 / 1,9 Possivelmente adequado Vitamina B2 (mg) 0,5 / 0,6 / 1,5 Possivelmente adequado Vitamina B3 (mg 6 / 8 / 15 18,6 Possivelmente inadequado Vitamina B6 (mg) 0,5 / 0,6 / 40 1,4 Possivelmente adequado Vitamina B12 (µg) 1,0 / 1,2 / 2,0 Possivelmente adequado Folato (µg) 160 / 200 / 400 147,7 Possivelmente inadequado Cálcio (mg) - / 800 / 2500 1051,9 Possivelmente adequado Fósforo (mg) 405 / 500 / 3000 1036,8 Possivelmente adequado Magnésio (mg) 110 / 130 / 110 230,7 Possivelmente inadequado Cobre (mg) 0,34 / 0,44 / 3,0 1,1 Possivelmente adequado Zinco (mg) 4,0 / 5,0 / 12 6,9 Possivelmente adequado Ferro (mg) 4,1 / 10 / 40 12,0 Possivelmente adequado Selênio (µg) 23 / 30 / 150 39,9 Possivelmente adequado Ao analisarmos as tabelas 2 e 3 percebemos que de maneira geral a alimentação da criança é adequada em relação à energia, macronutrientes, vitaminas e minerais. Entretanto, foi possível observar um alto consumo de proteínas. Já em relação aos micronutrientes, todas as vitaminas com exceção, da niacina e ácido fólico estão provavelmente adequadas; e ao delinear o perfil de ingestão de minerais foi possível observar a inadequação somente na ingestão de magnésio. A ingestão de niacina ficou um pouco acima da UL devido, provavelmente, à ingestão de alimentos enriquecidos Sustagen®. Em contrapartida, ao analisar o folato, percebemos uma situação inversa, já que a ingestão deste micronutriente não alcançou nem a EAR, que é o parâmetro inferior para se analisar a ingestão adequada dos micronutrientes a partir de um cardápio consumido. Sendo assim, uma sugestão para aumentar esta quantidade de folato ingerida seria a inserção de vegetais verde-escuros, como couve e espinafre no cardápio diário da criança, sob a forma de sucos ou até mesmo como ingredientes do feijão. 83 O caso de Agnes A atrofia muscular espinhal tem origem genética e caracteriza-se pela atrofia muscular secundária à degeneração de neurônios motores localizados no corno anterior da medula espinhal (Figura 1) (ZATZ, 2002; ARAÚJO; RAMOS; CABELLO, 2005). Sua incidência é de cerca de 1/10000, sendo a segunda desordem neuromuscular em freqüência na população, afetando igualmente ambos os sexos, com aparecimento da sintomatologia por volta dos 18 meses de vida. O diagnóstico é confirmado pelo quadro clínico, por eletroneuromiografia, da biópsia muscular e da investigação genética (KIM et al., 1999; BARBOSA et al., 2006). Outras características clínicas desse tipo de atrofia muscular são hiporreflexia e/ou arreflexia, incapacidade na manutenção da postura bípede, fasciculações linguais, dificuldade de locomoção e mastigação/deglutição. Destacam-se cifose e/ou escoliose que freqüentemente desencadeiam distúrbios respiratórios principalmente a partir da adolescência (CORRÊA, RIBEIRO e CARVALHO, 2006). Deve-se considerar ainda que a progressiva atrofia muscular, que ocasiona problemas respiratórios, e pode mascarar o aumento da demanda metabólica. Esse aumento das necessidades energéticas pode favorecer a diminuição do peso corporal. O músculo esquelético constitui, aproximadamente, 45% do peso corporal e é o maior sistema orgânico do ser humano, sendo um importante tecido na homeostasia bioenergética, tanto em repouso como em exercício (SANTOS, 2008). A função do sistema motor, em sua totalidade, requer que o sistema nervoso central esteja intacto e que o sistema músculo esquelético esteja conectado a ele, pelos nervos periféricos (DAVIES; BLAKELEY; KIDD, 2001). Os distúrbios neurodegenerativos se caracterizam por afetar múltiplos sistemas do corpo humano em decorrência de doenças nos neurônios sensoriais e/ou motores (MAGALHÃES; ZATZ, 2006). Agnes nasceu em 2002, é filha única e apresenta atrofia muscular espinhal tipo II. O diagnóstico definitivo só foi constatado quando a criança estava com 2 anos de idade. A mãe da criança, de uma forma geral, procurou compreender a doença e a partir de então proporcionar os melhores tratamentos, procurando 84 manter o bem-estar da filha. A criança mamou até os 9 meses de idade, sendo exclusiva apenas até os 3 meses, quando o Ministério da Saúde (BRASIL, 2002) preconiza a amamentação exclusiva até os 6 meses de vida. A mãe da criança relatou-nos que a mesma não apresentava problemas de sucção, já que os primeiros sintomas da doença começaram a surgir quando a criança tinha 6 meses de vida. No entanto, o fato da mãe ter amamentado até os 9 meses é um ponto positivo, já que, segundo Araújo e Almeida (2007), a amamentação além de nutrir, atende às especificidades fisiológicas do lactente, e assegura proteção imunológica e função moduladora, cujos benefícios ecoam para a vida adulta. Um ponto que observamos foi o estabelecimento de horários fixos para as refeições e o constante diálogo com a filha, mostrando a importância de uma alimentação adequada para minimizar os agravos da doença, considerando a aceitação de pequenas quantidades oferecidas. Verificamos ainda, que os lanches são constituídos principalmente por produtos industrializados, os quais são ricos em gorduras hidrogenadas, corantes e conservantes, que podem trazer prejuízos para a saúde infantil. Ao entrevistar a professora percebemos a preocupação existente em incluir a criança em todas as atividades da escola e em tratá-la igualmente a todos os outros alunos, o que é bastante importante no tocante à inclusão social. No que diz respeito à alimentação que a criança leva para a escola, foi relatado que a criança aceita melhor os produtos industrializados, tipo batata frita, biscoitos e salgadinhos; rejeitando parcialmente o lanche constituído por outros alimentos. Agnes normalmente não precisa de ajuda para lanchar, nem apresenta dificuldades na mastigação. Quanto à percepção da professora acerca de uma alimentação saudável a mesma, acredita ser composta por frutas, verduras e poucos alimentos gordurosos. Tal consideração revela o conhecimento da importância da qualidade dos alimentos para a saúde do indivíduo. Agnes utilizava cadeira de rodas e apresentava dificuldades em realizar movimentos que exigissem uma maior força muscular, com maiores limitações nos membros inferiores. Devido à progressão da atrofia, a criança já apresentava escoliose que, segundo Oliveiras e Souza (2004) pode levar a problemas posturais e respiratórios. Não apresentava dificuldade de deglutição nem disfagia, mas 85 necessitava de ajuda para se alimentar, já que se cansava facilmente após manipular quantidades e volumes acima de sua capacidade muscular. Foi diagnosticado ainda refluxo, o que leva à oferta de pequenos volumes (BEYER, 2003). Corroborando com Soares (2006), o desenvolvimento mental encontra-se preservado, com vivacidade e inteligência em contraste com sua pouca atividade motora. A criança procurava se esforçar para realizar atividades comuns para a sua faixa etária. Realizamos a avaliação nutricional de Agnes, que se apresentou da seguinte forma: Tabela 4: Medidas antropométricas de Agnes. MEDIDAS ANTROPOMÉTRICAS RESULTADOS Altura do joelho Estatura Massa corpórea IMC Circunferência braquial Prega cutânea tricipital Área muscular do braço corrigida 13cm 107 cm 13 kg 11,35 13 cm 8mm 2,26 cm² Diante dos dados da tabela 4, foi possível verificar que a criança encontrava-se com o peso abaixo do indicado para sua idade e estatura, indicando um quadro de desnutrição. Classificamos a área muscular do braço corrigida de acordo com Frisancho (1990) apud KAMIMURA et al., 2005, tendo o valor correspondente a menor que o percentil 5, o que indica desnutrição grave; esse valor está diretamente ligado a atrofia muscular presente na criança. A altura adequada para idade, segundo Accioly, Saunders e Lacerda (2005) demonstra que a criança não apresentou déficit de peso no inicio da infância, indicando que esse agravo nutricional é algo recente. Esse quadro de desnutrição corrobora com dados obtidos por Raimundo et al. (2007) o qual realizou uma pesquisa que mostrou uma elevada prevalência de inadequação do estado nutricional em crianças especiais. Na avaliação da ingestão alimentar temos os seguintes dados: Tabela 5: Adequação de macronutrientes consumidos por Agnes.. 86 RECOMENDAÇÃO (%) d Kcal/d 1642 10-30 164,2 – 492,6 25-35 410,5 – 574,7 35-65 574,7– 1067,3 Nutrientes VCT Proteínas Lipídios Carboidratos CONSUMIDA (%) d Kcal/d 1229 11 136 42 513 47 580 ADEQUAÇÃO % 74,8 - Observando os dados da Tabela 5, verificamos que a criança apresentava uma alimentação inadequada em relação à energia e proteínas, com valores abaixo do recomendado. Esse baixo consumo energético e proteico favorece à manutenção do quadro de desnutrição diagnosticado. A baixa ingestão calórica pode estar associada à falta de apetite relatada pela mãe, o que segundo Vitolo (2003) é comum na fase pré-escolar, uma vez que é um período caracterizado pela diminuição da velocidade do crescimento e, portanto, pela diminuição do apetite, fato esse também relatado por Devincenzi, Ribeiro e Sigulem (2005). A baixa ingestão proteica é preocupante, uma vez que as proteínas apresentam funções estruturais, reguladoras, enzimáticas e imunológicas (DOUGLAS, 2002). Portanto, seria fundamental adequar o consumo para minimizar o agravo nutricional e aumentar as defesas imunológicas, diminuindo assim, os problemas respiratórios. Um fator que dificulta a ingestão de proteínas de alto valor biológico por Agnes é a alergia à caseína e intolerância a lactose que esta apresenta, impossibilitando o consumo de leite e derivados. O consumo de carboidratos e lipídeos está adequado para sua faixa etária, sendo importante no tratamento da desnutrição, uma vez que, para o aproveitamento das proteínas é necessário que sejam satisfeitas as respectivas necessidades desses nutrientes, garantindo seu destino à síntese protéica, para reparação e manutenção dos tecidos (TIRAPEGUI, CASTRO e ROSSI, 2005). É importante ressaltar que as principais fontes de gordura presentes no recordatório, são as do tipo trans e saturadas (biscoitos, margarina, salgadinhos), as quais estão associadas ao risco aumentado de doença cardiovascular e câncer (ETTINGER, 2003). 87 Tabela 6: Adequação de micronutrientes consumidos por Agnes. RECOMENDAÇÃO NUTRIENTE PROPOSTA COMENTÁRIOS RDA / UL Vitamina A (µg) 400 / 900 465 Possivelmente adequado Vitamina C (mg) 25 / 650 47,5 Possivelmente adequado Vitamina E (mg) 7 / 300 14 Possivelmente adequado Vitamina B1 (mg) 0,6 / 1 Possivelmente inadequado Vitamina B2 (mg) 0,6 / 0,38 Possivelmente inadequado Vitamina B6 (mg) 0,6 / 40 1 Possivelmente adequado Vitamina B12 (µg) 1,2 / 8 Possivelmente adequado Folato (µg) 200 / 400 50 Possivelmente inadequado Cálcio (mg) 800 / 2500 107 Possivelmente inadequado Fósforo (mg) 500 / 3000 305 Possivelmente inadequado Magnésio (mg) 130 / 77 Possivelmente inadequado Cobre (mg) 0,44 / 3,0 0,34 Possivelmente inadequado Zinco (mg) 5,0 / 12 3 Possivelmente inadequado Ferro (mg) 10 / 40 4 Possivelmente inadequado Selênio (µg) 30 / 150 34 Possivelmente adequado Observando a tabela 6, verificamos uma possível adequação na ingestão das vitaminas A, C e E. Essas vitaminas reforçam a função imunológica, sendo muito importantes para Agnes, uma vez que esta constantemente apresenta quadros infecciosos. Elas também têm função antioxidante, o que confere proteção a ácidos graxos poliinsaturados, evitando a formação de peróxidos que desencadeiam ação lesiva nos tecidos (DINIZ, 2001; COZZOLINO, 2005; SILVA; COZZOLINO, 2005). A ingestão inadequada de vitaminas do complexo B favorece ainda mais os agravos nutricionais que a criança estudada apresenta, pois, podendo haver prejuízo na utilização orgânica adequada de carboidratos, lipídeos e proteínas ingeridos (COMBS, 2003). O consumo do folato também está possivelmente inadequado, limitando a sua ação como coenzima em várias reações essenciais para a síntese de DNA e RNA (MAFRA; COZZOLINO, 2005). A maioria dos minerais analisados na dieta de Agnes estava possivelmente inadequados, ou abaixo da recomendação para sua faixa etária, fato preocupante, pois, a desnutrição, quer por insuficiência, ou por excesso, conduz a outras carências nutricionais (SANTOS; AMANCIO; OLIVA 2007). O único mineral que estava possivelmente adequado foi o selênio, um elemento-traço necessário na síntese de enzimas fundamentais para neutralização de radicais livres e proteção contra a peroxidação lípídica de membranas celulares e subcelulares, com ação antioxidante (CUNHA; CUNHA, 88 2000; REIS, 2003). Comparando a pirâmide alimentar de Agnes com aquela preconizada pela Sociedade Brasileira de Pediatria (2006), verificamos um baixo consumo de alimentos do grupo Cereais, pães, tubérculos e raízes. Os alimentos pertencentes a esse grupo são as principais fontes de fibras dietéticas que atuam na motilidade intestinal, e de carboidratos, os quais têm como principal função o fornecimento de energia para o organismo (DEMONTE, 2000). A ingestão de frutas, verduras e legumes também se encontravam abaixo do recomendado. O consumo adequado dos alimentos pertencentes a esses grupos, ricos em vitaminas, minerais e fibras, e com capacidade antioxidante é indicado por contribuirem para a proteção à saúde e diminuição do risco de ocorrência de várias doenças (GALLAGHER, 2005). O consumo de leite de origem animal e derivados está bem abaixo do recomendado, o que é justificado pela alergia à caseína e intolerância à lactose que Agnes apresenta, substituindo o leite por produtos de soja. O grupo de carne e ovos também se apresentou abaixo do recomendado. Aconselha-se um consumo maior de carnes, uma vez que proteínas são fundamentais para diminuição do quadro de desnutrição que a criança apresenta (FAUSTINO, 2003). O consumo de óleos e gorduras está acima do recomendado. Esse fato é preocupante, pois, segundo Philppi et al. (1999), óleos e gorduras, açúcares e doces existem na forma natural, constituído ou em adição, em vários alimentos e preparações, e o consumo exagerado destes está diretamente relacionado ao surgimento de diversas doenças. O caso de todos No atendimento a crianças, independentes de elas apresentarem necessidades especiais ou não, é importante realizar orientações em relação à necessidade de ofertar uma maior variedade de alimentos em suas dietas. Pode-se adotar estratégias, tais com reduzir as porções e ofertar com mais frequência preparações diversas, evitando-se a monotonia alimentar. Desta forma, uma alimentação adequada quantitativa e qualitativamente proporcionará um crescimento 89 saudável, visando inclusive à prevenção e cura de carências nutricionais, como anemia ferropriva e desnutrição (VITOLO, 2003). Apesar das crianças estudadas apresentarem necessidades especiais e um quadro clínico que favorece a um agravo nutricional, uma alimentação adequada poderá contribuir para a melhoria no seu estado nutricional e a elevação de suas defesas imunológicas, o que resultaria numa melhor qualidade de vida. Assim, é imprescindível uma aproximação entre os setores saúde e educação, somando esforços para envolver profissionais, família e criança, propiciando um maior avanço no campo nutricional e também educacional. 90 EDUCAÇÃO E NUTRIÇÃO: PERSPECTIVA INCLUSIVA Lívia Maria Rodrigues de Pontes Maria de Fátima Araújo Vera Lucia Xavier Pinto Inclusão de crianças especiais em escolas regulares O mundo passa por constantes mudanças, por isso, o ser humano está sempre convivendo e se envolvendo com o novo, porém a diferença está em como as pessoas estão atentas a isso, e como cada um enfrentará o desconhecido. Alguns sentirão medo e até se negarão a participar dessas mudanças, enquanto outros sentirão a necessidade de ultrapassar as barreiras do medo e se portarão como pessoas capazes de adotar as concepções atuais e enfrentar os riscos. Essas mudanças também acontecem na educação e os educadores precisam ser sensíveis a elas, como é o caso da inclusão. De acordo com Carvalho (2004, p.26), “em toda a história, nas idéias sobre educação, a inclusão nunca esteve presente”, por outro lado, segundo Mantoan (2001, p.15), “ela implica numa mudança desse atual paradigma educacional, para que se encaixe no mapa da educação escolar que está sendo retraçado”. Ainda na opinião de Carvalho (2004, p.27), há muitos professores “que decidem enfrentar o desafio, e descobrem a riqueza que representa o trabalho na diversidade”. Assim como a escola, a sociedade e todas as áreas do conhecimento não podem se negar a reconhecer esse elemento novo, nem continuar ignorando as diferenças. Deve lembrar que a educação é uma forma de valorizar a pessoa humana, enquanto aprendiz e cidadão e que o aprender também engloba a representação das origens, de valores e sentimentos. Uma das representações das escolas que assim compreendem a educação é o NEI, formado por uma equipe que se engloba no grupo das pessoas “antenadas” às mudanças do mundo, que enfrentaram e continuam enfrentando as barreiras ainda existentes na inclusão: 91 Foram realizadas entrevistas biográficas com sete professores que assinaram o TCLE e a análise destas foi feita de acordo com a proposta de Schütze. O desafio “diferente” que há em todos nós Para os professores entrevistados, trabalhar com crianças especiais hoje, não significa mais medo ou risco, mas sim um desafio e uma nova oportunidade de aprender ensinando. Desafio representado pelo saber explorar o talento de cada criança, oferecendo-lhe a oportunidade de conviver e superar suas dificuldades, estando integrado a um grupo: “[...] é um grande desafio [...] precisava ter um cuidado maior para que ele não ficasse de escanteio, mas que tivesse envolvido no grupo” (Luana). Betti (2001, p.175) esclarece que “a resposta que damos a um desafio não muda só a realidade com a qual nos confrontamos, muda também a nós próprios, cada vez um pouco mais, e sempre de modo diferente”. E ainda enfatiza a oportunidade do ser que atua como professor estar sendo formado durante a sua prática, adaptando suas metodologias de acordo com a necessidade de cada criança, conhecendo novos olhares na educação e novos sentimentos: “[...] só acolho, recebo e me lanço de novo para fazer, [...] cada diferente que aparece é uma outra oportunidade [...] eles nos desestruturam e nos levam a aprender a reconstruir o que a gente sabe” (Denize). Segundo Mantoan (2001, p.79), “devemos trabalhar de forma a ampliarmos a visão e sempre na humildade de que todos estamos aprendendo e de que esse aprendizado se faz na convivência com pessoas diferentes, com pensamentos e desejos”. Faz-se necessário que seja construída uma escola de qualidade, um espaço que priorize o exercício da cidadania, a construção do conhecimento, da cultura, e também de sentimentos sadios em relação ao outro. É preciso garantir que as crianças permaneçam na escola, despertar nelas a vontade e o prazer de 92 aprender com alegria e emoção, adaptando-se às necessidades de cada uma, possibilitando um desenvolvimento em conjunto.“Estudos sobre a dinâmica na sala de aula têm evidenciado o quanto as atividades em grupo favorecem o processo educacional e dinamizam relações de cooperação” (CARVALHO, 2004, p.32). Torna-se necessário que o professor conheça o desenvolvimento de cada criança e compreenda como ela aprende para poder criar estratégias em que todos os alunos possam aprender e evoluir conjuntamente. Na opinião de Melli (2001, p.22), “se o meio escolar possibilita essa interação, o aluno tende a progredir”, idéia que parece ser seguida pelos professores do NEI: “[...] nós trabalhamos com uma proposta interacionista [...] proporcionar esses momentos onde ela possa se desenvolver de forma digamos “igual” com as outras crianças [...] inclusão no meu entendimento é isso, é você proporcionar [...] crescimento tanto na área física como intelectual de forma globalizada, onde a gente atinge todas as crianças, sabendo que essa especial requer uma demanda maior do seu olhar, mas assim, não se vai tratar com ela uma atividade diferenciada das outras” (Laura). Tudo isso caracteriza uma escola humanizada, o que torna a todos, segundo Mantoan (2001, p.93), “mais humanos, mais inteiros e mais felizes”, tendo em vista que o ser humano é único, torna-se importante ressaltar dentro desse contexto que a função da escola inclusiva seria a de introduzir nela alunos que antes estavam excluidos de seu interior, sejam os que apresentam alguma necessidade especial, uma limitação física ou mental, ou uma criança considerada “normal”, mas que se encontra à margem da sociedade. “[...] para que elas sejam vistas e vivam, participem da vida, [...] nós vivemos inseridos na sociedade e elas também têm que estar inseridas (Daniela) A escola precisa se redimensionar com o intuito de atender às necessiades de cada pessoa e receber todos os segmentos que dela foram excluídos, tornando possível a concretização dos conceitos de humanidade e eqüidade (educar de acordo com as necessidades e diferenças individuais, sem que qualquer manifestação de dificuldades se traduza em impedimento à aprendizagem). “A inclusão só pode ser compreendida no contexto de uma educação para todos, 93 pautada no princípio da igualdade entre os homens, no respeito à individualidade” (MELLI, 2001, p.21). Vivemos calcados na concepção de normalidade, mesmo sem sabermos o real conceito dessa palavra, o que gera idéias de oposição entre ser “normal” e ser “diferente” ou deficiente de alguma forma. Durante as entrevistas, percebemos que a maioria dos professores defende a opinião de que toda criança, independente de apresentar alguma limitação, é um ser especial, assim como todos nós somos, com características físicas, psíquicas, intelectuais, históricas, culturais e sociais distintas; de que todos são “normais” apresentando diferenças entre si e que a grande conquista da inclusão é saber lidar com essas diferenças porque cada criança “é singular” como nos lembra Luana. Segundo Mantoan (2001, p.58), “conviver com a diferença é descobrir o quanto somos semelhantes em essência” e esse exercício nos faz “avançarmos em crescimento humano” e que “enxergar-se é o grande desafio e para isso é imprescindível que vejamos o outro”. Portanto, essas diferenças não podem ser um obstáculo à educação, mas uma forma de enriquecê-la, o que requer mudança de postura, de ações pedagógicas, que devem se desprender da hegemonia da normalidade. É preciso trabalhar com as diferenças de habilidades, de competências, de acordo com os talentos de cada criança. “As crianças seguem caminhos diferentes para aprender e isso é o normal” (MANTOAN, 2001, p.235). É necessário também que a sociedade e a escola se adaptem a essas diferenças e não o contrário, para que essas crianças sejam aceitas e tornem-se produtivas, o que requer um trabalho coletivo e cooperativo. Essa idéia de coletividade e cooperação esteve bem presente na fala da grande maioria dos professores entrevistados, já que atribuem a capacidade de lidar com as diferenças e suas vitórias diárias no trabalho com crianças especiais a reuniões periódicas realizadas no núcleo escolar, onde discutem seus problemas, suas angústias, idéias e práticas bem sucedidas em sala de aula, sentem-se acolhidos, sentem que não estão sozinhos em seus erros e avanços, isso lhes dá confiança e vontade de continuar trabalhando, aprendendo e principalmente 94 incluindo esses alunos em suas salas, em seus grupos, enfim, na sociedade. “[...] a gente é uma equipe, [...] se algo eu não consigo dar conta, se algo está gerando insegurança, se algo não tenho resposta, [...] eu posso estar socializando, eu posso estar trocando, [...] a gente não se sente inferior ou menos professora por isso, [...] a gente começa a buscar respostas, [...] eu não me sinto só [...] Você consegue construir uma prática, e consegue levar essas crianças a avançar com esses múltiplos olhares” (Flaviana). O processo de inclusão traz benefícios para todos os segmentos relacionados direta ou indiretamente a ele, as crianças especiais terão as mesmas oportunidades que as outras crianças de se tornarem cidadãos, seres humanos inseridos no processo de ensino-aprendizagem, as crianças consideradas normais, aprenderão que o mundo não é uniforme e conhecerão o valor do respeito, da amizade, do afeto, crescendo mais tolerantes com as diferenças individuais, se desfazendo do preconceito e da segregação, enquanto os professores, terão maiores e melhores oportunidades de se aperfeiçoarem em suas práticas educativas, de se atualizarem e tornarem-se mais produtivos em seu trabalho, e os pais dos alunos especiais ou “normais”, terão a chance de participar de um processo educativo enriquecedor, tornando-os mais tolerantes e colaboradores (MARTINS, 2002, p.35,36). Um dos entrevistados sente que as crianças especiais devem ser aceitas primeiro por eles mesmos, para que as crianças e os seus pais possam fazer o mesmo: “[...] o trabalho com elas faz com que os nossos alunos aceitem mais essas crianças, se o professor não aceitar, os alunos não vão aceitar e a gente vê muito as crianças que não aceitam porque a família não aceita [...]” (Daniela). Para Carvalho (2004, p.74), precisamos construir um caminho nós mesmos, com firmeza e brandura, otimismo e determinação, pois as crianças, cidadãs brasileiras, assim merecem. A estes requisitos postos por Carvalho e baseado na fala da professora Daniela, acrescentamos a necessidade de uma postura ética em que se privilegie o respeito ao outro. Isso implica querer para o outro aquilo que queremos para nós 95 mesmos. Parece-nos que em se tratando do ambiente escolar e da questão da inclusão estes valores tornam-se fundamentais para que se cumpra o princípio da eqüidade e do direito a todos a ingressar, permancer e progredir na escola, como cidadãos de direito. Aquisição da competência profissional Ao longo da história da educação, os pesquisadores propuseram vários raciocínios e conceitos sobre o significado de competência, discussão que se estende na atualidade. É uma palavra de uso freqüente e utilizada em diversos sentidos, fazendo-se relação com as características de desenvolvimento intrínsecas dos seres, como andar, falar, escrever, além de outros aspectos como inteligência, capacidades, habilidades, saberes, porém, “o uso da noção de competência no mundo da educação também é feito por meio da formação profissional” (DOLZ; OLLAGNIER, 2004, p.12). E nesse contexto, será discutido a competência adquirida durante a formação, já que além dos professores se sentirem responsáveis pelo desenvolvimento de seus alunos, o que os leva à busca de um aperfeiçoamento contínuo, a sociedade também exige que eles tenham as competências necessárias que assegurem a aprendizagem dessas crianças. Segundo Ollagnier (2004, p.197), “na formação profissional, a competência é apresentada [...] em função das aprendizagens necessárias para adquirir as capacidades exigidas na profissionalização”. Nesta pesquisa os entrevistados desenvolveram a idéia de aquisição de competências a partir da necessidade de lidar com as diferenças, mais especificamente, com a inclusão de crianças especiais nas classes regulares, despertando no início desse contato, há aproximadamente 9 anos, distintos sentimentos e reações entre os professores, alguns sentiram-se preparados para enfrentar o dia-a-dia na sala de aula independente de deterem as habilidades exigidas, enquanto outros, sentiram-se inseguros e angustiados: “[...] ela não tinha um diagnóstico da deficiência mais especificamente [...] a gente não tinha como ir em busca de algo específico [...] a gente realizava um trabalho como realizava com 96 as demais crianças, e as respostas dessas crianças para a gente eram mínimas então isso gerava muita angústia, muita expectativa” (Flaviana). Para Perrenoud (2002a, p.20), o maior desafio na aquisição de competências é saber propor situações de aprendizagem em uma escola diferenciada, que leve em conta características, ritmos, motivações dos alunos. O mesmo autor esclarece que o “fracasso escolar” se deve ao tratamento dos alunos como “iguais em direitos e deveres”, mesmo apresentando desigualdades em relação a um ensino padrão (PERRENOUD, 2002a, p.43). Diante disso, torna-se indispensável trabalhar o princípio da eqüidade em sala de aula, o que vem sendo desenvolvido nas classes do NEI atualmente: “[...] a gente vê cada criança como um ser único, com as suas especificidades, com a sua história de vida, sua história de mundo [...]” (Flaviana). O desenvolvimento das competências profissionais é um processo. Professores sabem deste inacabamento: “[...] não me sinto pronta, a gente nunca vai estar pronta [...] mas eu me sinto hoje uma profissional com competências para desenvolver um trabalho de educação infantil” (Flaviana). A aquisição de habilidade se inicia na formação acadêmica, porém esta é apenas a primeira etapa, pois a imposição ao professor da atualização constante, exige um aprimoramento profissional permanente (DIAS; LOPES, 2003, p.1169). É perceptível na fala dos entrevistados a lacuna deixada na sua formação acadêmica em relação à prática vivenciada: “[...] a formação em academia, eu acho que ela deixou muito a desejar, era muito complicado essa coisa de estar se formando, estar estudando e ao mesmo tempo não ter a possibilidade de estar refletindo sobre essa teoria e a prática, e trabalhando mesmo, eu tenho essa possibilidade de estar desenvolvendo a prática e refletindo sobre essa prática” (Flaviana). Para Ollagnier (2004, p.200, 205), “a universidade exige pouco dos estudantes, devido à sua missão histórica de ‘grande escola das ciências’, [...] exige, acima de tudo, que os estudantes aprendam e retenham os saberes teóricos transmitidos”, porém, “ela é obrigada, mais que nunca, a redefinir os saberes acadêmicos em função das realidades sociais e econômicas”. 97 Para fazer suas práticas evoluirem, esses professores em serviço assumem a responsabilidade pela sua própria formação, “[...] essa construção que é cotidiana”, como nos fala Flaviana, para a aquisição de competências. Essa concepção de formação contínua compreende “um conjunto de formas de interação e cooperação entre pesquisadores, formadores e professores, favorecendo a pesquisa-ação, a prática reflexiva e a construção interativa” (PERENOUD, 2002b, p.91). Tal formação tornou-se uma busca constante pela equipe do NEI: “[...] primeiro uma busca de conhecimentos, estudando para entender o que fazia e depois na prática percebendo o que era melhor, o que não era e tentando ajustar” (Luana). Segundo os relatos, a competência se desenvolve a partir da utilização de estratégias como: O trabalho em equipe “[...] um espaço que a gente tem, que chama espaço de escuta, [...] a gente começa a fazer outras leituras, começa a ter outros olhares e aí o trabalho vai fluindo” (Flaviana). A pesquisa: Segundo Alessandrini (2002, p.157), a qualificação de um profissional se dá a partir de “textos e livros que auxiliam na compreensão dos mecanismos atuantes no processo, [...] estudá-los e compreendê-los torna-se fundamental para o aprimoramento técnico”. Quando os professores passam a refletir sobre suas práticas, tornam-se “pesquisadores”, sendo assim, o mesmo autor afirma que “somos eternos estudantes dentro da profissão que escolhemos como caminho de vida. Afinal, trabalhamos com o material mais precioso: o ser humano” (ALESSANDRINI, 2002, p.164). No NEI os professores assumem esta postura de professor-investigador: “[...] mas era estudando, [...] eu sempre investi muito no estudo, procurei materiais sobre educação, li livros, sempre tentei procurar explicações para as dificuldades que iam surgindo” (Milena). A participação em cursos, congressos: De acordo com Perrenoud (2002a, p.57), “os sistemas educacionais 98 devem aplicar estratégias de inovação que permitam lidar com os problemas nãoresolvidos, aprender com a experiência e compartilhar saberes”. O NEI garante e incentiva aos seus professores a oportunidade de participar de eventos que propiciem a ampliação de saberes: “[...] a gente está sempre se reciclando, fazendo cursos, [...] assistindo algumas palestras [...]” (Lidianne). O compartilhamento de experiências Perrenoud (2002b, p.104), afirma que “a aptidão do grupo de professores de desenvolver e instituir suas próprias condutas de identificação e de resolução de problemas não exclui que recorram a expecialistas externos” quando acharem necessário. Essa é uma prática comum no NEI: “[...] a gente vai buscar conhecer os especialistas que atendem essa criança na área de fonoaudiologia, de psicomotricidade, da área neurológica também, [...] para conhecer um pouco mais daquela síndrome ou da necessidade daquela criança, para poder a gente atuar de forma mais significativa” (Laura). O caminho percorrido pelos professores do NEI é trilhado com o objetivo de adquirir “conhecimentos complementares para uma inserção qualificada” na sala de aula (OLLAGNIER, 2004, p.191). “[...] o NEI se organizava em estudos, em seminários, e eu comecei a participar desses momentos de estudo, de congressos, de encontros para adquirir mais conhecimento [...] para poder atuar de forma mais significativa” (Milena). Na construção do perfil desejável, o professor deve desenvolver suas competências no contexto do seu desenvolvimento profissional e da qualidade da sua ação, cabendo a ele identificar suas necessidades de formação e realizar o esforço necessário para se aprimorar, pois ser profissional “implica ser capaz de aprender sempre” (DIAS; LOPES, 2003, p1169). “As estratégias a gente vai sempre buscando na hora da necessidade, [...] quando a gente tem algum aluno que apresenta algum comportamento a gente busca nesse comportamento algo que 99 possa ajudar a trabalhar com essa criança” (Luana). Dessa forma podemos afirmar que os educadores do NEI buscam o desenvolvimento de suas competências em sintonia com o dizer de Alessandrini (2002): Há uma consciência crítica que deve ser desenvolvida. Há uma qualidade de ser humano que precisamos aprender a ser. Há uma nova postura que precisa participar de nossa atuação no mundo [...] Há um desafio imenso que se traduz em pequenos gestos, no cotidiano de nossas vidas pessoais e profissionais, que deve ser enfrentado e elaborado com a maturidade que construirmos. Há competências a serem atualizadas e ressignificadas. Há novas competências a serem desenvolvidas (ALESSANDRINI, 2002, p.169). A construção dos saberes profissionais O entendimento da educação como um processo de humanização, com a finalidade de tornar os indivíduos participantes e responsáveis pelo processo civilizatório, torna necessário uma reflexão quanto à prática docente que possibilita a aquisição de competências pelos professores e seu objeto de trabalho, o aluno. Nesse ambiente escolar, de aprendizagem, organização, especialização, existe a questão dos saberes, que assim como as competências, estão “ligados ao contexto social” no qual o professor está inserido, e também são “exigidos e adquiridos no exercício da profissão” (TARDIF, 2007, p.218). Idéia que é confirmada na fala de um dos entrevistados: “[...] eu acho que tudo o que eu vivenciei na vida foi contribuindo” (Daniela). Os saberes são construídos e partilhados no cotidiano profissional, assumindo um sentido amplo que engloba os conhecimentos, as competências, as habilidades e atitudes, que segundo Tardif (2007, p.49), se manifestam através de um saber-ser e de um saber-fazer pessoais e profissionais. Nesse sentido, é desenvolvida a categoria saber docente, que engloba a complexidade dos saberes construídos no e para o exercício profissional, trazendo consigo “as marcas” do que os professores são e para quem trabalham: “seres humanos” (TARDIF, 2007, p.16). Para um dos professores entrevistados, “[...] à medida que a gente vai conhecendo 100 essa criança, que a gente vai conhecendo a história de vida, a gente vai desenvolvendo uma prática, para que ela possa avançar [...]” (Flaviana). Esses saberes que são constituidos por conhecimentos diversos e utiliza vários tipos de competências, implica de acordo com Tardif (2007, p.209), em um “saber ensinar na ação”. E de forma geral, esses saberes são “temporais, adquiridos através do tempo” (TARDIF, 2007, p.260), sendo assim, os primeiros anos de prática profissional ou o contato inicial com situações novas, para muitos: “A minha iniciação, primeiro uma busca de conhecimentos, estudando para entender o que fazia e depois na prática percebendo o que era melhor, o que não era e tentando ajustar” (Luana). Este é um tempo de dificuldade, pois representa um processo de aquisição de novas competências, adaptação e estruturação nas rotinas de trabalho, o que gera angústia e insegurança: “Nos primeiros anos não tinha essa experiência então muita coisa não faço hoje” (Milena). Essa diversidade de saberes inclui os saberes adquiridos na formação acadêmica, na prática cotidiana e na relação entre eles. Alguns autores, a exemplo de Tardif (2007, p.36), classificam esses saberes como saberes da formação profissional, transmitidos pelas instituições de formação dos professores; saberes disciplinares, que correspondem às diversas linhas do conhecimento, adquiridos de forma isolada através das disciplinas acadêmicas; os curriculares, que se apresentam sob a forma de programas escolares, determinando os objetivos, conteúdos e métodos que os professores devem aprender a aplicar em sala de aula; e os experienciais, saberes específicos desenvolvidos no exercício da profissão, “baseado no seu trabalho cotidiano e no conhecimento do seu meio, que brotam da experiência e são por ela validados” (TARDIF, 2007, p.39). Para Nunes (2001, p.34), “o saber do professor pode ser racional sem ser um saber científico, pode ser um saber prático que está ligado à ação que o professor produz, um saber que não é o da ciência, mas que não deixa de ser legítimo”. Todos esses saberes são válidos e contribuem para a formação profissional, evoluem com o tempo e as mudanças sociais, porém na tentativa de controlar os diversos saberes e dominar sua prática, o professor busca desenvolver aptidões que lhe possibilitem enfrentar os condicionantes e as situações adversas 101 no seu contexto de trabalho, utilizando-se de todos esses conhecimentos adquiridos durante sua formação inicial e continuada: “[...] e era através das dificuldades ou através das necessidades que eu ia buscando adaptar o meu trabalho [...]” (Luana). Freire (2007, p.68) faz a seguinte reflexão sobre essa construção do saber: “Como professor preciso me mover com clareza na minha prática. Preciso conhecer as diferentes dimensões que caracterizam a essência da prática, o que me pode tornar mais seguro no meu próprio desempenho”. É a partir dos condicionantes dessa prática que os professores julgam sua formação universitária anterior, segundo eles, muita coisa se aprende com a prática, e sentem-se despreparados para enfrentar as condições adversas do trabalho: “Eu acho que a minha formação acadêmica foi muito deficiente [...] deixou muito a desejar [...] minha formação profissional que tem me possibilitado desenvolver um trabalho pedagógico que eu acredito, tem sido a formação em serviço [...]” (Flaviana). Para Tardif (2007, p.51), alguns docentes vivem uma distância crítica entre os saberes experienciais e os saberes adquiridos na formação, e “ao se tornarem professores, descobrem os limites de seus saberes pedagógicos”. Portanto, a prática profissional não se restringe à aplicação dos saberes universitários, mas a sua filtração, transformando-os em função das exigências de trabalho, porém segundo Tardif (2007, p.53), “os professores não rejeitam os outros saberes totalmente, pelo contrário, eles os incorporam à sua prática”, fato constatado durante as entrevistas: “Já tendo um pouco da teoria, do que é possível usar de metodologia no ensino, na educação, na medida que nós fomos praticando, que ia surgindo a necessidade, nós íamos colocando em prática” (Laura). Para Pimenta (2007, p.29), “a teoria fornece pistas e chaves de leitura, mas o que o adulto retém está ligado a sua experiência”. O professor interioriza conhecimentos, competências e valores durante sua vida pessoal e escolar, que determinam sua personalidade e estruturam suas relações com os outros, portanto, o saber experiencial não está ligado exclusivamente à experiência de trabalho, mas também à essa história de vida, incorporando sua identidade, sua maneira de ser, seu agir e sua relação com os outros. “[...] o ser professor, sozinho não consegue se 102 construir como esse profissional competente, a gente precisa ‘desses outros’ [...] no meio que a gente trabalha, as crianças, a família” (Flaviana). Assim, ele constrói e reconstrói seus conhecimentos através de suas experiências, do cotidiano da vida social, visando sempre a transformação de uma realidade, e “para que a realidade seja transformada, a prática se faz necessária” (AZZI, 2007, p.47). Afinal, “um professor tem uma história de vida, é um ator social, tem emoções, um corpo, poderes, uma personalidade, uma cultura, ou mesmo culturas, e seus pensamentos e ações carregam as marcas dos contextos nos quais se inserem” (TARDIF, 2007, p.265), “[...] e trabalhando mesmo eu tenho essa possibilidade de estar desenvolvendo prática e refletindo sobre essa prática” (Flaviana). Sendo assim, à medida que vão surgindo novas situações, ocorre a necessidade de uma reflexão sobre essa prática, para compreensão do problema e organização da ação planejada, através da improvisação e adaptação a essas situações. A cognição do professor é, portanto, condicionada por sua atividade, deixando o saber experiencial de ser visto como instância inferior, passando a se transformar em núcleo central do saber: “[...] o aprendizado maior é a prática, ensina a gente a buscar as necessidades específicas que a gente tem [...] eu diria que a prática é o maior ensinador” (Luana). Esses saberes adquiridos por meio da experiência devem ser constantemente revisados: “A cada ano você vai revendo de acordo com a prática [...] (Flaviana). Este processo se dá no contexto da aquisição da sensibilidade para as diferenças entre os alunos, na compreensão de suas particularidades individuais e situacionais, assim como de sua evolução, aceitando-os para que sejam aceitos pelos colegas, pelas famílias dos colegas, enfim, por toda a sociedade: “[...] você tem que se adaptar mais, que entender os processos de ensinar e de aprender com eles, eles não são o padrão, nenhum é igual ao outro, então você tem que estar sempre buscando coisas por você” (Denize); Segundo Tardif (2007, p.17), compreender as diferenças entre os alunos “é uma das principais características do trabalho docente”, o que deve ser comportado pelo saber profissional, assim como “o componente ético e emocional”. 103 O NEI, como uma escola de referência no processo de inclusão forma seus professores no sentido de reconhecer as capacidades de cada aluno e suscitar neles o poder de produzirem seu próprio conhecimento, desenvolverem suas competências: “[...] educador não é aquele que vai levar o conhecimento pronto, mas aquele que vai auxiliar a criança a ampliar sua aprendizagem, porque a criança já tem um aprendizado que o mundo, que a família passa para ela e nós só vamos aqui mediar e organizar de uma forma mais tranquila esse aprendizado que ela já tem” (Laura). E de acordo com Freire (2007, p.22), “[...] ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”. Os conhecimentos profissionais são evolutivos e progressivos, seja em suas bases teóricas ou práticas, necessitando de uma formação, de um aperfeiçoamento contínuo, através de diferentes meios, partindo-se da prática para a formação inicial: “[...] à medida que fui me familiarizando com o trabalho, fui me apropriando mesmo das teorias [...]” (Flaviana). Para Pimenta (2007, p.26), “o futuro profissional não pode constituir seu saber-fazer senão a partir de seu próprio fazer”. A autenticidade da educação se dará no momento em que se toma a prática como ponto de partida, reinventando os saberes pedagógicos com base no exercício social da educação. Tardif define o saber experiencial como “um saber social e construído pelo ator em interação com diversas fontes sociais de conhecimentos, de competências, de saber-ensinar, provenientes da cultura circundante, da organização escolar, dos atores educativos, das universidades, etc. (TARDIF, 2007, p.111). Este autor considera ainda, que o saber social leva o ator a posicionar-se diante dos outros conhecimentos e a hierarquizá-los em função de seu trabalho. A construção de uma educação nutricional inclusiva A pesquisa realizada nos permite concluir que a educação é um meio que pode ser utilizado para efetivar a anulação de preconceitos, tornando as pessoas sensíveis às diferenças. Para que ela produza o efeito esperado, fica evidente nas falas dos entrevistados, a necessidade dos educadores substituírem o 104 medo e a insegurança em lidar com o novo, pelo estímulo em enfrentar desafios e o desejo de contribuir para a formação cidadã das nossas crianças. Essa insegurança é própria do ser humano diante de adversidades, porém os professores atribuem parte desse sentimento às lacunas deixadas pela sua formação acadêmica. O corpo docente do NEI usa como estratégias para a aquisição das competências essenciais ao ensino, a cooperação, a prática reflexiva, o estudo e a pesquisa. Todo esse processo possibilita o desenvolvimento dos saberes exigidos e adquiridos no exercício profissional. Apesar de a formação do educador ser constituída de saberes diversos, de acordo com as entrevistas, o saber obtido na prática cotidiana é o autêntico instrumento para a construção do conhecimento, o aprender a fazer. Esse saber da experiência é intrínseca do educador, engloba suas capacidades adquiridas como ser humano e como profissional, sua identidade, sua história de vida, entre outros aspectos. A educação nutricional deve ser uma constante na vida do cidadão, junto à família, à escola, aos meios sociais disponíveis, para que os indivíduos tenham a capacidade de refletir criticamente sobre o que devem ingerir, para que desenvolvam a consciência da funcionalidade de cada alimento em seu organismo, deixando de visualizá-lo apenas como algo que sacia a fome, que proporciona prazer, unindo esse sentimento ao ato de nutrir. Isso pode ser possível através do trabalho conjunto de pais, professores, coordenadores e profissionais da saúde, em especial o nutricionista, que assume um papel de educador dependente da cooperação, da interação com os outros agentes envolvidos no processo de formação cidadã. Ser um profissional educador é o princípio básico do nutricionista, independente da área de atuação, não deixando de ser um desafio no seu exercício profissional. E em se tratando da prática inclusiva esse desafio é ampliado, já que identificamos uma deficiência de materiais teóricos para estudo. Percebemos através desta pesquisa que um educador ao construir a competência para trabalhar com educação inclusiva necessita dos saberes acadêmicos (disciplinares), dos saberes curriculares (estratégias para educar) mas principalmente dos saberes experienciais, adquiridos a partir do contato com essas 105 pessoas e que é construído permanentemente. Para nós, da área da saúde, conhecer o percurso profissional destes educadores, suas histórias, sentimentos, dificuldades e acertos experienciados em sua vida laboral foi imprescindível para concluirmos que o trabalho de educação nutricional com crianças especiais pode ser construído não somente a partir dos saberes acadêmicos e curriculares, mas através da resposta dada aos desafios surgidos no exercício cotidiano da profissão, uma vez que a competência é adquirida ao caminhar, sendo já o momento da nutrição abrir estas sendas. 106 EDUCAÇÃO ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA INFÂNCIA: RETALHOS DE VIVÊNCIAS Ivone da Silva Martins Paula Lima Galvão Gomes Kília Lorena da Silva Freitas Maria de Fátima Araújo Rachel Telechea Inda Vera Lucia Xavier Pinto Buscando compreender a importância da prática pedagógica relacionada com a promoção da alimentação saudável, realizamos análises documentais da Proposta Curricular do NEI investigando aspectos relativos à alimentação e nutrição; além disso, analisamos os registros dos Temas de Pesquisa, referentes aos anos de 2005 a 2007, arquivados na instituição, e realizamos jogos pedagógicos com as crianças para observar se essa era uma boa metodologia para realização de atividades de educação alimentar e nutricional.. A análise da Proposta Curricular do NEI evidenciou que esta é composta por uma parte teórica, que norteia as questões filosóficas, políticas e educacionais da instituição e uma parte prática que está organizada levando em consideração as áreas do conhecimento e a faixa etária das crianças; além de dar orientações sobre os objetivos mínimos que devem ser alcançados com as atividades educacionais, os conteúdos possíveis de serem ministrados e orientações metodológicas. A referida proposta se constitui, portanto, num guia dos conteúdos previstos para serem trabalhados pelos professores. Este documento foi elaborado no início da década de 1990 e segundo relato de profissionais da instituição, encontra-se desatualizado, não contemplando a prática pedagógica e o momento atual por que passa a escola. A prática de estudo e reflexão constantes sobre as concepções de ensino, de criança e sobre a prática pedagógica desenvolvida pelos professores, aponta para a necessidade de renovar, atualizar e dinamizar este guia, segundo estes mesmos profissionais. Uma nova proposta encontra-se em discussão, no entanto, ela ainda não está organizada de forma documental. Ainda assim, este trabalho se propôs a 107 utilizar a proposta antiga como ferramenta de estudo, tendo em vista contribuir para a inserção do tema alimentação e nutrição na referida proposta e conseqüentemente no atendimento às crianças na educação infantil dessa instituição ou de outras que possam ter acesso a esta proposição. Acreditamos que estas contribuições também possam subsidiar os professores e alunos do curso de Nutrição, no planejamento e desenvolvimento de atividades relacionadas à alimentação e nutrição, destinadas a crianças da mesma faixa etária que aquelas atendidas pelo NEI. Como foi possível observar, conteúdos relacionados à temática da Alimentação e Nutrição se fizeram presentes somente na disciplina de ciências e nas faixas etárias correspondentes a turma I (2 a 3 anos de idade) e turma II (3 a 4 anos de idade). Como bem frisa Boog (1995) a alimentação e a nutrição trabalhadas no ensino, geralmente na disciplina de ciências tem como objetivo: possibilitar ao ser humano assumir com plena consciência a responsabilidade dos seus atos relacionados à alimentação. Ou seja, os temas trabalhados nesta escola, ainda que apenas nas primeiras turmas, já influenciam as crianças de alguma forma. Foi observado ainda que, termos relacionados ao tema (culinária, fazer comidinhas, entre outros), perpassam todas as faixas etárias e algumas outras áreas de conhecimento que não as ciências naturais como: linguagem, matemática, ciências sociais e a educação física. Este resultado mostra que apesar de não constar em todas as disciplinas do currículo escolar, a nutrição perpassa as aulas de forma implícita, relacionada a atividades rotineiras do aluno o que lhe propicia uma maior familiaridade com o assunto. Ainda assim, é preciso que a alimentação e a nutrição sejam temas freqüentes nas aulas, mesmo que de forma implícita como, por exemplo, quando uma professora propõe a resolução de problemas matemáticos utilizando frutas e não balinhas. A partir da análise da proposta curricular do NEI, foram inseridas atividades lúdicas (jogos e brincadeiras) incorporando os mesmos elementos relacionados à alimentação e nutrição. E foram acrescentadas como propostas no currículo de acordo com a faixa etária das crianças e áreas de conhecimento trabalhadas na escola. 108 Linguagem No processo educativo, é preciso considerar como ponto de partida a realidade social e histórica em que tanto a criança como o educador estão inseridos. Partindo desse pressuposto, a função da escola é oferecer condições para que a criança compreenda o mundo em que vive, assumindo, assim, uma atitude crítica e construtiva, principalmente nas etapas iniciais que são muito marcantes no desenvolvimento humano. Na educação infantil o trabalho com a linguagem oral e escrita se constitui um dos eixos básicos, dada sua importância para a formação do sujeito, na interação com as outras pessoas, na orientação das ações das crianças, na construção de muitos conhecimentos e no desenvolvimento do pensamento (BRASIL, 1998a, 1998b, 1998c). É por meio da linguagem que se constituem os espaços de ampliação das capacidades de comunicação e expressão e de acesso ao mundo letrado pelas crianças. Essa ampliação está relacionada ao desenvolvimento gradativo das capacidades associadas às quatro competências lingüísticas básicas: falar, escutar, ler e escrever (BRASIL, 1998a, 1998b, 1998c). A alimentação entra no ensino da linguagem ao proporcionar o aluno uma viagem diferente ao mundo das letras, já que o mesmo irá se relacionar com objetos que desde sempre viu e ouviu falar. Jean François Revel (1996) apud Pinto (2000, p. 63) fala - nos da possibilidade de estudar a história da alimentação a partir do registro literário. Este não será o enfoque para as crianças, mas poderão ser apresentados contos, poemas, quadrinhos, cordéis, rimas e músicas que abordem o assunto. Ainda segundo Revel (1996) apud Pinto (2000, p.63), nos livros específicos de culinária há inserido, além da descrição das receitas, os hábitos e costumes daquele tipo de cultura representada ali. A partir deste mote, poderia ser levado para a sala um grande livro de receitas culinárias e reveladas algumas receitas típicas que permeiam as regiões e estados do Brasil (culinária nordestina, mineira...). E a partir da apresentação do livro seria requerida dos alunos a montagem de uma receita própria deles na qual eles deveriam utilizar a criatividade para deixá-la com um ar de apetitosa. Ao final as receitas seriam unidas e seria montado um outro 109 livro. As crianças elegeriam o título e escolheriam figuras que simbolizariam seus pratos para ilustrá-lo (atividade proposta para a turma 4 ou 5). Desta forma, os alunos e treinariam diferentes combinações culinárias usando a criatividade. Além disso, essa atividade suscita as ciências sociais e a partir dela poderão ser trabalhadas as diferentes culturas dentro de nosso país. Em uma outra citação Revel (1996) apud Pinto (2000, p. 47), mostra como os cozinheiros brincam com a sintaxe na hora de nomear seus pratos. Ao fazer rearranjos verbais dá a um prato que não deu certo uma determinada classe e “finesse” que o torna apetitoso. Assim seria uma possibilidade também de no exercício anterior estimular os pequenos a darem nomes aos seus pratos. Eles poderiam brincar de criar novas palavras, alguma que combinem mais com a receita que fez. A linguagem permeia todas as áreas do conhecimento, e quando associada à alimentação e a nutrição proporciona os alunos uma viagem ainda mais deliciosa ao aprendizado de novas culturas, histórias, expande o vocabulário, aguça a criatividade e desperta para um novo mundo. Artes O trabalho artístico é o resultado da interpretação espontânea dos momentos de aprendizagem, da conquista, da organização estruturada do gesto e do manuseio adequado dos materiais e das cores. A atividade artística da criança apresenta o sentido de organização de suas experiências. Desenhando, pintando, esculpindo, jogando papéis dramáticos, cantando, dançando, entre outras atividades, a criança seleciona os aspectos de suas experiências que ela vê como importantes, articulando-os e integrando-os num todo significativo. É uma comunicação significativa consigo mesma, é a seleção daqueles aspectos do seu meio com que ela se identifica e a organização desses aspectos em um novo e significativo todo. A alimentação liga - se a arte na medida em que a cozinha é considerada um espaço de criação, um lugar onde as pessoas podem mostrar sua arte de fazer. “As belas artes são em número de cinco, a saber: a pintura, a 110 escultura, a poesia, a música, a arquitetura, a qual tem por ramo principal a patisserie [pastelaria].” (PINTO, 2006, p. 211). Mas a expressão artística no universo alimentar não está circunscrita ao extraordinário; ela se mostra também no cotidiano. A gastronomia entra como a arte culinária e a partir daí os cozinheiros (chefs) adquirem um novo patamar, através de cuja criação podem incidir sobre o gosto dos patrões. O gosto passa a ser moldado e surge a idéia de bom e mau gosto (PINTO, 2000, p. 43). As cores são objetos de prazer gustativo. Preparar um prato pode dar o mesmo prazer que organizar um lindo buquê. No universo alimentar, não só o estímulo visual é marcante. Outros sentidos também são conclamados. Na mesa, há que se despertar o apetite através do belo, da integração do homem com os elementos formadores da natureza. Combinação cuidadosa: além das cores, devem dialogar texturas múltiplas, temperaturas variadas, sabores diversos, perfumes delicados, todos fundamentais para o homem (PINTO, 2006, p. 213). Tendo em vista a explosão de cores, sabores e sensações dadas pela arte culinária, este seria um bom tema para ser inserido nas aulas de Artes. Estimular as crianças à montagem de seus próprios pratos de forma colorida, montar pratos com rostinhos de palhaços, bichos ou outras crianças, fotografar as criações alimentares das crianças e organizar exposições para que as crianças de outras turmas e seus pais possam ver. Tudo isso faz com que a criança encare o alimento não mais como um objeto de cor que precisa comer porque os seus pais e professores querem, a partir do momento que ele vira objeto de arte, o alimento torna - se admirável objeto de trabalho e de fascinação. A necessidade de criar, transformar, re-ligar, é inerente ao ser humano. É física e espiritual. No processo de criação há uma relação entre o homem e a natureza. Há uma simbiose. O alimento que está sendo trabalhado culturalmente, artisticamente, em seguida será o próprio homem (PINTO, 2006, p. 211). Outras possibilidades se vêem também de se trabalhar a alimentação e a nutrição nas artes. Segundo Brasil (1998 p. 45) através da música por exemplo, ela é a linguagem que se traduz em formas sonoras capazes de expressar e comunicar sensações, sentimentos e pensamentos, por meio da organização e 111 relacionamento expressivo entre o som e o silêncio. A música está presente em todas as culturas, nas mais diversas situações: festas e comemorações, rituais religiosos, manifestações cívicas, políticas etc. Devido a sua flexibilidade, atividades como: Construção de instrumentos musicais utilizando caixas de leite, potes de iogurte, cascas de alimentos, arroz, feijão, macarrão; ou realização de letras musicais que envolvam alimentos (iniciando a atividade dando como exemplo músicas famosas como: Piui Abacaxi – Trem da Alegria; De Sabugo a Visconde – Lenine, Sítio do Pica Pau Amarelo; Comer Comer, Capelinha de Melão, Sopa de Paulo Tatit....). Educação Física Na disciplina de educação física trabalha-se essencialmente o movimento. Este segundo Brasil (1998 p. 15), é uma importante dimensão do desenvolvimento e da cultura humana. As crianças se movimentam desde que nascem, adquirindo cada vez maior controle sobre seu próprio corpo e se apropriando cada vez mais das possibilidades de interação com o mundo. Ao movimentarse, as crianças expressam sentimentos, emoções e pensamentos, ampliando as possibilidades do uso significativo de gestos e posturas corporais. O movimento humano, portanto, é mais do que simples deslocamento do corpo no espaço: constitui-se em uma linguagem que permite às crianças agirem sobre o meio físico e atuarem sobre o ambiente humano, mobilizando as pessoas por meio de seu teor expressivo. Dessa forma, diferentes manifestações da linguagem do movimento foram surgindo, como a dança, o jogo, as brincadeiras, as práticas esportivas etc., nas quais se faz uso de diferentes gestos, posturas e expressões corporais com intencionalidade. Ao brincar, jogar, imitar e criar ritmos e movimentos, as crianças também se apropriam do repertório da cultura corporal na qual estão inseridas (BRASIL, 1998, p. 15). É de suma importância o incentivo a prática da Educação Física desde a infância. No documento da OMS (2004 p. 09) cita – se que a atividade física é um fator determinante do gasto de energia e, portanto, do equilíbrio energético e do controle de peso. Ela reduz o risco relacionado com as doenças cardiovasculares e crônicas, como o diabetes, além da obesidade e do câncer (principalmente de cólon 112 e mama). Recomenda-se ainda que as pessoas se mantenham suficientemente ativas durante toda a vida que possuam ao menos 30 minutos de atividade regular diariamente. Isso associada a uma dieta equilibrada seria a receita para uma vida saudável. Daí a importância de nessas aulas inserir atividades que envolvam a alimentação. Podem ser adotados jogos como “O tesouro do Pêrata”, nesta brincadeira se dividiriam em grupos e receberiam mapas com dicas em foram de charadas cujas respostas seriam nomes de frutas, a partir da descoberta do nome da fruta o professor daria uma dica em qual local da escola estaria a fruta, então, elas iriam procurá-la para encontrar a próxima dica, termina o jogo quem encontrar primeiro o tesouro do Pêrata que se trata, na verdade, de uma bola, peteca, bolas de gude ou qualquer outro objeto que seja uma forma das crianças iniciarem alguma outra atividade brincadeira. No jogo citado acima vê-se associados os dois temas, mas outras possibilidades também são possíveis como realizar brincadeiras cantadas envolvendo gestos como: cozinhar, plantar, colher (proposto para turma 1), organizar idas hipotéticas ao supermercado, entre outras já propostas. Matemática No tocante às noções matemáticas (contagem, relações quantitativas e espaciais etc.), estas, segundo Brasil (1998, p. 213) são construídas pelas crianças a partir das experiências proporcionadas pelas interações com o meio, pelo intercâmbio com outras pessoas que possuem interesses, conhecimentos e necessidades que podem ser compartilhados. Uma forma de proporcionar essas experiências é planejar atividades como: A seleção e a organização dos conteúdos matemáticos representam um passo importante no planejamento da aprendizagem e devem considerar os conhecimentos prévios e as possibilidades cognitivas das crianças para ampliá-los. Para tanto, deve-se levar em conta que: Aprender matemática é um processo contínuo de abstração no qual as crianças atribuem significados e estabelecem relações com base nas observações, experiências e ações que fazem, desde cedo, sobre elementos do seu ambiente físico e sociocultural; A construção de competências matemáticas pela criança ocorre simultaneamente 113 ao desenvolvimento de inúmeras outras de naturezas diferentes e igualmente importantes, tais como comunicar-se oralmente, desenhar, ler, escrever, movimentar - se, cantar etc. (BRASIL, 1998, p. 216). A nutrição entra no ensino da matemática levando às crianças a situações do cotidiano, como por exemplo, nas atividades de compra/venda, na confecção de preparações culinárias (conhecimento de medidas como tempo e capacidade), na formação de conjuntos, associações entre outras, que os farão aprender, pensar e, posteriormente, exercitar aquilo que aprenderam. A introdução na aula de temas como a alimentação proporciona ao aluno a oportunidade de sair do ambiente fechado e sistemático da sala de aula e o traz para o dia – a – dia. É interessante citar como exemplo um trabalho realizado por Soares; Rogowski (2008) em um centro de educação infantil em Concórdia no Paraná. Ele teve como objetivo analisar as representações de número e conceitos de alimentação saudável que as crianças tinham. Através da história infantil Camilão, o Comilão da escritora Ana Maria Machado procurou – se desenvolver os temas da matemática e da alimentação saudável, sendo esta uma forma lúdica de proporcionar situações para incentivar as crianças a expressarem suas idéias e assim registrá-las graficamente de forma espontânea. Ao contar a história foi percebido pelos pesquisadores que as crianças estavam atentas, observavam as ilustrações e já davam suas opiniões referindo-se a quantidade de alimentos que Comilão estava levando em seu carrinho. A partir daí foram realizadas perguntas sobre a história, tais como: Quais foram os alimentos que Camilão levou? Quantos foram de cada tipo de alimento? Quanto é meia dúzia de bananas? E por meio das respostas foram trabalhados os conceitos de alimentação saudável. Para Maia e Menino (2004) apud Soares e Rogowski (2008, p.06) A linguagem oral é tão importante para aprender matemática como para aprender a ler. O processo de construção de um conceito pelas crianças, passa por representações gráficas próprias, isso ajuda o educador a compreender facilmente a forma como elas organizam seu pensamento e assim, podemos agir de maneira adequada, no sentido de ajudá-las a desenvolver o pensamento matemático. A partir de um trabalho como esse se percebe que a interdisciplinaridade é fundamental na 114 hora de ensinar. Ciências Naturais Nas ciências naturais, o tema alimentação e nutrição é comum, afinal sabe-se como a alimentação é fundamental para manter os seres humanos vivos e com saúde, ou seja, antes de tudo imaginamos o ato de alimentar-se como algo fisiológico e portanto, pauta de aula nas ciências naturais. Como já fora citada anteriormente, essa concepção de ensino-aprendizagem é reforçada pela proposta do Ministério da Educação e do Desporto (MEC), de incorporação dos temas transversais no currículo do ensino fundamental, sendo a saúde um deles. Apesar de o NEI ser uma escola de educação infantil, é importante que desde cedo as crianças compreendam melhor a saúde humana, desde o enfoque preventivo até a promoção de formas de vida mais saudáveis (YUS, 1998 apud PIPITONE, 2003, p. 30). A partir daí poderá ser trabalhada uma situação muito freqüente nesta faixa etária (0 a 6 anos), a recusa de alimentar-se de certos alimentos como frutas, vegetais e feijão. Desta forma é interessante trabalhar nas aulas de ciências atividades que despertem o interesse em crianças com repertório alimentar restrito, estas podem ser por meio de peças teatrais, dia da fruta, lanches coletivos. Deve-se suscitar nas crianças a curiosidade em provar novos alimentos criando, como fizeram Costa; Guimarães (p. 129, 1998), educadoras de uma creche em Ribeirão Preto, por exemplo, elas criaram um mundo paralelo ao das crianças (O mundo dos alimentos) no qual existia a personagem Maria Chicória que vinha em algumas aulas dar notícias da terra dela e dizia as crianças quão tristes estavam as frutas e as verduras, pois as crianças não gostavam deles, em suas visitas ela sempre trazia um representante deles para que ele falasse de suas propriedades e elas pudessem degustar seu sabor. Desta forma, as educadoras citam que as crianças demonstraram mais interesse na matéria e em degustar alimentos diferentes Além disso, podem se utilizar outros conteúdos como os vegetais e suas funções, os animais (tipos, habitat, etc.), estado físicos da água, clima e etc, para falar sobre alimentação e nutrição. Pode - se enfocar, por exemplo, ao falar 115 sobre os vegetais (partes, utilidade para o homem e etc.) a utilidade de alguns chás de plantas como camomila, erva – doce e boldo, ou ainda fazer uma pesquisa sobre o que nos alimentamos que são raízes, folhas, flores, etc. Ciências Sociais Segundo Brasil (1998, p. 165 e 166) nas ciências sociais as propostas e práticas escolares baseiam-se fundamentalmente na diversidade cultural, social, geográfica e histórica. Sem negar informações valiosas para que as crianças reflitam sobre paisagens variadas, modos distintos de ser, viver e trabalhar dos povos, histórias de outros tempos que fazem parte do seu cotidiano. A observação e a exploração do meio constituem-se duas das principais possibilidades de aprendizagem das crianças desta faixa etária. É dessa forma que poderão, gradualmente, construir as primeiras noções a respeito das pessoas, do seu grupo social e das relações humanas. O trabalho com as brincadeiras, músicas, histórias, jogos e danças tradicionais da comunidade favorece a ampliação e a valorização da cultura de seu grupo pelas crianças. O professor deve propiciar o acesso das crianças a esses conteúdos, inserindo-os nas atividades e no cotidiano da instituição. Fazer um levantamento das músicas, jogos e brincadeiras do tempo que seus pais e avós eram crianças pode ser uma atividade interessante que favorece a ampliação do repertório histórico e cultural das crianças (BRASIL, 1998 p. 178). Em torno do ato de comer, os homens, em inúmeras culturas e em todas as épocas, foram constituindo alguns dos procedimentos, rituais, imagens e símbolos mais fortes e eloqüentes da história da humanidade. A partir desse ato fundamental, desenvolveram- se práticas e costumes que muitas vezes fundam e dão identidade às diversas sociedades e tradições, o que permite traçar uma relação direta entre a essencialidade da vida individual e a essencialidade da vida coletiva ou da humanidade (GALLIAN, 2007 p. 179). Segundo Pinto (2006, p. 206) há muito tempo o ato alimentar deixou de ser apenas a busca da saciedade passando a representar uma forma de linguagem que permitiu ampliar a comunicação humana com seus pares e também com os deuses. Ainda segundo a mesma autora, as motivações ideológicas, filosóficas e religiosas têm relevância na escolha dos alimentos e no desenvolvimento de 116 técnicas de manipulação; sendo assim, a cozinha pode ser pensada como um veículo que permite ao indivíduo, através da aceitação de determinadas práticas, estabelecer uma relação de pertencimento a um determinado grupo. A cozinha surge então como um espaço de sociabilidade. Para Pinto (2006, p. 175) a comensalidade, ou seja, o ato de comer em companhia de outros, caracteriza as relações estabelecidas com o alimento pelos seres humanos. Segundo Savarin (1995) apud Pinto (2006, p. 175) o prazer de comer e o prazer de estar à mesa são duas instâncias que articulam natureza e cultura. O primeiro envolve a fome, a necessidade, o segundo a reflexão, a inteligência e os requintes da civilização. Ao estar à mesa as preferências alimentares renovam-se, recriam-se a partir da convivência. (PINTO, 2006, p. 209). A alimentação é campo muito rico para se trabalhar as ciências sociais, através de sua relação com a história, cultura, costumes e filosofia, servindo de mote para desenvolver diversas atividades, tais como: Abordar relação pai, mãe, irmãos, avós – criança e a partir disso abordar tópicos como aleitamento, jantar ou almoços de família (fotos de momentos como estes) situações que envolvem o componente social e afetivo da família, além de atividades como lanches coletivos e piqueniques que dão as crianças a noção da comensalidade. A inserção de temas nutricionais na educação infantil deverá ter êxito se for fundamentada em metodologia pedagógica como aquela descrita por Bizzo e Leder (2005, p. 663): dialogal; significativa, ou seja, que tenha sentido para o aluno; problematizadora, levando à reflexão sobre as causas, mecanismos e soluções das questões nutricionais, superando uma visão ingênua por uma visão crítica e criativa, capaz de transformar o contexto vivido; transversal, fluindo em caráter integrado com as demais matérias do currículo; lúdica, sempre que adequado, como motivadora e mediadora da compreensão do real pela criança. A proposta curricular do NEI e as proposições aqui realizadas para a inserção da alimentação e nutrição como temas relevantes na educação infantil devem ser complementadas com a criatividade necessária ao exercício cotidiano da docência, que observamos no estudo sobre os temas de pesquisa. O tema de pesquisa é uma metodologia utilizada pela instituição para 117 articular três dimensões básicas: o conhecimento das áreas de conteúdo que se quer tornar disponível, o contexto sócio-cultural das crianças, ou suas realidades imediatas, e os aspectos vinculados diretamente à aprendizagem (RÊGO, 1995). Segundo Rêgo (1995), as principais referências utilizadas para a construção do tema de pesquisa foram de Madalena Freire (1983), em A paixão de conhecer o mundo e Sônia Kramer (1989), em Com a pré-escola nas mãos. Rêgo (1995) afirma que a proposta pedagógica para a pré-escola, que utiliza o tema gerador (que o Nei designa como tema de pesquisa), foi fundamentada em Kramer (1989). Para a escolha desse tema gerador o NEI utiliza como critério três princípios básicos: O Contexto Sócio-Cultural da Criança em que pressupõe um conhecimento da realidade onde a criança está inserida, tanto nas experiências anteriores com a família, quanto nas vivências partilhadas com outras crianças e do grupo social a que pertencem, considerando os conhecimentos, os valores e as diversas linguagens que já trazem no cotidiano. As Áreas de Conteúdo, ou seja, os conhecimentos produzidos e sistematizados nas áreas de linguagem, matemática, ciências naturais e ciências sociais. O Nível de Desenvolvimento das Crianças, em que são respeitadas as características próprias do desenvolvimento sócio-afetivo, cognitivo e psicomotor, isto é, quais as estruturas do pensamento das crianças naquele momento de aprendizagem, como aprendem. Analisamos 55 documentos (relatos de temas de pesquisa desenvolvidos na instituição); destes, 2 apresentavam alimentação como tema de pesquisa e 16 trabalharam a alimentação inserida em outro tema de pesquisa abordado. Assim, 67% dos temas de pesquisa analisados não apresentavam alimentação e/ou nutrição inseridos nos temas de pesquisa ou como tema de 118 pesquisa. De acordo com a Política Nacional de Educação Infantil, (BRASIL, 2006b, p.17) “as instituições de Educação Infantil devem elaborar, implementar e avaliar suas propostas pedagógicas a partir das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil”. Para a apresentação dos resultados e discussão bem como avaliação da consonância da proposta pedagógica do NEI com a utilização da educação nutricional nos seus temas de pesquisa, consideraram-se os documentos de referencial curricular nacional para educação infantil (RCNEI), as Diretrizes curriculares de Educação Infantil e a portaria 1010. A Forma de Aprendizagem da Criança No processo de construção do conhecimento, as crianças utilizam as mais diferentes linguagens e possuem a capacidade de terem idéias e hipóteses originais sobre aquilo que buscam desvendar. Nessa perspectiva as crianças constroem o conhecimento a partir das interações que estabelecem com as outras pessoas e com o meio em que vivem. O conhecimento não se constitui em cópia da realidade, mas sim, fruto de um intenso trabalho de criação, significação e ressignificação (BRASIL, 1998b, p. 21-22). Aprender em Situações Orientadas A aprendizagem orientada pode ser exemplificada no tema de pesquisa “ESQUELETO HUMANO: PERCEBENDO O NOSSO CORPO SOB UM NOVO OLHAR”;- com crianças na faixa etária de 5 a 6 anos- foram eleitos pela turma vários assuntos envolvendo o esqueleto, porém neste tema de pesquisa foram sugeridos pelas professoras os assuntos sobre “o que precisamos comer para deixar os ossos fortes e as doenças dos ossos” em que as professoras relataram no documento que tais assuntos tiveram uma boa aceitação. Utilizou-se uma discussão sobre a saúde dos ossos, lanche coletivo e a dança para desenvolver tais assuntos com as crianças. Obteve-se como resultado a construção do seguinte texto coletivo pelas 119 crianças: “Agente precisa ter cuidado com os ossos. Fazer exercícios, tomar leite e derivados, comer peixe, carne, ovos, feijão e etc...” (fragmentos do texto coletivo). A Integralidade no Ensinar Observando os relatos nos temas de pesquisa do NEI pode-se perceber o desenvolvimento interdisciplinar quando o mesmo trabalha as possíveis áreas de conhecimento (linguagem: leitura e escrita, matemática, artes, ciências naturais, ciências sociais, educação física, cuidados com a saúde e qualidade da alimentação) construindo junto com as crianças tal apredizagem. Como por exemplo, aconteceu quando foi desenvolvido o tema de pesquisa com crianças de 2 a 3 anos de idade, “CONHECENDO O AMBIENTE ESCOLAR EM MEIO AO SABOR DAS FRUTAS” com caminhada identificando as plantas frutíferas trabalhado com essa atividade ciências naturais e educação física, modelagem, desenho e pinturas das frutas desenvolvendo a arte, com lanche coletivo valorizando a comensalização, socialização, a matemática trabalhando o tamanho e as formas das frutas e a construção pelos alunos do seguinte texto coletivo:” Estudando sobre as frutas, aprendemos que elas têm casca, semente, polpa, talo e sementes. A melancia, o abacaxi e o coco são frutas grandes, tem também frutas pequenas como morango, acerola, limão, goiaba e uva. Dentro da goiaba, do mamão e da melancia tem muitas sementes. No morango a semente está na casca. A fruta é uma comida que tem vitaminas e água. Ela vem da planta: maçã- maceira, coco- coqueiro, bananabananeira. A fruta é vendida em supermercado e quitandas. Comer frutas é bom para não ficar doente, gripado e com dor de barriga”(texto coletivo na integra). Formação Pessoal e Social Aos 3 anos, a criança incorpora muitos aspectos ou traços da cultura humana. Consegue identificar o outro e a sua alteridade. Sabe esperar sua vez. Gosta de participar de brincadeiras com outras crianças, de jogar, negociar, mas também de brincar sozinha. Inicia a percepção da distinção entre a palavra falada, o movimento corporal e a postura correspondente. Com o tempo, as palavras também servirão para comunicar vivências passadas, o que é primordial para o homem como 120 gerador e transmissor da cultura. É comum, nesse período, surgirem manifestações de medo (de escuro, água, animais domésticos, etc.), isso pode ser justificado pelo fato da criança perceber que existem limites, que ela não pode tudo, que existe uma lei reguladora dos atos humanos a qual ela tem que se submeter. A capacidade de abrir mão da realização de seus próprios desejos, juntamente com a sedimentação das funções motoras e da linguagem, propicia à criança maior circulação social, com gradativo aumento de autonomia, ampliando seu campo de trocas, saindo do domínio exclusivo da família em direção à escola e sentindo prazer em estar com os outros (BRASIL, 1999, p.88). Assim, por volta dos 6 anos, a criança consegue pospor a realização de um desejo em virtude da aceitação e compreensão das proibições, como também por levar em consideração o outro, suas próprias limitações e possibilidades (BRASIL, 1999, p.88). Identidade e Autonomia A construção da identidade e da autonomia diz respeito ao conhecimento, desenvolvimento e uso dos recursos pessoais para fazer frente às diferentes situações da vida. “A missão do ensino é transmitir não o mero saber, mas uma cultura que permita compreender nossa condição e nos ajudar a viver, e que favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e livre” (MORIN, 2003, p. 11). No tema de pesquisa, com crianças na faixa etária de 3 a 4 anos, “O FAZER DELES X O NOSSO FAZER” com o objetivo das crianças reconhecerem o trabalho como uma atividade importante na vida humana dentro do nosso contexto social/cultural. Conhecer os diversos tipos de trabalho compreendendo a importância do mesmo. Foi mostrado através de uma história um personagem chamado Castor que tinha a profissão de cozinheiro, os alunos aprenderam a fazer um “bolo delicioso” e degustaram o bolo preparado pelos mesmos, com essas atividades as crianças aprenderam a escolher, a se impor, a repensar e a dialogar, estabeleceram relações significativas em que cada dia enriqueciam sua autonomia, a construção do conhecimento (fragmentos do relato das professoras). 121 Com o propósito de desenvolver a identidade e a autonomia na criança é fundamental que o mediador utilize os recursos utilizados pela criança para a sua aprendizagem. Dentre os recursos que as crianças utilizam, destacam-se a imitação, a oposição, a linguagem, o brincar e a apropriação da imagem corporal (BRASIL, 1998b, p. 21). O Brincar “Brincar é uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento da identidade e da autonomia” (BRASIL, 1998b, p. 21). Segundo Rêgo (1995), em geral, as crianças, a partir dos 4 anos de idade, já iniciam jogos coletivos sem a intervenção direta da professora, eles escolhem entre si os participantes e definem os papéis. A professora é solicitada a intervir para negociar a participação de alguma criança ou mediar conflitos, principalmente na distribuição de papéis. Entretanto com crianças entre 2 e 3 anos de idade, é importante, além de encaminhar o jogo, muitas vezes fazer parte dele. Assim a professora precisa encaminhar as brincadeiras/atividades via ação, com o auxílio da oralidade, isto é, explicando e demonstrando o que quer conduzir. O tema de pesquisa, desenvolvido com crianças de 3 a 4 anos, “VIAGENS AO MUNDO ENCANTADO DO SÍTIO DO PICA-PAU AMARELO” mostra bem a utilização do faz-de-conta para viabilizar conhecimentos para as crianças. Conhecendo os personagens, a história do sítio do pica-pau amarelo e o autor da obra, trabalhou-se a culinária com receitas docinho de Emília e o salgadinho de queijo alimentos preferidos pelos personagens, desenho de um sítio retratado pelas crianças animais, plantio de hortas, plantas frutíferas, lanches coletivos, construção de uma maquete de um sítio com um lago cheio de peixes. O resultado referido pelas professoras foi que “através da culinária as crianças foram capazes de perceber a transformação de alguns ingredientes e trabalhar alguns conceitos da matemática além de, sobretudo saborear os alimentos” (trecho dos relatos das professoras). 122 Imitação A imitação é conseqüência da capacidade de a criança observar e aprender com os outros e de seu desejo de se identificar com eles, ser aceita e de diferenciar-se. Entende-se como uma reconstrução interna e não meramente uma cópia ou repetição mecânica. As crianças tendem a observar, de início, as ações mais simples e mais próximas à sua compreensão, especialmente aquelas apresentadas por gestos ou cenas atrativas ou por pessoas de seu círculo afetivo. A observação é uma das capacidades humanas que auxiliam as crianças a construírem um processo de diferenciação dos outros e conseqüentemente sua identidade (BRASIL, 1998b, p. 21). O tema de pesquisa que se pode observar a imitação e também o fazde-conta como forma de aprendizagem, através de cenas atrativas e pessoas do seu círculo afetivo foram “ALIMENTOS DO CORPO, DO AFETO E DA CULTURA” desenvolvido com crianças de 3 a 4 anos, com a apresentação de um teatro de fantoches. “Outra atividade que merece destaque no nosso tema de pesquisa, foi à apresentação de um teatrinho de fantoches, trazido por Candice, mãe de Gabriel, que é nutricionista. O teatrinho, apresentado por bolsistas e estagiárias do curso de nutrição, era animado pela presença de Magali (uma das atrizes que incorporava esse personagem da turma da Mônica) e contou com a presença de fantoches/alimentos como: a banana, o jerimum, a batata, o ovo, o sorvete, dentre outros, que iam se apresentando e falando se sua importância na alimentação. Todas as turmas foram convidadas a assistir e curtiram bastante a peça de teatro” (parte dos relatos das professoras). A Apropriação da Imagem Corporal Adquirir a consciência dos limites do próprio corpo é um aspecto importante do processo de diferenciação do eu e do outro e da construção da identidade. Por meio das descobertas que realizam através do contato físico com outras pessoas, da observação daqueles com quem convive, a criança aprende sobre o mundo, sobre si mesma e comunica-se pela linguagem corporal (BRASIL, 1998b, p. 25). 123 Com o objetivo de proporcionar para as crianças com faixa etária de 2 a 3 anos o conhecimento do próprio corpo explorando suas habilidades físicas, motoras e perceptivas do seu corpo e do outro, perceber os cuidados necessários com o corpo, a prevenção de acidentes e a saúde de forma geral, foi realizado o tema de pesquisa “O CORPO SOU EU!!!!” e que utilizou a apropriação da imagem corporal como forma de aprendizagem quando realizou a utilização dos gestos e o lanche coletivo relatado como resultado no texto coletivo produzido pela turma; “aprendemos que a nossa mão serve para bater palmas bem fortes, para beber a vitamina, para comer, para brincar e para comer feijão. Percebemos que a nossa boca serve para comer...” (trecho do texto coletivo) e parte do relato das professoras “foi um momento muito prazerosos para as crianças”. A Linguagem O trabalho com a linguagem representa um dos eixos básicos na educação infantil, dada sua importância para a formação do sujeito, para a interação com as outras pessoas, na orientação das ações das crianças, na construção de muitos conhecimentos e no desenvolvimento cognitivo (BRASIL, 1998c, p. 117). O trabalho com a linguagem pode ser exemplificado no tema de pesquisa “CULTURA INDÍGENA: LENDAS E JOGOS” desenvolvido com crianças de 4 a 5 anos, apresentou como objetivos identificar os elementos constitutivos do modo de viver dos índios tais como: vestuário, decoração, alimentação, músicas, danças e jogos. A linguagem foi abordada com a história lendária da origem da mandioca, “era uma vez uma índia que estava grávida e queria ter uma menina, mas o seu marido queria ter menino. Nasceu uma menina e o pai nem olhava para a filha. Ela ficou grávida denovo e nasceu um menino. A menina ficou muito triste e pediu para ser enterrada, nasceu uma planta que batizaram de manoca, depois virou mandioca”; com a musica de Djavan- a farinha que retrata um pouco os hábitos alimentares do nordestino,” a farinha ta no sangue do nordestino... farinha com feijão é animal!... vou a vizinha pegar para fazer pirão ou mingau...”; culinária de um bolo de milho, visita a casa da pedra com a degustação da tapioca, desenho sobre a origem da mandioca. De acordo com o relato das professoras no documento a 124 abordagem da cultura indígena com as crianças significou o desafio de aproximá-las dos valores e significados que os povos indígenas atribuem às ações cotidianas bem como as suas formas de explicação do mundo. Conhecimento de Mundo Movimento (educação física) O movimento, no trabalho com a criança, é importante, pois favorece a incorporação, a expressividade e a mobilidade próprias da infância. Compreender o caráter lúdico e expressivo das manifestações da motricidade infantil poderá ajudar o professor a organizar melhor a sua prática, levando em conta as necessidades das crianças (BRASIL, 1998c, p.19). Grande parte dos temas de pesquisa não trabalhou a educação física envolvendo alimentação, mas podemos citar o tema de pesquisa “CONHECENDO O AMBIENTE ESCOLAR EM MEIO AO SABOR DAS FRUTAS” em que promoveu uma caminhada pela escola identificando as plantas frutíferas e o tema de pesquisa” ALIMENTOS DO CORPO, DO AFETO E DA ALMA, realizado com crianças na faixa etária de 3 a 4 anos, utilizou um momento do “banho de grude” que pode ser trabalhado as cores dos alimentos: “Depois de longas discussões sobre os vegetais, em especial as verduras e legumes, combinamos um banho de grude, em que as crianças puderam vivenciar a extração de diferentes tonalidades para tingir o grude que pintaria seus corpos. Da cenoura extraímos a cor laranja; da beterraba, o rosa escuro e do espinafre, o verde. Esta atividade tinha ainda como objetivo vivenciar o lúdico relacionando o tema de estudo e o prazer em desenvolver atividades criativas e instigantes para as crianças, uma vez que não temos como fugir de uma educação que considere o sujeito por inteiro, numa fusão corpo-alma-ludicidade. Enfim, uma educação “que considere o corpo como uma ligação homem-mundo, (...) presente na cultura, nas tradições, na natureza, no cosmos” Érica Verderi (www.programapostural.ccom.br). (relato de experiências das professoras). “Fizemos o grude misturando apenas a goma e a água, depois levamos o liquidificador para sala de aula e junto com as crianças, obtivemos cada uma das cores citadas, liquidificando a cenoura, a beterraba e o espinafre com água. Depois 125 separamos em três bacias diferentes, o grude branco e o tingimos, misturando as cores obtidas. Atividades como esta, propicia à criança o desenvolvimento de uma melhor consciência corporal, proporcionando relações mais elaboradas com seu próprio corpo e o de seus colegas” (trecho dos relatos de experiências das professoras). Artes De acordo com as (DCNEI) as escolas devem respeitar os Princípios Estéticos da Sensibilidade, da Criatividade, da Ludicidade e da Diversidade de Manifestações Artísticas e Culturais. Arte Musical “A linguagem musical é excelente meio para o desenvolvimento da expressão, do equilíbrio, da auto-estima e autoconhecimento, além de poderoso meio de integração social” (BRASIL, 1998c, p. 62). O professor pode incentivar a criação de pequenas canções, em geral estruturadas, tendo por base a experiência musical que as crianças vêm acumulando. Trabalhar com rimas, por exemplo, é interessante e envolvente. As crianças podem criar pequenas canções fazendo rimas com seus próprios nomes e dos colegas, com nomes de frutas, cores etc. Assuntos e acontecimentos ocorridos no dia-a-dia também podem ser temas para novas canções. O professor deve observar o que e como cantam as crianças, tentando aproximar-se, ao máximo, de sua intenção musical. Muitas vezes, as linhas melódicas criadas contam com apenas dois ou três sons diferentes, em sintonia com a percepção, experiência e modo de se expressar das crianças (BRASIL, 1998c, p. 62). Com o uso de parlendas, o tema de pesquisa “BOI, BOI, BOI... BOI DA CARA PRETA. QUEM TEM MEDO DE CARETA” utilizou a linguagem musical com a seguinte canção: “um, dois, feijão com arroz, três, quatro, feijão no prato, cinco, seis, feijão inglês, sete, oito, comer biscoito, nove, dez, comer pasteis!” (canção produzida pela turma). Arte Visual 126 As Artes Visuais estão presentes diariamente no cotidiano infantil. Ao rabiscar e desenhar no chão, na areia e nos muros, ao utilizar materiais encontrados ao acaso (gravetos, pedras, carvão), ao pintar os objetos e até mesmo seu próprio corpo, a criança pode usar as Artes Visuais para expressar experiências sensíveis (BRASIL, 1998c, p. 85). Segundo Rêgo (1995), significa que para a criança o desenho é em sua essência realista, embora seja muitas vezes apenas uma intenção. A criança desenha sobre os temas abordados, antes mesmo de expressar o que realmente vê. A concepção de um desenho que não procurasse representar alguma coisa é de tal modo estranha à criança, que algumas não chegam a encontrar uma interpretação exata para o desenho que acabam de fazer, e declaram que representa ‘uma coisa’” (LUQUET, 1969, p.124). “No processo de aprendizagem em Artes Visuais a criança traça um percurso de criação e construção individual que envolve escolhas, experiências pessoais, aprendizagens, relação com a natureza, motivação interna e/ou externa” (BRASIL, 1998c, p. 91). “A VACA FOI PRO BREJO E PAROU NA TURMA 1” trabalhado com crianças de 2 a 3 anos, foi um tema de pesquisa que desenvolveu a aprendizagem utilizando a arte visual com o desenho da vaca e suas partes. Alguns outros temas de pesquisa também utilizaram a arte visual como uma ferramenta para aprendizagem como: “CONHECENDO O AMBIENTE ESCOLAR EM MEIO AO SABOR DAS FRUTAS” desenvolvido com crianças de 2 a 3 anos, com a massinha de modelagem, colagem e pintura de frutas e o tema “O PINTINHO AMARELINHO” realizado com crianças de 1,7 a 2,6 anos, em que para o lanche coletivo utilizou uma toalha de mesa pintada com desenhos de fruta. Linguagem Oral e Escrita Para o desenvolvimento das capacidades lingüísticas na infância é importante o professor favorecer o maior número possível de situações comunicativas e expressivas, ou seja, ampliar, integrar e dar conteúdo para a fala das crianças em contextos comunicativos para que ela se torne competente como 127 falante. (BRASIL, 1998c, p. 135). Muitos temas de pesquisa utilizam o texto coletivo, lista de compras e receitas para desenvolver a linguagem escrita como se pode perceber durante a análise documental, a linguagem oral geralmente os temas de pesquisa empregam a leitura de histórias e rodas de conversas. A linguagem oral foi trabalhada no tema “LÁ VAI A MÃE E O PAI... LÁ VAI O PATO!”com crianças na faixa etária de 1,8 a 2,3 anos, através de leituras de vários livros como o patinho feio, o pato gordo e o pato magro. O tema de pesquisa “ALIMENTOS DO CORPO, DO AFETO E DA ALMA, realizado com crianças na faixa etária de 3 a 4 anos desenvolveu a seguinte atividade trabalhando a linguagem oral: “Com o objetivo de que as crianças pudessem conhecer como os homens se alimentavam nos primórdios da nossa história, lemos textos na forma de interpretação da história, narrando como estes obtinham alimentos, o que comiam, onde conseguiam seus alimentos. Essas narrativas também enfatizavam as mudanças ocorridas na alimentação do homem pré-histórico com a descoberta do fogo e mais tarde da cerâmica, em que estes podiam contar com panelas e vasilhas para suas preparações. Ainda trabalhando a literatura, líamos diariamente, na hora da história, livros que contavam histórias de frutas, como a laranja, a uva, a tangerina, a jabuticaba, etc. Ao final, esses livros traziam sempre a receita de uma preparação com utilização da respectiva fruta. Aproveitamos e no dia que lemos o livro sobre a laranja, propusemos fazer um flameri de laranja. No dia seguinte as crianças acompanharam todo o processo de preparação, mas na hora da degustação, este não foi muito bem aceito pela maioria das crianças (trecho dos relatos das professoras). Outro tema de pesquisa interessante de se relatar como exemplo do uso da linguagem como forma de aprendizagem foi “CONHECENDO O AMBIENTE ESCOLAR EM MEIO AO SABOR DAS FRUTAS” desenvolvido com crianças de 2 a 3 anos, em que junto com os alunos criaram a história dos três porquinhos e as frutas, porém a história em si não foi descrita no documento, a elaboração de uma lista de compras e um texto coletivo com o seguinte registro: “Estudando sobre as frutas, aprendemos que elas têm casca, semente, polpa, talo e sementes. A 128 melancia, o abacaxi e o coco são frutas grandes, tem também frutas pequenas” (trecho do registro nos relatos de experiência das professoras). Matemática Vários temas de pesquisa utilizaram as receitas e a própria culinária para desenvolver o conhecimento com a matemática. Como exemplo, o tema “EU E A FORMIGA: SOU EU ASSIM COMO VOCE?” desenvolvido com crianças de 2 a 3 anos, em que utilizaram a receita de um bolo formigueiro e um momento de culinária para a sua preparação, possibilitando a criança conhecer as transformações, misturas, formas, consistências, odor e sabor, ou seja, as características organolépticas dos alimentos bem como a aplicação de boas práticas do manipulador na elaboração das preparações pelos alunos com o uso de toca e higienização das mãos. Outra vivência que se pode citar foi à ida ao mercado para fazer compras realizadas no tema “ALIMENTOS DO CORPO, DO AFETO E DA CULTURA” realizado com crianças na faixa etária de 3 a 4 anos, em que o seu documento apresenta o seguinte relato: “Com a lista pronta, decidimos que iríamos juntos a um mercadinho comprar os ingredientes. Assim, escolhemos um mercadinho pequeno, onde as crianças pudessem transitar com mais segurança e ter mais liberdade para explorar os diversos alimentos e ajudar a escolhê-los. Esse dia foi muito especial. Foi interessante ver como as crianças se sentiam responsáveis em estar num mercado fazendo compras, e juntos escolhemos todos os nossos alimentos. Contendo no carrinho tudo que precisávamos, fomos ao caixa e todos viram o valor de cada alimento, o valor total, e fizemos uma breve discussão sobre se o dinheiro que tínhamos daria para pagar, se haveria troco, etc. Pagas nossas compras, voltamos todos muito felizes e com grandes expectativas para o dia seguinte, no qual, enfim, faríamos nossa sopa” (trecho dos relatos de experiências das professoras). Ciências Naturais O tema de pesquisa “A VACA FOI PRO BREJO E PAROU NA TURMA 129 1” desenvolvido com crianças de 2 a 3 anos, realizou uma visita a um curral de vaca em que o texto coletivo construído pelas crianças com o auxílio das professoras relata o seguinte: “a vaca é um animal que dá leite, usamos o leite da vaca para fazer bolo, biscoito, queijo, doce, manteiga e iogurte, também comemos a carne da vaca....” (trecho do texto coletivo). Outro relato importante de se citar foi o tema “ALIMENTOS DO CORPO, DO AFETO E DA CULTURA” realizado com crianças de 3 a 4 anos, com os seguintes momentos: “... fizemos uma aula passeio a Escola Técnica de Jundiaí. Nosso objetivo era que as crianças vivenciassem um pouco da forma como se produz alimentos, em especial na horta, vissem a ordenha de uma vaca, além de outras coisas da vida rural que pudessem despertar o interesse das crianças. Este passeio foi extremamente produtivo e prazeroso. O ponto inicial da nossa visita foi à horta e as crianças ficaram encantadas ao visitá-la. Tiveram a oportunidade de colher cenouras, beterraba, pimentão, berinjela e alface. Na área livre da escola, deslumbraram-se com a beleza dos pavões e dos gansos, correram atrás das galinhas, identificaram seus ninhos com ovos. Na visita à casa dos coelhos, conheceram várias espécies e se encantaram com a beleza muito singular desses animais. No curral, fizeram a ordenha de uma vaca, e puderam depois tomar o leite fresquinho. Mostraram-se impressionados com o tamanho enorme dos porcos adultos e a beleza dos filhotes. No dia seguinte ao do passeio, tínhamos duas atividades a cumprir: fazer um suco com alguns dos vegetais que trouxemos da horta. Decidimos fazer suco de limão com beterraba e as crianças acompanharam na cozinha todo o processo de preparação desse suco. Mesmo que inicialmente algumas tenham resistindo a provar, todas se encorajaram e tomaram do suco. Muitas até repetiram várias vezes, foi uma grande festa. A outra atividade era retomar tudo que vimos no dia anterior e produzir um texto coletivo. Nessa atividade todas as crianças participaram ativamente, relembrando com muito entusiasmo as experiências vividas. Veja a seguir o resultado dessa produção: NOSSO PASSEIO À ESCOLA DE JUNDIAÍ Fomos na besta para a escola. A viagem foi legal. Quando chegamos à 130 escola, paramos. Vimos bichos, como: pavão, pato, ganso, galinha e galo. Depois fomos andando ver os vegetais na horta. Lá tinha pimentão, cenoura, alface, beterraba, berinjela, coentro e cebolinha. Quando saímos da horta fomos lanchar numa quadra. Depois fomos ver os coelhinhos. Para ver os coelhinhos a gente tinha que fazer silêncio. Tinha coelho preto, marrom, branco e cinza. Depois fomos de trator ver as vacas. Vimos muitos bezerrinhos e também vimos o homem limpando o peito da vaca. Depois ele tirou o leite e nós tiramos o leite também. Depois bebemos o leite da vaca. No final fomos ver os porcos. Tinha porcos muito grandes e filhotes. Depois voltamos para a escola. Nosso passeio foi lindo e legal!”(fragmento do relato de experiência das professoras). Ciências Sociais Os temas de pesquisa que abordaram as festas juninas favorecendo as crianças o conhecimento da cultura nordestina bem como os seus costumes. “O CORPO: ISSO QUE MEXE!” desenvolvido com crianças de 2 a 3 anos, junto com o tema de pesquisa foi trabalhado as festas juninas em que os alunos pintaram o seu rosto, caracterizaram-se de acordo com a cultura nordestina para a festa junina, dança de quadrilha e forró, degustação de alimentos típicos nas festas juninas e tais experiências resultou o seguinte texto coletivo: “aprendemos que na festa de São João, as meninas pintam o rosto e os meninos fazem bigode. No São João comemos pé-de-moleque, milho, assado e cozinhado, canjica, pamonha e bolo, também dançamos forró e quadrilha....” (trecho do texto coletivo). “CONHECENDO O SÃO JOÃO EMBALADOS PELO SONHO DE PAPEL” realizado com crianças de 2 a 3 anos, foi outro tema de pesquisa que desenvolveu atividades na área de ciências sociais que deu inicio ao tema com uma “caixa junina” instigando os alunos a uma discussão sobre o são João surgindo assim às primeiras idéias sobre essa cultura; posteriormente realizou um momento 131 de culinária com as receitas de um bolo junino e uma cocada, alimentos típicos das festas juninas, lanche coletivo, elaboração de uma festa junina com músicas e danças tradicionais, figurinos e pintura. Como resultado dessa vivência a turma construiu o seguinte texto coletivo: “a festa de são João do Nei foi boa, tinha bolo de chocolate, milho, churrasco, docinho e coca-cola. Na festa tinha fogueira de papel, balão, muitas bandeirinhas, chumbinho, cachorro quente...” (trecho do texto coletivo). A cultura mantém a identidade humana naquilo que tem de específico; mas também as identidades sociais com as suas particularidades. As culturas são aparentemente fechadas em si mesmas para salvaguardar sua identidade singular. Porém, na realidade, são também abertas: integram nelas não somente os saberes e técnicas, mas também idéias, costumes, alimentos, indivíduos vindos de fora. As assimilações de uma cultura a outra são enriquecedoras (MORIN, 2002, p.57). As culturas de outras épocas foram contempladas no tema de pesquisa “DE ULISSES À GRÉCIA ANTIGA: UMA EXPERIÊNCIA COM O ENSINO DE HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL” desenvolvido com crianças de 5 a 6 anos, apresentou como objetivo fazer a criança refletir sobre modos distintos de ser, viver e trabalhar dos povos. Com pesquisas dos alunos sobre esses povos, discussões em aula e apresentação de seminário, finalizando com a produção de um registro coletivo, em forma de texto descritivo, contendo não só o que foi aprendido, mas também as suas impressões sobre o que foram estudados, esses objetivos foram alcançados como se pode conferir no texto produzido pelos alunos: “na Grécia antiga as pessoas só fazem 2 refeições ariston e dupnon. A primeira era como se fosse o nosso almoço e a segunda como se fosse o jantar. No ariston as pessoas comiam nabo cozido ou cebola cru acompanhado as vezes de ervilha e outras vezes com feijão...”(trecho do texto coletivo). Componentes Curriculares Objetivos A definição dos objetivos em termos de capacidades - e não de comportamentos - tem como objetivo ampliar a possibilidade de concretização das intenções educativas, visto que as capacidades se expressam por meio de diversos 132 comportamentos e as aprendizagens que convergem para ela podem ser de naturezas diversas. (BRASIL, 1998a, p. 48). Na opinião de Morin (2002), é preciso o docente aprender a ensinar através de princípios de estratégia que permitiriam enfrentar os imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar seu desenvolvimento, em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza. Na analise documental pode-se perceber que o NEI busca atingir os objetivos em termos de capacidades quando observamos o seguinte trecho do tema de pesquisa “ALIMENTOS DO CORPO, DO AFETO E DA CULTURA” realizado com crianças de 3 a 4 anos: “O estudo iniciou com o resgate das idéias iniciais das crianças sobre o tema: Carne tem muita gordura, tem ferro e faz bem para a saúde; Carne faz bem para ficar forte; O almoço é muito bom para ficar forte; Verdura faz ficar forte como o super-homem; A parte boa da comida vai para o sangue e o bagaço vai para o cocô e o xixi; O feijão faz bem para saúde. Se não comer feijão fica fraco; A banana e o feijão são fortes e faz ter músculos gordos; Chocolate, bagana, balinha e chiclete não fazem bem para saúde; As folhas, arroz, peixe, macarrão, tomate e frutas fazem bem para a saúde; Também precisa beber água para matar a sede. Como se pode perceber, as idéias iniciais das crianças dão pistas de que já possuíam muitas informações/conhecimentos acerca dessa temática. Algumas, ao que parece, influenciadas pelo que as crianças ouvem em casa, de seus pais e/ou adultos com os quais convivem. Em seguida partimos para o levantamento do que as crianças queriam 133 aprender. Elas abordaram as seguintes questões: Qual o alimento que tem mais vitamina? Qual o alimento que faz ter músculos fortes? De onde vem o macarrão? Existe algum alimento que faz a gente ficar doente? Quais os cuidados que precisamos ter com os alimentos? Quais as vitaminas que existem, para que servem e em quais alimentos encontramos? Diante desses questionamentos e indagações, elegemos os nossos objetivos de estudo: Resgatar um pouco da história da alimentação; Formação de consciência para uma alimentação mais saudável; Identificar as origens dos alimentos; Compreender os procedimentos relacionados aos cuidados, conservação e higienização dos alimentos; Resgatar os alimentos que fazem parte da nossa cultura; Vivenciar práticas de culinária e degustação; “Vivenciar práticas de expressão corporal e artística, a partir desse tema”. (retalhos dos relatos de experiência das professoras). Conteúdos As diferentes formas de aprendizagens se dão por meio de sucessivas reorganizações do conhecimento, e este processo é construído pelas crianças quando podem vivenciar experiências que lhes forneçam conteúdos apresentados de forma não simplificada e associados a práticas sociais reais. É importante marcar que não há aprendizagem sem conteúdos (BRASIL, 1998a, p. 48). “Durante nossas aulas tivemos a oportunidade de ouvir varias músicas que falavam de alimentos. Uma dessas músicas falava de sopa e na sua letra, perguntava: “o quê que tem na sopa do neném?” e ia dizendo uma série de alimentos. Essa música, em especial, chamou muita a atenção das crianças, e no 134 transcorrer dos dias foi surgindo a idéia de fazermos uma sopa. Então começamos a perguntar para as crianças: “O que tem na sopa da turma 3?” E elas iam falando diversos alimentos. Até que decidimos realmente fazer uma culinária na qual prepararíamos uma deliciosa sopa. Fizemos no quadro, com a ajuda das crianças, uma lista do que elas queriam que tivesse na sopa. Foram escolhidos os seguintes ingredientes: cenoura, abóbora, coentro, cebola, batata, chuchu, tomate, macarrão e carne moída” (trecho do tema de pesquisa: alimentos do corpo, do afeto e da cultura). Conteúdos Conceituais Os conteúdos conceituais referem-se à construção ativa das aptidões para operar com símbolos, idéias, imagens e representações que permitem atribuir sentido à realidade. Desde os conceitos mais simples até os mais complexos, a aprendizagem se dá por meio de um processo de constantes idas e vindas, avanços e recuos nos quais as crianças constroem idéias provisórias, ampliam-nas e modificam-nas, aproximando-se gradualmente de conceitualizações cada vez mais exatas (BRASIL, 1998a, p. 49). Logo, deve-se ter consciência de que alguns conteúdos conceituais são possíveis de serem apropriados pelas crianças durante o período da educação infantil. Outros não, e estes precisarão de mais tempo para que possam ser construídos. Isso significa dizer que muitos conteúdos serão trabalhados com o objetivo apenas de promover aproximações a um determinado conhecimento, de colaborar para elaboração de hipóteses e para a manifestação de formas originais de expressão (BRASIL, 1998a, p. 49). Com o objetivo das crianças com faixa etária de 2 a 3 anos conhecerem o próprio corpo, explorando habilidades físicas, motoras e perceptivas do seu corpo e do outro. Perceber os cuidados necessários com o corpo, a prevenção de acidentes e a saúde de forma geral. Realizaram um lanche coletivo com frutas: “as crianças experimentaram frutas de diversos sabores, azedas, doces, além de ser um momento de interação e de aprendizagem sobre a importância das frutas para a saúde do corpo. Foi um momento prazeroso para as crianças”. (relato 135 das professoras no tema de pesquisa “O CORPO SOU EU!”) Conteúdos Procedimentais Os conteúdos procedimentais referem-se ao saber fazer. A aprendizagem de procedimentos está diretamente relacionada à capacidade da criança construir instrumentos e estabelecer caminhos que lhes possibilitem a realização de suas ações. (BRASIL, 1998a, p. 51). O relatório Delors et al. (2001) enfatiza a importância dos conteúdos procedimentais para formação da pessoa quando estabelece o segundo pilar da educação. Com o objetivo de favorecer a adaptação a convivência em grupo, possibilitar a partilha não só de sentimentos, mas também dos alimentos. O tema de pesquisa “CONHECENDO O AMBIENTE ESCOLAR EM MEIO AO SABOR DAS FRUTAS” desenvolvido com crianças de 2 a 3 anos realizou um momento de divisão das frutas em que cada dia uma criança traria uma fruta e dividiria com as demais crianças. Este procedimento favoreceu a construção do respeito pelo outro colega, a construção da amizade, o fortalecimento de laços afetivos e a solidariedade. De acordo com os relatos das professoras mesmo quando não mais realizaram o momento da divisão de frutas perceberam que algumas crianças ainda sim, dividiam os seus lanches com os demais coleguinhas. Conteúdos Atitudinais Os conteúdos atitudinais tratam dos valores, das normas e das atitudes. Conceber valores, normas e atitudes como conteúdos implica torná-los claros e compreendê-los como passíveis de serem aprendidos e planejados. Para as crianças aprenderem conteúdos atitudinais, é importante que o docente e todos os profissionais que integram a instituição possam refletir sobre os valores transmitidos cotidianamente e sobre os valores que se quer desenvolver. A aprendizagem de conteúdos deste tipo implica uma prática coerente, onde os valores, as atitudes e as normas que se pretende trabalhar estejam presentes desde as relações entre as pessoas até a seleção dos conteúdos, passando pela própria forma de organização 136 da instituição (BRASIL, 1998a, p. 51). Com o objetivo de desenvolver a compreensão da necessidade de uma alimentação mais saudável, o tema de pesquisa “ALIMENTO DO CORPO, DO AFETO E DA CULTURA” desenvolvido com crianças de 3 a 4 anos, realizou várias atividades algumas citadas anteriormente e as demais encontradas no quadro em anexo, com o seguinte resultado: “Ressaltamos, ainda a formação de atitudes nas crianças, quanto à escolha de alimentos mais saudáveis, orientação e até críticas aos colegas que continuam trazendo pipos ou semelhantes para o lanche, o desejo manifestado por elas quanto a orientar seus pais em aspectos relacionados aos alimentos” (trecho dos relatos de experiência das professoras). Experiência de conteúdos atitudinais desenvolvidos pelas crianças na faixa etária de 4 a 5 anos, que podemos citar foi o tema de pesquisa “MEU CORAÇÃO NÃO SEI PORQUE....” mostrou a anatomia, fisiologia do coração no corpo humano através de desenhos, pesquisa, leitura, as doenças relacionadas ao coração, através de uma conversa e leitura de um livro sobre as coisas que fazem bem e mal ao coração que resultou na elaboração de um painel informativo (coisas que fazem mal ao coração e coisas que fazem bem ao coração), pesquisa em revistas sobre o mesmo assunto, partendas, lanche coletivo –“ um dia de frutas” em que de acordo com o relato das professoras no documento esse conteúdo teve como resultado uma maior preocupação na qualidade dos lanches pelos alunos rejeitando frituras e afirmando que “ isso faz mal ao coração”. Uma das tarefas mais importantes da prática educativa-crítica é proporcionar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se. Assumir-se como ser social e histórico como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar. Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto. A assunção de nós mesmos não significa a exclusão dos outros. (FREIRE, 2007, p.41) Na realização de jogos pedagógicos, foi possível observar o nível de envolvimento das crianças, bem como a percepção das professoras. Para medir o 137 envolvimento das crianças foi utilizada uma forma (re)adaptada da Escala de Envolvimento da Criança, traduzida e adaptada da escala original The Leuven Involvement Scale for Young Children (LIS-YC) (LAEVERS, 1994 apud FORMOSINHO; ARAUJO; 2004). A percepção das professoras foi apreendida através de um questionário aplicado após a realização das atividades. Para estas atividades foram utilizadas as ferramentas pedagógicas de Educação Nutricional, intituladas “Saúde na panela X Doença na lixeira”; “Forca”; “O que me faz bem e o que me faz mal” e “Plaquinhas A e B”. O “saúde na panela x doença na lixeira” consistiu na exposição de figuras de alimentos, animais e objetos e as crianças observando as figuras identificavam o significado e escolhiam o seu destino: a panela ou a lixeira. O jogo “forca” foi realizado tal e qual é tradicionalmente conhecido. Foram trabalhadas 3 palavras e oferecidas dicas para facilitar a descoberta pelas crianças. Como por exemplo, para a palavra refrigerante foram dadas as dicas: “Seu consumo não é saudável; é uma bebida; pode ser de uva, de laranja, de guaraná ou de cola” “O que me faz bem e o que me faz mal” foi um jogo no qual foram utilizadas duas carinhas, sendo uma feliz (você me faz bem) e uma triste (você me faz mal) que foram afixadas no quadro. As crianças recebiam figuras de alimentos com dicas (como por exemplo, na ficha que havia a foto do espinafre encontrava-se: “sou um vegetal; te deixo fortão; o marinheiro Popeye me adora”) e escolhiam, de acordo com as suas características, onde deveriam colocá-los, se na cara feliz ou triste. No jogo “Plaquinhas A e B” foram distribuídas para as crianças e eram feitas perguntas, às quais elas respondiam erguendo a plaquinha correspondente ao que elas compreendiam como resposta certa. Como exemplo, para a pergunta “lanche saudável” havia as alternativas: (A) fruta, (B) salgadinho. Em cada sala onde foram realizados os jogos, estiveram presentes estudantes de nutrição e cada um observou 2 crianças, que foram aleatoriamente escolhidas (sorteio entre os nomes das crianças presentes). Os professores que trabalham em cada turma executaram as atividades. As quatro brincadeiras foram 138 realizadas em 2 dias, duas por dia em cada turma. A medição do envolvimento das crianças foi feita através da (re) adaptada Escala de Envolvimento da Criança, traduzida e adaptada da escala original The Leuven Involvement Scale for Young Children (LIS-YC) (LAEVERS, 1994 apud FORMOSINHO; ARAUJO; 2004), que é constituída por duas componentes: uma lista de indicadores/sinais característicos de um comportamento de envolvimento (Concentração, Complexidade e Criatividade, Persistência, Precisão, Reação ao Estímulo, Comentários Verbais, Satisfação) e os níveis de envolvimento (Nível 1: Ausência de atividade, Nível 2: Atividade freqüentemente interrompida, Nível 3: Atividade mais ou menos contínua, Nível 4: Atividade com momentos intensos, Nível 5: Atividade intensa mantida). Para avaliar a percepção dos professores foram aplicados questionários, analisados dentro de uma perspectiva qualitativa. Ao serem trabalhados os jogos, verificou-se que estes proporcionaram concentração, variável que indica que a criança focaliza a sua atenção ao círculo limitado da sua atividade; persistência, pois as crianças foram motivadas à não abandonarem a atividade; sendo percebível os comentários verbais positivos, reação ao estímulo, precisão e a satisfação, demonstradas através de olhares, gestos e dedicação. Porém a variável complexidade e criatividade não foi observada para nenhum dos jogos utilizados, isso se explica pelo fato de que os jogos estavam adaptados para a faixa etária das crianças e foi devidamente explicado pelos professores na hora de sua execução, como também porque os jogos já estavam prontos e as regras pré-estabelecidas, não permitindo às crianças variações nas ferramentas e tampouco na forma de utilizá-la. Quanto aos níveis de envolvimento, foi percebido que no jogo da “Forca” em relação às 6 crianças observadas, 2 tiveram nível IV e 2 nível V. As crianças em sua maioria estiveram com os olhos ininterruptamente focalizados nas ações e no material, não se distraíram com estímulos circundantes. As ações foram prontamente realizadas e exigiram esforço mental o que aconteceu de forma natural. Na brincadeira “Saúde na panela X Doença na lixeira” de 8 crianças analisadas, 4 apresentaram nível IV e 2 Nível V. A brincadeira “O que me faz bem e o que me faz 139 mal” de 9 crianças observadas, 4 apresentaram o nível IV de envolvimento. As Plaquinhas com alternativa “A” e “B’ proporcionaram para a maioria das crianças, o nível IV de envolvimento, com 5 crianças das 8 observadas, sendo assim o único jogo, dos 4 utilizados, com o maior número de crianças expressando esse nível de envolvimento. Portanto, em todas as brincadeiras executadas, principalmente no jogo “Plaquinhas A e B”, o nível IV foi o mais observado, traduzindo um grande envolvimento por parte da criança na atividade realizada, tendo essa uma importância real, deduzido pela sua concentração, persistência, energia ou satisfação, contudo com falha na complexidade, não requerendo das crianças, um grande esforço mental. As 4 atividades aplicadas em sala de aula envolveram um total de 4 professores que mediaram as brincadeiras. Três professores puderam responder ao questionário, elaborado para a obtenção de mais um fator que identificasse o envolvimento dos alunos na utilização das ferramentas pedagógicas de educação nutricional. Através das respostas dos questionários verificou-se a importância da brincadeira, sendo esta fundamental para a criança, ampliando seu conhecimento de mundo, ajudando no seu desenvolvimento, bem como na sua socialização com seus colegas, como afirma a professora Tereza, que “a brincadeira faz parte do universo infantil. Por isso, é essencial no cotidiano pedagógico”. Para mim, a brincadeira é de primordial importância para as crianças. É através da brincadeira, do jogo, do faz-de-conta que a criança amplia seu conhecimento de mundo, cresce como ser humano, e interage com o outro de uma forma muito especial.” (Lúcia). A brincadeira é uma atividade muito importante para o desenvolvimento infantil, tanto pelo seu caráter lúdico, quanto pela possibilidade de a criança vivenciar papéis e adentrar a um universo nem sempre possível em seu mundo real. por isso é indispensável que a brincadeira faça parte da rotina da prática pedagógica na educação infantil.” (Regina). Segundo as professoras, os jogos preferidos pelas crianças são do tipo 140 faz-de- conta; brincadeiras com regras, música e atividades que envolvam movimentos. Porém foi percebido por elas, que os jogos aplicados nas turmas despertaram interesse, participação ativa e demonstração de contentamento. Uma das formas de avaliar se o jogo agradou às crianças é fazer pergunta para as mesmas, se elas gostaram da atividade. A partir das respostas, é que é percebido se há necessidade de redimensionar a atividade e repeti-la; bem como a simples observação das brincadeiras das crianças, que muitas vezes o repetem nos seus momentos livres. Quanto à avaliação da reação das crianças aos jogos aplicados, as professoras responderam o seguinte: Forca A professora Regina respondeu que “as crianças desse grupo estavam em processo de alfabetização e a forca estava muito presente no cotidiano da sala de aula, mesmo assim, parecia a primeira vez que elas estavam participando desse jogo, pois se envolveram muito e participaram ativamente”. A professora Tereza afirmou que “faz parte do cotidiano de brincadeiras das crianças. Elas sempre se envolvem e demonstram prazer/alegria emaprticipar”. Saúde na panela X Doença na lixeira “Foi muito interessante, pois é uma brincadeira que a criança realmente põe a ‘mão na massa’, e esse tipo de atividade envolve muito as crianças” (Professora Lúcia) “Na minha avaliação esta foi a atividade que mais despertou interesse, as crianças se divertiram muito com cada novo objeto que surgia e tinham que decidir para onde ia se ia pro lixo ou pra panela. Considero também que a forma como foi conduzida a atividade contribuiu para o envolvimento do grupo” (Professora Regina) A professora Tereza apreciou os jogos: “foi interessante, inclusive pelo material bem elaborado”. 141 O que me faz bem e o que me faz mal Lúcia afirmou: “Acho que foi bem interessante, elas realmente colocaram em jogo os conhecimento que já construíram sobre a alimentação e se interessaram em refletir para resolver o jogo”. Corroborando com a professora, Regina afirma: “Uma atividade que levou as crianças a pensar brincando. AS crianças se envolveram bastante e demonstraram interesse” e Tereza complementa: “Foi muito interessante. As crianças se envolveram. Foram desafiadas a pensar”. Plaquinhas A e B Segundo Lúcia, “As crianças também se envolveram bastante, ficaram muito atentas, e o fato de se ter um instrumento para elas manipularem (as plaquinhas) para responder as perguntas, fez com que elas se envolvessem com muito mais interesse, pois a brincadeira ficou mais divertida”. A brincadeira criou movimento e isso é um fator que contribui para o envolvimento da criança. Regina avaliou que “nessa atividade, embora em menor intensidade, também considero que houve envolvimento sim” e Tereza achou esse jogo também interessante. Segundo as professoras entrevistadas o jogo que mais agradou as crianças foi o ‘Saúde na panela X Doença na lixeira’. A utilização dos jogos permitiu às crianças “demonstrar os conhecimentos que já sabiam sobre a alimentação, tornando assim, as brincadeiras um desafio, o que é bem estimulante para as crianças dessa idade” (Lúcia) “As atividades de jogos possibilitaram as crianças vivenciar momentos importantes de ludicidade, afetividade e conhecimento a respeito da educação nutricional, sem que necessariamente este tema tivesse sido anunciado como algo a ser estudado. Mesmo assim as crianças, brincando, nos deram pistas de que já sabem muito sobre o ato de alimentar-se, dos mitos que envolvem a alimentação e dos valores transmitidos pela cultura. Em todas as atividades as crianças se envolveram e brincaram, o que é mais importante nesta etapa da vida humana” (Regina). Tereza ratificou que “As situações de jogos possibilitaram às crianças expressarem [...] a necessidade de uma alimentação saudável. 142 Em relação aos três aspectos observados neste texto, a análise da Proposta pedagógica e dos Temas de Pesquisa da instituição, bem como a aplicação de jogos pedagógicos, pôde-se observar que é possível a promoção de uma alimentação saudável a partir da Educação Infantil. 143 A ESCOLA E A PESQUISA 144 A ESCOLA E A PESQUISA: TEMPO DE COLHER O saber de que a escola é um terreno especialmente fértil para o plantio de práticas salutares de alimentação, de nutrição, de educação e de vida é fato comum entre todos os que nela pisam. Cultivar essas práticas, entretanto, não é tarefa fácil. Perceber a estação melhor, aceitar e enfrentar o desafio das mudanças de clima, buscar o melhor método, controlar os perigos e ver, por fim, nascer os brotos, regá-los e provar seus frutos foi o doce presente deste projeto. A nossa idéia era fazer dialogar Escola e Pesquisa, tocar essa interface e encontrar nas falas dos sujeitos envolvidos o aroma e o sabor de suas expectativas e de suas vivências. E se, em separado, os resultados nos encheram os olhos e nos despertaram o apetite para o farto menu de pratos típicos (e atípicos, mas não menos saborosos), descobrimos que, como nas refeições, ainda tínhamos a sobremesa. A percepção do quanto foi emancipatório para a vida de todas as pessoas do NEI ser partícipe ativo dessa pesquisa, compreendendo-se como alguém que poderia mudar e ser mudado nos estimulou a mexer naquela terra e observar o movimento recíproco de transformação ambiente-indivíduo-ambiente, apresentados nas páginas que se seguem. 145 PLANTANDO SABORES, COLHENDO SABERES Priscilla Pereira Machado Guimarães Vera Lucia Xavier Pinto Ingrid Wilza Leal Bezerra A alimentação é primordial para o crescimento, desenvolvimento e saúde da criança e, para a adoção de hábitos saudáveis, ela deve contar não só com o cuidado dos pais, como também da escola. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), com seu caráter assistencial e educativo, entra nesse contexto como importante ferramenta de educação e saúde. O NEI, durante o desenvolvimento do projeto de pesquisa apresentado neste livro, optou pela adesão ao PNAE, o que gerou a necessidade de transformações no espaço físico, na organização do trabalho e nas relações entre as pessoas. Nosso objetivo foi compreender os diversos significados atribuídos a este processo de implantação da Unidade de Alimentação Nutrição (UAN) no NEI pelos sujeitos envolvidos: direção, coordenação, docentes, funcionários, pais e estagiária de nutrição. A coleta dos materiais para a investigação foi feita através de uma pesquisa qualitativa, com a realização de entrevistas semi-estruturadas que foram gravadas e posteriormente transcritas e analisadas através da análise de conteúdo (BARDIN, 1977). Observamos nas falas que as mudanças causadas pela implantação trouxeram melhorias para os sujeitos envolvidos em vários aspectos como o trabalho, a rotina e a qualidade da alimentação. Participaram 18 pessoas, havendo representação de todos os grupos que compunham a comunidade escolar possuindo, assim, propriedade para tratar do assunto. Os reais nomes dos sujeitos envolvidos foram substituídos por nomes de flores, a fim de preservar sua identidade. Plantando as sementes A ausência de um profissional nutricionista para conduzir o processo de implantação da UAN foi o primeiro obstáculo a ser superado. A presença de uma estagiária com carga horária fixa no NEI, orientada pelas professoras responsáveis 146 pelo projeto e, posteriormente, o apoio das nutricionistas do Restaurante Universitário da UFRN tornaram o clima ideal ao plantio. Tínhamos, pois, o solo fértil (o desejo de produzir a alimentação), as sementes (o programa) e a expectativa de toda a comunidade em ver as flores e os frutos aparecerem. Começamos a jardinagem... Existia na escola uma cozinha e, vizinho a essa, um almoxarifado onde objetos da escola eram guardados. Nesses locais, tudo acontecia: das conversas dos professores nos intervalos às práticas de culinária das crianças. Esse era o espaço de integração das pessoas que estavam na escola e acabar com ele seria, pelo menos a priori, retirar de todos aquele local de encontro. Algumas modificações precisariam ser feitas na estrutura física daqueles espaços, para que pudéssemos dar início à produção da alimentação escolar. O desafio, no entanto, não era somente transformar o espaço, mas, sim, envolver as pessoas. Assim, iniciamos pela capacitação dos funcionários que poderiam estar envolvidos nesse processo, incluindo manipuladores, coordenação e direção da escola. “[...]Durante a capacitação, percebi uma certa resistência às mudanças e acredito que essa resistência aconteceu principalmente pelas novas tarefas que seriam incorporadas à rotina, pois eles, muitas vezes, tinham tempo ocioso, e agora precisariam trabalhar mais. Além disso, as mudanças estavam sendo estabelecidas por alguém que, até então, era desconhecida deles. Foi aí que percebi essa capacitação como uma oportunidade de criar um vínculo com todos, não só de amizade, como também de respeito e profissionalismo. Ao ingressar na faculdade, tínhamos a nutrição como o “fazer dieta” e esse conceito, felizmente, vai sendo desmitificado ao longo do curso, com o decorrer das disciplinas. Estou chegando ao final dessa caminhada, e percebo que o conceito de nutrição torna-se muito mais amplo, fazendo-me perceber o quanto cresci desde o ingresso ao término. Estar nesse processo de capacitar pessoas para transformar o fazer e o comportamento com relação ao alimento, me fez perceber o quanto o papel do nutricionista, que está à frente de todas essas mudanças, é delicado e fundamental (Botão de Flor, estagiária). Concomitante à capacitação de pessoal e adequação da estrutura física, enviamos a todos os pais um questionário a fim de pesquisar os hábitos alimentares das crianças e a reações adversas aos alimentos (alergias e/ou 147 intolerâncias) que porventura elas tivessem. Essa pesquisa tinha a finalidade de identificar, em cada turma, quais as crianças que precisariam ter adequações em alguns lanches. Percebemos o quanto que essa observação tranqüilizou muitos pais, que estavam apreensivos sobre como os seus filhos teriam a alimentação adaptada. Fizemos um levantamento de todos os utensílios que já existiam na escola para dimensionar, posteriormente, quantos seriam necessários à produção, para que pudéssemos comprá-los. Como a escola não possuía recurso financeiro nem uma estrutura já organizada para tal, foi acordado com os pais que as crianças levariam os utensílios de uso pessoal de casa. No primeiro dia, quando iríamos iniciar a Alimentação Escolar, fizemos um teatro de fantoches com as crianças, com um menino e uma menina conversando sobre lanchar na escola, uma forma lúdica de fazer chegar até elas as mudanças que ocorreriam dali por diante nas suas rotinas. Para elaboração do cardápio, consideramos tanto os alimentos recomendados pelo PNAE, quanto a disponibilidade de equipamentos, utensílios e pessoal da escola. Inicialmente, os per capitas foram testados, levando em consideração per capitas pra crianças2. As sobras e restos eram observados ao final da distribuição do lanche, a fim de fazer as adequações necessárias. Esse foi mais um desafio, o de conseguir adequar o cardápio e os per capitas às crianças, pois muitas vezes as professoras relatavam que determinado alimento não tinha sido aceito, mas não observávamos restos e/ou sobras que pudessem confirmar esses relatos. O florescer das sementes Durante os relatos, nos foi possível conhecer os diversos significados atribuídos pelas pessoas envolvidas nesse processo, desde o plantar até o surgimento dos frutos. Saber o quanto uma mudança no ambiente de trabalho pode interferir no dia-a-dia e na vida das pessoas, tanto positiva quanto negativamente, fez-nos pensar na responsabilidade a cada tomada de decisão, a cada passo, a cada semente lançada ao solo. 148 “Enquanto condutora dessas mudanças, confesso que, inevitavelmente, muitas mudanças internas aconteceram, do pensar ao fazer. O “ser nutricionista” ficou bem mais próximo e evidente, já que tive que atuar como tal e assim, compreendi que lidar com pessoas é a parte mais difícil, porém a mais gratificante e encantadora. Dimensionar equipamentos, adequar áreas e controlar custos é simples; difícil – e bonito - é mudar pensamentos e atitudes, plantar satisfação”. (Botão de Flor). Rosa, a vice-diretora, estava envolvida com o processo ‘do fazer’ da alimentação escolar, e relatou as mudanças: [...] Mudou toda a estrutura na escola, quer dizer, com relação à cozinha, a almoxarifado, teve que mudar mesmo e com isso minha vida também. [...] Foi mais um trabalho que a gente adquiriu, que a gente incorporou e de certa forma eu me sinto feliz de fazer esse trabalho [...]. A partir do relato das gestoras da escola, percebemos que, com as mudanças, houve uma inclusão de trabalho à rotina antes estabelecida, mas isso pareceu ser visto de forma positiva. Amarílis, professora, também relatou como observou a reação de algumas pessoas nesse processo: Eu vi muita gente muito preocupada e eu achava que isso não ia acontecer nesse contexto, eu não achava que ia ter uma certa resistência e uma certa cobrança [...] e também eu tinha certeza absoluta que eles [os pais] tinham a maior confiança no que era proposto pelo NEI para a comunidade. Enfatizando a importância de envolver todos nesse processo, Margarida, coordenadora, disse: A merenda provou que quando a escola deseja algo, ela acredita num objetivo, e consegue pulverizar essa coisa entre os funcionários, conscientizar, as coisas se arranjam [...]. Eu acho teve uma mudança de postura, tanto dos professores, como dos funcionários [...]. Por incrível que pareça, os funcionários abraçaram essa idéia de um jeito maravilhoso, eu tinha muito receio de como isso ia ser colocado para os funcionários que iam lidar com a merenda, mas me surpreendi como esse fator inclusive de estímulo para o trabalho [...]. Ela trouxe um motivo maior pra estar nessa escola pra muitos funcionários. Percebemos, durante a conversa com as funcionárias que lidam diretamente com a alimentação escolar (as merendeiras), o quanto foi motivante 149 iniciar esse processo de mudança: Eu achei que mudou o meu trabalho, que eu tinha pouca coisa pra fazer e quando chegou a merenda melhorou muito, porque além de eu aprender muito com a merenda, [...] meu trabalho rendeu mais [...] E isso mudou muito a minha vida. Eu até pensei em me aposentar ano passado, mas quando a merenda chegou, eu desisti, agora não tem previsão. Eu não tenho previsão porque eu amo o que eu estou fazendo (Jasmim). Miosótis, a outra funcionária que recebeu a capacitação, trabalhava anteriormente na limpeza e relatou: Para mim a mudança foi muito importante [...] foi como se eu tivesse passado para um nível superior, porque eu passei para uma coisa melhor e como eu era meio ‘irresponsavelzinha’ com o horário, a merenda me impulsionou a ser mais responsável [...]. Mas isso pra mim foi ótimo, chegou aqui o que eu queria, o que eu pensava. As professoras, que também participaram dessas modificações, relataram como se sentiram: No momento que a gente soube que o NEI ia passar a implantar a alimentação, o primeiro sentimento que eu tive é que isso não seria possível. Embora eu fosse completamente a favor, ficava imaginando na estrutura que envolvia tudo isso, eu percebia que o NEI não tinha e ficava pensando como isso ia dar trabalho (Tulipa). Acácia, mãe e professora do NEI, estava afastada para doutorado no momento da implantação, mas a vivenciou enquanto mãe, e disse: Eu fiquei com algumas expectativas, desde o início eu percebia com algo positivo, eu tinha essa perspectiva, que ia ser algo legal, nunca pensei de forma negativa. Eu achei muito bom, achei muito importante (Hortência). E Dália, também professora, acrescentou: Eu achei a proposta muito boa, de ter a alimentação para as crianças até pela questão do cuidado, a qualidade desses alimentos com relação aos lanches que eles traziam. A coordenadora, Margarida, pareceu preocupada: Assim que a gente soube, eu de fato fiquei muito apreensiva [...] pela grandiosidade que era isso, era mexer com alimentação de famílias [...]. Então eu fiquei um pouco ansiosa achando que talvez a gente não conseguisse dar conta de dar esse passo. Camomila, professora, falou como as crianças reagiram: Acho que 150 houve muita expectativa delas, curiosidade de saber que lanche seria esse [...]. Pra algumas acho que até era uma coisa natural, de aceitar o que estava posto e incorporar na rotina, mas a maioria acho que ficou muito excitada. A professora Hortência também relata com foi esse início: Eles ficaram super contentes, muito felizes, muito alegres, atrás de saber o que era a novidade. As crianças gostam de ir pegar o lanche, quando não é uma das professoras, as crianças vão e trazem o lanche sozinhas, eu acho isso legal, acho isso positivo (Gérbera). Begônia, mãe, também falou da aceitação da criança: Foi bem importante porque ela mesma aceitou numa boa, achou isso maravilhoso. Ela se empolga muito com o lanche e pra gente também foi maravilhoso. Além da mudança no cotidiano das pessoas, foram necessárias mudanças na rotina da escola, incluindo mudanças na estrutura física. A diretora da escola, Violeta, relatou essa estruturação: A gente precisou estruturar esse setor de alimentação escolar para que ele funcionasse como teria que funcionar [...]. A gente foi vendo a necessidade de [...] estruturar todo o espaço, não só da cozinha, mas na parte de almoxarifado para que essa alimentação escolar pudesse acontecer. E acrescentou: E isso ajudou a gente a estruturar a questão da culinária das crianças, que a gente trabalhava também talvez de forma inadequada pela questão de também não ter um espaço exclusivo, destinado a essa atividade que também requer os mesmos cuidados da preparação da alimentação escolar. Begônia, mãe, relatou que: A gente aceitou muito bem, porque como a gente tem essa vivência já com o NEI, a gente sempre aprova todas essas medidas, tentativas. E então essa parte da alimentação eu acho que foi um avanço que favoreceu não só as crianças, como também nós, familiares. Cravo, pai, acrescentou: Eu me senti muito feliz. De toda a estrutura que o NEI tinha, eu acredito que essa talvez fosse uma necessidade complementar que estava precisando implementar. A parte de toda a estrutura educacional e pedagógica é muito boa e essa questão do controle da alimentação foi muito bem vindo. Além dos pais e da direção, Miosótis, funcionária, disse: Meu pai e minha mãe tiveram aqui e falaram com Jasmim que eu estou muito direita, estou 151 muito decente agora [...]. Eles dizem que se eu tivesse mudado antes, talvez não tivesse nem ido pra diabetes, por conta do que eu fui aprendendo e da alimentação. Eu estou melhor, minha taxa baixou mais e a doutora me elogiou. Foi ótima essa mudança pra mim, fiquei outra pessoa. Assim, a mudança assumiu múltiplos significados para os sujeitos que estiveram envolvidos, sendo muitos deles bem mais amplos que simples mudanças laborais, influenciando diretamente na vida e no cotidiano das pessoas e fazendo brotar um sentimento de satisfação. Para a gestão da escola, iniciar o PNAE foi a concretização de um desejo coletivo, de um sonho. Segundo os relatos, para que as coisas dessem certo, foi importante confiar no trabalho das pessoas, delegando funções e descentralizando tarefas. Essa confiança no trabalho, assim como o processo de capacitação, trouxe aos funcionários novas funções e saberes, fazendo-os dar mais sentido ao trabalho e às vidas. Oliveira (2007) em estudo feito no NEI, a fim de identificar o perfil qualitativo do lanche consumido, observou que havia uma presença significativa de alimentos industrializados nos lanches das crianças, com destaque para os achocolatados, salgadinhos, biscoitos com e sem recheio e bebidas lácteas. Essa má qualidade do lanche das crianças foi muito citada durante as entrevistas: Antes quando as crianças traziam lanche, o que a gente observava normalmente era, com exceção de algumas crianças que às vezes traziam frutas ou traziam suco, freqüentemente as crianças traziam muita coisa artificial, biscoito, pippo’s... (Gérbera, professora). A vice-diretora, Rosa, se também se preocupava com a alimentação anterior: Não é que as crianças tenham tanta carência, não é pela carência de alimentação, mas pela qualidade desse alimento, que apesar de nossa clientela não ser aquela clientela que tenha muita carência alimentar, não tem carência financeira para comprar o alimento, mas tem carência de qualidade. Violeta, a diretora da escola, acrescentou: Com isso [a alimentação escolar] a gente evita o que acontecia anteriormente, como lanches inadequados: muito toddynho, muito pippo’s, muitos alimentos industrializados, alguns mal 152 conservados, sem a higiene adequada. Quando tratamos de qualidade do alimento, não estamos levando em consideração somente o ponto de vista nutricional, a qualidade higiênica também é fundamental de ser observada. Em pesquisa feita no NEI por Nascimento (2008), foram pesquisados os riscos higiênico-sanitários nas lancheiras dos alunos, onde foram encontrados problemas evidentes, tanto de natureza física quanto biológica. A autora detectou a presença de sujidades e bolores em alguns utensílios como garrafas, tampas e potes e até mesmo na própria lancheira das crianças. Violeta, citando esse estudo a respeito das lancheiras, acreditava que a alimentação escolar acabaria com esse problema: A gente constatava muita lancheira sem higiene adequada, a partir de estudos que foram desenvolvidos na escola, a gente foi fazendo essa constatação e com essa questão da alimentação escolar isso foi possível de ser resolvido. Contudo, uma professora relatou que os utensílios que as crianças trazem de casa continuavam sem higiene: Eu tenho observado essa coisa da falta higiene da lancheira deles, porque muitos deles estão lavando da hora que chega aqui. Tem algumas crianças que está acontecendo isso, aí vai lavar na hora de lanchar, corre pra pia pra passar água (Dália). Os pais são os principais responsáveis pela escolha do alimento a ser oferecido para seu filho, pois este não tem autonomia suficiente para tal. A criança muitas vezes pode despertar aversão por algum alimento como também desenvolver apetite por outros. Este apetite pode variar dia a dia ou entre refeições e esta variação tem a ver com a fase de descoberta do espaço que a cerca (LACERDA; ACCIOLY, 2005). A coordenadora Margarida ressaltou a importância de a família se envolver com o tema abordado na escola: Eu atribuo isso [a resistência com relação a alguns alimentos] a uma questão cultural e o primeiro núcleo cultural dela, social, é a família; se a família não pega essa deixa [de oferecer frutas] e aí começa a em casa também fazer, por isso que eu vejo ainda uma barreira, porque a família ainda não comprou, não coincidiu ainda esse olhar da família com a escola em relação às frutas. 153 Acácia, mãe e professora, também retratou essa influência da família: Eu ficava muito apreensiva enquanto professora porque na alimentação da criança você vê os valores das famílias e ficava difícil, eu achava que ia entrar muito de choque; é melhor a escola estar oferecendo e chamar esses pais e explicar. Cravo, pai, reconheceu esse papel da família: Ela [a criança] ainda tem mantido alguns outros hábitos de tomar refrigerante, mas isso aí é aspecto da família. A família da mãe, a avó, toma refrigerante e ela naquele ciclo, fica com o costume. Mas tem melhorado. Cravo, pai, defendeu que falta de tempo por vezes é responsável pela falta de qualidade do lanche das crianças: Tradicionalmente as pessoas pela falta de tempo, por andarem apressadas, pelos afazeres, sempre procuravam soluções mais rápidas de lanche para o filho, produtos com conservantes, produtos com frituras e sem um controle da quantidade calórica, energética, para as crianças. A partir das falas, percebemos que, de uma maneira geral, houve uma melhora na qualidade da alimentação das crianças, não só no ponto de vista nutricional, como também higiênico, visto que, atualmente, há cuidado e controle no preparo e armazenamento desses alimentos. No entanto, nos dois pontos de vista, tanto o higiênico quanto o nutricional, fica claro que a escola precisa do apoio da família, o que muitas vezes não acontece. O PNAE pode ser uma oportunidade para que as atividades educativas em nutrição ocorram, visto que além fornecer uma parte dos nutrientes que o aluno precisa, pode ser um instrumento pedagógico. Corroborando com essa afirmação, Violeta, diretora, disse: Ao entender que a criança é um ser global e a gente está preocupada com ela no seu todo, então a alimentação faz parte desse processo inclusive educativo. Eu me preocupava e achava que era papel da escola também contribuir nisso. Acácia, mãe e professora, concordou com Violeta quando disse: Foi uma coisa legal que está ampliando essa tarefa educativa da gente também, porque do jeito que o meu, a minha criança está levando para casa, eu penso que você juntando todas as duzentas e tantas as famílias têm sido influenciadas, porque eles chegam em casa discursando. 154 Tulipa, professora, reconheceu que a Alimentação escolar de certa forma trouxe uma equidade na forma da criança estar se alimentando, acho que fica mais fácil fazer essa educação alimentar, porque está todo mundo comendo a mesma coisa. [...] Acredito que é um caminho para uma educação nutricional mais efetiva. Seguindo a linha de inovar estratégias de ensino, a professora Amarílis relatou: Eu brincava muito com as frutas, com as cores e isso também ajudou em termos de trabalhar matemática, trabalhar as cores, trabalhar os gostos. Isso é uma coisa que a gente faz com todos os alimentos, a parte pedagógica mesmo. Pra trabalhar o pedagógico é uma excelente oportunidade [...]. A professora Tulipa também utilizou estratégias para que as crianças aceitassem melhor os alimentos: O dia que vinha frutas a gente inventava brincadeira de quitanda, eu fazia de conta que estava vendendo o lanche e eles entravam mesmo na brincadeira [...]. A gente usou muito essa estratégia da quitanda, que estava vendendo as frutas. “Estabelecer uma relação entre o planejamento da alimentação e o planejamento pedagógico, articulando conteúdos do ensino com as práticas alimentares é fundamental” (BRASIL, 2004, p.3). Além da escola, esse tema deve estar presente nas famílias dos alunos, bem como nos demais ambientes de socialização. Eu acho que uma coisa muito legal, que é um aspecto da escola, é a questão afetiva e a da interação. Como é bom chegar nas salas e ver [...] todo mundo compartilhando o mesmo alimento. E é muito gostoso porque uma criança vê a outra comendo, então se essa criança tem uma relação afetiva legal com aquela outra que come, ela passa a comer porque ela vê naquilo um modelo, um exemplo. As crianças maiores, a questão da troca, da conversa, do bate-papo, eles estão comendo as mesmas coisas com os professores juntos, sentados a mesa com as crianças. Então eu acho que a merenda ela também trouxe essa relação de afeto e de partilha na escola. Um outro aspecto é o da aproximação da criança com o alimento (Margarida, coordenadora). Para alimentar-se, a criança é influenciada por aspectos ligados ao 155 desenvolvimento, à maturação motora, cognitiva e social, enquanto o comportamento em relação à alimentação recebe influências de fatores emocionais, psicológicos, socioeconômicos e culturais. A combinação desses fatores irá determinar o comportamento e os hábitos alimentares infantis (RUFINO, 2005). Violeta também falou desse elemento de socialização: Tem a coisa também da afetividade, todo mundo come a mesma coisa, come junto o mesmo alimento, compartilha; não existe mais diferenciação de lanche, uns trazem um lanche mais elaborado, mais cuidado, outros não. [...] Então, nesse sentido é muito bom, a questão da higiene, o apoio da professora que come junto com eles; enfim é um momento de socialização também, além de ter a questão alimentar, tem a questão da socialização do grupo. Assim, a convivência da criança com os colegas na escola pode promover mudanças na sua rotina alimentar, influenciando os hábitos alimentares adquiridos com a família. Segundo Rufino (2005) os hábitos alimentares saudáveis, se bem estabelecidos durante o período escolar, poderão permanecer durante a vida inteira. Dália, professora, referindo-se às crianças disse que [...] pra eles foi ótimo, eles acharam legal, essa coisa da novidade [...]. Eles ficam incentivando o outro “prove, prove um pouquinho”. Realmente essa coisa de comer junto acaba ajudando mesmo. E Camomila, também professora, relata ainda que era engraçado, porque quando chegava aí um olhava pro outro e começava a rir [...]. Era legal, havia muito riso entre eles, a coisa da novidade. Tulipa, professora, observou: O lanche diferente tinha uma coisa meio de competição, de rejeição do outro, às vezes a até rejeição por querer estar comendo o que o outro está comendo. Eu percebia esse lanche quando ele era trazido de casa, que não era tão aglutinador, um elemento tão socializador quanto é agora. [...] Inclusive eles conversam mais, fazem mais barulho [...] e eu percebo que esse é um momento que passou a ser mais socializador. [...] Essa coisa de comer junto, eu percebo que passou a ter um outro sentido, eu acho que eles estão mais juntos mesmo. Lucas (2005) descreveu a influência dos colegas na vida da criança no 156 período pré-escolar, em que a mesma passa a compartilhar e escolher seu alimento e a experimentar novos sabores na hora do lanche. Isso pode influir positivamente no momento em que o colega estimula alimentos saudáveis antes não aceitos ou não degustados por ela. Por outro lado, pode interferir negativamente quando a oferta se trata de guloseimas densamente calóricas e pouco nutritivas. Camomila, professora, também citou a comensalidade: Ao longo desse tempo percebemos uma aceitação maior por parte das crianças [...] e acho que é a coisa afetiva mesmo, do grupo, de todo mundo comendo a mesma coisa junto. Isso é muito bom, acho que essa coisa afetiva é que vai influenciando quem não estava muito a fim pra vir comer junto, a coisa da comunhão. Esta influência, citada pela professora, é lembrada por Acácia: O fato de estar comendo junto com os colegas, pessoas que ele tinha algumas afinidades, de repente com o coleguinha preferido dele; então isso influenciou bastante [...]. Ele ficou mais tolerante, mais compreensivo, achou que passou a entender mais essa importância da variedade na alimentação. A formação de hábitos alimentares, como mostra Brasil (2006) é feita de modo gradual, principalmente durante a primeira infância. Assim, é importante que as mudanças de hábitos inadequados sejam alcançadas em tempo hábil, sob orientação correta. Esse processo, porém, não é tão simples, visto que estão envolvidos valores sociais, culturais, afetivos e comportamentais, que precisam ser associados às propostas de mudança. Em relação à formação desse hábito, Camélia, mãe, acreditava que o melhor disso [a implantação da alimentação escolar] foi o estímulo, porque a gente sabe que a alimentação saudável é a melhor que tem [...]. O que eles precisam é aprender o sabor e como a turma dele já pegou no final eu acho mais difícil do que quem vem desde a turma 1, que acostuma mais rápido. Dália, professora, disse ainda que o que foi bom nesse processo é ver essa coisa de eles realmente estarem começando a aceitar esses novos alimentos [...]. Já tivemos relatos de pais dessas crianças que já procuraram em casa experimentar. Confirmando a fala da professora, Acácia, mãe, disse: Nos sucos é 157 visível a mudança dele, como ele passou a abrir o leque. [...] Outra coisa que eu percebi muito positiva é essa coisa de se lançar para experimentar o novo. Antigamente ele dizia ‘eu nunca comi, eu não gosto, eu não quero’, sem nunca ter experimentado e com o lanche aqui, tinha o incentivo do colega, o incentivo das professoras; então ele passou a se lançar [...]. E a gente vê ele mais receptivo, está provando coisas diferentes e os meus discursos passaram a ter mais força. Antúrio, pai, relatou que seu filho habitualmente comia alimentos saudáveis e veio o receio com relação à qualidade da merenda porque habitualmente eu tinha acostumado ele a se alimentar com frutas e as outras crianças já tinham o hábito de trazer alguns outros alimentos, aí eu tive receio dessa adaptação. Azaléia, mãe, também disse: Lá em casa a gente tenta ter uma alimentação bem legal, então a gente evita comer açúcar, a gente evita comer muito doce, a gente evita comer biscoito, coisas assim e eu acho que teve uma mudança um pouco pra pior, porque agora ela só quer o suco adoçado, que a gente tava dando sem açúcar, a salada de fruta com leite condensado. E acrescenta: Eu tinha um certo problema, porque eu mandava fruta pra ela, enquanto outras crianças traziam o recheado de chocolate e salgadinhos, e aí ela não queria mais comer a merenda que eu estava mandando, comia a dos amigos e sempre voltava tudo, então eu achei muito bom homogeneizar pra todo mundo. Essa troca dos lanches foi retratada também pelas professoras: O que eu observava é que algumas crianças cujos pais tinham uma preocupação com a qualidade da alimentação elas ficavam desejando o lanche das outras, porque é muito comum as crianças desejarem aquilo que é mais atrativo, que está no consumo, que está na mídia (Gérbera). A gente via que mesmo aquelas crianças que traziam o lanche mais sadio, ficavam desejosas quando viam o pippo’s do outro, a coca-cola. Eu acho que ela [a alimentação escolar] trouxe mais qualidade na alimentação dessas crianças (Tulipa). Algumas mudanças também ocorreram nos funcionários da escola: Eu 158 sempre fui uma pessoa muito cuidadosa com a limpeza e com o alimento mesmo, mas eu percebo que eu inseri mais verdura lá em casa, que não tinha antes, que eu não me preocupava tanto; já que não tinha tempo de fazer, eu não comprava, porque não tinha quem fizesse. Mas agora eu tenho procurado algum tempo na minha vida para tentar inserir mais verdura lá em casa. Uma mudança importantíssima foi o suco, lá em casa eu comprava muito de garrafa, agora não, agora eu me preocupo em comprar a polpa da fruta [...]. E tenho aprendido muitas coisas, principalmente a estar atenta a validade dos alimentos, ao valor nutritivo (Rosa, vice-diretora). As modificações também foram percebidas nas falas das merendeiras: Na minha casa, eu não me preocupava de colocar frutas para meus filhos comerem. Não tinha aquele cuidado que eu tenho aqui, não sabia muito como lidar, eu ouvia falar, mas não é a mesma coisa de estar no dia a dia fazendo, tendo que fazer daquele jeito. Então isso mudou, mudou que eu uso mais suco na minha casa ao invés de refrigerante, minha neta levava pippo’s pra escola, agora não leva mais porque eu não deixo; ao invés de toddynho eu quero que ela leve suco natural... Tudo isso me ajudou muito, muito mesmo, foi muito gratificante (Jasmim). E Miosótis acrescentou: Fruta quase que eu não comia. Com essa vivência que eu estou tendo, já implantei mais fruta em casa [...]. E outra, eu sou professora da família, porque trabalho com você, eles ficam perguntando o que é que é, o que é que não é. Também, você sabe que agora eu sou diabética e nessa vivência eu fui aprendendo sobre os doces, que eu comia muito doce [...]. Eu não tinha mudança lá em casa não, aprendi contigo sabia? Lá em casa ficava uma coisa só, a vida toda, sem variar. “O Programa de Alimentação Escolar se revela, assim, como um espaço propício para desenvolver atividades de promoção da saúde, produção de conhecimentos e de aprendizagem na escola” (COSTA; RIBEIRO; RIBEIRO, 2001, p.228). A escola, enquanto espaço educativo pode ser mediadora do diálogo com a comunidade escolar sobre os fatores que influenciam suas práticas alimentares diárias, possibilitando questioná-las e modificá-las. Depois de todo o trabalho realizado, da implantação à pesquisa, e ao 159 dia-a-dia, percebemos o quão grandioso foi todo esse processo e como foi significativo para todos que estiveram envolvidos. Perceber que aspectos da vida de tantas pessoas da comunidade escolar foram mudados para melhor, fez valer o semear de cada semente. E mais que isso, perceber o surgimento das primeiras flores, fez-nos ver que muito mais poderá ser feito. Lidar com alimentação é muito mais que trabalhar com tabelas, equipamentos, números, nutrientes e dietas; ao mexer com a alimentação de crianças – estendendo-se assim à alimentação das famílias – estamos lidando com cultura, costumes, lembranças, sabores e dissabores, o que torna o trabalho do nutricionista, que precisa ser técnico-gestor-educador, um desafio. Acreditamos ser fundamental, num ambiente escolar, adotar estratégias permanentes de Educação Nutricional, visto que educação e alimentação estão estreitamente ligadas quando se trata de promoção à saúde, e a escola é o local ideal para essa união, por ser um ambiente de construção de saberes e valores. Reconhecemos, por fim, que a escola não é uma instituição isolada, e que, portanto, é necessário aproximar, criar vínculos com as famílias, fazendo com que todos – pais, professores, funcionários e alunos – ampliem a capacidade de desenvolver estratégias mais saudáveis para todos os espaços de vivência. 160 VIDA, MEMÓRIA E COMENSALIDADE: FRUTOS DE UMA EDUCAÇÃO ALIMENTAR NA ESCOLA. Palavras de gestora Antônia Fernanda Jalles Há muito tempo nos incomodava a qualidade do lanche trazido pelas crianças. Em lancheiras, muitas vezes mal acondicionados, chegavam salgadinhos artificiais, biscoitos recheados, achocolatados, alimentos industrializados e com alto valor calórico e nem sempre acompanhados pelo adequado valor nutricional. O ritmo de vida da modernidade imprimia muitas vezes, a necessidade de, na pressa, as famílias optarem por essa forma mais rápida, prática, porém mais cara e prejudicial ao bom desenvolvimento físico das crianças. As poucas famílias que se preocupavam e se dedicavam a preparar o lanche de suas crianças de maneira mais saudável, eram muitas vezes frustadas e vencidas pela maioria, que optava pela primeira opção, o que já foi apresentado em outros textos deste livro. Algumas tentativas já eram realizadas no NEI no sentido de interferir nos hábitos alimentares das crianças, uma vez que sempre tivemos a clareza de nossa responsabilidade no desenvolvimento global- físico, psíquico, cognitivo e social das crianças e esse era um dos aspectos que tinham influência direta nesse processo. Como sabemos também que é pela via da aprendizagem que os conhecimentos nas diversas áreas são construídos, tínhamos a clareza de que precisávamos interferir nesse sentido. Algumas alternativas eram buscadas, como por exemplo, a de instituir o “dia da fruta”, no sentido de fazer com que as crianças provassem frutas variadas pelo menos um dia na semana, já que no contexto familiar essa prática não era observada em algumas das nossas crianças. Era comum ouvirmos: “O que é isso?” Demonstrando não conhecerem a fruta apresentada. Também, as atividades de culinária buscavam chamar a atenção das crianças sobre esses aspectos. Mas sabíamos que somente estas iniciativas não eram suficientes para que pudéssemos contribuir para a construção de hábitos alimentares saudáveis nas crianças. 161 Como diretora dessa instituição no período de 2005 a 2008, buscava alternativas de intervenção em um aspecto importante e diretamente relacionado às condições de aprendizagem e desenvolvimento das crianças - a alimentação, especialmente onde tínhamos a possibilidade direta de intervenção, ou seja, em um dos momentos de nossa rotina diária – a hora do lanche. A idéia inicial era a de oferecer diariamente, através de algum meio (que naquele momento ainda não sabiamos qual), pelo menos um suco de frutas, o mais natural possível. Os conhecimentos de nutrição que eu tinha adquirido ao longo de minha vida, especialmente como mãe, me permitiam constatar que o suco que alguns traziam, passadas algumas horas, já não tinham valor nutritivo na hora em que iam lanchar. Pensando formas de viabilizar essa idéia, busquei junto aos demais diretores do CONDICAP - Conselho Nacional dos Diretores de Escolas de Aplicação, sondar quais as escolas que participavam do PNAE - Programa de Alimentação Escolar, do MEC - Ministério da Educação, ao qual constatei que a maioria era beneficiada. Esse programa, mais conhecido como Merenda Escolar, implantado em 1955, garante, por meio da transferência de recursos financeiros, a alimentação escolar dos alunos de toda a educação básica (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos) matriculados em escolas públicas e filantrópicas. Continuando essa busca, procurei descobrir os caminhos em direção a esses objetivos. Percebí que estávamos prescindindo de algo que era direito das crianças e de suas famílias, que era o direito à alimentação escolar. Fui informada que o FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação era a entidade responsável pela assistência financeira, bem como pela normatização, coordenação, acompanhamento, monitoramento e fiscalização da execução desse programa. Trilhando o caminho em busca de aceder ao recurso destinado a esse programa, qual não foi minha surpresa ao ser informada pelo FNDE de que esse recurso já chegava anualmente em nome de nossa instituição, uma vez que respondíamos o censo escolar, sendo automaticamente cadastrados nesse programa. Esse recurso era descentralizado via Secretaria Municipal da Cidade do Natal e deveria ser repassado ao NEI, o que não vinha acontecendo. Assim, tratei imediatamente de fazer com que o referido recurso chegasse ao seu necessário destino. Apesar de ser 162 um valor muito pequeno (atualmente, o valor repassado pela União, por dia letivo, é de R$ 0,22 por aluno) essa era uma alternativa para viabilizarmos algo que era um direito das crianças – a merenda escolar. O próximo desafio era envolver os demais parceiros da comunidade escolar a abraçar a idéia de introduzirmos essa novidade. Como convencer as coordenadoras, professore(a)s, funcionário(a)s, pais e especialmente as crianças de que a mudança era algo necessário e que só traria benefícios? Precisávamos de uma mudança estrutural na escola, desde as concepções que tínhamos sobre a alimentação escolar, à estrutura física da escola para essa implementação, à formação e instrumentalização dos funcionários que atuariam diretamente na preparação e distribuição desses alimentos nas salas... enfim, eram muitos desafios! Como em qualquer aspecto relativo ao desenvolvimento e aprendizagem das crianças, esse tinha que estar inserido na proposta pedagógica da escola e precisava do diálogo, em busca de alternativas metodológicas criativas e próprias para as questões vinculadas a esse tema. Um diálogo realizado por todos e em muitos espaços: educandos, educadores, pais, funcionários e demais membros da comunidade escolar. O projeto de pesquisa, trabalhava na concretização desse sonho, à medida que contribuía para que a equipe da escola refletisse sobre esse tema e constatasse o quanto eram urgentes e necessárias as mudanças nesse aspecto. Também os pais, importantes parceiros na educação e cuidado das crianças, foram alvo de nossas preocupações. Muitos eram os que aprovaram de imediato a nova medida e viam todos os seus aspectos positivos. Percebiam que não somente as crianças seriam beneficiadas, mas eles próprios seriam diretamente afetados, em especial - na economia e praticidade, uma vez que não mais teriam de comprar, preparar e enviar o lanche para as crianças. Outra grande contribuição, não só no aspecto econômico, mas principalmente, ambiental, foi possível a partir das mudanças introduzidas, uma vez que decidimos na ocasião, abolir de vez os copos descartáveis utilizados historicamente na instituição - a princípio para as turmas dos maiores e pouco a pouco também para os menores. Combinamos com as famílias de que teriam que 163 responsabilizar-se a partir de então, em enviar na mochila das crianças os utensílios utilizados na hora do lanche (toalhinha, prato e dois copos – um para o lanche e outro para água). Salientamos a importância da higiene com esses utensílios. A relação de respeito, confiança e colaboração que estabelecemos com as famílias foi de fundamental importância na concretização dessas mudanças. Destacamos o importante papel que teve nesse processo de implantação da merenda escolar a bolsita Priscila Pereira, que, sendo apoiada pelos professores, ajudou-nos a estruturar todo esse processo, relatado em parte neste livro. Desde a organização de um cardápio nutricionalmente balanceado tanto quantitativo quanto qualitativo, em que para cada dia da semana eram planejados deliciosos e nutritivos lanches, até a contribuição na formação alimentar e nutricional de professores, funcionários, crianças e pais, foi evidente a importância de sua presença em nossa instituição. Através de pesquisas realizadas nas salas de aula, conversas e realização de peças teatrais, buscava chamar a atenção para a importância de uma alimentação saudável. Seu carinho, esforço, dedicação e compromisso, bem como de outras pessoas envolvidas no projeto, contagiou a todo(a)s da escola, sendo assim, co-responsáveis pelo sucesso dessa implantação. Diariamente os(as) profissionais responsáveis pela preparação da merenda eram acompanhados(as) e orientados(as), cuidadosamente por essa profissional, que com seu jeito afetuoso e ao mesmo tempo, seguro e inteligente, fazia da preparação desses alimentos, motivo de alegria, sentido e prazer. Foi muito gratificante ouvir de uma destas profissionais, o depoimento de que já iria aposentarse, mas a nova atribuição de preparar diariamente esse lanche para as crianças passou a dar sentido e motivação ao seu trabalho, o que a fez continuar mais tempo do que devia, contribuindo com nossa instituição. As resistências de alguns poucos pais, eram respeitosamente quebradas através do diálogo, assegurando-os de que queríamos o mesmo que eles: o melhor para as crianças. Ficávamos surpresas ao conhecer hábitos que eram engessados nas crianças, a partir dos depoimentos do tipo: “quero que meu filho continue trazendo seu lanche de casa, pois ele só gosta de comer banana todos os dias, é só disso que ele gosta...”. Parecia ser mais cômodo para alguns, ceder às 164 imposições das crianças sobre suas vontades, do que insistir em que provassem outros alimentos. Costumávamos dizer aos pais: “a gente não gosta daquilo que não conhece”. Os convencíamos de que aos poucos, ao ver os demais colegas comendo, acabariam provando, conhecendo e gostando dos novos alimentos que lhes eram oferecidos. Foi pela via do diálogo, do convencimento, mas também da firmeza de nossos propósitos que essa ação foi extendida à todas as crianças do NEI, sem distinção. O NEI é uma escola em que se faz presente uma diversidade muito grande nos mais variados aspectos e a diferença de classe sócioeconômica é uma delas. Assim, o que representava a merenda escolar apenas uma opção para algumas famílias e para suas crianças, para outras famílias era uma necessidade e um benefício a que tinham direito e a que nós, nos sentíamos na obrigação de propiciar, e da melhor forma possível. Ver as crianças partilhando a mesma comida, igual para todas, sem diferenças e competições entre as que traziam lanche mais caro, ou mais barato, melhor ou pior, em maior ou menor quantidade; vê-las todas igualmente alimentando-se de forma adequada, saudável e nutritiva era algo extremamente gratificante. A intervenção direta no lanche das crianças era acompanhada por estudos realizados junto à equipe de professores e funcionários, bem como de outras ações concretas que visavam uma maior consciência das crianças para a importância de alimentar-se corretamente e de concomitantemente, manter atitudes ecologicamente saudáveis, como entre muitas, destaco a construção da horta escolar, desenvolvida por alguns grupos e socializada com todos da escola. Nossas ações a partir desse projeto, foram abordadas de forma transdisciplinar, envolvendo a educação ambiental, alimentar e nutricional, ensinando, reeducando e estimulando um estilo de vida saudável nas crianças, refletindo também nos demais membros de nossa comunidade escolar - direção, coordenação, professores, funcionários, pais. Compreendemos que para isso, a informação e a educação no currículo escolar constituem uma excelente iniciativa, pois representa um espaço social onde se dão interações e convivências entre 165 diferentes pessoas. O ambiente escolar permite a disseminação de informações não somente para a dita comunidade, mas também para suas famílias e comunidade, já que as crianças são grandes multiplicadoras da informação. Palavras de Professoras Maria de Fátima Araújo Gilka Silva Pimentel Uiliete Márcia Silva de Mendonça “Durante a minha vida meu peso sempre esteve em oscilações constantes. Fui uma criança “gordinha”, comia tudo que era de direito (refrigerantes, doces, frituras). Comia nos horários certos, mas não tinha uma alimentação balanceada. Na época da adolescência, preocupada com a forma física, procurei fazer dietas caseiras, reduzindo a ingestão de alguns alimentos considerados muito calóricos. Perdi peso, mas continuei comendo alguns alimentos não saudáveis e me alimentando em horários inapropriados. Nessa época pesava em média 55 kg e 1,54 m. Passaram-se alguns anos e quando casei voltei a engordar. Durante 10 anos engordei 36 kg. Cheguei a ficar com 91 Kg. Nunca fui uma gordinha infeliz e “paradona”, tinha muita energia. Mas, em meados de 2007 a minha vida mudou para melhor. No inicio deste ano, foi iniciado no Núcleo de Educação Infantil um Projeto de Educação Nutricional, dentre algumas atividades desenvolvidas no projeto como palestras, pesquisa sobre a alimentação das crianças, os professores do NEI, participantes da pesquisa, tiveram a oportunidade de escrever suas Autobiografias alimentares. Foi a partir desse momento que a minha vida mudou para sempre. Escrevi minha autobiografia alimentar e trouxe fotos antigas e atuais, quando pesava 54 kg e 91 Kg, respectivamente. Nessa atividade pude refletir que estava fazendo muito mal a mim mesma. Não estava preocupada com a minha 166 saúde e resolvi tomar uma decisão muito séria. Resolvi fazer uma dieta. Procurei um profissional que trabalha com a “Dieta dos pontos” (Reeducação alimentar), em que os alimentos possuem uma quantidade de pontos. Realizei alguns exames e definimos uma meta para eu perder 1 Kg por semana, me alimentando com 280 pontos ao dia. No início foi muito difícil, tinha insônia e chorava angustiada, pois sentia muita fome. Mas fui disciplinada e tive muita força de vontade, pois sabia que aquilo que estava fazendo era para o meu bem. Meus hábitos alimentares mudaram completamente, passei a comer seis vezes ao dia nos horários corretos, antes comia 03 a 04 vezes em horários inadequados. Deixei de lado doces e frituras. Diminui as massas e passei a comer mais saladas, muitas frutas e legumes e a tomar mais água. A dieta foi aliada a exercício físico (caminhadas), que me ajudou muito na quebra de massa e gordura, auxiliando na perda de peso. Quando iniciei a dieta (no final de outubro de 2007) estava com 89 Kg. Ao final de 07 meses e 15 dias (15 de Junho de 2008) tinha perdido exatamente 30 Kg, cumprindo a meta estabelecida junto com o endocrinologista no início do tratamento, ficando com 59 Kg. Depois da perda de peso, a quantidade de pontos diários foi aumentada, fazendo com que meu peso permanecesse estável e continuo mantendo este peso até hoje. Atualmente sou mais feliz do que já era. Tenho uma vida ativa, pratico exercícios e uma alimentação saudável. Minha auto-estima está no ápice, antes usava manequim de calça tamanho 50, hoje uso manequim 38. Usava blusa tamanho GG, hoje uso blusa tamanho M. Era difícil comprar roupas que coubessem em mim. Comprava apenas em lojas especializadas, hoje compro em qualquer loja. Sou agradecida pela oportunidade de participar do Projeto de Nutrição no Nei, pois foi a partir das discussões sobre a importância da alimentação saudável e das atividades realizadas nesse projeto, que eu tomei a decisão que mudou para sempre a minha vida”. Com o desenvolvimento das ações do Projeto de Pesquisa “É de 167 pequeno que se aprende? Alimentação e nutrição de pais, alunos e professores do Núcleo de Educação Infantil e coordenado por profissionais do DNUT e do NEI, envolvendo toda comunidade escolar: crianças, pais, professores e funcionários participantes da pesquisa, conseguimos viabilizar muitas discussões e reflexões sobre esta temática o que vem repercutindo na nutrição das crianças: mudanças substanciais ocorreram nas escolhas de alimentos feitas por elas, em suas posturas apresentadas em momentos de preparações culinárias e de degustação. Também pudemos perceber mudanças no comportamento alimentar de funcionários e em especial de alguns professores que despertaram para a necessidade de adotar um estilo de vida mais saudável a partir da reflexão desencadeada pela escrita de suas autobiografias alimentares, a exemplo do que nos relata a professora Uiliete no início deste texto. Madalena Freire (1992) nos lembra que “um grupo se constitui na constância de sua rotina e de suas atividades”. Viver, pensar, decidir, planejar, sofrer, comer, amar... são apenas alguns verbos que podemos conjugar como ações de um grupo que decide levar um projeto adiante. A vida no interior de um grupo tem mais movimento, mais cores, emoções e mais sabores. A hora da comida, o comer junto é um desses momentos em que professores e crianças, crianças/crianças compartilham/partilham conversa, gosto, prazer, desprazer, riso, choro. Às vezes até o choro tem o gosto do suco escorrendo na boca. Comer juntos é também uma forma de conhecer o outro e a si próprio, sendo o momento da comida uma atividade educativa, prazerosa e socializadora que permite a vivência de um ritual de oferta, partilha, celebração e exercício de generosidade. São momentos de doação, atenção e cuidado. Na escola infantil a hora do lanche é sempre um desses espaços de troca e socialização. Pensando nessas coisas resolvemos registrar um pouco sobre como tem sido nosso lanche desde que o NEI passou a oferecer um cardápio comum para todas as crianças. Se antes cada uma das crianças podia trazer seu próprio lanche na forma de suco, biscoito recheado, Danone, pipos, bolo de chocolate, salgado, refrigerante e frutas – uma ou outra trazia. Hoje essa diversificação não mais existe. Antes era mais fácil trocar e até desejar o lanche do outro. Difícil controlar a tentação da gula, o desejo de desejar o lanche do colega. Pois bem, não é preciso mais 168 provar, brigar ou deixar de ser amigo só porque o colega não quis dar um pouco do seu pipos. Estamos construindo outra cultura de alimentos entre as crianças? Talvez. Com certeza outra possibilidade de comer juntos e partilhar do mesmo alimento. Isto nos traz alguns desafios e dificuldades. Um deles diz respeito à própria cultura alimentar do grupo familiar a que pertence cada uma das crianças. O outro nos remete para certa “uniformização” de gosto, sabor, prazer, desprazer e restrição alimentar das próprias crianças. Preparar, cuidar, ofertar um alimento saudável, gostoso, cheiroso que seduza o prazer de comer de todas as crianças tem sido uma tarefa desafiadora dos responsáveis pelo cardápio e feitura da merenda na escola. Construir um cardápio comum para todas as crianças requer observação, experimentação, aceitação, aprovação, criatividade, inovação. Uma culinária comum para todos supõe abertura para a diversidade de sabores, odores, gostos e texturas, potencializando uma nova educação para o alimento, pensando no futuro das novas gerações e no próprio planeta. Pensar uma nova educação para o alimento, na perspectiva de uma pedagogia nutritiva requer trabalhar junto às crianças com as questões relacionadas à educação alimentar desde os primeiros anos de vida já que muito cedo os bebês são introduzidos neste ritual, alcançando outro status quando passam a comer junto com a família; aprendem a mastigar e são convocados a compartilhar cultura, hábitos e necessidades. Comer junto em diversas culturas tem sido um hábito milenar. Nesses encontros se consagram amizades, se (des)fazem afetos. São momentos/ fragmentos/ instantes de celebração, promessas, acordos, alegria, risos, choros, prazer e desprazer. Nessas horas as pessoas se constituem grupos em torno do alimento. O alimento - fonte de energia- nos aproxima, fornecendo a força vital para a vida. Aprender a comer junto nos ensina o prazer da companhia, do fazer para o outro. Na escola quando fazemos uma culinária, aprendemos como uma mistura de ingredientes vira um delicioso bolo de chocolate, uma doce e gostosa 169 cocada de leite condensado; aprendemos a textura, o ponto exato, a pitada certa para a comida ficar saborosa. A culinária na escola nos permite manter viva a tradição da cozinha regional, a cultura dos nossos antepassados – histórias, memórias e identidades. Com as receitas aprendemos a ler e escrever, a usar referências de medidas, a contar e quantificar. Na culinária podemos viajar no tempo para conhecer costumes, tradições de povos antigos e até fazer de conta que somos um deles. Foi pensando coletivamente em todas estas dimensões que conseguimos uma adequação na estrutura física da escola diante de uma nova realidade, tendo em vista que, concomitante ao desenvolvimento da pesquisa, vivenciamos o processo de implantação do Programa Nacional de Alimentação do Escolar (PNAE). Além da Unidade de Alimentação e Nutrição, que se destina à preparação dos lanches, surgiu a idéia de implementar nossa cozinha experimental e lá, como em um conto de fadas, as crianças podem mergulhar num mundo mágico, porque é mágico aos olhos das crianças poder vivenciar o processo de transformação de víveres em iguarias/acepipes que são degustados coletivamente. Ali as crianças podem também assumir diferentes papéis que começa na hora em que adentram o espaço e recebem uma toca para conter seus cabelos. A partir daí, vão tirando de suas cartolas diferentes personagens/produtores de poções mágicas que são provadas e partilhadas com prazer e com afeto. Estas experiências, mediadas por um trabalho pedagógico têm evidenciado um efetivo interesse e envolvimento das crianças em relação ao compartilhamento de receitas culinárias com outras turmas, o prazer de comer juntos criando uma cumplicidade que nos faz sentir grupo e aí não mais um grupo de profissionais/adultos que sentam, pensam, planejam, executam, mas um grupo formado por sujeitos de um processo, crianças e adultos imbuídos numa mesma atividade: a de viver todos os sentidos da comensalidade, compartilhar emoções e sensações, convidar amigos para comer junto, presentear receitas culinárias, viver enfim, as várias dimensões que comporta o ato de alimentar-se na nossa sociedade. Estas crianças, certamente, jamais esquecerão a experiência de uma preparação 170 culinária, do alimento compartilhado e o calor afetivo que envolve esta atividade. Em suas memórias olfativas permanecerão os cheiros de nossos temperos, o soar de nossas palavras, a delicadeza dos gestos e a perpetuação dos sabores de uma cultura que teima muito sabiamente, em não deixar que nos esqueçamos quem somos. 171 POSFÁCIO A complexidade que envolve a alimentação traz muitas possibilidades a serem exploradas e estudadas. Este livro, fruto da junção de várias “mentes e corações” envolvidos no Projeto “É de pequeno que se aprende”, desenvolvido no Núcleo de Educação Infantil (NEI) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), é um presente a todos os interessados no tema da “Promoção da alimentação saudável na escola”, considerando a riqueza de informações, saberes, sentidos e significados apresentados no decorrer dos vários artigos. A leitura é um convite ao exercício da reflexividade acerca da alimentação escolar e das relações entre escolhas alimentares, alimentação adequada e saudável, educação alimentar e nutricional, educação inclusiva e as influências e subjetividades que perpassam e ultrapassam o contexto da escola, frente ao desafio de promover saúde e contribuir com a realização da Segurança Alimentar e Nutricional e o Direito Humano à Alimentação Adequada. Viajando nas palavras, linhas e entrelinhas dos textos, que misturam poesia e ciência, emoção, afetos, possibilidades e limites, é possível superar o enfoque estritamente biológico que tem caracterizado o discurso sobre alimentação saudável. A partir da abordagem das diversas dimensões do comer, do aprender/do ensinar e do resgate das histórias de vida e das práticas alimentares, dos valores, sentimentos e experiências de relação com a comida e das conexões existentes entre a alimentação, a cultura e a saúde, proporciona novos olhares e ressignificações relacionados à alimentação e nutrição no cotidiano das pessoas, e em especial, no espaço escolar. Esta publicação é, portanto, de grande relevância para a produção científica e para a construção de novas práxis nesta área, representando a coragem de um grupo de profissionais da saúde e educação, de famílias e alunos de uma escola de educação infantil que ousaram apostar na transdisciplinaridade, no compartilhamento de saberes e responsabilidades, na perspectiva de construir coletivamente, o encontro em torno da alimentação no ambiente escolar e, para além dele, descobrindo gostos, cores, formas, aromas e texturas e valorizando o 172 alimento como fonte de prazer, identidade e qualidade de vida. Natal, 04 de outubro de 2009. Rosana Maria F. de Moura Lima Nutricionista “... O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem...”. (Guimarães Rosa) 173 REFERÊNCIAS ALARCÃO, I. (Org.). Formação Reflexiva de Professores: Estratégias de supervisão. Portugal: Porto Editora Ltda, 1996. 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