MARKETING E O NOVO CONSUMIDOR DE ALIMENTOS ARTIGO DE MARCOS FAVA NEVES (PROFESSOR DE MARKETING NO DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO DA FEAIUSP, RIBEIRÃO PRETO, E PESQUISADOR DO PENSA - PROGRAMA DE ESTUDOS DOS NEGÓCIOS DO SISTEMA AGROINDUSTRIAL), LUCIANO THOMÉ E CASTRO E KARLAFAZANARO (GRADUANDOS EM ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DA FEA/USP, RIBEIRÃO PRETO, E PESQUISADORES DO PENSA). Esta pesquisa traz dados quantitativos do consumidor no Brasil e lista algumas das mudanças na preferência do consumidor de alimentos, mostrando às empresas certos atributos que podem ser úteis no processo de lançamento de novos produtos e nas estratégias de propaganda e promoção de vendas. As empresas do setor de alimentos e bebidas passam hoje por grandes transformações que partem do seu elemento-chave que é o consumidor final. Entender as mudanças nos desejos desse novo consumidor, que altera gradativamente seu hábito alimentar é fundamental para compreender como as empresas ao longo das redes agroalimentares (cadeias produtivas) devem trabalhar para ter sucesso. Os supermercados, o setor de serviços de alimentação (food-service), os distribuidores atacadistas, a indústria de alimentos, a agroindústria, a produção agropecuária e as empresas de insumos nunca precisaram tanto do fluxo eficiente de informações ao longo da rede produtiva para compreender o que este “maestro consumidor” demonstra em termos de preferência alimentar e conseqüentemente como e o que irá comprar, em virtude de um ambiente externo mais competitivo. Antes de focar o consumidor vale mostrar alguns dados macroeconômicos e demográficos brasileiros. Figura 1. – Brasil, regiões geográficas NORTE NORDESTE CENTROESTE ÁREA 45% 18% 16% POPULAÇÃO 7% 29% 7% ECONOMIA 4% 14% 13% Fonte:IBGE SUDESTE 15% 42% 58% SUL 9% 15% 11% TOTAL 8,5 x106 km2 160x106 US$772x109 Os dados da figura 1 mostram as regiões do Brasil em termos de área, de participação na população e de participação na economia. Apenas o Sudeste e o Centro-Oeste apresentam participação na economia superior à participação na população. Os dados, trazidos pelo IBGE, IBOPE e Target, quantificam de maneira mais clara como é o mercado brasileiro. Pode-se tentar caracterizar quatro grandes segmentos na população, baseado no critério de segmentação de mercados “renda”. São estas as classes: A, B, C e D/E. Apesar das mudanças de comportamento do consumidor estarem presentes nos segmentos que se comportam de maneira similar a dos consumidores dos países industrializados (segmentos A e B), existem os grandes segmentos que consomem produtos básicos, pouco elaborados e ainda o segmento carente de alimentação. A classe econômica D representa 46% da população brasileira e a C mais 31%, totalizando 77% da população, uma porcentagem bastante relevante. As classes A e B juntas representam 23% da população brasileira. Essa parcela, apesar de minoria no País, corresponde a cerca de 37 milhões de indivíduos, o que equivale a países como Espanha ou ainda Holanda, Bélgica e Dinamarca juntos. Quanto a valores, o poder de consumo das classes A e B alcançam cerca de US$ 200 bilhões e das demais (classes C, D e E) cerca de US$170 bilhões (figura 2). Figura 2. - Consumo das classes econômicas (em bilhões) 1999 Classe A Classe B Classe C US$ 72,6 US$ 131,5 US$ 100,8 Classe D/E US$ 67,7 Fonte:Target/Simonsen Associados O crescimento populacional brasileiro está estabilizado em cerca de 2 milhões de nascimentos ao ano a partir de 1990 o que significa que a taxa de crescimento populacional vem caindo (Figura 3). Figura 3. - Crescimento populacional brasileiro (em milhões de habitantes). Ano 1980 1990 1995 1996 1997 1998 Pop. 119 145 156 158 160 162 Fonte: IBOPE NPD 1999 164 2005 175 Como conseqüência da menor taxa de crescimento populacional, o maior aumento relativo esperado entre as faixas etárias mostradas na Figura 4 é a aquela com mais de 65 anos, 31%. Em segundo lugar, está a faixa etária dos 25 até 64 anos (os adultos) com um aumento de 25%. A faixa de 10 a 24 anos aumenta apenas 4%. Ou seja, a proporção de idosos é a que aumenta mais, apesar de que em termos absolutos, essa fatia da população ainda não é muito representativa, com cerca de 8 milhões. Fiura 4. - Dados populacionais brasileiros 2005 Crescimento (%) 1995 População Total 155 175 12,9% Força de Trabalho 72 90 25% Faixa Etária 10 a 24 anos 47,8 49,8 4% 25 a 64 anos 66,3 83,2 25% Mais de 65 anos 7,7 10,1 31% Fonte: PNDA/IBGF/IPEA Quanto à distribuição de renda, pode ser visto pela Figura 5 o porcentual da população de acordo com as faixas de renda anual em 1990 e 1997. As faixas da população com renda superior a US$ 7.050 e com renda entre US$ 1.410 a US$ 2.820 sofreram um decrescimo. Os aumentos ocorrem nas classes que possuem renda entre US$ 2.820 e US$7.050 e inferior a US$ 1.420. Processo de decisão de compra Existe uma falha na introdução de novos produtos, principalmente devido ao não acompanhamento do consumidor. Pesquisa realizada nos Estados Unidos com 11 mil produtos lançados por 77 empresas mostra que estavam no mercado depois de 5 anos. Da mesma forma, empresas que atendem mal, colocam o consumidor onde querem, deixam o consumidor fazer por conta própria, nao se preocupam como tempo do consuumidor, não se preocupam com o conforto do consumidor, com a sua segurança, negligenciam o valor da vida e não têm o mínimo de interesse em informações que o consumidor traz, estão fora da nova realidade de concorrência acirrada. Se elas ainda existem é devido simplesmente por se tratar de única opção. Entender as necessidades dos consumidores e mais, o seu comportamento, passa a ser fundamental. Mas o que é afinal, entender o comportamento do consumidor? É poder predizer com maior chance de acerto as suas mudanças e descobrir os relacionamentos de causa e efeito que gerenciam a persuasão para a compra de produtos e compreender como é a educação desse consumidor ao longo do relacionamento dele com a empresa. Começa-se, então, pela análise do modelo de comportamento de compra. O que influenciará o processo de decisão de compra são os estímulos de marketing introduzidos pelas empresas através das características do produto, preço, comunicações (promoção, propaganda) e estratégia de distribuição, mais os estímulos do ambiente que são os fatores econômicos, tecnológicos, políticos e culturais e ainda as características culturais, sociais, pessoais e psicológicas desse comprador. A influência desses três fatores no processo de decisão de compra, irá resultar nas decisões do comprador (Figura 6). Figura 6. - Modelo de comportamento de compra. Estímulos de Outros Características O Processo de Marketing: Estímulos do Comprador Decisão de (Controláveis) (Incontroláveis) (consumidor) Compra: Produto Preço Distribuição Comunicação Político Sócio-Cultural Econômico Tecnológico Culturais Sociais Pessoais Psicológicas Reconhece o problema Busca de informações Avaliação de alternativas As Decisões do Comprador EscoIha de Produto Escolha da Marca Escolha do Vendedor Tempo de Compra Montante Decisão de compra Comportamento pós-compra Gasto Fonte: Adaptado de Kotler, 2000 Uma análise mais detalhada do processo de decisão de compra esclarece que, ao mesmo tempo em que as etapas do processo são explicadas, procura-se mostrar como essas ferramentas podem ser usadas pelas empresas do setor de alimentos e, além disso, quais as perguntas que devem ser feitas ao consumidor, em forma de pesquisa e mesmo no dia-a-dia da empresa, para identificar as suas preferências e entregar a melhor oferta possível. O modelo do processo de decisão de compra pode ser visto no quadro a seguir: O Processo de decisão de compra dos consumidores Etapa do Processo Como se Dá Como usar? Reconhecimento da Necessidade de compra Valores e necessidades pessoais associados a influências externas, principalmente advindas da interação social, fazem que o estado atual seja diferente do desejado, surgindo assim uma necessidade. Aplicar os estímulos mais frequentes e mais eficientes para dinamizar essa necessidade como, por exemplo, propagandas mostrando benefícios de alimentos saudáveis,ou simplesmente saborosos. A embalagem deve comunicar esses valores, agindo como um mini out-door. Identificar o quanto o consumidor pesquisa por informações e as fontes que mais ele consulta. Isso ajuda a empresa a modelar melhor o preço do produto, sua estratégia de distribuição e principalmente o plano de comunicação/propaganda. Precisa trabalhar as fontes que mais influenciam o consumidor. A empresa deve, através de pesquisa, identificar o que o consumidor valoriza (atributos) e estar competitiva nesses atributos. Busca de Informações A busca é feita através de fontes internas (memória, conhecimento) e em fontes externas (mercado e através de contatos pessoais). Avaliação das Alternativas O consumidor irá escolher a alternativa que for mais forte nos critérios que ele mais valoriza. Quais perguntas devem ser feitas aos consumidores? Qual necessidade é sanada ao consumir deste produto? Estas necessidades são evidentes? O quanto estão os consumidores alvo envolvidos com o produto? Qual produto ou marca o consumidor tem na memória? O consumidor está motivado para procurar fontes externas e quais são estas fontes? Quais são os atributos de produto mais pesquisados? O consumidor avalia e compara as alternativas? Quais são as alternativas e critérios Reposicionar-se em atributos de análise, reposicionar concorrentes, mudar pesos dos critérios de análise, Os consumidores de carnes têm como atributos importantes para a compra de carne em ordem de importância: o preço, a coloração, a presença do selo de inspeção e por último a embalagem. (Saab, 1999) de escolha? Da para alterar? Qual o resultado da avaliação das alternativas? São verdadeiramente diferentes? Dá para comprovar? O consumidor gastara Forte trabalho deve ser feito São agora tomadas tempo e energia até no ponto de venda (na decisões da compra que a melhor compra de alimentos 2/3 das propriamente dita, alternativa seja decisões são tomadas aí). Decisão de onde comprar, quando encontrada? Atentar para o crescimento de compra Onde prefere comprar comprar, o que compra por correio, correio comprar e como o produto (canal) e em eletrônico, telefone e pagar. que momento do seu catálogos. dia? Manter um 0800 ou e-maiI funcionando adequadamente O consumidor está É a comparação das e com agilidade. satisfeito com o expectativas sobre o Fazer pesquisas para produto ou serviço? produto e seu monitorar a satisfação do Quais são as razões desempenho. As consumidor. Alimentos da satisfação / conseqüências vão representam o quinto lugar no Comportamento insatisfação? desde a extrema ranking de reclamações no Pós-compra Ele comenta isso com satisfação e o “boca a Procon, com 7%. outras pessoas? boca” positivo, até a Lembrar que apenas 5% dos Por quê? tomada de atitudes consumidores insatisfeitos Existe a intenção de judiciais contra a reclamam. repetir a compra? empresa Os demais simplesmente deixam de comprar. Fonte: Autores (etapas do processo de decisão de compra são de Engel et ai. e Kotler 2000) O ABC DO CONSUMIDOR De posse dos dados demográficos trabalhados no início do texto, de observações e de pesquisas, algumas considerações podem ser feitas, direta ou indiretamente, a respeito das mudanças nos desejos do consumidor. Vale ressaltar que essas considerações não são conclusivas e devem ser usadas apenas com o propósito de levantar idéias e aspectos de discussão. Outros fatores resultados da dinâmica da vida moderna afetam o consumo de alimentos, como mostrado na figura 6. Aspectos como aumento do número de divórcios, estilos de vida cada vez mais variados, maior necessidade de diversão, cultura, entretenimento, o exotismo, a valorização da tradição, menor tempo disponível e outros que são melhor explorados nos textos sobre comportamento do consumidor. (Engel et al., 1995; Kanuk et al., 1997). Dessa forma chega-se ao quadro resumo chamado ABC do consumidor de alimentos. O quadro abaixo deve ser lido no sentido de o que o consumidor (alguns segmentos) quer e quais as oportunidades que surgem decorrentes dessas preferências. Estes novos desejos de satisfazer as necessidades mudam o hábito alimentar, definem o novo consumidor de alimentos. Alguns caracteres até tem dois atributos colocados. Como usar o ABC do consumidor? Conforme dito na introdução, a elaboração deste quadro é apenas uma tentativa de resumir grandes tendências e mostrar oportunidades. A partir dele, empresas poderiam ter uma agenda de trabalho que envolvesse as seguintes questões: • Que oportunidades a empresa vislumbra ao ver este quadro? • A empresa tem entendimento claro dos segmentos de mercado onde atua? • Esta focada e dirigindo esforços específicos para estes mercados? Quais destes argumentos do quadro os produtos da empresa possuem? • Como usar positivamente estes argumentos? • Como, com base nestes argumentos, reposicionar concorrentes? • O consumidor valoriza este argumento no processo de decisão de compra? • Quais destes é possível uma adaptação? O ABC DO CONSUMIDOR Atributos AS OPORTUNIDADES PARA AS EMPRESAS A Autenticidade Ousar no lançamento de produtos, seguindo as necessidades do mercado alvo. Ser autêntica, assumindo erros e com honestidade. Respeitar o consumidor B Beleza Preocupar-se com a aparência dos alimentos. Trabalhar fortemente o ponto de venda. Embalagens C Conveniência, Cidadania, Comunitário. Produtos de fácil manuseio, com embalagens práticas. Os canais de distribuição devem ser escolhidos no sentido de favorecer a compra rápida. Ação de cidadania, de vinculo comunitário da empresa. Opções diversas dentro de cada linha de alimentos e o leque de alternativas dentro da marca. Atrair o público infantil, quando este compor o mamado-alvo, com produtos coloridos, diferentes, divertidos e principalmente educativos. Consumidores querem diversão e conhecimento na hora da alimentação. Alimentos de diferentes origens (paises, regiões do Brasil, etc.) com E características exóticas. Ligada á diversão. Produtos que veiculem a geração Exótico, de empregos. Marcas e selos para pequenos produtores de alimentos. Produtos com menor teor de açúcar ou níveis de colesterol, produtos Emprego, Envelhecimento. saudáveis, embalagens claras para leitura, fáceis de abrir e com explicações de uso. D Diversidade, Diversão. F Funcional Adicionar aos alimentos propriedades funcionais como fortificantes e redutores de peso. O alimento será o remédio. G Garantia Honrar os compromissos assumidos com o consumidor seja em retorno de produtos, seja em qualidade e segurança. H Harmonia Equilíbrio na atuação em comunicação, em preços, em produtos e em uso dos canais / pontos de venda. I Inovação, Individualização. Intensificar o lançamento de novos produtos, produtos inovadores e que realmente representem novas soluções. Pensar em produtos individuais, embalagens menores, para as pessoas que vivem sozinhas. J Juventude Pessoas querem ser sempre jovens. Espaço para produtos nesta linha, na linha da forma física e exercícios. L Legal, Limpo. Transmitir limpeza, higiene, com embalagens claras e transparentes. M Meio Ambiente Gradual valorização do meio-ambiente, criando espaço para ação de sustentabilidade. Produtos com selo garantia de preservação ao meio ambiente (Ex: ISO 14000) N Nostalgia Oferecer produtos que resgatem momentos especiais de uma geração que compõe o mercado-alvo. O Orgânico Produtos orgânicos. Produtos que remetam a um ambiente limpo P Praticidade, Preço. Produtos práticos para o dia-e-dia, com rapidez no preparo. Variável preço é fundamental no momento da decisão. Q Qualidade Requisito básico para operar em qualquer mercado. R Rastreabilidade Rastrear toda a história do produto, desde a produção agrícola até o consumidor final e comunicar esta ação. S Saúde, Sustentável, Solitário. Oferecer produtos saudáveis com selos que dêem credibilidade (Ex. Certificado da Associação Brasileira de Cardiologia). Atenção ao consumidor solitário e ao preocupado com sustentabilidade. T Tradição A empresa deve manter em sua linha produtos tradicionais. Usar argumentos de idade e tempo de atuação em mercados, passando confiança. U Uniformidade Consumidor não está disposto a aceitar variações em produtos, principalmente os que afirmam ser padronizados. V Valor Agregar valor ao alimento, ao menor custo, trazendo o conceito de “melhor valor da categoria” (“best value”) muito usado nos USA. EM X Xenofobia Presente em alguns paises, ligados á questão da valorização do emprego local. Z Zzzz.... Velocidade Não ser lenta. Velocidade é fundamental. Visitar web pages, copiar, ter idéias, estar atenta a novas oportunidades, estar à frente dos concorrentes, surpreendendo-os e aos consumidores. SINTESE, PROCUROU-SE COM ESTE TEXTO CHAMAR A ATENÇAO PARA A IMPORTÂNCIA DE SE CONHECER O CONSUMIDOR E SEU PROCESSO DE DECISÃO DE COMPRA E FORNECER IDÉIAS PARA QUE EMPRESAS DE ALIMENTOS E BEBIDAS POSSAM OFERECER PRODUTOS QUE SEJAM MELHOR ACEITOS E MAIS VALORIZADOS. BIBLIOGRAFIA Bech-Larsen, T. 2000— The Hoven ofthe selfservice store —A study of the froit and vegetoble deportment~s itifluence on customer ottitudes towords food choiti stores. Working Paper numero 70, The Aarhus Schoot ot Business, Dinamarca, l2p Engel, J. F.; BLackwell, R.l3; Miniard, P.W. 1995 - Consumer Behaviour. Dryden, 1995, ‘789p. Kotler, P. 2000 — Administro ção de Morketiog - 10a. edição. Prentice Haíl, ‘764 p. Neves, M.F., Chaddad, F.R. & Lazzarini, S. G., 2000 — Alimentos: Novos Tenípos e Conceitos no Gestão de Negócios — Editora Pioneira, l29p. Neves, M. 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