importância do tratamento restaurador atraumático _art

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IMPORTÂNCIA DO TRATAMENTO RESTAURADOR
ATRAUMÁTICO (ART)
Aline Santos Costa*
Ivana Marques Praes*
Jerusa Tótaro Vieira*
Verônica Gomes da Silva*
Romero Meireles Brandão**
RESUMO
O objetivo deste estudo foi realizar uma revisão da literatura sobre a importância do
Tratamento Restaurador Atraumático (ART), destacando suas indicações, eficácia,
vantagens e limitações. O ART foi desenvolvido principalmente para minimizar a
progressão de lesões cariosas e é bastante utilizado em locais desprovidos de
equipamentos odontológicos e até mesmo onde não há energia elétrica. A técnica do
ART é considerada como uma das mais conservadoras, pois baseia-se na mínima
intervenção e máxima preservação das estruturas dentárias. O material mais utilizado
nesse tipo de restauração é o cimento ionômero de vidro devido à suas características
como biocompatibilidade pulpar, adesão química ao dente e liberação de flúor. Pode-se
concluir que o ART é um procedimento de caráter definitivo, de simples execução e tem
um importante papel no controle e tratamento da doença cárie.
Palavras-chave: Tratamento restaurador atraumático. Cimento ionômero de vidro.
Cárie dentária.
*Acadêmicas do 8º período do Curso de Odontologia da Universidade Vale do Rio Doce
** Especialista e Mestre em Endodontia/UFRJ/UERJ. Professor das disciplinas de Endodontia II e III do
Curso de Odontologia da FACS/UNIVALE.
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INTRODUÇÃO
A doença cárie tem diminuído nas últimas décadas em países desenvolvidos,
mas ainda representa um problema a ser solucionado em diversos países. Segundo a
Organização Mundial de Saúde, essa doença atinge entre 50 e 99% das pessoas em
todas as comunidades. Em países subdesenvolvidos a incidência da doença cárie não
diminuiu significativamente e o seu tratamento não é realizado devido à falta de
condições financeiras, por parte dos pacientes, para o tratamento convencional, sendo a
extração dentária o procedimento mais realizado para esses casos (PRADO, 2008).
Oliveira, Raggio e Imparato (2005) relataram que o tratamento restaurador
atraumático (ART) foi idealizado por Frencken no final da década de oitenta no
continente africano, como alternativa ao tratamento convencional da cárie dentária para
populações de áreas carentes, onde havia falta de infra-estrutura e pessoal qualificado
para a realização de tratamentos odontológicos.
De acordo com Martins; Ferreira (2001); Figueiredo; Forte; Sampaio (2008) o
tratamento restaurador atraumático configura como um método de remoção das lesões
cariosas por instrumentos cortantes manuais, e na restauração imediata do preparo
cavitário com cimento de ionômero de vidro (CIV), beneficiando-se da capacidade
adesiva e do poder de liberação de fluoretos deste material.
Essa técnica utiliza somente instrumentos manuais na remoção de tecidos
cariados, trata-se de uma técnica pouco invasiva, pois preconiza somente a remoção da
dentina infectada por microorganismos cariogênicos responsáveis pela progressão da
lesão e é restaurado com cimento de ionômero de vidro. Contrário ao tratamento
restaurador convencional, o ART dispensa o uso de equipamentos odontológicos
tradicionais e de eletricidade, contando com a facilidade de acondicionar e transportar
os instrumentos. Também minimiza o uso de anestesia local, reduzindo o grau de
desconforto, aumentando as chances de intervenção precoce e de preservação das
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estruturas dentárias afetadas, levando dessa maneira ao aumento de sobrevida dos
dentes cariados (FRENCKEN et al., 2004; LIMA; SALIBA; MOIMAZ, 2008).
De acordo com Myaki et al. (2000); Luz (2009) , a opção pelo CIV baseia-se na
sua capacidade de adesão química ao esmalte e dentina, o que garante um bom
selamento da cavidade, e na sua característica de liberar flúor, o que preveniria a
formação de cárie secundária. Além dessas características o CIV não necessita de
fotopolimerização e tem coeficiente de expansão térmica semelhante ao tecido dental.
O objetivo deste estudo é realizar uma revisão da literatura sobre a importância
do Tratamento Restaurador Atraumático (ART), destacando suas indicações, eficácia,
vantagens e limitações.
REVISÃO DA LITERATURA
Histórico
A técnica da restauração atraumática (ART) foi preconizada por Frencken na
década de 80 e introduzida com sucesso em situações clínicas na década de 90, e
consiste em uma proposta de tratamento para controle da doença cárie. Essa técnica
parte do princípio de mínima intervenção e simplificação do procedimento podendo ser
utilizada em locais onde não há infra-estrutura para tratamento convencional (GOMES,
1999; GOMES, et al. 2003; NUNES et al., 2003).
Segundo Wambier; Paganini; Locatelli (2003) a necessidade de se minimizar o
desconforto causado pela presença de lesões cavitadas em pessoas cujos dentes eram
perdidos em decorrência da evolução do processo carioso, fez com que Frencken
desenvolvesse um método alternativo de atendimento a pacientes de comunidades
carentes da África, onde a ausência de energia elétrica não permitia a aplicação da
Odontologia convencional. Frencken passou a remover todo o tecido cariado superficial
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com instrumentação manual, fazendo o selamento da dentina residual com um material
adesivo, o cimento ionômero de vidro. A denominação dada a esta modalidade de
atendimento foi Tratamento Restaurador Atraumático, e mesmo a literatura nacional
adotou nos trabalhos publicados a sigla do inglês “ART” (Atraumatic Restorative
Treatement).
O ART surgiu como uma alternativa de tratamento da cárie dentária para países
em desenvolvimento, onde mais de 90% das lesões em dentina permaneciam sem serem
tratadas por falta de acesso a serviços odontológicos. O procedimento pode ser realizado
até mesmo fora do consultório, havendo somente a necessidade de um local onde o
paciente possa ficar deitado, com iluminação razoável e a remoção do tecido cariado
seja realizada por meio de instrumentos manuais. A partir de 1994, a Organização
Mundial de Saúde (OMS) e a Federação Dentária Internacional (FDI) recomendaram o
ART como parte de programas mais amplos de promoção de saúde bucal em países em
desenvolvimento e posteriormente também para países desenvolvidos (RIOS;
ESSADO; FREIRE, 2006; LUZ, 2009).
O Tratamento Restaurador Atraumático (ART)
O Tratamento Restaurador Atraumático (ART) tem como objetivo a atenção à
saúde bucal de populações subdesenvolvidas com alta prevalência e gravidade da
doença cárie. É considerado como um tratamento alternativo, atraumático e definitivo,
em que seu método consiste na realização de restaurações com a utilização apenas de
instrumentos manuais. Tem como característica a possibilidade de manter uma camada
mais profunda de tecido cariado sob o cimento de ionômero de vidro, o qual é tido
como material de eleição (VENTIN et al., 2007).
Somente instrumentos manuais são necessários para executar o ART: espelhos
bucais, exploradores, pares de pinças, cinzéis, curetas, enxadas, esculpidores, bloco de
mistura e espátula, além de pares de luvas, bolinhas de algodão, cimento de ionômero
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de vidro, verniz para proteção do material inserido na cavidade, matrizes cunhas e tiras
de poliéster (SAKAMOTO; MOIMAZ, 2001).
A parte da dentina amolecida e altamente cariada, responsável pela progressão
da lesão cariosa, pode ser removida apenas com uso de curetas e sem anestesia, por ser
necrosada e insensível, enquanto se preserva a parte mais profunda e passível de
remineralização. Dispensando o uso de equipamentos odontológicos tradicionais e de
eletricidade, a técnica conta com a facilidade de acondicionar e transportar os
instrumentos, aumentando as chances de intervenção precoce e de preservação das
unidades dentárias afetadas (FIGUEIREDO; LIMA; MOURA, 2004).
Em contraste com o tratamento convencional das lesões de cárie, o ART (Fig. 1)
preserva a estrutura dental, sendo minimamente invasivo e passível de ser realizado em
comunidades carentes desprovidas de recursos tecnológicos mais sofisticados. Consiste
na remoção da dentina infectada usando apenas instrumentos manuais, não sendo
necessária ou desejável a escavação de todo tecido amolecido, pouco infectado e
próximo à polpa dental, quando da ausência de sinais e sintomas da pulpite. Após a
remoção da dentina infectada a cavidade é selada com um material ionomérico
(CICCONE et al. 2004).
FIGURA 1: Seqüência da técnica do ART utilizando o cimento ionômerico Ketac Molar (3M/ESPE).
FONTE: RAGGIO (2004).
O termo atraumático é utilizado, pois se refere à ausência de dor em todos os
momentos do tratamento, quer seja durante a remoção do tecido cariado, realizada com
o uso de instrumentos manuais, onde remove-se apenas a dentina infectada que não
apresenta sensibilidade dolorosa, ou durante a restauração, que é realizada com
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isolamento relativo (OLIVEIRA; RAGGIO; IMPARATO, 2005). No contexto do ART
e quando comparado a outras técnicas restauradoras mais invasivas, atraumático pode
significar que o tratamento causa nenhum ou um mínimo trauma ao paciente devido à
ausência de dor ou desconforto, e ao dente cariado, pois conserva maior quantidade de
estrutura dental possível e reduz o risco de exposição pulpar devido a não necessidade
de remoção completa da dentina cariada (RIOS; ESSADO; FREIRE, 2006).
Além de menos doloroso e atraumático, o ART preserva uma maior quantidade
de tecido dentário devido ao maior controle do operador quando o mesmo faz a remoção
da dentina cariada. Nesta técnica, nenhum tecido dentário sadio é removido com o
instrumento manual. Entretanto, quando a camada superficial de esmalte está somente
com uma pequena abertura e não permite a passagem do instrumento manual, é
recomendado o uso de recortadores de bordo para romper a camada de esmalte sem
suporte e permitir o acesso à dentina cariada subjacente (STELMANN et al. 1982). Ao
contrário dos preparos cavitários convencionais, em que o tecido dental sadio é sempre
removido para que haja retenção mecânica do material restaurador, no Tratamento
Restaurador Atraumático o uso de instrumentos manuais limita-se a remoção de tecido
dental mortificado (MYAKI et al., 2000).
Indicações e contra-indicações do ART
Essa técnica é indicada em dentes com lesões de cárie oclusal e ocluso-proximal
onde não há aproximação pulpar e sintomatologia dolorosa, em pacientes com alto
índice de lesões cariosas, difícil manejo, cárie de acometimento precoce, gestante,
paciente com contra-indicação à anestesia local e pacientes especiais. Não estão
indicados para o ART dentes que apresentem abscesso, exposição pulpar, fístula ou dor
espontânea (MENEZES et al., 2009).
Mesmo sabendo que esta técnica pode ser realizada em qualquer ambiente,
certos cuidados devem ser tomados, tais como: evitar a contaminação do material por
saliva, utilizar correta proporção na manipulação do cimento ionômero de vidro e
proteção superficial deste, remover completamente todo tecido cariado na junção
amelodentinária (STELMANN et al. 1982).
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Uma das principais preocupações de clínicos e pesquisadores é o controle da
infiltração marginal, quando há necessidade de tratamento restaurador. É sabido que a
ocorrência desse fenômeno na interface dente-material restaurador pode levar ao
surgimento de cárie secundária, sensibilidade pós-operatória, injúria pulpar e
manchamento das margens da restauração. No ART, a restauração danificada pode ser
facilmente reparada (MYAKI et al., 2000; SAKAMOTO; MOIMAZ, 2001).
Material de eleição para o ART
A fase restauradora do ART pode ser considerada como procedimento de sessão
única, no qual é feita remoção parcial de tecido cariado, com o auxílio de instrumentos
manuais e, na maioria das vezes, sem a necessidade do uso de anestesia. O selamento da
cavidade é feito com cimento de ionômero de vidro, de maneira definitiva
(CARVALHO et al. 2009).
O ART combate as bactérias remanescentes na cavidade cariosa por meio do
efeito cariostático do cimento ionômero de vidro e da capacidade seladora do material
restaurador, que funciona como uma barreira física, impedindo a passagem de nutrientes
para o crescimento das bactérias que se localizam abaixo da restauração. Assim, o
selamento marginal conseguido com o emprego dos materiais ionoméricos adesivos
pode assegurar que haja diminuição e paralisação da cárie e, até mesmo, a estimulação
de dentina esclerótica e reparadora, que poderão garantir um pós-operatório indolor e
com maior longevidade às restaurações (GARBIN, 2008).
A utilização do cimento de ionômero de vidro como material restaurador é um
dos fatores responsáveis pelo sucesso dessa técnica, devido às inúmeras vantagens:
constante liberação de fluoretos, biocompatibilidade pulpar e adesão química ao tecido
dentário. A liberação de fluoreto também contribui para diminuir o número de bactérias
da placa sob as restaurações (LIMA; SALIBA; MOIMAZ, 2008).
O cimento ionômero de vidro (CIV) apresenta um potencial significativo de
remineralização, exibido pela presença de fluoretos na sua composição, pois, em suas
pesquisas em 1995, Tem Cate e Van Duinen observaram que todas as restaurações feitas
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com cimento inonômero de vidro apresentaram hipermineralização do tecido, bem
como na parede do preparo que estava em contato com a restauração (CORDEIRO et al.
2001).
De acordo com Gomes et al. (2003) o cimento de ionômero de vidro
quimicamente ativado ou fotopolimerizável é o material de escolha para o selamento da
cavidade no ART devido às suas propriedades de liberação de flúor, adesão às estruturas
dentárias, além da biocompatibilidade pulpar. Estes autores ainda ressaltaram que este
material deve ser utilizado somente depois da remoção de toda dentina amolecida, pois
a retirada inadequada do tecido infectado pode resultar em necrose pulpar e formação de
abscesso. Acredita-se que a remoção da dentina cariogênica e alterada irreversívelmente
seja o principal objetivo para o sucesso desse tipo de tratamento restaurador.
Segundo Sakamoto; Moimaz (2001); Figueiredo; Lima; Moura (2004) o cimento
ionômero de vidro causa resistência quanto a sua aceitação em caráter permanente. De
custo mais elevado que outros materiais restauradores definitivos, os cimentos
ionoméricos preconizados para uso no ART geralmente não estão disponíveis no
serviço público. Também pode-se perceber que há resistência de muitos profissionais da
área da saúde quanto a utilização do ART em espaços comunitários ou em visitas
domiciliares realizadas junto aos outros profissionais das equipes de saúde da família do
Programa de Saúde da Família (PSF). Ainda assim, com a avaliação dos custos das duas
abordagens, evidenciou-se a grande redução de gastos com instrumentais, materiais
auxiliares, equipamentos e fatores correlatos, como a eletricidade, obtida com a
simplificação inerente ao ART.
Vantagens e limitações ao uso do ART
A técnica de ART é um procedimento de tratamento de cáries promissor para
uso em áreas rurais e suburbanas em países pouco industrializados, pois raramente
requer anestesia e não requer equipamentos elétricos podendo ser realizada com sucesso
em áreas rurais. O ART possibilita a reintegração de dentes com cárie profunda na sua
função (SAKAMOTO; MOIMAZ, 2001; NUNES et al. 2003; RIOS; ESSADO;
FREIRE, 2006; FIGUEIREDO; FORTE.; SAMPAIO, 2008).
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Com o ART podemos observar mudanças positivas na dentina abaixo da
restauração, onde ocorrem alterações na textura do tecido, para uma consistência mais
firme, esclerose da dentina, redução do número de microrganismos presentes, bem
como a diminuição da virulência das bactérias remanescentes (CICCONE et al., 2004).
Além de apresentar boa eficácia, a técnica causa mínima sensibilidade operatória
e pós-operatória; preserva mais estrutura dental sadia durante o preparo cavitário do que
as técnicas convencionais, dando origem a pequenas cavidades e apresenta uma boa
aceitação entre os usuários. Por não fazer uso de motor e sugador, pode ser considerada
uma técnica de fácil aceitação por adultos e crianças (GOMES, 1999; SAKAMOTO;
MOIMAZ, 2001; LIMA; SALIBA; MOIMAZ, 2008).
A técnica do ART além de simples tem grande eficácia, baixo custo, dispensa o
uso de anestesia e do isolamento absoluto, sendo realizada a remoção parcial do tecido
cariado com instrumentos manuais (MJÖR; GORDAN, 1999; MENEZES, 2009).
De acordo com Ventin et al. (2007) apesar de ter sido elaborado para ser
utilizado em populações carentes, o ART possui várias aplicações em países
desenvolvidos, como: introdução de tratamento odontológico precoce em bebês,
pacientes extremamente ansiosos e medrosos, pacientes especiais (problemas físicos ou
mentais), pacientes que vivem em clínicas de repouso e com alto risco de cárie.
Segundo Cordeiro et al. (2001) a utilização do ART pode ser considerada como
fator motivador dos pais para minimizar o risco à cárie em pacientes com alta atividade
cariogênica, pois a técnica favorece diminuição do risco com controle dos fatores que
promovem a doença. O uso do ART pode ser incentivado em bebês, em comunidades
carentes, nas quais existe dificuldade de acesso do profissional e o número das lesões de
cárie é elevado. Os autores ainda relataram que a vantagem da técnica do ART sobre as
restaurações de amálgama é que o mesmo CIV que preenche a cavidade pode ser usado
para selar fissuras adjacentes.
O ART é uma técnica de baixo custo, que faz uso de instrumentos manuais
baratos e de fácil manejo, em que não há emprego de eletricidade, nem de equipamento
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especial. Porém, pode ocorrer, devido a utilização de instrumentos manuais por longo
período de tempo (SAKAMOTO; MOIMAZ, 2001).
Os insucessos de algumas dessas restaurações com cimento de ionômero de vidro
podem ser atribuídos a combinação de preparos cavitários inadequados e propriedades
físicas impróprias do material para resistir às forças oclusais ou até mesmo o resultado
de contaminação salivar. Ao desconsiderar cavidades maiores, pode-se obter uma
tendência de bons índices de sucesso (GOMES et al. 2003; VENTIN et al., 2007;
MICKENAUTSCH; GROSSMAN, 2008).
Como limitação, a técnica restauradora atraumática não atende a todas as
necessidades curativas do paciente, por estar contra-indicada para o tratamento de lesões
de cárie em estágios avançados (OLIVEIRA; RAGGIO; IMPARATO, 2005).
Sakamoto; Moimaz (2001); Lima (2003); Nunes et al. (2003); Luz (2009;
Mickenautsch; Yengopal; Banerjee (2010) consideraram que as limitações ao uso das
restaurações atraumáticas são basicamente devido ao maior desgaste superficial e a
menor dureza do material restaurador quando comparado com os materiais
convencionais como o amálgama e as resinas compostas. Estes autores também
afirmaram que as propriedades físicas do CIV são pobres, apresentando baixa
resistência ao desgaste o que muitas vezes limita seu uso a cavidades pequenas. A
longevidade das restaurações e selantes ocorre por um período de tempo de três anos,
em média.
De acordo com Nunes et al. (2003) assim como a maioria dos tratamentos o ART
não é totalmente eficaz possuindo algumas desvantagens como os problemas de
solubilidade e degradação devido ao fenômeno de sinérese e de embebição,
propriedades mecânicas desfavoráveis, baixa resistência coesiva e desgaste do material
de escolha, o cimento ionômero de vidro.
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DISCUSSÃO
Os relatos de autores como Gomes (1999); Gomes et al. (2003); Wambier;
Paganini; Locatelli (2003); Ventin (2007); Prado (2008) e Luz (2009) indicaram que o
Tratamento Restaurador Atraumático (ART) foi proposto, por Frencken na década de
80, e introduzido em situações clínicas na década de 90, buscando o controle para a
doença cárie, para se minimizar o desconforto causado pela presença das lesões
cavitadas, principalmente em populações de áreas carentes, podendo ser utilizado em
locais onde não há infra-estrutura para tratamento convencional, onde haja pelo menos
um ambiente onde o paciente possa ficar deitado, com iluminação razoável e a remoção
do tecido cariado seja através de instrumentos manuais.
Conforme relatado por Myaki et al. (2000); Sakamoto; Moimaz (2001); Oliveira;
Raggio; Imparato (2006); Menezes (2009) a literatura nos mostrou que o ART tem
eficácia, baixo custo e pode ser executado de forma simples apenas com instrumentos
manuais como curetas, cinzéis, enxadas, e raramente requer o uso de anestesia.
Dispensa também o uso de equipamentos odontológicos tradicionais e de eletricidade,
removendo a parte da dentina amolecida e altamente cariada, preservando a parte mais
profunda e passível de remineralização, quando não há sinais e sintomas de pulpite,
diferenciando-se do tratamento convencional onde há remoção de tecidos sadios para
que haja retenção mecânica do material.
A preservação de tecido dentário sadio, a redução do número de
microrganismos presentes, a diminuição da virulência das bactérias remanescentes, a
minimização do risco à cárie em pacientes com alta atividade cariogênica, a esclerose da
dentina, relatados por Stelmann et al. (1982); Cordeiro et al. (2001); Sakamoto; Moimaz
(2001); Ciccone et al. (2004), nos faz acreditar na eficácia do ART do ponto de vista
biológico.
Gomes et al. (2003); Rios; Essado; Freire (2006); Ciccone et al. (2004);
Oliveira; Raggio; Imparato (2006) foram unânimes ao afirmarem que o ART preconiza
a ausência de traumas e de dor ou mínima sensibilidade operatória e pós-operatória em
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todos os momentos do tratamento, quer seja durante a remoção do tecido cariado, onde
se remove apenas a dentina infectada que não apresenta sensibilidade dolorosa, ou
durante a restauração, utilizando material ionomérico, sendo assim uma técnica
minimamente invasiva.
As indicações do ART listadas por Cordeiro et al. (2001); Ventin (2007);
Menezes (2009) para o ART como dentes com lesões de cárie oclusal e ocluso-proximal
onde não há aproximação pulpar e sintomatologia dolorosa, em pacientes com alto
índice de lesões cariosas, pacientes de difícil manejo, cárie de acometimento precoce,
gestante, pacientes com contra-indicação à anestesia local, pacientes em clínicas de
repouso, pacientes ansiosos e medrosos, bebês e pacientes especiais; demonstram que a
aplicação desta técnica não se limita aos países em desenvolvimento, mas que a mesma
é uma possibilidade útil aos países desenvolvidos. Também ressaltamos como foi
preconizado por Menezes (2009), que dentes que apresentam abscesso, exposição
pulpar, fístula ou dor crônica são contra-indicados para o ART.
Como nos foi demonstrado por Cordeiro et al. (2001); Garbin (2008); Lima;
Saliba; Moimaz (2008); Carvalho et al. (2009) as excelentes propriedades do cimento
ionômero de vidro (CIV), como liberação de fluoretos, potencial significativo de
remineralização, ser cariostático, biocompatibilidade pulpar e adesão química ao tecido
dentário impedindo a passagem de nutrientes para o crescimento das bactérias que se
localizam abaixo da restauração, fizeram deste cimento o material de eleição para
aplicação no ART e um dos fatores responsáveis pelo sucesso da técnica. Entretanto,
Sakamoto; Moimaz (2001); Nunes et al. (2003); Figueiredo; Lima; Moura (2004); Luz
(2009) apontaram que a baixa resistência coesiva e o desgaste deste material, o custo
elevado, sua indisponibilidade no serviço público, são fatores de resistência ao seu uso
como material definitivo e conseqüentemente provocam uma resistência de aplicação do
ART por parte de alguns profissionais da Odontologia.
As considerações de Stelmann et al. (1982); Myaki et al. (2000); Gomes et al.
(2003) nos fez entender que para o sucesso do ART, devemos ter cuidados como
controle da infiltração marginal, evitar a contaminação do material por saliva, utilizar
correta proporção na manipulação do cimento ionômero de vidro e proteção superficial
deste, realizar um preparo cavitário adequado com remoção completa de todo tecido
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cariado na junção amelodentinária. Descuidos por parte do profissional podem levar ao
surgimento de cárie secundária, sensibilidade pós-operatória, injúria pulpar e
manchamento das margens da restauração, caracterizando insucesso da técnica.
As informações de Sakamoto; Moimaz (2001); Nunes et al. (2003); Oliveira;
Raggio; Imparato (2005); Luz (2009) indicaram as limitações de uso das restaurações
atraumáticas devido a não atender a todas as necessidades curativas do paciente, por
estar contra-indicada para o tratamento de lesões de cárie em estágios avançados,
longevidade das restaurações e selantes por um período de tempo de três anos, pode
ocorrer grande cansaço manual, devido a utilização de instrumentos manuais por longo
período de tempo.
Estas limitações não impedem de destacarmos sua grande importância social e a
fácil aceitação por pacientes adultos e infantis. Quando utilizada corretamente, com
todas as prerrogativas técnico-científicas, esta técnica pode ser de grande valia para
populações carentes ou diferenciadas quer seja em zonas rurais ou suburbanas, que
provavelmente pouco ou mesmo nunca teriam acesso ao tratamento odontológico
convencional. Parece-nos importante não somente considerar os aspectos positivos da
facilidade de aplicação da técnica, a redução de custo ou mesmo seu ganho biológico,
mas ressaltarmos que o ART minimiza a mutilação causada por extrações dentárias,
possibilita à restauração da saúde bucal do indivíduo, seu caráter educativo, e que este
pode ser o tratamento de escolha em várias situações onde a falta de estrutura ou
recursos impedem a possibilidade de um tratamento considerado ideal, principalmente
nos programas de saúde pública. Percebemos que mesmo com vários trabalhos
publicados sobre este assunto, a eficácia e efetividade do ART ainda merecem ser
investigadas e que um maior conhecimento da técnica por parte dos profissionais da
área, talvez diminuísse sua rejeição.
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CONCLUSÕES
De acordo com a revisão da literatura realizada, podemos concluir que:
● O Tratamento Restaurador Atraumático tem importante papel no tratamento da
doença cárie, e é aplicado principalmente em países em desenvolvimento;
● O ART é um procedimento de simples execução, de caráter definitivo e que não exige
ambiente tecnológico, sendo feita a remoção da cárie apenas com instrumentos manuais,
e selamento da cavidade com cimento ionômero de vidro;
● O ART tem como vantagens ser uma técnica pouca invasiva e de baixo custo. Suas
limitações se devem principalmente a baixa resistência ao desgaste e menor dureza do
cimento ionômero de vidro;
●O ART é contra-indicado em casos de abscesso, fístula, exposição pulpar e dor
espontânea;
●A eficácia e efetividade do ART ainda merecem ser investigadas, e um melhor
conhecimento da técnica pelo cirurgião-dentista, talvez diminuísse sua rejeição.
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ABSTRACT
IMPORTANCE OF THE ATRAUMATIC RESTORATIVE TREATEMENT (ART)
The aim of this study was to realize a literature review about the importance of the
Atraumatic Restorative Treatment (ART), highlighting its indications, efficacy,
advantages and limitations. The ART was developed primarily to minimize the
progression of carious lesions and is widely used in areas without dental equipment and
even where there is no electricity. The ART technique is regarded as one of the most
conservative, since it is based on minimum intervention and maximum preservation of
dental structures. The most common material used in this type of restoration is the glass
ionomer cement because of its pulp biocompatibility, chemical adhesion to tooth and
fluoride release. It can be concluded that the ART is a procedure for a definitive
character, simple to perform and has an important role in the control and treatment of
caries.
Key-words: Atraumatic restorative treatment. Glass ionomer cement. Dental caries.
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Endereço para correspondência
Aline Santos Costa
Rua Prudente de Morais nº 491 Centro
Governador Valadares – MG
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Fones: (33) 88082853 (33)32717980
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