PDF Português - Residência Pediátrica

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ARTIGO ORIGINAL
Perfil clínico, laboratorial e histológico de lactentes com hepatite por
citomegalovírus
Clinical, biochemical, and histological profile of infants with hepatitis cytomegalovirus
Mateus Teixeira do Amaral Rocha1, Luciana Rodrigues Silva2, Cibele Dantas Marques3, Marcia Santos da Silva4
Palavras-chave:
coqueluche,
criança,
infecções respiratórias,
tosse.
Resumo
Keywords:
child,
cough,
respiratory infections,
whooping cough.
Abstract
Objetivo: A infecção por CMV pode se manifestar com hepatite ou ser assintomática, porém pode ser acompanhada de
hepatoesplenomegalia, aumento das aminotransferases, colestase, acometimento multissistêmico, hipertensão portal e
progressão para cirrose. Este estudo objetiva descrever o perfil clínico, laboratorial, histológico de recém-nascidos e lactentes
diagnosticados com hepatite por citomegalovírus (CMV). Métodos: É um estudo descritivo de série de casos com crianças com
hepatite por CMV. Houve revisão de prontuários de pacientes atendidos entre janeiro de 2008 e março de 2014, sendo incluídos
pacientes com menos de 1 ano de vida e hepatite por CMV. O diagnóstico da infecção foi estabelecido por meio de sorológica
antiCMV IgM ou do PCR urinário/sérico. Resultados: Onze pacientes com hepatite preencheram os critérios de inclusão. Oito
apresentaram hepatomegalia e nove esplenomegalia. Todos manifestaram icterícia. O tratamento com ganciclovir por 42 dias
ocorreu em oito pacientes com hepatite por CMV. Houve redução em 79,7% nos níveis de AST e em 72,4% de ALT. Bilirrubinas
totais caíram em 89%, e em 91,3% houve queda da bilirrubina direta. Dois pacientes mantiveram hepatite crônica, sendo um
encaminhado para transplante. O tamanho amostral, heterogeneidade da população e falta de grupo controle representam
limitações. Conclusão: O tratamento para CMV visa melhorar a hepatite e também o prognóstico hepático, ao impedir
mecanismos lesivos que propiciem degeneração hepática, fibrose e cirrose. Apesar dos resultados animadores com o antiviral,
é necessária a realização de estudos pareados, duplo cegos, com coletas laboratoriais seriadas e sistematizadas.
Objective: CMV infection can manifest with hepatitis and may be asymptomatic, but may be accompanied by hepatosplenomegaly,
increased aminotransferases, cholestasis, multisystem involvement, portal hypertension and progression to cirrhosis. This study
aims to describe the clinical profile, laboratory, histological newborns and infants diagnosed with hepatitis cytomegalovirus.
Methods: This is a case series descriptive study of children with hepatitis CMV. There was a review of medical records of patients
treated between January 2008 and March 2014 and included patients younger than 1 year old and hepatitis CMV. The diagnosis of
infection was established by serological anti-CMV IgM or through the urinary/serum PCR. Results: Eleven patients with hepatitis
met the inclusion criteria. Eight had hepatomegaly and splenomegaly nine. All expressed jaundice. Treatment with ganciclovir for
42 days occurred in eight patients with CMV hepatitis. Decreased by 79.7% in the levels of AST and ALT of 72.4%. Total bilirubin
fell by 89%, and in 91.3% there was a reduction of direct bilirubin. Two patients remained chronic hepatitis, being sent for
transplantation. The sample size, heterogeneity of the population and lack of control group represent limitations. Conclusion:
The treatment for CMV aims to improve hepatitis as well as liver prognosis by preventing harmful mechanisms that promote liver
degeneration, fibrosis and cirrhosis. Despite encouraging results with antiviral, conducting paired studies is necessary, doubleblind, with serial and systematic laboratory collections.
Pós-graduação latu sensu - Médico residente, Vitória da Conquista, BA, Brasil.
Professora Titular de Pediatria da Universidade Federal da Bahia. - Chefe do Serviço de Gastroenterologia e Hepatologia Pediátricas do Complexo
Hospitalar Universitário Professor Edgard Santos HUPES-CPPHO da UFBA, Vitória da Conquista, BA, Brasil.
3
Professora Assistente de Pediatria. - Supervisora da Residência de Gastroenterologia e Hepatologia Pediátricas do Complexo Hospitalar Universitário Professor Edgard Santos HUPES-CPPHO da UFBA, Vitória da Conquista, BA, Brasil.
4
Pós-graduação Latu sensu - Residente em Endoscopia Digestiva Hospital Geral Roberto Santos, Vitória da Conquista, BA, Brasil.
1
2
Endereço para correspondência:
Mateus Teixeira do Amaral Rocha.
Avenida Jesiel Norberto, nº 1220, Ap 404, Bairro Candeias, Vitória da Conquista, Bahia, Brasil. CEP: 45.000.000.
Residência Pediátrica 2016;6(1):25-30.
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O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa.
Foram incluídos no estudo os lactentes com menos
de 1 ano de idade com hepatite por CMV, internados ou
acompanhados no ambulatório de hepatologia infantil. O
diagnóstico da infecção foi estabelecido por meio de viragem
sorológica da genitora durante a gravidez e/ou presença de
anticorpo antiCMV IgM positivo no recém-nascido/lactente
ou por intermédio de positividade do PCR urinário/sérico
para CMV no recém-nascido/lactente. Foram excluídos os
pacientes com outras doenças infecciosas congênitas, que
causam hepatite: rubéola, hepatites B e C, herpes, varicela,
sífilis, toxoplasmose, HIV, além daqueles com diagnóstico de
fibrose cística, más formações biliares e doenças metabólicas
causadoras de hepatite e colestase.
Os dados colhidos dos prontuários foram anotados em
um questionário previamente elaborado. Avaliaram-se itens
demográficos, além de principais sinais e sintomas, resultados
de exames séricos como perfil e função hepáticos, hemograma,
função renal, imagem radiológica e histológica, início do
tratamento, dias de uso do ganciclovir e o relato de efeitos
colaterais, comorbidades (doenças metabólicas, genéticas,
síndromes de hipoplasia de vias biliares, atresia de vias biliares
extra-hepáticas, endocrinopatias e se houve tratamento
cirúrgico com derivação biliodigestiva ou transplante hepático).
Todos os dados foram armazenados e analisados em
um banco de dados do programa Microsoft Excel.
INTRODUÇÃO
O citomegalovírus (CMV) representa importante causa
de morbidade e mortalidade perinatal tanto pela aquisição
intraútero (determinando más formações congênitas) quanto
por meio do canal do parto, leite materno ou hemotransfusão,
e por contato pessoa a pessoa devido a mãos mal lavadas ou
por fômites contaminados. Geralmente, as consequências
decorrentes dessa infecção acometem mais aqueles que
são prematuros, de baixo peso ao nascer ou pacientes
imunossuprimidos.
As crianças maiores e imunocompetentes, quando
infectadas, costumam ser assintomáticas ou apresentarem
quadros leves e autolimitados.
A maior parte dos recém-nascidos com infecção
por CMV é assintomática e isso se deve, hipoteticamente,
à reativação viral que ocorre na mãe, de modo que a
criança nasce com anticorpos protetores. Por outro lado, os
prematuros têm menos anticorpos e, portanto, costumam ter
mais sintomas.
A infecção por CMV pode se manifestar mais
frequentemente como pneumonite, enterite e hepatite,
além de linfoadenopatia, envolvimento auditivo ou
meningite asséptica. O envolvimento hepático pode
determinar um quadro assintomático, mas pode também ser
acompanhado de hepatoesplenomegalia, icterícia, aumento
das aminotransferases e até colestase. Alguns desses casos
podem evoluir com gravidade, acometimento multissistêmico,
hipertensão portal e progressão para cirrose1-3.
O tratamento com ganciclovir tem indicação clássica
naqueles pacientes que apresentam quadro de CMV
dentro primeiro mês de vida e acometimento do sistema
nervoso central. Para aqueles que o sistema nervoso
central é poupado, pode-se considerar terapêutica para
CMV quando determina pneumonite, trombocitopenia ou
hepatite. O esquema recomendado tem duração de seis
semanas, com impacto sabidamente efetivo na redução
de perda auditiva e no adequado desenvolvimento
neuropsicomotor. No caso da hepatite por CMV, o
tratamento com ganciclovir no período neonatal e em
lactentes imunocompetentes é controverso, pois se
trata de uma medicação de uso venoso e com efeitos
colaterais 4,5.
Assim, baseado nessa lacuna da literatura, este
estudo tem o objetivo de descrever o perfil clínico,
laboratorial, histológico dos pacientes recém-nascidos e
lactentes no primeiro ano de vida que foram diagnosticados
com hepatite sintomática por citomegalovírus.
RESULTADOS
Foi obtida pela revisão de registros da unidade uma
lista com 85 pacientes, sendo investigados os prontuários a fim
de se avaliar a causa da hepatite e colestase. Desses, apenas
11 preencheram os critérios de inclusão. A Tabela 1 mostra os
principais achados encontrados entre os pacientes estudados. Os
dados revelaram que a maioria desses pacientes nasceu a termo,
sete dos 11 investigados, com média total de 36,3 semanas de
gestação. A média de peso ao nascer foi de 2579 gramas, sendo
o menor peso encontrado em um prematuro de 31 semanas,
nascido com 1460 gramas. Apenas um nasceu com peso adequado
para idade e nove crianças nasceram com peso abaixo de 3 quilos.
Em relação aos antecedentes neonatais, como
intercorrências, além da hepatite, observou-se anemia em cinco
pacientes, três com plaquetopenia e dois com insuficiência
respiratória. Oito desses pacientes se apresentaram à unidade por
referência ambulatorial e três por transferência entre hospitais.
Sobre os antecedentes obstétricos, três genitoras não
realizaram pelo menos seis consultas de pré-natal. Apenas uma
genitora referiu intercorrência na gravidez - infecção urinária.
Em relação aos sintomas nos lactentes, houve dispneia
em três e ganho ponderal insuficiente em três pacientes.
A idade de início da dispneia foi de 30 dias de vida e a sua
duração ocorreu em média por 21 dias. A descrição de ganho
ponderal insuficiente foi descrita em média na idade de 11
dias e durou 83 dias.
MÉTODOS
Estudo descritivo e retrospectivo de série de casos,
realizado num hospital terciário em neonatos e lactentes com
menos de 1 ano de idade portadores de hepatite por CMV, no
período de janeiro de 2008 a março de 2014.
Residência Pediátrica 2016;6(1):25-30.
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Tabela 1. Perfil dos lactentes acompanhados com hepatite por citomegalovírus (CMV)
Pacientes
Idade gestacional (semanas)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
Nt
39
nt
37
31
Nt
37
40
Nt
36
34
2665
2700
3300
2755
1460
1800
2250
4700
1988
2620
2130
Idade de aparecimento (dias)
Nt
Nt
59
Nt
Nt
Nt
1
Nt
Nt
60
2
Dias de duração
Nt
Nt
7
Nt
Nt
Nt
40
Nt
Nt
30
7
Idade de aparecimento (dias)
Nt
Nt
Nt
Nt
Nt
Nt
1
Nt
30
1
Nt
Dias de duração
Nt
Nt
Nt
Nt
Nt
Nt
40
Nt
150
60
Nt
1
1
1
1
240
1
1
1
1
30
31
120
30
90
90
30
30
90
180
212
Nt
100
Idade de aparecimento (dias)
1
Nt
Nt
Nt
240
1
1
3
Nt
Nt
Nt
Dias de duração
Nt
Nt
Nt
Nt
30
30
90
180
Nt
Nt
Nt
Idade de aparecimento (dias)
1
Nt
Nt
Nt
Nt
1
1
3
Nt
Nt
Nt
Dias de duração
Nt
Nt
Nt
Nt
Nt
30
90
180
Nt
Nt
Nt
Peso ao nascimento (g)
Sintomas
Dispneia
Ganho de peso
Sinais
Icterícia
Idade de aparecimento (dias)
Dias de duração
Acolia
Colúria
Hepatomegalia
Idade de aparecimento (dias)
Dias de duração
1
1
Nt
Nt
240
1715
1
1
1
1
1
870
60
Nt
Nt
1715
131
365
180
515
Nt
135
1
1
1
nt
240
1
1
1
1
1
Nt
870
150
90
nt
1715
131
365
180
515
nt
Nt
Esplenomegalia
Idade de aparecimento (dias)
Dias de duração
Diagnóstico
Idade do diagnóstico (dias)
103
nt
54
87
270
89
9
60
129
120
52
Exames pré-tratamento
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Não
Sim
Sim
Sim
Sim
Tratamento
Sim
Não
Sim
Sim
Não
Sim
Sim
Não
Idade de início do tratamento (dias)
103
54
87
90
9
Exames pós-tratamento
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Não
Não
Não
Sim
Sim
Sim
170
150
60
Sim
Sim
Sim
Nt: Sem descrição no prontuário.
quando firmado o diagnóstico foi de 97 dias (27-167 dias),
sendo o diagnóstico mais precoce dado no nono dia de vida
por sorologia no recém-nascido.
Nove pacientes foram submetidos ao exame
de ultrassonografia de abdome total. Os exames de
ultrassonografia realizados detectaram hepatoesplenomegalia
em três, apenas hepatomegalia em três lactentes e apenas
esplenomegalia em um. O exame foi normal em dois
indivíduos. Um paciente foi submetido à colangiografia
operatória, que mostrou patência de vias biliares. A análise
histológica foi efetuada em nove dos 11 indivíduos. A Tabela
3 mostra as alterações encontradas.
Em relação à avaliação multidisciplinar, todos fizeram
avaliação oftalmológica com fundoscopia e lâmpada de
Todos os pacientes apresentaram icterícia e cinco
apresentaram acolia e colúria. Dez apresentaram hepatomegalia
ao exame físico e nove, esplenomegalia. Apenas um que
manifestou insuficiência respiratória, sob suspeita de pneumonite,
apresentou ausculta pulmonar alterada. Um teve choque
hemodinâmico, provavelmente séptico, antes do diagnóstico de
infecção por CMV. Outros dois tiveram alterações neurocognitivas
manifestadas no período com atraso motor e irritabilidade e
apenas um teve microcefalia detectada ao exame físico. A Tabela
2 mostra as principais médias de idade de início e duração dos
principais sinais.
O diagnóstico de infecção pelo CMV foi firmado nesses
casos em nove situações por PCR urinário para CMV e em duas
oportunidades por sorologia. A média de idade dos pacientes
Residência Pediátrica 2016;6(1):25-30.
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ou imunossupressos são os mais susceptíveis5. Na gravidez,
o risco envolvido é com a infecção do concepto. Naquelas
soronegativas que se infectam na gestação, o risco de
transmissão fetal está entre 30 a 40% e as crianças infectadas
em útero, nessa circunstância, apresentam risco maior para
o desenvolvimento de infecção grave. As mães portadoras de
IgG positivo para CMV podem reativar a infecção em 10-30%
com transmissão ao feto em torno 1-3%, com maiores chances
de infecção assintomática5. Essa informação não pode ser
extraída neste estudo, pois apesar da maioria das mães terem
realizado consultas de pré-natal, com mais de seis avaliações
como recomenda o Ministério da Saúde, a qualidade desse
acompanhamento fica aquém do ideal, prejudicando a triagem
e o diagnóstico precoce de algumas infecções na gestação,
como a infecção pelo CMV.
Os recém-nascidos quando infectados, geralmente
são assintomáticos e podem ser identificados por técnicas
laboratoriais6. Como descrito previamente, a doença é mais
evidente naqueles prematuros e de baixo peso ao nascer,
corroborado neste estudo, que comprovou uma média de
idade gestacional abaixo de 37 semanas e peso abaixo do ideal.
As manifestações da infecção por CMV são muito amplas,
e podem provocar a tríade neonatal clássica de sintomas
composta por ictérica em 62-67% dos casos5, petéquias (58%)
e hepatoesplenomegalia (50%). Provavelmente devido à
seleção dos pacientes deste estudo, o perfil com hepatite foi
identificado em todos os casos com colestase, hepatomegalia
clínica em 90% e esplenomegalia em 81%, superando as
taxas encontradas por Swanson & Schleiss5, que constataram
hepatoesplenomegalia em 60% dos casos, hiperbilirrubinemia
conjugada em 81% e icterícia clínica em 67% em casos de
infecção congênita por CMV.
As principais alterações histológicas encontradas
podem não ser patognomônicas da infecção por CMV, mas
refletem a lesão hepática, tais como a infiltração de células
mononucleares, esteatose leve, fibrose perissinusoidal,
hiperplasia de células de Kuppfer e até mais específicas, como
reação granulomatosa, inclusões citomegálicas em células
ductais e quadros de colestase3. Outras alterações têm sido
descritas, como transformação em célula gigante, colestase,
foco hematopoiético extracelular, pobreza de ductos biliares
a padrão obstrutivo biliar, fibrose e cirrose.
Essa falta de especificidade tem exigido métodos
mais confiáveis de diagnóstico como cultivo viral no tecido
hepático, imunohistoquímica e PCR sérico. Desses, o PCR
vem se mostrando excelente método, inclusive superando a
imunohistoquímica, pois esta se apresenta falsamente negativa
com frequência em casos de hepatite em lactentes devido à
pesquisa mais “tardia”, geralmente após os três meses de vida7.
Goedhals et al.7 constataram a superioridade da sorologia
ELISA IgM sobre a imunohistoquímica nessa circunstância.
Assim, apesar da grande importância na avaliação
clínica e como parâmetro para acompanhamento do paciente
com doença hepática, a biópsia não apresenta grande
Tabela 2. Média da idade de início e duração dos sinais nos lactentes
acompanhados com hepatite por citomegalovírus (CMV) com quadro
colestático.
Média de início dos
sinais e sintomas
(dias de vida)
Média de duração dos sinais e
sintomas (dias)
Icterícia
28
97
Acolia/hipocolia
49
83
Colúria
2
100
Hepatomegalia
28
496
Esplenomegalia
28
502
Sinal
Tabela 3. Alterações histológicas hepáticas nos lactentes acompanhados com hepatite por citomegalovírus (CMV).
Alteração Histológica
Número de indivíduos
Hepatite de células gigantes
4
Hipoplasia ductular
2
Duplicação ductular
3
Fibrose periportal e/ou sinusoidal
4
Balonização de hepatócitos
4
Colestase
6
Infiltrado linfocitário
2
Infiltrado neutrofílico
1
fenda, sendo encontrada alteração em apenas um caso, com
palidez de mácula. A avaliação da audição neurossensorial foi
executada em apenas um paciente, sendo alterada. A Tabela 4
demonstra os valores em média e desvio padrão daqueles que
foram tratados e apresentavam exames pré e pós-tratamento.
Dos indivíduos diagnosticados, apenas oito foram tratados
com o antiviral específico, ganciclovir. A média de início do
tratamento foi de 90 dias de idade e com duração por 42 dias, todos
com dose de 12 mg/kg/dia. Quatro apresentaram efeitos colaterais,
sem necessidade interrupção ou mudança da posologia. Três
apresentaram anemia, um leucopenia leve e um teve complicação
com acesso venoso periférico. Os três com anemia receberam
concentrado de hemácias durante a terapia com ganciclovir.
Dos 11 pacientes, sete ainda estão sob acompanhamento
no ambulatório de hepatologia infantil, seis melhoraram as provas
hepáticas e, desses, dois receberam alta ambulatorial aos dois anos
e meio de idade. Dois descontinuaram acompanhamento, com
perda do contato. Dois pacientes não receberam tratamento com
ganciclovir e mantiveram hepatite crônica, sendo um encaminhado
para transplante devido à colestase intensa. Não houve mortes
detectadas entre os casos.
DISCUSSÃO
O citomegalovírus causa a infecção congênita mais
comum do mundo. Mulheres grávidas e pacientes prematuros
Residência Pediátrica 2016;6(1):25-30.
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Tabela 4. Média de exames laboratoriais nos lactentes acompanhados com hepatite por citomegalovírus (CMV)
Exame
Médias
Valor pré-tratamento
Hb (g/dL)
DP Amostral
Valor pós-tratamento
DP Amostral
Variação %
10,1
1,4
11,1
1,0
+9,2
11.449
3341,0
7797,5
9217
+5,0
Segmentados %
35,4
7,8
35,9
11,2
+1,4
Linfócitos %
52,7
9,3
50,0
13,1
-5,1
Leucograma (Leuc/mm3)
Plaquetas/mm
250.142
89.947
312.900
120.541
+25,1
AST (49) (U/L)
296
224
60
20
-79,7
ALT (56) (U/L)
189
76
52
25
-72,4
RNI
1,1
0,2
1
0,1
-6,8
Razão de TTPa
1,4
0,7
1,3
0,3
-5,6
Albumina (g/dL)
4,2
2
3,8
0,4
-9,9
GGT (U/L)
297
244
81
55
-72,7
FA (U/L)
655
359
346
218
-47,1
Bil Total (mg/dL)
8,4
4
0,9
0,6
-89,0
Bil Direta (mg/dL)
5,0
2,5
0,4
0,3
-91,3
3
especificidade para o diagnóstico de hepatite por CMV, nem
quando se usa a imunohistoquímica, sendo reservada como
padrão ouro a técnica de PCR. A sorologia (IgM) teve grande
importância neste estudo no diagnóstico, pois a média de idade
do diagnóstico ficou em 97 dias, semelhante à observada na
literatura, com maior sensibilidade que a imunohistoquímica.
Mas ainda assim, a histologia mantém grande importância para
avaliar o dano hepático, sua extensão e gravidade.
Os níveis de aminotransferases encontrados se
assemelham àqueles encontrados na literatura, chegando
em média a três vezes o valor de referência. Essa elevação
costuma persistir por aproximadamente seis semanas e
pode regredir espontaneamente1,8,9. No entanto, muitos
especialistas defendem que, em neonatos, há evidência de
melhor prognóstico hepático e neurológico para aqueles que
receberam terapia antiviral, bem como para aqueles que
apresentam menor carga viral10.
Ozkan et al.3 mostraram que há redução significativa
dos níveis de aminotransferases, fosfatase alcalina,
gamaglutamiltransferase e bilirrubinas em três meses
do tratamento quando se trata os recém-nascidos com
ganciclovir em comparação com aqueles que não receberam o
tratamento. Esse estudo também constatou que há redução da
carga viral mais acentuada naqueles tratados com ganciclovir,
apesar de não haver significância estatística pela pequena
amostra estudada.
A mesma recomendação não é feita de modo
sistemático para crianças maiores e imunocompetentes com
hepatite por CMV. Alguns relatos demonstram que aqueles
com hepatite aguda grave ou com progressão para doença
crônica hepática podem ser pacientes cujo tratamento está
indicado2,8,11.
Tezer et al.2 mostraram benefício do tratamento (21
dias) para hepatite em lactentes com idade entre dois e quatro
meses com resposta da hepatite aguda. Essas evidências
revelaram o impacto do tratamento da hepatite aguda, mas
não fornecem ainda substrato para seu efeito em longo prazo,
mesmo sabendo-se da hipótese sobre o desenvolvimento de
doença crônica hepática, quando a viremia se mantém apesar
do tratamento.
Avila-Agüero et al.9 investigaram pacientes com sinais
de infecção por CMV (mal-estar, febre, elevação de enzimas
hepáticas, linfocitose) e imunidade competente. A efetividade
total do ganciclovir foi de 80% ao término do tratamento.
Entre os não tratados, 19/54 (35%), sete tiveram antigenemia
negativa em duas semanas, sendo que estes pacientes
apresentavam antigenemia baixa no início do tratamento.
Vancíková et al. 11 estudaram o tratamento com
ganciclovir por 15 dias em poucos lactentes que tiveram
hepatite por CMV com curso mais agressivo, diagnosticados
em média com nove semanas de vida. Observaram melhora
na vigência da terapia antiviral, embora tenha havido aumento
das aminotransferases e da carga viral posteriormente,
criando hipótese de um gatilho imune associado à replicação
viral e também à possibilidade de efetuar tratamento mais
prolongado que 15 dias.
Mesmo a média de idade no início do tratamento
estando fora do período neonatal, bem como não havendo
gravidade intensa no envolvimento hepático, o tratamento
demonstra indícios de ser uma medida positiva para condução
da hepatite em lactentes. Este estudo corrobora essa assertiva,
pois constatou redução nos níveis de aminotransferases e
bilirrubinas, superando 70% antes, versus pós-tratamento,
bem como presença de poucos efeitos colaterais. Nenhum
dos pacientes tratados que seguiram com acompanhamento
desenvolveu quadro crônico de hepatopatia. Os dois indivíduos
que desenvolveram cronicidade, com hepatite crônica,
colestase e cirrose, não receberam tratamento específico para
Residência Pediátrica 2016;6(1):25-30.
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CMV. Estes fatos podem demonstrar a utilidade do tratamento
em longo prazo. Entre os tratados, a maioria revelou melhora
clínico-laboratorial com acompanhamento até dois anos e
meio de idade.
Existem alguns limites neste trabalho, pois se trata de
um estudo descritivo que observa critérios não estabelecidos
previamente e, portanto, dificulta sua análise. O tamanho
amostral e a heterogeneidade da população, quanto à idade
e formas de diagnóstico (sorologias e PCR) dificultam a análise
linear dos fatos, tal como a demora no diagnóstico, muitas
vezes confundindo o momento correto da infecção (pré-natal,
canal de parto ou pós-natal).
Além disso, o tratamento e o acompanhamento não
se iniciaram ao mesmo tempo para todos os pacientes, sendo
muitas vezes tardio, acima do primeiro mês de vida, época
considerada na literatura ideal para o tratamento da hepatite
por CMV.
A falta de grupo controle pareado ao grupo
tratamento limita a avaliação da resposta sobre a queda
das aminotransferases, melhora da função hepática ou
impedimento de progressão para doença crônica. Há
necessidade de mais estudos com maior número de pacientes.
Por outro lado, há poucos estudos na literatura sobre o tema,
sendo importante esta intervenção terapêutica como tentativa
de mudar o prognóstico dos pacientes.
O tratamento para CMV não visa puramente melhora
aguda da hepatite, mas também melhorar o prognóstico
hepático e impedir que se desenvolvam mecanismos
lesivos que propiciem degeneração hepática, colestase e
cirrose. Portanto, se faz necessária a realização de estudos
pareados, duplo cegos, com coletas laboratoriais seriadas
e sistematizadas, além de acompanhamento regular e por
longo período para entender melhor o impacto do tratamento
da hepatite por CMV, principalmente entre os lactentes
imunocompetentes.
É válido destacar que o CMV muitas vezes é
negligenciado e esquecido por obstetras e pediatras e que
pode determinar alterações graves neurossensoriais e
hepáticas. Assim, o pré-natal bem conduzido, o diagnóstico
precoce e as intervenções terapêuticas imediatas poderão
determinar melhor prognóstico e melhor qualidade de vida
para os pacientes infectados precocemente na vida.
Não foram encontradas alterações específicas do
CMV, tais como inclusão citomegálica e não foi realizado
estudo de imunohistoquímica para este vírus nos espécimes
retirados.
Média de exames laboratoriais antes e após o
tratamento de 7 pacientes portadores de hepatite por CMV
que receberam tratamento com ganciclovir.
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