BJID 2006; 10 (June) Volume 10 • 1 ISSN 1413-8670 Supplement 1 • August 2006 THE BRAZILIAN JOURNAL OF INFECTIOUS DISEASES An Official Publication of the Brazilian Society of Infectious Diseases EDITOR Anastácio Q. Sousa I Consenso da Sociedade Brasileira de Infectologia para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) PUBLISHED BY CONTEXTO APOIO GlaxoSmithkline Brasil August 2006 Printed in Brazil www.bjid.com.br 2 BJID 2006; 10 (June) THE BRAZILIAN SOCIETY OF INFECTIOUS DISEASES The Brazilian Society of Infectious Diseases is conducted for scientific purposes, for the advancement and promulgation of knowledge relevant to infectious diseases. OFFICERS 2005-2006 President João Silva de Mendonça Vice President Denise Vantil Marangoni First Secretary Juvêncio José D. Furtado Second Secretary Érico Antônio Gomes de Arruda First Treasurer Roberto Marcio da Costa Florim Second Treasurer Flávio de Queiroz Telles Filho Federal Alagoas - Raquel Guimarães Amazonas - Eucides Batista da Silva Bahia - Fernando Badaró Ceará - Anastácio Queiroz de Sousa Distrito Federal - Dea Márcia da Silva M. Pereira Espírito Santo - Carlos Urbano Gonçalves Ferreira Jr. Goiás - Luiz Antonio Zanini Maranhão - Graça Viana Mato Grosso do Sul - Andréa L. de S. Campos Minas Gerais - Carlos Starling Pará - Helena Andrade Zeferino Brígido Paraíba - Luciana Holmes Simões Paraná - Alceu Fontana Pacheco Jr. Pernambuco - Martha Maria Romeiro F. Fonseca Piauí - Kelsen Dantas Eulálio Rio de Janeiro - J. Samuel Kierszembaum Rio Grande do Norte - Hênio G. Lacerda Rio Grande do Sul - Luciano Goldani Rondônia - André Luis de Freitas Alves Santa Catarina - Silvia Cristina C. Flores São Paulo - Hamilton Antônio Bonilha de Moraes Sergipe - Angela Maria Silva Tocantins - Hertz Ward de Oliveira www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (June) 3 THE BRAZILIAN JOURNAL OF INFECTIOUS DISEASES An Official Publication of the Brazilian Society of Infectious Diseases EDITOR Esper Georges Kallas (BR) Flávia Rossi (BR) Guido Levi (BR) Guillermo Prada (CO) Henry Masur (US) Jefrey Shaw (BR) John R. David (US) Jorge Arias (BR) José Tavares Neto (BR) Kleber Luz (BR) Marcelo Ferreira (BR) Marcos Antônio de Ávila Vitória (BR) Maria Aparecida Shikanai Yasuda (BR) Marinella Dellanegra (BR) Mark Wainberg (CA) Mauro Schechter (BR) Mitermayer Galvão dos Reis (BR) Naftale Katz (BR) Raimundo Paraná (BR) Raúl Istúriz (VE) Reinaldo Salomão (BR) Ricardo Diaz (BR) Richard Guerrant (US) Richard Locksley (US) Richard B. Roberts (US) Robert Schooley (US) Rod Hay (GB) Rodolfo Teixeira (BR) Rogério de J. Pedro (BR) Sérgio Cimerman (BR) Sérgio Coutinho (BR) Sylvia Lemos Hinrichsen (BR) Warren D. Johnson, Jr. (US) Zilton Andrade (BR) Anastácio Q. Sousa ASSOCIATE EDITORS Adauto Castelo (BR) André Villela Lomar (BR) Antônio C. Pignatari (BR) Carlos Brites Alves (BR) Hélio Sader (BR) João Silva de Mendonça (BR) Márcio Nucci (BR) Roberto Badaró (BR) Roberto Focaccia (BR) PRODUCTION STAFF Luciana Bastianelli, Managing Editor Heloísa Carvalho, Submissions Manager Taís Cupertino, Secretary EDITORIAL BOARD Achilea L. Bittencourt (BR) Aluízio Prata (BR) Antônio Alci Barone (BR) Antônio Andrade (BR) Antônio Campos Neto (BR) Antônio Carlos Nicodemo (BR) Arnaldo Colombo (BR) Celso Ramos Filho (BR) Cláudio Sérgio Pannuti (BR) Diana Pedral-Sampaio (BR) Dirceu Grecco (BR) Eduardo Gotuzzo (PE) Eduardo Netto (BR) www.bjid.com.br 4 BJID 2006; 10 (June) The Brazilian Journal of Infectious Diseases is an official publication of the Brazilian Society of Infectious Diseases and is published bimonthly by Contexto - Rua Alfredo Magalhães, 04/ Barra, 40140-140, Salvador-Bahia-Brazil. The editorial offices are at Contexto. Editorial Office Correspondence concerning subscriptions, advertisements, claims for missing issues, changes of address and communications to the editors should be addressed to Dr. Anastácio Q. Sousa, The Brazilian Journal of Infectious Diseases - BJID, Rua Alfredo Magalhães, 04/Barra, 40140-140, Salvador-BahiaBrazil; phone: (55 71) 3264-2971; fax (55 71) 32643326; or should be sent by e-mail: [email protected]. Contributors please consult the Instructions for Authors in this issue or visit www.bjid.com.br Permissions Copyright 2006 by The Brazilian Journal of Infectious Diseases and Contexto Publishing. All rights reserved. Except as authorized in the accompanying statement, no part of the BJID may be reproduced in any form or by any electronic or mechanical means, including information storage and retrieval systems, without the publisher's written permission. 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Now Indexed in MEDLINE, EMBASE/EXCERPTAMEDICA, LATINDEX, LILACS, SUBIS DATABASE, SIIC, SCIELO, CAS www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (June) 5 I Consenso da Sociedade Brasileira de Infectologia para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Coordenação Evaldo Stanislau Affonso de Araújo Organização Sociedade Brasileira de Infectologia – Comitê de Hepatites João Silva de Mendonça Roberto Focaccia Fernando Lopes G. Junior Evaldo Stanislau Affonso de Araújo. Grupo de Consenso Aline G. Vigani Ana Teresa Rodrigues Viso André Cosme de Oliveira Antonio Alci Barone Edgard DeBortholi Edson Abdala Evaldo Stanislau Affonso de Araújo Evandro S. de Melo Fátima Mitiko Tengan Fernando Lopes Gonçales Jr João Silva de Mendonça José Carlos Fonseca José Fernando de Castro Figueiredo* Marcel Cerqueira* Marcelo Simão Ferreira Maria Helena P.Pavan* Marta Heloísa Lopes* Neiva S.L. Gonçales Norma de Paula Cavalheiro Ricardo S. Diaz Roberto Focaccia Rodrigo Angerami* Umbeliana Barbosa Oliveira Venâncio Avancini* * Revisores não participantes da reunião de consenso. www.bjid.com.br 6 BJID 2006; 10 (June) I Consenso da Sociedade Brasileira de Infectologia para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Histórico das Hepatites B e Delta Dr. José Carlos Ferraz da Fonseca (AM) Epidemiologia da Hepatite B e D e seu Impacto no Sistema de Saúde Professora Fátima Mitiko Tengan (HC-FMUSP) Professor Evaldo Stanislau Affonso de Araújo (HC-FMUSP) Patogenia da Hepatite B e Delta Professor Antônio Alci Barone (HC-FMUSP) Dra. Ana Teresa Rodriguez Viso (HC-FMUSP) Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B Fulminante e de ReAgudizações (Flare) Professor Roberto Focaccia (IIER) Dra. Umbeliana Barbosa Oliveira (IIER) Terapia da Hepatite B Crônica: Como e Quando? Pacientes Virgens de Terapia Professor Evaldo Stanislau Affonso de Araújo (HC-FMUSP) Professor Antônio Alci Barone (HC-FMUSP) Abordagem Terapêutica Sequencial dos Pacientes com Hepatite B Crônica Submetidos a Tratamento Prévio Professor Fernando L. Gonçales Jr. (UNICAMP) História Natural da Hepatite B Aguda e Crônica Professor João Silva de Mendonça (HSPE) Dra.Aline Gonzalez Vigani (UNICAMP) Tratamento da Hepatite D Professor José Carlos Ferraz da Fonseca (AM) Marcadores Sorológicos da Hepatite B e sua Interpretação Professora Norma de Paula Cavalheiro (HC-FMUSP) Professora Neiva S. L. Gonçales (UNICAMP) Perfis Sorológicos Anômalos, Genótipos e Mutantes do VHB Professora Neiva S. L. Gonçales (UNICAMP) Professor Fernando Lopes Gonçales Jr. (UNICAMP) Aconselhamento a Doadores e Infecção Oculta pelo VHB Professor José Fernando de Castro Figueiredo (FMUSP – Ribeirão Preto) Dr. Rodrigo Nogeuira Angerami (UNICAMP) Mensuração do HBV DNA Professor João Silva de Mendonça (HSPE) Professor Ricardo S. Diaz (UNIFESP) Co-Infecção: HIV-VHB Dr. Edgard DeBortholi Santos (IIER) Professor Roberto Focaccia (IIER) Dra.Maria Helena Postal Pavan (UNICAMP) Professor Marcelo Simão Ferreira (UF-Uberlândia) Prevenção da Hepatite B e Delta Professora Marta Heloísa Lopes (HC-FMUSP) Abreviaturas de Instituições DMIP: Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias Anatomia Patológica da Hepatite B Professor Venâncio Avancini Ferreira Alves (HC-FMUSP) Professor Evandro Sobroza de Mello (HC-FMUSP) História Natural e Manuseio do Carcinoma Hepatocelular no Paciente com Hepatite B Dr.André Cosme de Oliveira (HC-FMUSP) Professor Marcel C.C. Machado (HC-FMUSP) Indicações para o Transplante Hepático e Manuseio Pré e Pós-transplante na Hepatite B Professor Edson Abdala (HC-FMUSP) Professora Fátima Mitiko Tengan (HC-FMUSP) HC FMUSP: Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo LIM 47: Laboratório de Investigação Médica 47 FMUSP: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo IIER: Instituto de Infectologia Emílio Ribas HSPE: Hospital do Servidor Público Estadual UNICAMP: Universidade de Campinas www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (June) THE BR AZILIAN BRAZILIAN 7 JOURNAL OF INFECTIOUS DISEASES Volume 10 • Supplement 1 1 August 2006 Apresentação 40 H i s t ó r i a N a t u r a l e M a n u s e i o d o Carcinoma Hepatocelular no Paciente com Hepatite B Evaldo Stanislau Affonso de Araújo 2 Histórico das Hepatites B e D Marcel C. C. Machado, André Cosme de Oliveira José Carlos Ferraz da Fonseca 6 Epidemiologia da Hepatite B e D e seu Impacto no Sistema de Saúde Fátima Mitiko Tengan, Evaldo Stanislau Affonso de Araújo 11 Patogenia da Hepatite B e Delta Ana Teresa Rodriguez Viso, Antônio Alci Barone 46 Indicações para o Transplante Hepático e Manuseio Pré e Pós-Transplante na Hepatite B Edson Abdala, Fátima Mitiko Tengan 50 Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B Fulminante e de Re-Agudizações (Flare) Roberto Focaccia, Umbeliana Barbosa Oliveira 15 História Natural da Hepatite B Aguda e Crônica João Silva de Mendonça, Aline Gonzalez Vigani 19 Marcadores Sorológicos da Hepatite B e sua Interpretação 53 Terapia da Hepatite B Crônica: Como e Quando? Pacientes Virgens de Terapia Evaldo Stanislau Affonso de Araújo, Antônio Alci Barone Neiva S. L. Gonçales, Norma de Paula Cavalheiro 23 Perfis Sorológicos Anômalos, Genótipos e Mutantes do VHB Neiva S. L. Gonçales, Fernando Lopes Gonçales Jr. 29 Aconselhamento a Doadores e Infecção Oculta pelo VHB José Fernando de Castro Figueiredo, Rodrigo Nogueira Angerami 57 Abordagem Terapêutica Seqüencial dos Pacientes com Hepatite B Crônica Submetidos a Tratamento Prévio Fernando Lopes Gonçales Jr. 63 Tratamento da Hepatite D José Carlos Ferraz da Fonseca 67 Co-Infecção HIV-VHB 32 Mensuração do HBV DNA Marcelo Simão Ferreira,Roberto Focaccia, Edgard DeBortholi Santos, Maria Helena Postal Pavan Ricardo S. Diaz, João Silva de Mendonça 36 Anatomia Patológica da Hepatite B Evandro Sobroza de Mello, Venâncio Avancini Ferreira Alves 72 Prevenção da Hepatite B e Delta www.bjid.com.br Marta Heloísa Lopes BJID 2005; 9 (June) 185 BJID on line The Brazilian Journal of Infectious Diseases (BJID) is now of the BJID and the institutions that support the Journal. present in a new Web Site: www.bjid.com.br. The BJID is an The visitors can be addressed directly to the sponsor official publication of The Brazilian Society of Infectious they want by a link) Diseases and it is a vehicle for original publications in this About us (This section inform the visitors about the field. The BJID is published bi-monthly by Contexto Publishing production staff of the Journal, the address, phone (Salvador/BA, Brazil) since 1997. The aim of this site is to number, e-mail, and the contacts of the BJID) familiarize visitors with BJID' contents by providing online Links (Interesting links about infectious diseases and subscriptions, review process, submission process, abstracts, institutions) past publications, and extend the BJID´s instructions for This website reserved a new space to the authors who authors to infectious-disease specialists worldwide. Full have already submitted papers to the Journal and/or those instructions for authors are provided in English and have papers in the submission process in BJID with the Portuguese. This new website is divided into the following following sections: sections: On-line Submission Process (The authors now could Home (A new design was established for BJID, including send the papers by e-mail, following the specific rules spaces for advertising) described in this section. Also, the authors now can Editors (This section includes all the editorial board of consult the review process of the submitted articles via BJID) on-line. Immedialely after the submission of the article, Subscriptions (In this section, the visitor could subscribe the main author will receive a login and a password, with the BJID online) which the author will be able to consult the status of the Instructions to Authors (This section is in Portuguese article. If other authors want to check the status of their and in English, and can help the authors who want to article via on-line, they can also register a proper login submit papers to BJID to follow. There are the rules for and password. publishing in the Journal). On-line Review Process (The reviewers now can receive Index Listing (The visitors can check the status of the the article and make all the edition process by internet. BJID in the medicus indexa round the world. In a nearly The reviewer will receive a message with a login an a future, we will include a service to check the impact of password. With them, he could access the entire article. each article published in BJID) After he comments in a specific form, it will be sent to the Abstracts (The visitors have free access to the abstracts author automatically. The authors now can consult the of the current year. For example: every each issue, the review process of the submitted articles via on-line. abstracts will be available to be consulted. If the visitors Immediately after the submission of the article, the main would like the full text, they need to ask the permission to author will receive a login and a password, with which our office). the author will be able to consult the status of the article. Publications (In this section, it will be available the full If other authors want to check the status of their article text of last volumes 1997 to 2003 in pdf format) via on-line, they can also register a proper login and Sponsors (This space is reserved to the advertising board password. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 1 I Consenso da Sociedade Brasileira de Infectologia para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) A Medicina é uma área da ciência na qual os desafios nunca são fáceis ou menores e, certamente, a Infectologia é uma das especialidades em que essa assertiva é mais perceptível. Desde a antiguidade lutamos contra infecções bacterianas, virais e parasitárias, mas sempre temos novos desafios. O surgimento da Aids, as infecções hospitalares e em imunodeprimidos, as doenças emergentes e re-emergentes, as “velhas” doenças tropicais e a tuberculose estão todas aí a nos ameaçar. Avançamos ainda nas ferramentas diagnósticas, no melhor conhecimento da interação parasita-hospedeiro e, evidentemente, na terapia, com medicamentos desenvolvidos de forma moderna, com tecnologias inimagináveis há poucos anos. Tudo isso foi percebido pela Sociedade Brasileira de Infectologia que constituiu os seus diversos Comitês, entre os quais, o das Hepatites Virais. As hepatites virais não foram citadas antes de forma proposital para o destaque em separado que merecem. As doenças crônicas do fígado, mormente as causadas pelas hepatites virais, constituem, na atualidade, a maior causa de transplante hepático no mundo, acarretam a morte de milhões de pacientes e consomem, em que pese todo o sub-diagnóstico existente, significativo montante de recursos econômicos. Assim, somos hoje, como alguns dizem, “aidólogos”, “hepatitólogos”. Na verdade, as hepatites são tão relevantes que não cabem entre os “hepatitólogos” apenas e, nesse sentido, o Comitê de Hepatites da SBI deliberou entre suas prioridades a realização desse I Consenso sobre Hepatite B. Colegas de larga experiência e dedicação ao estudo das hepatites virais e áreas correlatas realizaram uma discussão profunda, franca e independente, que resultou em uma revisão do tema e no Consenso propriamente dito. Se existem revisões Grupo do I Consenso da SBI para Manuseio e Terapia da hepatite B (e Delta) internacionais, as mesmas não possuem nosso “tempero”, representado não apenas pela profunda erudição do grupo, mas pelo conhecimento de nossa realidade médica, social e econômica. Pretendemos, assim, contribuir para que a assistência se aprimore e se difunda, auxiliando a quem necessita, aos portadores da hepatite B. Essa é a terceira vez que o núcleo desse grupo de consenso se reúne. Nas duas ocasiões anteriores, discutimos o Consenso da Sociedade Paulista de Infectologia para o manuseio e terapia da Hepatite C. Dessa vez, reforçados por colegas de outros centros do Brasil e com a força da SBI, nos propusemos a realizar o I Consenso da SBI para o Manuseio e Terapia da Hepatite B e, em 2007, atualizar o Consenso de Hepatite C, sempre em datas atreladas a um de nossos congressos nacionais ou regionais. As discussões e o clima fraterno se ampliam a cada reunião. Não foi diferente agora. Nosso desafio futuro sempre é superar e aprimorar os anos anteriores. No entanto, a exemplo das outras edições, para atingir esse objetivo, mais uma vez tivemos o decisivo apoio da indústria farmacêutica que, de forma ética, apoiou a reunião dos especialistas e a edição de uma separata no The Brazilian Journal of Infectious Diseases (BJID), onde publicamos o Proceedings do “I Consenso da SBI para o Manuseio e Terapia da Hepatite B (e Delta)”. Pelo apoio ético e a não-interferência em nosso trabalho, externamos nosso agradecimento ao Laboratório GlaxoSmithkline Brasil. Aos leitores, esperamos que nossas reflexões sejam úteis e, aos pacientes, que lhes traga a possibilidade de uma assistência médica tecnicamente adequada e a garantia do tão desejado acesso ao médico competente. Boa leitura e até a próxima ! Evaldo Stanislau Affonso de Araújo Comitê de Hepatites da SBI e Grupo de Consenso www.bjid.com.br 2 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Histórico das Hepatites B e D José Carlos Ferraz da Fonseca Professor Adjunto da Universidade Federal do Amazonas- Faculdade de Ciências da Saúde- Disciplina de Doenças Infecciosas e Parasitárias; Especialista em Hepatologia (Sociedade Brasileira de Hepatologia) Histórico da Hepatite B Na história das grandes descobertas da medicina, a chamada descoberta “acidental” ou “por acaso” é notória e podemos citar como exemplo a conhecida história da descoberta da penicilina (Alexander Fleming, 1929). Um outro exemplo da descoberta “por acaso” na medicina foi a do vírus da hepatite D (Delta) em 1977 por Mário Rizzetto e cols. A princípio, ao estudarem por técnicas de imunofluorescência fragmentos de tecido hepático obtido por biópsia hepática de pacientes italianos soropositivos para o HBsAg, os autores identificaram um novo sistema antígeno/anticorpo distinto do VHB. Estudos posteriores, sejam de caráter experimental ou de biologia molecular, findaram na descoberta de um novo agente viral das hepatites, hoje designado de vírus da hepatite D. Fica patente com os dois exemplos acima citados que as grandes descobertas da Medicina podem ser produtos finais de observações inesperadas. Entretanto, o maior louvor dessas descobertas científicas está na competência dos técnicos em decifrar tais achados inesperados e explaná-los corretamente. Segundo Louis Pasteur, “o acaso favorece apenas as mentes preparadas” e a descoberta do VHB teve também caráter puramente acidental ou “por acaso”, como descreveremos a seguir. Certo dia, em 1964, um geneticista americano chamado Baruch Blumberg e cols., estudando anticorpos contra lipoproteínas séricas em pacientes que tinham recebido transfusão de sangue, ou seja, com objetivos completamente diferentes dos objetivos iniciais e achados finais da pesquisa, identificaram no soro pertencente a um aborígine australiano a presença de um antígeno que reagia como o soro de dois doentes hemofílicos politransfundidos. O referido antígeno descoberto foi denominado pelos autores como Antígeno Austrália (AgAu), em razão da origem da amostra do paciente e publicado no Journal of the American Medical Association (JAMA) em 1965, com o título “A New antigen in Leukemia sera”. A distribuição do AgAu em várias populações, como reportado no estudo inicial e pioneiro de Blumberg, revelou os seguintes resultados: de um total de 1704 amostras testadas para o AgAu, 38 (2,3%) foram positivas, sendo que a maioria foi reativa entre nativos de Taiwan, 23/3 (13%) e aborígines australianos, 208/12 (5,7%). Após a descoberta do referido antígeno e de acordo com próprio Blumberg, um questionamento o deixava perplexo e uma devida pergunta o deixava preocupado, “What is this Australia antigen?”. Inicialmente, Blumberg focando a associação da leucemia com o AgAu, levantou a hipótese de que a presença de tal antígeno entre pacientes leucêmicos poderia ser uma predisposição herdada para leucemia ou um agente causal ou até um fator predisponente para o desenvolvimento da leucemia. Estudos subseqüentes sobre o AgAu revelaram uma alta freqüência deste entre portadores da Síndrome de Down institucionalizados (30%), quando comparada com pacientes leucêmicos (10%) e portadores de Down vivendo em casa (1%). Qual a razão destes achados, já que os portadores da síndrome de Down eram todos negativos para o AgAu ao nascimento? Testando amostras de soro dos portadores de Down, ele verificou que a ALT apresentava níveis significativos e elevados entre os positivos para tal antígeno, fato não observado entre os AgAu negativo. A peça final da ligação entre o AgAu e a hepatite aconteceu quando Barbara Werner, uma investigadora do laboratório de Blumberg, desenvolveu quadro clínico e bioquímico de hepatite aguda. Testada para o AgAu, ela foi positiva. Previamente, a referida investigadora tinha servido de controle negativo para o AgAu. Em 1967, Blumberg e cols. sugeriram pela primeira vez que a alta freqüência do AgAu no soro de pacientes com hepatite aguda poderia estar relacionada com um suposto “vírus” introduzido entre humanos por transfusões de sangue. De acordo com Blumberg B (2002), tal publicação foi rejeitada inicialmente e aceita após intensa revisão dos autores. Os revisores da revista Annals of Internal Medicine informaram ao autor que os resultados encontrados não eram convincentes para suportarem a hipótese de que o AgAu estaria associado à hepatite. Independentemente dos achados de Blumberg em 1965 e 1967, Prince AM em 1968, isolou um outro antígeno no sangue durante o período de incubação de uma hepatite póstransfusional. O referido antígeno foi denominado por Prince de antígeno SH, relativo a hepatite sérica. Posteriormente, comprovou-se que o antígeno SH de Prince AM era o mesmo Antígeno Austrália de Blumberg. No mesmo ano da descoberta de Prince, um outro americano e pertencente a equipe de Blumberg, chamado Bayer M (citado por Blumberg BS, 2002), analisou por microscopia eletrônica o soro de um portador crônico do antígeno Austrália e encontrou numerosas partículas, algumas esféricas e outras tubulares. As esféricas mediam cerca de 22nm de diâmetro, enquanto as tubulares cerca de 22nm de largura e 150 nm de comprimento. Tais partículas reagiam com o soro dos pacientes convalescentes www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) de hepatite, sugerindo que o AgAu estaria presente na sua superfície. Estudos posteriores revelaram que as partículas encontradas por Bayer eram apenas um produto da síntese em excesso do antígeno de superfície pelos hepatócitos infectados. Tais partículas seriam, na realidade, invólucros virais vazios não infectivos. Finalmente, em 1970, Dane DS e cols. demonstraram por microscopia eletrônica em soros positivos para o antígeno Austrália uma terceira partícula de forma esférica e medindo cerca de 42nm. Em 1971, Almeida J e cols. caracterizaram o que chamaram de Partícula de Dane, de pacote viral completo do VHB. A partícula de Dane constituía-se de um invólucro externo e um núcleo, sendo que o invólucro externo correspondia ao antígeno Austrália, passando posteriormente a ser designado de antígeno de superfície do vírus da hepatite B (HBsAg). A primeira publicação sobre a presença do AgAu no Brasil deu-se em 1970 por Salzano FM& Blumberg BS. Estudando amostras de pacientes brasileiros para o referido antígeno, os autores revelaram uma prevalência de 0,5% entre indivíduos sadios, O% entre portadores de Hansen, de 4,0% entre portadores de leucemia, com prevalência total de 0,6% para o AgAu. Grande parte das amostras estudadas pertenciam a indivíduos e pacientes nativos de Porto Alegre (RS) e Florianópolis (SC). Estudos posteriores confirmaram que a partícula de Dane de 27 nm representava o virion completo do VHB, sendo constituída por um ácido nucléico (DNA) e do antígeno central do VHB (HBcAg). O vírus B foi o primeiro vírus humano patogêncio a ser seqüenciado. Em 1972, Magnus e Espmark, utilizando testes de imunodifusão, descobriram antígenos distintos do HBsAg, que eles chamaram de antígeno e do vírus da hepatite B (HBeAg), como também seu anticorpo correspondente (anti-HBe). A presença sérica do HBeAg entre portadores do VHB foi identificada como um marcador de replicação viral e de alta infectividade com o HBV-DNA. Em 1986, estudos dirigidos entre pacientes de origem italiana e grega revelaram uma rápida e progressiva doença hepática crônica HBsAg reativa, negativa para o HBeAg e positiva para o anti-HBe. Os referidos pacientes, apesar de serem HBeAg negativos, tinham evidências de alta replicação viral e eram positivas para o HBV-DNA. Em 1989, dois estudos independentes e realizados entre pacientes anti-HBe positivo originários de algumas áreas do mediterrâneo, revelaram que a maior causa da discrepância entre a presença do HBV-DNA e ausência do HBeAg estaria relacionado com a infecção de uma cepa variante do VHB incapaz de produzir o HBeAg (mutante precore 1896). Novas descobertas com relação a biologia do VHB revelam que este vírus tem uma diversidade viral complexa e apresenta diferentes subtipos e genótipos. Diferenças antigênicas no antígeno de superfície do vírus B (HBsAg) estabelecem quatro subtipos: adw, ayw, adr, e ayr. Correntemente o VHB é dividido em oito genótipos (A, B, C, D, E, F, G, H), que são 3 associados com diferentes mutações nas regiões dos genes pré-core e promoter core basal durante a soroconversão do HBeAg para anti-HBe. Estudos recentes sugerem que os genótipos do VHB possam influir na gravidade da doença e resposta ao tratamento. Confirmada a relação da descoberta de Blumberg com o VHB, o próximo desafio dos pesquisadores seria descobrir uma vacina capaz de prevenir a doença. Uma retrospectiva na história da descoberta da vacina contra o VHB começa em 1971 com Samuel Krugman. O autor inoculou em crianças americanas portadoras de deficiência mental da escola “Willowbrook State School for the Mentally Handicapped, New York” o soro MS2 (vírus inativado pelo calor de 98° durante um minuto). Os resultados forma parciais, ou seja, sem proteção adequada. Entre 1975 e 1976 diversos grupos de pesquisa publicaram resultados do emprego de uma vacina mais purificada, de boa tolerabilidade e eficaz. Todavia, somente em 1981 foi registrada a vacina derivada do plasma de portadores saudáveis do HBsAg. Estudos randomisados mostraram que tal vacina era bem tolerada e eficaz, protegendo os vacinados contra o VHB em 95% dos casos. Finalmente, em 1986, a vacina derivada de plasma foi substituída pela nova descoberta da medicina, a vacina contra o VHB produzida por engenharia genética, até hoje utilizada. Conhecida a história da descoberta do VHB e os meios de prevenir a doença que o vírus provoca, fazia-se necessário encontrar drogas que pudessem atuar sobre a replicação do vírus e interferissem na patogenia da doença crônica, evitando assim a progressão para as formas mais graves de doença. Até o início dos anos setenta, o uso de plantas e infusões de várias naturezas foram utilizadas no tratamento dos pacientes portadores da então chamada icterícia infecciosa ou por soro homologo. Durante a década de setenta, o uso de corticóide (prednisona) no tratamento da hepatite crônica de qualquer etiologia, principalmente ocasionada pelo VHB, fez parte do arsenal terapêutico em todo mundo. No entanto, estudos retrospectivos conduzidos em 1974 revelaram que a retirada abrupta da droga durante o tratamento estava freqüentemente associada à elevação das aminotransferases e a efeitos colaterais de média gravidade. A primeira tentativa científica de tratar pacientes com hepatite crônica B com drogas de efeito antiviral, tais com alfa interferon humano leucocitário e interferon humano fibroblasto, ocorreu no ano de 1976, de acordo com as publicações de Greennberg HB et al. e Demyter J et al. Os resultados obtidos nesses dois estudos, apesar de preliminares e do número pequeno de pacientes estudados, demonstraram que o emprego do interferon humano leucocitário e fibroblasto ocasionavam significativa queda dos marcadores de replicação viral do VHB. O efeito conseguido pelas duas drogas era temporário. As dificuldades de obter as referidas drogas e seu custo exorbitante fizeram caí-las em esquecimento www.bjid.com.br 4 Sociedade Brasileira de Infectologia temporário. Somente em 1982, com a descoberta do interferon alfa recombinante, recomeçaram os estudos no tratamento da hepatite crônica B e o pioneiro nesses estudos foi Schalm SW em 1982. Entre 1985 e 1987, ensaios controlados com interferon alfa recombinante no tratamento da hepatite crônica B revelaram uma resposta virológica por grupo estudados que variou de 26% a 32%. Desde os primeiros pacientes tratados com o interferon alfa recombinante em 1982 e até o presente momento, novas drogas surgiram e são referenciadas como opção de primeira linha no tratamento da hepatite crônica B. De acordo com o ano de aprovação da Federal Drugs Association (FDA), cinco drogas fazem parte do tratamento da hepatite crônica B: Interferon alfa recombinate, 1982; Lamivudina, 1988; Adefovir, 2002: Interferon alfa peguilado; 2005; Entecavir, 2005. Como podemos observar, a história da “hepatite sérica” ou do próprio VHB, inciou-se em 1895 com o estudo e publicação de Lürman A dos fatos ocorridos entre trabalhadores do estaleiro de Breman, na Alemanha. De acordo com os resultados obtidos no referido estudo (citado por Freitas J), 191 dos 1289 trabalhadores do porto de Bremen (Alemanha), que receberam vacina contra a varíola (via parenteral), preparada a partir de linfa humana, desenvolveram quadro de icterícia após 2 meses a 8 meses da aplicação. Provavelmente, pelo período de incubação, o agente transmissor seria o ainda não descoberto vírus da hepatite B (VHB). O referido estudo ainda hoje é considerado como um modelo nos estudos epidemiológicos das hepatites de etiologia viral. A descoberta do VHB por Blumberg em 1965, merecido ganhador do premio Nobel de Medicina (1978) por tal achado, é considerada como um dos fatos mais importantes da medicina no último século. Contudo, a história da hepatite B ainda não pode e nem deve ser considerada como penúltimo capítulo, já que o número de portadores crônicos do VHB ainda encontra-se em fase de ascensão, apesar da existência da vacina há mais de vinte anos. O que falta, do ponto de vista científico, para que a história do VHB possa ser concluída? Com certeza, a expansão total e mundial da vacinação contra o VHB e a descoberta de novas drogas capazes de destruir ou suprimir o vírus definitivamente. A junção da medicina profilática e terapêutica seria o suporte ideal para que possamos num futuro bem próximo, erradicar totalmente a doença ocasionada pelo VHB e quem sabe, descrever uma outra história. Histórico da Hepatite D Em 1977, Mario Rizzetto et al. descreviam pela primeira vez um novo sistema imunológico, constituído pelo antígeno Delta (HDAg) e anticorpo anti-Delta (anti-HD), associado à infecção pelo VHB. Inicialmente, os descobridores desse novo sistema denominaram-no de sistema Delta. De acordo BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) com os autores, tal sistema, constituído de antígeno e anticorpo, seria uma nova variante do VHB ou um novo agente viral. Nesse mesmo estudo, Rizzetto e cols. demonstraram que os anticorpos específicos do sistema delta (anti-delta) eram somente detectados em portadores do antígeno de superfície do vírus da hepatite B (HBsAg), com ou sem doença hepática, não sendo positivo dentro do grupo-controle, nos demais o HBsAg fora negativo. Esses resultados e os obtidos através de infecções induzidas em experiência em primatas não humanos confirmaram que a expressão deste novo agente infeccioso somente ocorria em indivíduos e animais infectados pelo vírus da hepatite B (VHB). Estudos posteriores a 1977 revelaram que este novo agente viral das hepatites poderia ser encontrado em outras regiões do mundo e que, através de estudos de transmissão parenteral em chimpanzés, o mesmo era altamente infeccioso. Em 1983, foi proposta e aceita uma nova nomenclatura para o agente Delta: vírus da hepatite Delta, previamente designado de Agente Delta. Na década de noventa, estudos genéticos e seqüenciais do genoma do VHD revelam uma alta heterogeneidade deste vírus, com várias seqüências isoladas, sendo identificados até o presente momento três genótipos do VHD, diferenciados e denominados de tipo I, II (IIa,IIb) e III. Em 2002, estudos de análise do genoma do VHD entre pacientes infectados de origem africana sugerem a existência de mais três tipos diferenciados de genótipos do VHD. Cada genótipo do vírus D apresenta uma distribuição geográfica diferente e doença hepática associada, sendo o subtipo Ia e tipo III considerados os mais graves. A primeira tentativa científica de tratar pacientes com hepatite crônica D com drogas imunossupresivas (corticóide) e imunoestimulantes (levamisole), ocorreu no ano de 1983. Em 1990, estudo piloto e de caráter clínico sugeriu que o Interferon alfa poderia inibir a replicação do VHD e o controle da hepatite D em um mesmo grupo de pacientes. Até o presente momento, o Interferon alfa (IFN) tem sido a única opção terapêutica no tratamento das hepatites crônicas pelo VHD, já que o uso de outras drogas antivirais, como a Ribavirina e Lamivudina, apresentou resultados não satisfatórios. Referências Bibliográficas 1. Blumberg B.S., Alter H.J., Visnich A. A “new” antingen in leukemia sera. Journal of American Medical Association 1965;191:541-6. 2. Krugman S., Giles J.P., Hammond J. Infectious hepatitis: evidence for two distinctive clinical, epidemiological, and immunological types of infection. Journal of the American Medical Association 1967;200:365-373. 3. Blumberg B.S., Gerystley B.J.S., Hungerford D.A., et al. A serum antigen (Australia antigen) in Down’s syndrom, leukemia and hepatitis. 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Journal of Viral Hepatitis 2005;12:2-9. www.bjid.com.br 6 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Epidemiologia da Hepatite B e D e seu Impacto no Sistema de Saúde Fátima Mitiko Tengan1, Evaldo Stanislau Affonso de Araújo2 Professora Assistente da Disciplina de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da FMUSP; Médica do Ambulatório e Laboratório de Hepatites/LIM 47 DMIP-HC-FMUSP; 2Assistente-Doutor da Divisão de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do HC-FMUSP, Médico do Ambulatório e Laboratório de Hepatites/LIM 47 DMIP-HC-FMUSP 1 Epidemiologia da Hepatite B Estima-se que mais de 2 bilhões de pessoas no mundo estão infectadas pelo vírus da hepatite B e que cerca de 360 milhões sofrem de infecção crônica por esse agente. A incidência da infecção pelo HBV e os padrões de transmissão variam muito no mundo em diferentes subgrupos de populações. Este fato é influenciado principalmente pelo predomínio da idade de aquisição da infecção. A endemicidade da infecção é considerada alta naquelas partes do mundo onde pelo menos 8% da população é HBsAg positivo. Nessas áreas, 70-90% da população geralmente possui evidências sorológicas de infecção prévia pelo HBV. Quase todas as infecções ocorrem tanto durante o período perinatal ou infância precoce, um fato que é responsável pelas altas taxas de infecção crônica pelo HBV nessas populações. O risco de infecção pelo HBV continua após os primeiros cinco anos de vida, mas sua real contribuição para a alta taxa de infecção é insignificante. Em áreas altamente endêmicas como a Ásia, África abaixo do Saara e no Pacífico, as taxas de portador de HBsAg variam de 8% a 25% e as prevalências de anti-HBs de 60% a 85%. Assim a exposição ao HBV em áreas endêmicas, medida sorologicamente, pode aproximar-se de 100%. Em áreas do mundo com padrão intermediário de infecção pelo HBV (Europa oriental e central, Oriente Médio, subcontinente indiano e a Bacia Amazônica), a prevalência de positividade do HBsAg varia de 1% a 8%, evidências sorológicas de infecção passada é encontrada em 10-60% da população e o risco total de tornar-se de tornar-se infectado pelo HBV é esstimado em 20-60%. Nessas áreas, prevalecem os padrões mistos de transmissão no lactente, na infância e no adulto. Na maioria das regiões desenvolvidas do mundo, a prevalência da infecção crônica pelo HBV é menor que 1% e a taxa total de infecção é de 5-7%. No total, cerca de 45% da população global vive em áreas de alta prevalência de HBV crônico. Epidemiologia dos Sorotipos e Genótipos da Hepatite B O HBV apresenta uma substancial heterogeneidade genética. Quatro sorotipos da HBsAg chamados subtipos (adw, ayw, adr e ayr) do HBV foram definidos por dois pares de determinantes mutuamente exclusivos, d/y e w/r a um determinante comum a. Pela subdivisão dos quatro maiores subtipos no meio da década de 70, nove diferentes subtipos foram identificados. Eles mostram algumas distribuições geográficas distintas. O sequenciamento dos genomas virais tornou-se a ferramenta mais importante utilizada na virologia descritiva e os dados do sequenciamento são utilizados agora para reconstruir a história filogenética dos vírus e delimitar os subtipos genéticos. A análise genética permitiu-nos classificar o HBV em sete genótipos distintos (A-G) que possuem diferentes distribuições geográficas e associações com diferentes grupos de risco para infecção. O genótipo A é predominantemente encontrado no noroeste da Europa, América do Norte e África Central; os genótipos B e C são encontrados predominantemente na Ásia oriental e no sudeste asiático incluindo China e Japão; o genótipo D é encontrado principalmente na área do Mediterrâneo, o genótipo E é predominantemente na África ocidental e, o mais divergente, genótipo F é encontrado exclusivamente entre as populações indígenas na América Central e Sul. O genótipo G foi bem identificado em poucas amostras nos EUA e França. Os genótipos B, C e D são predominantes no mundo, com uma estimativa de 240 milhôes de pessoas infectadas com o genótipo B/C e 40 milhões infectados com o genótipo D. O genótipo A infecta aproximadamente 3 milhões e o genótipo E 20 milhões de pessoas. O significado clínico dos genótipos não foi inteiramente avaliado. Alguns dados recentes sugerem que essas associações entre certos genótipos e a soroconversão de HBeAg, as mutações virais, gravidade da doença hepática e a resposta ao tratamento podem existir. Estudos recentes da Ásia indicam que o genótipo B do HBV está associado com a soroconversão precoce de HBeAg mais do que o genótipo C, explicando assim a doença menos progressiva em pacientes com genótipo B. Transmissão do HBV O vírus é encontrado nas mais altas concentrações no sangue e nos exsudatos serosos. Exposições percutâneas ou de membranas mucosas ao HBV em sangue contaminado ou secreções corpóreas derivadas do soro são responsáveis por praticamente todas as infecções pelo HBV. Embora o HBsAg tenha sido identificado em uma grande variedade de fluidos corpóreos, somente o soro, o sêmen e a saliva mostrou-se contagioso, enquanto o leite materno e a urina permanecem www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Figura 1. Distribuição geográfica da infecção crônica pelo HBV Figura 2. Distribuição geográfica dos genótipos do HBV www.bjid.com.br 7 8 Sociedade Brasileira de Infectologia controversos. A presença de HBeAg no soro está relacionado com maiores títulos de HBV e maior contagiosidade. Contudo, as cepas de HBV que possuem mutações na região pré-core do genoma viral que previnem a expressão de HBeAg (variantes de HBeAg-negativo/anti-HBeAg-positivo) também se associaram com a transmissão. A infecção por fezes, urina, lágrimas, leite materno, bile ou suco pancreático não foi relatada, embora HBsAg ou as partículas do HBV tenham sido identificados em tais fluidos a possibilidade da transmissão por artrópodes que se alimentam de sangue tem sido discutido, mas nunca provado. Exposição Percutânea As exposições de percutâneas que resultaram na transmissão do HBV incluem a transfusão de sangue ou derivados de sangue, quipamento contaminado usado para injeções terapêuticas e outros cuidados de saúde relacionado procedimentos, uso de droga injetável. Além do mais, os casos esporádicos da hepatite B associaram-se com tatuagem e acupuntura. Como o HBV é estável em superfícies ambientais por mais de 7 dias, a inoculação indireta de HBV também pode ocorrer através de objetos inanimados. Nenhuma infecção foi demonstrada em pessoas suscetíveis expostas à saliva HBsAg-positiva, embora a transmissão a animais por inoculação subcutânea de saliva tenha sido demonstrada. A disseminação pessoa-a-pessoa pode ocorrer em situações que implicam contato interpessoal não-sexual por longos períodos, como entre contatos domiciliares de uma pessoa cronicamente infectada; os mecanismos exatos da transmissão são desconhecidos. Contudo, o freqüente o contato interpessoal de pele ou membranas mucosas nãointatas com secreções ou sangue, saliva é o veículo mais provável de transmissão. Por causa da concentração extremamente alta do vírus no sangue, o número de virions em montantes até muito pequenos de sangue ou fluidos corpóreos pode ser bastante alto. Além do mais, a contaminação de HBsAg de superfícies é comum em casas de pessoas cronicamente infeccionadas, e o HBV permanece contagioso por períodos de tempo longos em condições ambientes. Transmissão sexual A transmissão de HBV de pessoas com a hepatite aguda ou crônica B aos seus parceiros sexuais é uma fonte importante da infecção, 79 ‘102 e os adultos HBsAg-positivos que se ocupam na atividade sexual de alto risco estão no alto risco de transmitir HBV.118’ 119 Contudo, a maior parte de pessoas com HBV crônico em ¬ os fection não são conscientes que eles são infeccionados. Essas transportadoras silenciosas são a fonte mais provável da infecção para por ¬ filhos com múltiplos parceiros sexuais. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Nos países mais desenvolvidos, inclusive aqueles na Europa do norte e Ocidental, a maior parte (de 80-85 %) das infecções agudas da hepatite B ocorrem entre adultos jovens, que se ocupam no uso 120 de droga de injeção e atividade sexual desprotegido de alto risco. Transmissão Horizontal e Vertical O risco da transmissão horizontal e vertical do HBV foi bem descrito. Este risco é maior em recém-nascidos de mulheres HBeAg-positivas e varia de 70% a 90% aos 6 meses da idade. Aproximadamente 90% destas crianças permanecem cronicamente infectadas. O risco da infecção perinatal entre os recém-nascidos de mães HBeAg-negativas varia de 10% a 40%, com 40-70% desses recém-nascidos tornarem-se cronicamente infectados. Crianças nascidas de mães HBsAgpositivas que não se infectaram no período perinatal permanecem sob alto risco de infecção durante a infância. Epidemiologia da Hepatite D Dados coletados na década de 80 indicaram que menos que 5% dos portadores HBsAg no mundo estavam infectados pelo HDV. Como o número de portadores de HBV estimado na época era de 300 000 000, não menos que 15 000 000 de pessoas deveriam estar infectadas pelo HDV. A distribuição geográfica da infecção de HDV não acompanhou aquela do HBV, pois algumas áreas endêmicas para HBV quase que não tinham HDV. Atualmente, o HDV permanece endêmico em áreas tropicais e subtropicais. Nas décadas de 1970 e 1980, a infecção pelo HDV ocorreu esporadicamente na população geral de HBV no mundo ocidental, mas foi endêmica nas subpopulações de HBsAg que compartilhavam dos fatores de risco que predispunham à transmissão do viral. Três padrões epidemiológicos de infecção pelo HDV foram descritos: os padrões endêmico e epidêmico e os grupos de alto risco para aquisição do HDV (Figura 4): Padrão Endêmico A infecção pelo HDV era endêmica nas populações que vivem em torno do mar mediterranean até a década de 1990. A infecção tendia a ocorrer nos primeiros anos de vida, afetando principalmente crianças e adultos jovens. A via de transmissão principal era a propagação através da inoculação inaparente em pele e mucosa. A transmissão intrafamiliar era comum e provavelmente associada a hábitos higiênicos inadequados. Nas áreas que mantêm endemicidade, a disseminação de HDV é irregular na região. No Brasil, Kenya e China, bolsões de infecção foram identificados perto de áreas onde a prevalência de HDV era insignificante. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Figura 3. Fatores associados à infecção pelo vírus da hepatite B 1990-2000 (EUA) Figura 4. Distribuição geográfica da Infecção pelo HDV www.bjid.com.br 9 10 Sociedade Brasileira de Infectologia Em áreas endêmicas, o HDV é a causa principal de hepatite fulminante, especialmente em portador de HBsAg com doença hepática progressiva é infectado pelo HDV. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Impacto na Saúde Pública do Brasil Na America do Norte e norte da Europa, o HDV foi praticamente restrito a grupos de alto risco que compartilham dos mesmos fatores de risco predisponentes como ser portador de HBsAg e exposição parenteral aparente ou inaparente a sangue não fiscalizado ou condições de promiscuidade e superpopulação. Usuários de droga intravenosa que compartilham de agulhas foram considerados vítimas principais da infecção de HDV no mundo ocidental, com prevalência na década de 1980 de 17% a 98% e uma presença consistente do anti-HDV em indivíduos anti-HBs positivos. O impacto da Hepatite B crônica no Brasil ainda não se faz claro. O custo da triagem sorológica entre candidatos a doador de sangue no Brasil e na rotina diagnóstica do Sistema Único de Saúde (SUS) atingiu entre 2000 e 2005 a representativa quantia de R$ 356,5 milhões, ressaltando a relevância da adoção de um critério seletivo para usar os marcadores sorológicos diagnósticos. O diagnóstico por Biologia Molecular ainda não existe no SUS, razão pela qual seu impacto não pode ser avaliado. Porém, se considerarmos o parâmetro da Hepatite C, o impacto da Biologia Molecular per se não será tão representativo quanto a triagem sorológica. O problema gerencial e financeiro decorrerá da terapia dos casos diagnosticados. O valor unitário do Interferon convencional e da Lamivudina não é elevado, porém, o advento de novas terapias, mormente os antivirais, sem um tempo definido de tratamento, resultará em um impacto significativo. Uma análise farmacoeconômica poderá demonstrar se a incorporação dessas tecnologias será custo-efetiva. Um outro relevante aspecto está associado aos custos do transplante hepático e a prevenção da infecção maciça do enxerto. A cirrose por hepatite B é uma das principais indicações para o transplante de fígado, ocupando a segunda ou terceira colocação entre as principais indicações. Portanto, pelo todo, a melhor medida a se considerar é a ampliação do acesso à Vacina contra a hepatite B, hoje incluída no calendário vacinal básico, porém, ainda de abrangência modesta entre populações susceptíveis, como os jovens e adolescentes, que precisam ser priorizados nas políticas de prevenção. Epidemiologia Molecular do HDV Referências Bibliográficas A análise genética dos isolados de HDV em várias regiões do globo mostrou que existem, pelo menos, 3 genótipos filogeneticamente distintos agrupados em áreas geográficas diferentes. O mais disseminado geograficamente é o genotipo I, que foi identificado na América do Norte, Europa, Ásia oriental e ocidental e o Pacífico Sul e está associado com uma grande diversificação de manifestações crônicas. O genotipo II foi isolado somente no leste asiático, e pode ser responsável por algumas das formas mais leves da doença pelo HDV desta região. O genótipo III é encontrado exclusivamente no norte da Ámérica do Sul, onde a infecção pelo HDV ocorre em surtos epidêmicos entre os índios e exibe uma evolução particularmente grave. 1. Padrão Epidêmico A infecção pelo HDV ocorre em surtos epidêmicos em algumas populações ou indivíduos de alto risco. São descritas epidemias distintas entre os índios Yupca e Yanomanis na Venezuela; ambas associadas a uma taxa elevadaa de hepatite fulminante. Surtos em pequena escala de infecção pelo HDV foram relacionadas à transmissão nosocomial, tanto em pacientes fazendo haemodialysis como naqueles com câncer submetidos à quimioterapia. Grupos de Alto Risco 2. 3. 4. 5. 6. DiBisceglie A.M. Hepatitis D Virus. Epidemiology and Diagnosis in Viral Hepatitis, Zuckerman AJ, Thomas HC, Churchil Livingstone, Second Edition, 1998, p.371-8. Evans A.A., London W.T. Epidemiology of Hepatitis B in Viral Hepatitis, Zuckerman AJ, Thomas HC, Churchil Livingstone, Second Edition, 1998, p.107-14. Hoofnagle J.H. Hepatitis B – Preventable and now treatable. The New England J of Medicine 2006;354:1074-6. Keeffe E.B., Dieterich D.T., Han S.-H.B., et al. A treatment algorithm for the management of chronic hepatitis B virus infection in the United States: an update. 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O VHB causa doença hepática de graus de severidade que podem variar de pessoa para pessoa. Isto pode dever-se a fatores do hospedeiro, como a resposta inata, a humoral e a resposta celular [1], como também a fatores virais, como certos genótipos, mutações VHB e a carga viral do VHB [2]. Afirma-se que, em algumas situações, possa ocorrer lesão citopática direta causada pelo VHB [1], embora menos importante que a resposta imune. Na infecção pelo VHB, a resposta inata é induzida após a primeira semana de infecção e é mediada pelas próprias células infectadas que reconhecem a presença do vírus e respondem com a produção de interferon tipo I (INF-I) α/β que interfere na síntese viral por indução de diversas proteínas, como a Proteína Kinase e a 2’,5’-oligoadenilato sintetase [3,4]. Além disto, o INFα/β recruta e ativa macrófagos e estes secretam diversas citocinas como IL (interleucina) 12 e TNF (fator de necrose tumoral) α que por sua vez ativam células NK (natural Killer) [4]. Essas células também são ativadas após o reconhecimento do VHB pelo MHC-I (complexo de histocompatibilidade maior) e vão agir com destruição da célula infectada pelo VHB, diretamente ou mediada pela produção de TNFα e INFγ. As células de Kupffer são importantes na inibição da replicação do VHB através da produção de INFα/β, TNFα e INFγ, além do recrutamento de LT (linfócitos T) e células NK [5]. Os macrófagos e células dendríticas fagocitam as proteínas virais e as transportam aos linfonodos regionais para a resposta imune adaptativa, além disto, produzem diversas quimiocinas que recrutam antígenos adicionais e células inflamatórias como neutrófilos e LT ao fígado [1]. Estas células inflamatórias inespecíficas compõem a as alterações necro-inflamatórias do infiltrado intra-hepático que coincide com os sintomas e sinais da hepatite aguda e lesão hepática [1]. A resposta humoral contra o VHB aparece por volta da décima semana após a infecção e é fundamental para eliminação do VHB na fase aguda. Ela está associada a diferentes fases e evolução da infecção por este vírus. Os anticorpos contra o AgHBe nas fases iniciais da infecção são sinal de doença auto-limitada, associada a lesão hepática leve, normalização da atividade das aminotransferases e diminuição da carga viral do VHB [6]. Anticorpos contra as glicoproteínas da região S são neutralizados com aparecimento de anticorpos específicos anti-HBS produzidos por LT e estes estão associados a proteção contra novas infecções quando títulos maiores do que 10 UI/mL [1]. Na hepatite B oculta há perda dos antígenos e anticorpos circulantes antiHBs e/ ou antiHBe devido a mutações da região core ou pré-core do VHB e geralmente estes pacientes tem doença hepática mais severa, maiores níveis de aminotransferases e a carga viral mantémse alta [7,8]. A resposta celular contra o VHB é mediada por linfócitos T, que são responsáveis pela lesão hepática tanto na fase aguda como na fase crônica da doença [9]. O VHB fica quiescente até 4-7 semanas da infecção, quando inicia multiplicação vigorosa que geralmente é controlada por LT, tanto CD4+ como CD8+ específicos que podem ser detectados durante o aumento da replicação viral [10]. Estudos sugerem que os hepatócitos requerem altas doses de antígenos do VHB para induzir a produção de INFγ por LTCD8 ativados, já que na presença de pequenas quantidades de antígenos AgHBs ou AgHBe os hepatócitos preferencialmente estimulam a degranulação dos LTCD8+ e há pouca expansão clonal e pouca apoptose [11]. A diminuição da replicação viral é observada com o aumento proporcional das transaminases, que é indicativa de injúria hepática mediada por LT [4, 10]. Os LTCD4+ reconhecem peptídeos virais resultantes de fagocitose ou clivagem das proteínas virais apresentados por MHC-II [1]. Além disto, ativam a diferenciação dos linfócitos B, contribuem com a indução e manutenção dos LTCD8+ específicos [10] e permitem às células dendríticas ativar os LTCD8+ efetores. Os LTCD8+ específicos contra VHB reconhecem peptídeos apresentados por MHC-I derivados de metabolização de proteínas endógenas e induzem a apoptose dos hepatócitos infectados, o que é revelado na histologia como corpúsculos de Councilman [1]. A destruição de células infectadas pode não ser suficiente para eliminar o nucleocapsídeo VHB, que é susceptível a ação mediada por TNFα e INFγ [12]. Pesquisas têm evidenciado que os LTCD8+ específicos contra VHB são detectados no sangue periférico na infecção aguda antes dos sintomas e aumentam até que haja redução sérica do DNA-VHB, quando diminuem mantendo-se, porém, detectáveis após a eliminação viral [13]. A eliminação do VHB na infecção aguda está associada a uma resposta vigorosa, policlonal e multiespecífica dos LTCD4+ e CD8+ aos epítopos do VHB [1,9]. Na resposta aguda auto-limitada a maior parte dos virions do VHB são eliminados na fase de incubação sem a destruição de células do fígado www.bjid.com.br 12 Sociedade Brasileira de Infectologia devido a ação de citocinas antivirais TNFα e INFγ produzidas pela resposta inata e adaptativa por mecanismo não citolítico mediado por células não T [14]. Essa resposta pode ser detectada no sangue periférico nas primeiras semanas de infecção e precedida de altos níveis de ALT, clearence dos antígenos AgHBe e AgHBs e síntese de anticorpos neutralizantes. Isto é seguido por uma amplificação antígenoespecífica do infiltrado intra-hepático que coincide com os sintomas e sinais da hepatite aguda e lesão hepática [1]. Há desenvolvimento de anticorpos neutralizantes específicos contra AgHBs que eliminam os antígenos do VHB e produção de LT de memória específicos contra o VHB que controlam os vírus remanescentes ou antígenos residuais e podem ser importantes no controle da infecção a longo prazo [1,4,9]. Diversos trabalhos com chimpanzés demonstraram que as manifestações hepáticas da hepatite B aguda ocorrem quando os níveis de DNA-VHB tornam-se indetectáveis, ou seja, a lesão resulta da ação dos LTCD4+ e CD8+ bem como da indução das citocinas como TNFα e INFγ no fígado, evidenciando o caráter não citopático da doença [15]. Na resolução da hepatite B aguda há diminuição dos LTCD4+ e CD8+ específicos no sangue e no fígado [1,9]. Estudos in vitro demonstraram que com re-estimulação utilizando peptídeos específicos do VHB os LT se proliferam rapidamente e produzem citocinas. Este tipo de resposta com LTCD8+ específicos também acontece em pacientes cronicamente infectados que eliminam o vírus espontaneamente ou com tratamento [1]. Na fase crônica do VHB, alguns pacientes conseguem eliminação tardia devido a produção de grandes quantidades de citocinas e LTCD8+ específicos que diminuem a carga viral do VHB[1].A persistência do VHB pode estimular continuamente os LT específicos que por sua vez, previnem re-infecções, mas a recuperação e proteção contra re-infecções não estão necessariamente associadas a imunidade perene [1]. Não se sabe exatamente em quais órgãos o VHB persiste, mas o vírus já foi detectado em ductos biliares, pâncreas, rins, pele, cérebro, tecido endócrino e linfonodos. A reativação do VHB ou a transmissão em indivíduos com anti-HBS positivos pode ocorrer em casos de imunossupressão como em transplantes devido à presença de mutações ou a persistência do cccDNA no núcleo dos hepatócitos. O cccDNA pode sobreviver a mitose do hepatócito, mas é perdido após 2,6 turnover do fígado [16]. Diversas citocinas interferem na replicação do VHB. O INFα/β está relacionado à eliminação do nucleocapsídeo do VHB e a clivagem de proteínas virais, com desestabilização e degradação do RNA-VHB [17]. Já o INFδ e TNFα inibem a replicação citoplasmática do VHB e podem remover o cccDNA do núcleo de células infectadas em experimentos com ratos [18]. Os pacientes cronicamente infectados que adquirem VHB na idade adulta geralmente apresentam um defeito na resposta específica dos LT [19]. Diversos mecanismos têm sido BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) propostos para explicar a disfunção dos LT, como a tolerância imunológica do fígado, a exaustão dos LT devido a altos níveis de antígenos AgHBs e AgHBe [12] e a supressão da resposta pelos LT regulatórios [2]. Uma deficiente resposta T aos antígenos do VHB poderia reduzir sua apresentação e favorecer ao escape de reconhecimento do LT efetor. É possível que insuficientes LTCD8+ ativados não sejam capazes de eliminar a infecção através da produção adequada de citocinas, já que diversos trabalhos mostram que os pacientes cronicamente infectados têm uma resposta T citotóxica menor dos que os pacientes que eliminam o VHB, além disto o TNFα e INFγ intra-celulares são produzidas em maiores quantidades em pacientes que eliminaram o VHB [20].Apesar da diminuição ou perda da resposta T específica ao VHB no sangue periférico de indivíduos cronicamente infectados, clones de LT específicos contra VHB tem sido isolados em biópsias hepáticas. Há maior proporção de LTCD8+ no infiltrado intra-hepático de pacientes com menores níveis séricos de ALT e DNA-VHB do que em pacientes com altos níveis de ALT e B-DNA [21]. O recrutamento de LT específicos e inespecíficos pelo fígado está associado a lesão hepática necro-inflamatória e a progressão da doença crônica [1]. O tipo de inóculo e a cinética de replicação do VHB podem induzir a uma grande resposta imune caso o VHB infecte rapidamente a maioria dos hepatócitos, mas a infecção de sítios extra-hepáticos pode não ser acessível aos LT específicos contra o VHB. O escape viral e o aparecimento de mutações também dificultam o reconhecimento dos epítopos do VHB. A alta incidência de cronificação na transmissão vertical do VHB pode decorrer de uma imaturidade do sistema imune do recém nascido determinando diminuição da ação dos LT, com menor secreção de TNFα e INFγ no fígado [22], com uma fase de imunotolerância que pode se prolongar por décadas permitindo altos níveis de DNA-VHB, agHBe e transaminases normais. Efeitos imunomodulatórios do AgHBe podem interferir neste processo, pois este antígeno é rapidamente secretado no sangue e é tolerado por LT em ratos trangênicos [23]. Por razões ainda controversas, inicia-se uma resposta celular que levará a doença hepática mais severa com maior progressão para cirrose, mesmo com diminuição dos níveis de DNA-VHB [4]. Patogenia da Hepatite Delta A hepatite D é causada por um vírus pequeno e defeituoso, o vírus da hepatite D (VHD), que tem um genoma de RNA, um antígeno codificado para o VHD (AgHD) e um envoltório de lipoproteína fornecido pelo VHB, o AgHBs [24]. O genoma do VHD é circular, de fita única, de tamanho de 36 a 43 nm, com até 39% de heterogeneidade de sequências, sendo indentificados inicialmente 3 genótipos, tipos I, II e III [25] e mais recentemente 7, sendo que uns parecem ser mais www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) patogênicos que outros [26]. A replicação do VHD é limitada aos hepatócitos e depende da presença do vírus da hepatite B (VHB) que fornece o envoltório de lipoproteína de seu antígeno de superfície [27]. A patogenia do VHD é complexa e variável, pois depende de sua patogenicidade, da interação entre o VHD e o VHB e da resposta imune do hospedeiro contra ambos os vírus [27,28]. Muito do que se conhece sobre este patógeno deriva de estudos in vitro usando cultura de células ou estudos experimentais em chimpanzés e em marmotas (woodchuck), animais capazes de reproduzir a replicação do VHD e do VHB [29,30]. O receptor do VHD nas células do hospedeiro ainda é desconhecido, mas sabe-se que a região amino-terminal da proteína L do envelope do VHB participa da entrada do VHD na célula hospedeira [30,31]. Após a entrada do VHD nos hepatócitos, seu RNA é transcrito em RNA complementar e forma-se AgHD dentro do núcleo. Há duas isoformas do AgHD, a pequena (S-AgHD) e a grande (L-AgHD) [32]. A SAgHD participa da replicação do VHD-RNA enquanto que grandes quantidades de L-AgHD suprimem a replicação viral, além de direcionar os aminoácidos do vírion a interagirem com os aminoácidos da proteína S do VHB [32]. Na ausência do VHB a replicação pelo VHD não se completa e, sem envoltório, o vírion não pode ser liberado da célula. Neste caso, a infecção pode ser eliminada ou manter-se de forma inativa (infecção latente). Durante esta fase não há evidência de hepatopatia e o VHD não pode ser detectado. O VHD pode causar diretamente lesão hepática durante a infecção aguda [33], enquanto que na lesão crônica a lesão predominante é imunomediada [28]. O encontro de autoanticorpos anti-microssomais contra o citoplasma dos hepatócitos e a presença de infiltrado inflamatório lobular em hepatite crônica pelo VHD sugerem que a resposta imune ao VHD contribua para a destruição dos hepatócitos e pior evolução da doença [24,27].Teoricamente como o VHD é RNA, a citopatogenicidade teria características semelhantes a esses vírus. A apoptose parece ser um dos responsáveis pela citopatotoxicidade deste vírus após estímulo in vitro [34]. O genótipo do VHB e o nível de replicação do mesmo também influenciam na expressão da doença hepática causada pelo VHD. Todos os genótipos do VHD podem ter manifestações fulminantes na fase aguda, sendo que o II é que menos frequentemente causa este quadro. O genótipo III foi relacionado doença hepática mais severa na América do Sul [2]. A associação entre o genótipo III do VHD e o genótipo F do VHB foi relacionada a formas mais graves de hepatite na região da Amazônia Peruana [35]. Quando há infecção simultânea por VHD e VHB (coinfecção) a hepatite aguda geralmente é auto-limitada devido a alta taxa de eliminação natural do VHB pela resposta humoral eficiente contra o VHB [10]; exceto em casos de UDI, onde têm sido relatadas altas taxas de hepatite fulminante. Já a resposta humoral contra o VHD é ineficiente e a presença de anticorpos 13 contra o VHD não lhe conferem imunidade. No início da infecção, o VHD se replica rapidamente, mas na infecção crônica, os novos vírus morrem antes de adequada produção do agHD e as lesões tendem a ser menos intensas. Na superinfecção aguda pelo VHD em portador crônico do VHB a lesão hepática costuma ser mais severa levando a maior risco de evoluir para hepatite fulminante do que a co-infecção VHB-VHD [27,33]. A evolução para a cronicidade ocorre em até 70% dos casos de superinfecção [27]. Há alta viremia de VHD no início da infecção aguda e sua manifestação dependerá do estágio de replicação do VHB. Quando a infecção do VHD ocorre em indivíduo com ausência de replicação do VHB (agHBE e VHB-DNA negativos) geralmente a superinfecção pelo VHD tem evolução lenta para a cronicidade [36]. Por outro laldo, quando o VHB está em replicação, há maior chance de que a superinfeção seja mais grave com possibilidade de desenvolver forma fulminante [36]. Na maior parte dos casos de superinfecção pelo VHD este suprime a replicação do VHB e a lesão hepática é essencialmente causada pelo VHD [27,36]. A erradicação do VHB com o desenvolvimento de antiHBs protege os indivíduos contra a re-infecção pelos VHB e VHD, mas a erradicação do VHD com a persistência do agHBs mantém o risco de re-infecção pelo VHD. Referências Bibliográficas 1. Rehermann B. Immune Responses in Hepatitis B Virus Infection. Semin Liver Dis 2003;23(1):21-37. 2. Bertoletti A. Immune response and viral tolerance during chronic HBV infection. Abstracts of the 12th International Symposium on Viral Hepatitis and Liver Disease. 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História natural da infecção pelo VHB R es oluç ão Infec ç ão ag ud a E s ta biliza çã o In fec çã o crônic a Ó bito C irros e com pe ns ad a C irros e P rog re ss ão CHC Ó bito C irros e d es co mp en sad a 3 0-5 0 a nos Infecção Aguda pelo VHB O período de incubação da hepatite B aguda varia de 50 a 180 dias, com duração média de 75 dias e caracteriza-se pela presença do antígeno de superfície do VHB (HBsAg) e ausência de sintomas. O surgimento de sintomas inespecíficos como anorexia, náusea, vômitos, fraqueza, intolerância alimentar, artralgia, desconforto abdominal e febre caracterizam o período pré-ictérico. No momento em que surgem estes sintomas inespecíficos ocorre elevação das transaminases e os anticorpos anti-HBcAg das classes IgM e IgG estão presentes no soro. O surgimento de icterícia, hipocolia fecal e colúria caracterizam o período ictérico que se segue à fase pré-ictérica. Mas somente 20% dos pacientes com infecção aguda desenvolvem icterícia clinicamente reconhecida. Na fase ictérica as transaminases estão muito elevadas no soro, geralmente maiores que 1.000 UI/L, demonstrando intensa lesão hepatocítica. O período ictérico pode prolonga-se por aproximadamente 20 dias e após este período o paciente entra na fase de convalescença com melhora progressiva da sintomatologia por um período de 20 a 30 dias. No início da doença aguda os marcadores de replicação viral, HBeAg e VHB-DNA, são encontrados em altas concentrações. O anti-HBc IgM também se apresenta com títulos elevados neste momento. A partir da resposta imunológica do hospedeiro ocorre progressivo decréscimo da replicação viral e redução nestes títulos. Indivíduos com resposta imunológica suficiente para eliminação do VHB controlam a replicação viral, caracterizada pela eliminação do HBeAg e aparecimento do anti-HBeAg, em geral, até o 3º mês de doença. Cessando a replicação viral ocorrerá o desaparecimento do HBsAg e, após um tempo variável, surge o anti-HBsAg, anticorpo neutralizante e indicativo de cura da infecção. A ausência da soroconversão de HBeAg para antiHBeAg até o 3° mês da doença aguda pode indicar falha do sistema imunológico em controlar a infecção. Adultos com infecção aguda pelo VHB desenvolvem doença auto limitada com resolução do quadro em até 6 meses. No entanto, uma minoria (1%) evolui para hepatite fulminante em decorrência da lise maciça, imuno-mediada, dos hepatócitos infectados. Hepatite fulminante é definida como desenvolvimento de encefalopatia e coagulopatia até 8 semanas após o início dos sintomas e apresenta altas taxas de letalidade. A probabilidade de um indivíduo com infecção aguda pelo VHB tornar-se cronicamente infectado depende da idade na qual o indivíduo adquire a infecção. Entre aqueles infectados na idade adulta, 5% dos imunocompetentes e 20% daqueles com infecção pelo HIV, tornam-se portadores crônicos do VHB. Entre os recém-nascidos com infecção perinatal e crianças infectadas durantes os primeiros anos de vida, 90% e 20-50%, respectivamente, falham em produzir uma resposta imunológica eficiente para eliminar o VHB durante a infecção aguda e evoluem para cronicidade [1]. Infecção Crônica pelo VHB O início da infecção crônica é caracterizado pela persistência do HBsAg por um período maior ou igual a 6 meses, altos níveis de VHB-DNA e a presença do HBeAg no soro (Webster). A hepatite B crônica é uma doença dinâmica, caracterizada pela interação entre o VHB e o sistema imunológico do hospedeiro. O paciente com infecção crônica pelo VHB pode transitar entre doença ativa e inativa, dependendo da interação “vírus e hospedeiro”. Quando a resposta imune é suficiente para controlar a replicação viral a doença estabiliza (fase não replicativa) e o indivíduo torna-se um portador inativo do VHB. Por outro lado quando a resposta www.bjid.com.br 16 Sociedade Brasileira de Infectologia imune não é suficiente para controlar a replicação viral a doença progride com atividade inflamatória e fibrose hepática. Dentre os indivíduos com infecção crônica aproximadamente 70% evoluem para estabilização da infecção, 30% apresentam progressão da doença com evolução para cirrose e deste um quarto desenvolve descompensação hepática em 5anos e 5 - 10% desenvolvem carcinoma hepatocelular (CHC) [2]. Hepatite B Crônica em Pacientes Infectados no Período Perinatal A história natural de hepatite B crônica em crianças geralmente é silenciosa e indolente. O curso da infecção crônica pelo VHB adquirida no período perinatal pode ser dividido em três fases (Figura 2). Figura 2. Curso da hepatite B crônica adquirida no período perinatal HBV DN A ALT Serica HBeAg Fase de Im unotolerâ ncia Anti - HBe Fase Im uno elim inação Fase Não Replicativa BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) CD4 reagem contra os antígenos virais, estimulando a lise dos hepatócitos que expressam esses antígenos. Isto promove dano hepático progressivo e aumento nos níveis de aminotransferases. Nesta fase o desenvolvimento da resposta imune pode controlar a infecção ou provocar inflamação hepática prolongada, fibrose e cirrose. Se a resposta imune contra o VHB for suficiente para controlar o vírus há aumento da inflamação hepática associada a soroconversão AgHBe / anti-HbeAg (definida como perda do HBeAg e presença do anticorpo Anti-HBeAg), declínio progressivo da replicação viral (DNA-VHB < 10 5 cópias / mL) e normalização dos níveis de ALT. Por outro lado, se não ocorrer a soroconversão HBeAg / anti-HBeAg, a lise de hepatócitos persiste com intermitente ou continua elevação de ALT e progressão da hepatite. Caracterizada por períodos prolongados de inflamação hepática, progressão da fibrose e desenvolvimento de cirrose. A transição para a fase não replicativa pode ser rápida ou prolongada, inclusive podendo ocorrer exacerbações recorrentes dos sintomas da hepatite aguda. 3) Fase não replicativa. Caso durante a fase de imunoeliminação ocorra o controle da replicação viral, o paciente entra na fase não replicativa. Neste período há baixo nível de vírus circulante, HBeAg indetectável e HBsAg detectável, transaminases normais e ausência de inflamação hepática. A fase nãoreplicativa pode persistir por anos, no entanto, pode ocorrer recorrência da hepatite devida à presença de mutantes da região pré-core do VHB. Nesse casos, ocorre aumento dos níveis de DNA-VHB no soro (usualmente > 10 4 cópias / mL), atividade necro-inflamatória, aumento no nível de transaminases séricas, HBeAg indetectável e Anti-HBeAg presente. Hepatite B em Pacientes Infectados na Idade Adulta 1) Fase de imunotolerância. Corresponde a fase inicial da infecção crônica e pode perdurar por 15 a 35 anos. Caracterizase por altos níveis de replicação do VHB, sem doença hepática ativa. Durante esta fase, HBsAg e HBeAg são encontrados em altas concentrações no soro e DNA-VHB > 109 cópias / mL. A lesão hepatocelular na hepatite B crônica é produzida pela atividade do sistema imunológico, pois o VHB não é diretamente citopático. Como nesta fase o sistema imune é tolerante ao VHB, a despeito da alta replicação viral, não há inflamação hepática e os níveis de transaminases são normais. Não está completamente elucidado porque o sistema imune do hospedeiro não reconhece ou não responde à presença do vírus, mas, provavelmente, isso ocorre pela passagem transplacentária do HBeAg da mãe para o feto, durante a gestação. O curso crônico da infecção adquirida na idade adulta pode ser dividido em duas fases (Figura 3). Figura 3. Curso da hepatite B crônica adquirida na fase adulta HBV DNA ALT Serica HBeAg Fase Replicativa 2) Fase de imunoeliminação. Após a fase de imunotolerância segue-se a fase de imuoeliminação. Durante esta período o sistema imunológico reconhece a presença do VHB e células www.bjid.com.br Anti - HBe Fase Não Replicativa BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 1) Fase de imunoeliminação. Corresponde à fase inicial da infecção crônica com alta replicação viral, necro-inflamação e fibrose hepática, podendo evoluir para cirrose hepática. Cursa com a presença do HBeAg no soro, níveis elevados de VHBDNA (> 100.000 cópias/mL), ALT também elevada e progressão da doença. Nesta fase pode ocorrer a soroconversão HBeAg / anti-HBeAg, a qual é precedida por uma queda acentuada nos níveis séricos de DNA do VHB (de 107 – 1010 para menos de 105 cópias de genoma /mL), redução dos níveis séricos de ALT para níveis normais e persistência do HBsAg. Estima-se que 5-15% dos pacientes com infecção crônica pelo VHB soroconvertem espontaneamente para anti-HBeAg a cada ano [3]. A soroconversão usualmente representa a transição da fase replicativa para a fase não replicativa (“estado de portador inativo HBsAg”). Alguns fatores como idade, gênero, nível sérico de ALT e genótipo do VHB influenciam a probabilidade de soroconversão HBeAg / anti-HBeAg. Em um estudo em nativos do Alasca com hepatite B, a taxa de soroconversão entre indivíduos com 0 a 18 anos de idade foi 33%, naqueles entre 19 e 30 anos, 52% e naqueles entre 31 e 78 anos, 76% [4]. Liaw [5] demonstrou que 50% dos pacientes com eleveção do nível de ALT > 5 vezes o valor normal soroconverteram, no entanto somente 10% daqueles com nível de ALT < 5 vezes o valor normal apresentam esta evolução. Soroconversão HBeAg / anti-HBeAg também é mais freqüente em mulheres e naqueles com infecção pelo VHB genótipo C. Nesta fase também pode ocorrer soroconversão HBsAg / Anti-HBsAg, mas é raro (< 1% por ano). 2) Fase não replicativa. Caso ocorra parada da replicação viral, o paciente entra na fase não replicativa e apresentará evolução mais favorável mesmo apresentando fibrose avançada. Esta fase é caracterizada pela ausência de HBeAg no soro e presença de anti-HBeAg, baixos níveis (< 104 cópias /mL) ou níveis indetectáveis de VHB-DNA e ALT persistentemente normal. Nesta fase a doença hepática geralmente não progride e o desenvolvimento de carcinoma hepatocelular raramente ocorre [6]. Esta fase caracteriza o portador inativo do VHB e pode persistir ao longo de toda a vida, porém 10% a 20% dos pacientes podem evoluir com reversão para o estado de HBeAg positivo e outros 20 a 25% dos pacientes evoluem com reativação da replicação viral, pela seleção de mutantes da região pré-core do VHB, freqüentemente acompanhado por elevações de ALT e reativação da inflamação hepática, caracterizando a hepatite B crônica HBeAg negativo [4]. A infecção crônica pelo VHB pode se classificada em duas categorias, dependendo do status do antígeno e: doença HBeAg-positiva (VHB tipo-selvagem) e doença HBeAgnegativa (VHB mutante da região pré-core). As duas categorias podem levar a cirrose e insuficiência hepática. 17 Hepatite B crônica HBeAg-positivo caracteriza-se por altos níveis de DNA-VHB sérico (105 – 107 cópias/mL) e níveis aumentados de transaminases. Se não tratados a maioria dos pacientes nesta categoria mantém altos níveis de replicação do VHB e necroinflamação hepática a qual é associada com o desenvolvimento de fibrose, progressão para cirrose e risco aumentado de CHC. Doença HBeAg-negativa caracteriza-se por persistente replicação do VHB (104 – 105 cópias/mL) mas em níveis inferiores àqueles da doença HBeAg-positiva, níveis flutuantes de ALT, progressiva necroinflamção e fibrose, ausência do HBeAg e presença do anti-HBeAg. A replicação viral é mantida por variantes do VHB, decorrentes de mutações nas regiões precore ou core promoter do genoma do vírus, que impedem ou reduzem a produção do AgHBe. Estas mutações podem ocorrer espontaneamente na fase de imunoeliminação da infecção crônica pelo VHB ou em decorrência da reativação da replicação viral. Remissão espontânea da doença HBeAg negativa é rara. Esta população de pacientes precisa ser distinguida daqueles indivíduos em um verdadeiro estado de portados inativo HBsAg, nos quais os pacientes soroconvertem espontaneamente de HBeAg para anti-HBeAg sem emergência da forma mutante do VHB. Hepatite B e “Flare” O chamado “flare” na infecção crônica pelo VHB é uma exacerbação aguda da hepatite crônica caracterizada por grande elevação no nível de ALT sérica, em geral superior a 10 vezes o valor da normalidade, em conseqüência da lise imunemediada dos hepatócitos infectados. É precedida por elevação do nível circulante de DNA VHB com sucessiva queda destes níveis. Pode ocorrer precedendo a soroconversão HBeAg / anti-HBeAg e, também, em resposta à re-emergência da replicação viral. O “flare” pode ser assintomático e diagnosticado somente durante o seguimento de rotina. Embora alguns possam ser acompanhados por sintomas de hepatite aguda e reaparecimento do anti-HBc IgM, o que pode levar a um diagnóstico equivocado de hepatite B aguda em pacientes sem diagnóstico prévio de infecção crônica pelo VHB. As conseqüências desse quadro de exacerbação aguda podem resultar em soroconversão HBeAg / anti-HBeAg, mas também podem ocorrer múltiplos episódios de “flare” com progressão acelerada da hepatite e risco aumentado de desenvolvimento de cirrose. Em pacientes com fibrose hepática avançada, este quadro de exacerbação aguda pode levar a descompensação hepática e óbito por necrose maciça. Hepatite B e Cirrose A incidência anual de cirrose em pacientes com infecção crônica pelo VHB varia de 2 a 6%. Alguns www.bjid.com.br 18 Sociedade Brasileira de Infectologia fatores, incluindo idade avançada, replicação viral persistente e longos períodos de necroinflamação hepática, influenciam a taxa de progressão para cirrose [4]. A média de idade dos pacientes com diagnóstico de cirrose em estágio inicial é aproximadamente 40 anos. Chen e colaboradores demonstraram um risco aumentado de cirrose em indivíduos com DNA VHB ≥ 10 4 cópias / mL [7]. Pacientes com episódios recorrentes de “flare” também podem apresentar taxa de progressão mais acentuada para cirrose. A taxa de sobrevida, em cinco anos, para pacientes com cirrose hepática compensada varia de 80 a 85%, já entre pacientes com cirrose descompensada, essa taxa é aproximadamente 14% [8]. Hepatite B e Carcinoma Hepatocelular (CHC) CHC ocorre aproximadamente 30 a 50 anos após infecção pelo VHB. A incidência anual de CHC, entre pacientes com infecção pelo VHB e ausência de cirrose, é aproximadamente 0,5%, já naqueles com cirrose varia entre 2 e 6% [9]. Fatores de risco para desenvolvimento de CHC em pacientes com hepatite B crônica incluem: história familiar de CHC, infecção na infância pelo VHB, presença de cirrose (embora CHC possa ocorrer na ausência de cirrose), consumo crônico de álcool e sexo masculino.A presença do HBeAg e HBV DNA é associada com aumento do risco para CHC. Yang [10] demonstrou que pacientes com alta carga viral do VHB (> 106 cópias /mL) possuíam um risco 12 vezes superior para desenvolver CHC quando comparado com aqueles com níveis baixos de VHB DNA (< 300 cópias / mL), indicando a importância da replicação viral em determinar o desenvolvimento de CHC. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Referências Bibliográficas 1. Lee W. Hepatitis B vírus infection. N Engl Med 1997; 337:17331745. 2. Fattovich G., Giustina G., Schalm S.W., et al, for the EUROHEP Study Group on Hepatitis B Virus and Cirrhosis. Occurrence of hepatocellular carcinoma and decompensation in western European patients with cirrhosis type B. 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Program and abstracts of the 40th Annual Meeting of the European Association for the Study of the Liver; April 13-17, 2005; Paris, France. Abstract 35. 8. de Jongh F.E., Janssen H.L., de Man R.A., et al. Survival and prognostic indicators in hepatitis B surface antigen-positive cirrhosis of the live. Gastroenterology 1992;103:1630-5. 9. Fattovich F., Stroffolini T., Zagni I. Hepatocellular carcinoma in cirrhosis: incidence and risk factors. Gastroenterology 2004;127 (5, Supp 1): S35-S50. 10. Yang H.I., Lu S.N., Liaw Y.F., et al. Hepatitis B e antigen and the risk of hepatocellular carcinoma. N Engl J Med 2002;347:168-74. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 19 Marcadores Sorológicos da Hepatite B e sua Interpretação Neiva S. L. Gonçales1, Norma de Paula Cavalheiro2 Grupo de Estudos das Hepatites, Disciplina de Moléstias Infecciosas, Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Ciências Médicas-UNICAMP;2Laboratório de Hepatites, LIM 47 Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias, HC/FMUSP 1 Durante o curso da infecção pelo vírus da hepatite B (VHB), os antígenos virais induzem uma resposta imune específica. Para uma melhor compreensão dos marcadores sorológicos que se desenvolvem durante a infecção é necessário considerar a própria estrutura do vírus (Quadro 1). O VHB é um vírus hepatotrópico da família Hepadnavirus, de aproximadamente 42 nm de diâmetro, com um nucleocapsídeo icosaédrico (27 nm) que contém o antígeno do core da hepatite B (HBcAg), envolto por um envelope viral composto de proteínas, lipídeos e carboidratos. Exposto sobre a superfície do envelope está um mosaico de glicoproteínas conhecido coletivamente como HBsAg (antígeno de superfície do VHB). No interior do core está o genoma viral que é composto por uma fita dupla de DNA circular incompleta codificada por uma DNA polimerase. Um antígeno viral adicional, embora não seja um componente estrutural, aparece no soro durante o curso da infecção pelo VHB e é conhecido como antígeno e (HBeAg). O gene do core (C) no genoma viral é subdividido em duas regiões; a região C que codifica o antígeno c e a região do pré C que codifica o antígeno e. Assim, os antígenos e e c contém praticamente os mesmos aminoácidos, porém um acréscimo de 29 aminoácidos na porção terminal da proteína codificada pela região pré C (antígeno e) resulta em moléculas com estrutura e antigenicidade diferentes. A proteína do antígeno c (core) forma monômeros que resultam no nucleocapsídeo, não permitindo sua circulação no soro, enquanto que a proteína do antígeno e é solúvel e secretada pelos hepatócitos infectados. A resposta imune em portadores do VHB imunocompetentes, cedo ou tarde, leva à produção dos correspondentes anticorpos contra os antígenos virais que são: anti-HBc, anti-HBe e o anti-HBs. Todos os antígenos e anticorpos podem ser identificados e utilizados no diagnóstico, durante o curso da infecção pelo VHB. A identificação dos constituintes do VHB, nas diferentes fases evolutivas da infecção, pode ser realizada por testes sorológicos (pesquisa de antígenos e anticorpos) e moleculares (pesquisa qualitativa e quantitativa do DNAVHB). Além disto, pode ser realizada a pesquisa dos antígenos HBsAg e HBcAg no tecido hepático (marcadores virais teciduais) pela imunohistoquímica. Os testes mais utilizados no diagnóstico sorológico são os ensaios imunoenzimáticos (EIA). Estes ensaios são baseados na imobilização do antígeno ou anticorpo em um suporte sólido, geralmente no fundo de microplacas. Um antígeno ou anticorpo complementar, presente na amostra a ser testada é adicionado por simples aplicação, então este complexo antígeno-anticorpo é detectado por um outro antígeno ou anticorpo marcado com enzima. Esta enzima acoplada ao antígeno ou anticorpo é capaz de catalisar a reação, quando o substrato é adicionado, produzindo uma reação de oxidação que gera uma cor. Esta reação colorimétrica é medida e pode gerar resultados quantitativos ou qualitativos (reagente ou não reagente). O período de incubação (PI) do VHB varia de 50 a 180 dias. Um resultado confirmando a presença do HBsAg indica, na maioria das vezes, uma infecção pelo VHB. Na prática, todos os indivíduos HBsAg positivos devem ser considerados infectantes. Em indivíduos recentemente infectados, o HBsAg é o único marcador sorológico detectável durante as primeiras 3 a 5 semanas após a exposição, persistindo por um período variável. O tempo médio para a detecção do HBsAg, após a exposição, é de 30 dias. Entre 2 a 6 semanas antes do aparecimento da icterícia, o HBsAg e o HBeAg podem ser detectados, no soro, indicando a presença do VHB replicante e infectante. O HBeAg é, portanto, um marcador de replicação e infectividade do VHB e sua presença, usualmente, se associa à positividade do DNA do VHB, no soro, com alto risco de transmissão da infecção. Testes de detecção do ácido nucléico, com altíssima sensibilidade, podem detectar o DNA do VHB no soro de uma pessoa infectada, 10 a 20 dias antes da detecção do HBsAg. Positividade transitória do HBsAg pode ser observada, 18 dias após vacinação contra a hepatite B, sem nenhum significado clínico. O HBcAg é um antígeno intracelular, insolúvel, que não pode ser detectado no soro. O anti-HBc IgM aparece no início dos sintomas, até 30 dias após o aparecimento do HBsAg, ou durante o período que os testes bioquímicos hepáticos ficam alterados, na infecção aguda. A fração IGM do anti-HBc pode estar elevada, de maneira intermitente, em parte dos pacientes com hepatite pelo vírus B crônica, HBeAg positiva, durante os períodos de reativação da doença. Em adição, resultados falso-positivos para o antiHBc IgM, podem ocorrer. Porque o valor preditivo positivo é baixo em indivíduos assintomáticos, para o diagnóstico de HVB aguda, o teste do anti-HBc IgM só deve ser considerado em indivíduos com evidências clínicas de HVB aguda ou em casos que tenham ligações epidemiológicas. O anti-HBc total geralmente persiste por toda a vida do indivíduo infectado pelo VHB. O anti-HBc total é considerado um marcador de infecção pregressa do VHB. www.bjid.com.br 20 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Quadro 1. Principais padrões sorológicos encontrados na infecção pelo VHB HBsAg HBeAg Anti-HBc IgM (+) (+) (+) (+) (-) (+) Anti-HBc Total Anti-HBe Anti-HBs Interpretação (+) (-) (-) (+) (+) (+) (-) (+) (-) (+) (-) (-) HBV crônica (Ag e +) (+) (-) (-) (+) (+) (-) HBV crônica (Ag e -) (-) (-) (-) (+) (+)/(-) (-) Janela Imunológica (-) (-) (+) (+) (+)/(-) (-) (-) (-) (-) (+) (+) (+) HBV pregressa imune (-) (-) (-) (-) (-) (+) Vacinação Prévia (-) (-) (-) (+) (-) (-) HVB aguda (Fase Inicial) HBV aguda (Fase Tardia) HBV aguda (baixa antigenemia) HBV pregressa ou Reação cruzada Figura 1. Infecção Aguda pelo VHB com curso sorológico típico de recuperação Sintomas anti-HBe HBeAg Título anti-HBc Total HBsAg 0 4 anti-HBs IgM anti-HBc 8 12 Source: US CDC and Prevention 16 20 24 28 32 36 Semanas de exposição www.bjid.com.br 52 100 BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 21 Figura 2. Curso sorológico típico da progressão da infecção crônica pelo VHB Aguda (6 meses) Crônica (anos) anti-HBe HBeAg HBsAg anti-HBc Total Título IgM anti-HBc 0 4 8 12 16 20 24 28 32 36 52 Anos Semanas de exposição Source: US CDC and Prevention A presença do HBeAg (positivo) indica replicação ativa do VHB. Entretanto a sua ausência não pode ser assumida como ausência de replicação viral, porque em pacientes com mutação do pré-core ou do core promoter o HBeAg não é detectável. O aparecimento do anti-HBe geralmente evidencia que o indivíduo está caminhando para recuperação, pois, é considerado indicativo de diminuição de replicação viral com conseqüente queda na infectividade (exceto em mutante pré-core e core promoter). Em indivíduos que se recuperam da infecção pelo VHB, o HBsAg é eliminado do sangue, habitualmente dentro de 3 a 4 meses, aumentando progressivamente a concentração do antiHBs no soro. A presença do anti-HBs indica, na maioria das vezes, imunidade à infecção pelo VHB (exceto em mutações da região S). Infecção ou imunização com um genótipo do VHB confere imunidade à todos os outros genótipos. Em outras ocasiões, o anti-HBs pode ser detectado vários meses após a administração de imunoglobulina hiperimune (HBIG). A maioria dos indivíduos que se recuperam de uma infecção natural apresentam positividade para o anti-HBc e anti-HBs, enquanto que pessoas imunizadas por vacina contra o VHB, só apresentarão o anti-HBs positivo (Figura 1). Nos indivíduos com infecção crônica pelo VHB, o HBsAg e o anti-HBc persistem positivos, habitualmente, por toda a vida. Em 0,5 a 2% dos pacientes com infecção crônica, o HBsAg irá se tornar indetectável, ao longo da evolução da doença, e o anti-HBs será positivo na maioria destes casos. Existe um período chamado janela imunológica onde não se detecta o HBsAg no soro e, também, ainda não está presente o anti-HBs. Neste período, o diagnóstico de infecção pelo VHB é evidenciado pela pesquisa do anti-HBc. O anti-HBc isolado pode ocorrer após a infecção aguda pelo VHB entre pessoas que se recuperaram, mas nas quais a concentração do anti-HBs é ainda muito baixa ou quando ainda o mesmo não foi sintetizado. Também, aqui, ficam incluídos os casos onde o nível de HBsAg circulante é muito baixo (menor que 10 8 partículas/mL), não podendo ser detectado por nenhum ensaio sorológico comercial. O perfil sorológico será de anti-HBc isoladamente positivo. Estes indivíduos não eram são considerados infectantes, mas podem ser fontes diretas para contaminação percutânea de receptores susceptíveis as baixas quantidades de vírus (transfusão de sangue, transplante de órgãos). O DNA do VHB pode ser detectado no sangue de pelo menos 5% das pessoas com anti-HBc isoladamente positivos. Habitualmente, à freqüência de anti-HBc isolado está diretamente correlacionado com a freqüência do VHB na população. Em populações com alta prevalência do VHB, o anti-HBc isolado provavelmente indica infecção prévia, com perda do anti-HBs. Já, em indivíduos fora de áreas endêmicas, com baixa prevalência para o VHB, o encontro do antiHBc isolado representa na maioria das vezes resultado www.bjid.com.br 22 Sociedade Brasileira de Infectologia falso-positivos. A maioria destas pessoas tem uma resposta primária ao anti-HBs após 3 doses da vacina. Assim, o anti-HBc pode, ser detectado durante a fase de antigenemia do HBsAg (fase aguda), na fase intermediária (janela imunológica) e durante a fase de convalescença e de imunidade, geralmente, associado ao anti-HBs. Crianças nascidas de mães HBsAg positivas e que não se tornaram infectadas, podem apresentar o anti-HBc detectável por até 24 meses, após o nascimento, por transferência passiva dos anticorpos maternos Em pacientes que evoluem para a HBV crônica, o HBsAg permanecerá detectável, no soro, por mais de 6 meses. Nas HBV crônicas o HBeAg poderá permanecer reagente por vários anos ou apresentar soroconversão em um período de tempo variável. A soroconversão é caracterizada pelo surgimento do anti-HBe com o conseqüente desaparecimento do antígeno e, associado a negativação do DNA do VHB no soro (exceto nos casos de mutação da região do pré-core). A fase de convalescença da infecção, caracterizada pela perda do HBsAg e desenvolvimento do anti-HBs, pode ocorrer em um número restrito de pacientes com infecção crônica pelo VHB (Figura 2). Refências Bibliográficas 1. da Silva L.C., Granato C. Características dos vírus e dos marcadores sorológicos – Importância clínica. Silva LC editor. Hepatites agudas e crônicas. 3rd ed. São Paulo: Sarvier; 2003. p: 09-20. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) 2. Di Bisceglie A.M., Waggoner J.G., Hoofnagle J.H. 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Gonçales, Fernando Lopes Gonçales Jr. Grupo de Estudo das Hepatites (GEHEP), Disciplina de Moléstias Infecciosas, Departamento de Clínica Médica- FCM/UNICAMP Variações no genoma do vírus da hepatite B (VHB), no decorrer dos anos, resultaram na emergência de pelo menos oito genótipos. Os genótipos de A a H são classificados baseados na divergência de mais de 8% na seqüência de nucleotídeos do genoma inteiro (Figura 1). Enquanto a relevância clínica e terapêutica dos genótipos do VHB continua a ser investigada, evidências se acumulam, sugerindo que os mesmos podem afetar a história natural da doença hepática e, provavelmente, possam ter um papel definido no manuseio de pacientes com hepatite pelo vírus B (HVB). O VHB foi inicialmente classificado por sorotipos (a/d e y/ r). Foram identificados, então, 9 sorotipos baseados na imunoreatividade dos anticorpos para um número limitado de aminoácidos do antígeno de superfície do VHB. A relação entre os genótipos do VHB e os sorotipos tem sido estabelecida, porém, como a genotipagem é baseada na seqüência inteira do genoma, ela traduz melhor a diferença que o sorotipo, uma vez que existem os mesmo sorotipos em distintos genótipos. O genótipo A é mais freqüente no Noroeste da Europa, América do Norte, Índia e África Central, enquanto que os genótipos B e C são encontrados no leste da Ásia e Pacífico. O genótipo D tem sido detectado no Sudoeste da Europa, Região Mediterrânea, América do Norte e Índia. O genótipo E foi descrito no Oeste África, o F na América Central/Sul e Polinésia, o H na América Central e do Sul, enquanto que o G tem sido encontrado na França, Alemanha, México e Estados Unidos. A distribuição do VHB nas várias regiões brasileiras mostra um maior predomínio do genótipo A (50-89%) seguido pelo genótipo D (24-38%). Os genótipos C e F são encontrados em freqüência bem menor (3-4%), a despeito de algumas revisões internacionais, estabelecerem ser o genótipo F altamente prevalente no Brasil. Na verdade, sabese que o genótipo F apresenta altas prevalências entre os ameríndios, principalmente na Amazônia. É importante lembrar que a distribuição dos genótipos não é estática e pode variar com o tempo e com as migrações populacionais (Figura 2). Métodos para Genotipagem Existem vários métodos que são disponíveis para a genotipagem do VHB. Os principais métodos com suas vantagens e desvantagens estão esquematizados no Quadro 1. Genótipos e Patogênese Distintos estudos têm avaliado o impacto dos genótipos do VHB sobre a patogênese e seguimento clínico da HBV. Foi observado que os pacientes com infecção pelo VHB, com genótipo A, apresentam altas taxas de remissão sustentada e eliminação do HBsAg, e apresentam doença hepática menos severa que a do genótipo D. O genótipo A também foi associado a uma melhor resposta terapêutica com o interferon que outros genótipos, principalmente, quando as cepas virais são do tipo europeu. Alguns estudos consideram que o genótipo D está mais associado com as hepatites fulminantes que os outros genótipos. Os pacientes infectados com genótipo B apresentam maiores taxas de soroconversão precoce para o HBeAg que os com genótipo C. Além disto, mostram um maior índice de soroconversão espontânea após seguimento prolongado. O genótipo B geralmente se associa com quadros histológicos menos intensos e com uma menor taxa de progressão para doença hepática avançada, quando comparado com o genótipo C. O genótipo C, por sua vez, tem se mostrado como um fator independente para o desenvolvimento de carcinoma hepatocelular. Os dados de comparação de genótipos B e C, foram obtidos de pacientes asiáticos, com doença transmitida verticalmente, enquanto que os dados referentes aos genótipos A e D foram obtidos de pacientes europeus. Análises futuras são necessárias para assegurar que estes achados se repetem em populações de diferentes grupos étnicos, com diferentes vias de transmissão, ou sob diferentes características clínicas e epidemiológicas. As evidências até agora encontradas não permitem colocar a genotipagem dentro das decisões rotineiras para a abordagem e manuseio clínico dos pacientes infectados pelo VHB. Desta forma, mais informações são necessárias, para que a genotipagem do VHB se torne um fator relevante na decisão da terapêutica e no seguimento clínico de pacientes com hepatite B. Mutantes do VHB A freqüência de mutações do VHB tem sido estimada em aproximadamente 1,4 a 3,2 x 105 substituições/nucleotídeo/ sítio/ano, sendo esta taxa 10 vezes maior que a encontrada em outros vírus DNA. A taxa de mutação é influenciada principalmente pela fase clinica da doença, como a imunotolerância, imunoeliminação, imunossupressão e/ou transplante e pelo tratamento. Existem populações do VHB www.bjid.com.br 24 Sociedade Brasileira de Infectologia Figura 1. Distribuição dos genótipos do VHB de acordo com árvore filogenética orangutan BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Figura 2. Distribuição geográfica dos genótipos do VHB gibbon AF193863 AF193864 U46935 AJ131573 gorilla AJ131572 AJ135767 AF160501 98 AF222322 chimpanzee AB032432 D00220 93 98 94 X69798 89 93 AB032433 E G 91 78 X75658 X75664 58 F 79 X75657 78 96 97 AB048702 AB048703 99 99 X75663 98 99 83 98 80 100 X97848 D Z35716 100 X52939 M12906 X75656 91 X02496 AB048705 AB048704 M57663 Z35717 X02763 D00331 A C D00330 D00329 B Quadro 1. Métodos Vantagens Desvantagens Seqüenciamento Direto Melhor Método - Padrão Ouro Detecta novos genótipos ou recombinação entre eles Muito caro e trabalhoso Geralmente difícil de ser realizado em larga escala em investigação clínica RFPL Relativamente fácil de executar Amplificação por PCR Mudança em um nucleotídeo pode afetar a análise ELISA Disponível Comercialmente Fácil de executar e barato Não requer amplificação por PCR Ainda não disponível no país Simples mudança de um nucleotídeo pode afetar a análise Sensibilidade reduzida em genótipos mistos e com baixos níveis de HBsAg Ainda não disponível no país Mais caro que os outros métodos Diferença em um nucleotídeo pode afetar a ligação e a hibridização da sonda LIPA predominantes entre um pool de variantes ou quasispécies. Estas são mantidas, pela pressão seletiva do sistema imune do hospedeiro ou por pressão exógena, como a administração de imunoglobulinas para a hepatite B (HBIg), vacinas e terapêuticas antivirais. Entre as principais mutações do VHB, de interesse clínico, estão as do gene core/pré-core, do core promoter, do gene da polimerase e da região do envelope. Mutações da Região Pré-Core e Core Promoter O HBeAg geralmente é visto como um marcador de replicação e, no passado, pacientes HBeAg negativo eram considerados não replicativos para o VHB. Pacientes HBeAg negativos, com ALT normal, eram considerados como portadores ‘sãos’ do VHB. Hoje estes pacientes considerados como portadores inativos do HBsAg. Estudos recentes www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Figura 3. Constituição do genoma do HBV com suas estruturas gênicas pré-S1 pré-S2 S HBsAg RNA Viral HBcAg C P HBeAg DNApolimerase pré-C X Constituição do genoma do HBV com suas estruturas gênicas mostraram que algumas mutações no genoma do VHB impedem a secreção do HBeAg mas não impedem a replicação viral. A mutação na região pré-core do DNA-VHB que leva a uma falha na expressão do HBeAg, é uma das mais importante. Como se sabe, o HBeAg e o HBcAg são produzidos pelo mesmo gene. Este gene tem dois códons únicos para a síntese protéica (pré-core e C). O códon pré-core leva à síntese do HBeAg, e o códon C codifica o HbcAg (Figura 3). Foi descrita uma mutação na região pré-core, que surge quando o aminoácido glicina é substituído pelo aminoácido arginina no nucleotídeo 1896. A análise pela PCR (reação em cadeia da polimerase) do soro de indivíduos anti-HBeAg reagente que paradoxalmente exibiam altos níveis séricos de DNA-VHB, mostrou, após a amplificação da região pré-core que estes eram incapazes de sintetizar o HBeAg, porque abrigavam mutantes, tanto em forma pura, como em infecções mistas com o VHB selvagem. Esta mutação foi associada a quadros de hepatites fulminantes e às exacerbações de quadros de hepatites crônicas produzidas pelo VHB, produzindo maiores graus de morbidade e mortalidade que os observados nas infecções pelos VHB selvagens. Uma segunda mutação também conhecida é a mutação dupla básica do core promoter que envolve duas substituições de nucleotídeos (A1762T e G1764A), levando a uma queda na regulação da produção do HBeAg. Em suma, os quadros hepáticos fulminantes poderiam ser conseqüentes ao aumento da virulência das cepas mutantes induzidas pelas alterações na região pré-core e do core promoter. O desenvolvimento destas mutações da região précore e do core promoter modificam a história natural da hepatite B, dificultando o diagnóstico de replicação (pela ausência ou queda do HBeAg no soro) e a terapêutica específica (o tempo de tratamento aumenta consideravelmente e há menor porcentual de resposta virológica). 25 A mutação mais comum no pré-core (G1896A) é exclusiva de pacientes infectados com os genótipos B, C, D, E que possuem timidina (T) na posição 1858 do pré-core. No genótipo A o nucleotídeo 1858 é a citosina (C), impedindo a seleção da mutação G1896A. O mutante que troca a guanina (G) da posição 1896 por adenina (A) confere um aumento da estabilidade da estrutura secundária do sinal de encapsulação só em genótipos que possuem o nucleotídeo T na posição 1858, aumentando assim, a intensidade da doença no fígado. Isso foi encontrado em pacientes com hepatite ativa ou hepatite fulminante, porém essa mutação (A1896), também, tem sido freqüentemente detectada em portadores assintomáticos HBeAg negativos Estes mutantes são os principais agentes de hepatite B crônica em vários países. No Brasil, na região de Campinas, cerca de 70% dos pacientes HBsAg positivos são HBeAg negativos, isto é, podem apresentar mutações no core ou no core promoter. Torna-se imprescindível que se realize a quantificação do DNA-VHB e se faça a pesquisa de mutantes do core e do core promoter em todos os pacientes HBeAg negativos com evidências clínicas de doença hepática em atividade. Mutações da Polimerase Mutações freqüentes e naturais têm sido encontradas na região da polimerase nos códons 15-18 e 30-41, mas seu significado e clínico permanece incerto. Entretanto, algumas mutações da região da polimerase têm afetado diretamente a resposta ao tratamento com alguns nucleosídeos análogos, como a lamivudina. A lamivudina é um nucleosídeo análogo da citosina, amplamente utilizada na hepatite B. É uma droga altamente bem tolerada que é um potente inibidor da transcriptase reversa. O tratamento com a lamivudina pode levar à perda do HBsAg e ao clareamento do DNA-VHB do soro de pacientes com infecção crônica. Entretanto, variantes resistentes à terapêutica podem emergir em pacientes com tratamento prolongado (50%-60% em 3 anos de tratamento contínuo). Estas variantes resistentes ocorrem devido a mutações na tirosina-metionina-aspartato-aspartato (YMDD) da região responsável pelo sítio catalítico da transcriptase reversa. As substituições no códon 550 (metionina) pela valina (M550V) ou por uma isoleucina (M550I) são comumente encontradas em pacientes sob terapêutica prolongada com a lamivudina. Em adição, mutações dentro do domínio B da transcriptase reversa como a F512L ou a L526M, têm sido observadas durante o tratamento com a lamivudina e o famciclovir. A não detecção do HBsAg no soro, que não significa necessariamente soroconversão para o anti-HBs, tem sido observado em pacientes tratados com lamivudina. Parte da dificuldade em diagnosticar esta soroconversão é devido a expressão do gene do HBsAg que está no DNA-VHB www.bjid.com.br 26 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Figura 4. Região de mutação de resistência a Lamivudine no gen da polimerase do VHB Spacer Proteína Terminal Transcriptase reversa RNA-ase H Mutações de Resistência a Lamivudine L 73 80m V1 L1 1 F G A B integrado no hepatócito. Este é duplicacado por uma polimerase resistente a lamivudina mais eficiente que a polimerase não resistente adroga. As partículas subvirais do HBsAg existem em excesso quando comparadas com a partícula de Dane. Para diferenciar a ausência do DNA-VHB e a presença de baixos títulos deste existem algumas dificuldades, inclusive na sensibilidade dos ensaios utilizados, para monitoramento da terapêutica. Estudos recentes de pacientes sob tratamento com lamivudina, indicam que baixos níveis de DNA-VHB, no soro, podem ser indicativos de soroconversão para o anti-Hbe. A presença de altos níveis do DNA-VHB, antes do tratamento, pode indicar o surgimento de cepas com variantes da polimerase resistentes a diamba. É importante a identificação precoce dos mutantes YMDD, que representam apenas uma pequena porcentagem da população viral, especialmente, porque existe a possibilidade de incluir outros antivirais efetivos, contra estes mutantes e, evitar a piora do quadro. De acordo com os dados disponíveis na literatura é imprescindível a realização da pesquisa de mutantes induzidos pelo tratamento em pacientes com evidências de doença hepática em atividade, na vigência de terapêutica. Mutações do HBsAg A imunidade protetora conferida pela vacinação contra a hepatite B está associada à um anticorpo neutralizante específico (anti-HBsAg) contra o grupo de antígenos do determinante “a” (aminoácidos 124-148) que é um epítopo conservado do VHB. Anticorpos neutralizantes contra o determinante “a” produzem proteção cruzada contra todos os subtipos do VHB. O clareamento da infecção pelo VHB está sempre associado com a soroconversão do HBsAg para o anti-HBsAg. Entretanto alguns casos esporádicos de falha na vacinação têm sido observados. O HBsAg e o anti-HBs C o DD 4V YM M20 D u I 344 E podem ser encontrados no paciente simultaneamente, indicando insucesso do anticorpo neutralizante. Estudos revelam que mutações no epítopo protetor do determinante “a” do HBsAg não permitem o reconhecimento do anticorpo neutralizante derivado da cepa selvagem, sendo então considerada uma mutação por escape imune. A mutação mais comum do determinante “a” é a substituição da glicina pela arginina no códon 145 do HBsAg (sG145R) ou aspartato para alanina no códon 144 (sD 144A) (Figura 4). Observações similares têm sido feitas em pacientes transplantados hepáticos que receberam tratamento com imunoglobulina anti-HBs (HBIg) e entre recém-nascidos de mães HBsAg positivas que receberam HBIg e vacina. Pelo fato de ocorrer uma sobreposição estrutural dos genes da região S e da polimerase do VHB, uma mutação no gene da polimerase pode levar a alterações no epítopo do HBsAg impedindo sua neutralização. A terapêutica com a lamivudina pode reduzir mutações no gene da polimerase que podem se associar a mutações adicionais no determinante ’a’ da proteína do HBsAg. Em países com alta endemicidade para o VHB e com programas de imunização universal para este vírus, podem ocorrer mutantes por escape vacinal que são capazes de causar infecção em indivíduos já imunizados. Portanto, os programas de vacinação em massa e o uso da lamivudina, em larga escala, podem propiciar a seleção destas mutações combinadas do gene da polimerase e do envelope, com conseqüente restauração da replicação do VHB. Por isto, é importante que se utilizem ensaios sorológicos com alta sensibilidade e com capacidade comprovada de detecção de mutantes da região S. O DNA-VHB como marcador virológico da HBV A quantidade de DNA-VHB no soro é uma medida do nível de replicação viral. O desenvolvimento e a implementação www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) de ensaios de alta sensibilidade para a detecção do DNAVHB de alta sensibilidade tem permitido avaliar melhor os pacientes com infecção pelo VHB, bem como medir a eficácia da terapêutica utilizada. O Workshop de manuseio de hepatite B do National Institutes of Health (NIH) recomenda que o tratamento seja considerado em pacientes com DNA-VHB >105 cópias/mL ou 20.000 UI/mL, utilizando ensaios de não amplificação. Entretanto, alguns pacientes HBeAg positivos e muitos pacientes HBeAg negativos apresentam níveis flutuantes de DNA-VHB que estão abaixo de 105 cópias/mL. Até hoje, não se conhece, realmente, qual é o valor de corte do DNA-VHB que está diretamente associado com doença hepática progressiva. Alguns relatos mostram que pacientes com doença hepática avançada apresentam níveis persistentes de DNA-VHB menores que 20.000 UI/mL. Desta forma, o significado clínico do nível de DNA-VHB no soro deve ser analisado junto com aos dados clínicos presentes em cada paciente. Referências Bibliográficas 1. Arauz-Ruiz P., Norder H., Robertson B.H., Magnius L.O. Genotype H: A new amerindian genotype of hepatitis B vírus revealed in Central America. J Gen Virol 2002;83:2059-73. 2. Arauz-Ruiz P., Norder H., Visona K.A., Magnius L.O. Genotype F prevails in VHB infected patients of hispanic origin in Central América and may carry the precore stop mutant. J Med Virol 1997;51:305-12. 3. Avellón A., Echevarria J.M. Frequency of hepatitis B virus “a” determinant variants in unselected Spanish chronic carriers. J Med Virol 2006;78:24-36. 4. Bartholomeusz A., Schaefer S. Hepatitis B virus genotypes: comparison of genotyping methods. Rev Med Virol 2004;14:3-16. 5. Bonino F., Brunetto M.R. Chronic HbeAg negative, anti-Hbe positive Hepatitis B: An overview. In: EASL International Consensus Conference on Hepatitis B. J.Hepatol 2003;38:533-40. 6. Bowyer S.M., van Staden L., Kew M.C., Sim J.G.M. A unique segment of the hepatitis B virus group A genotype identified in isolates from South Africa. J Gen Virol 1997;78:1719-29. 7. Carman W.F., Anetti A.R., Karayiannis P., et al. Vaccine-induced escape mutant of hepatitis B virus. Lancert 1990;336:325-9. 8. 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Hoofnagle J.H. Challenges in therapy of chronic hepatitis B. In: EASL International Consensus Conference on Hepatitis B. J.Hepatology, 38, p.533-540, 2003. 15. Kramvis A., Weitzmann L., Owiredu W.K., Kew M.C. Analysis of the complete genome of subgroup A‘ hepatitis B virus isolates from South Africa. J Gen Virol 2002;83:835-9. 16. Lee C.H., Kim S.-O., Byun K.S., et al. Predominance of hepatitis B virus YMDD mutants is prognostic of viral DNA breakthrough. Gastroenterology 2006;130:1144-52. 17. Li D., Gu H.-X., Zhang S.-Y., et al. YMDD mutations and genotypes of hepatitis B virus in Northern China. Jpn J Dis 2006;59:42-5. 18. Liu K.-Z., Hou W., Zumbika E., Ni Q. Clinical features of chronic hepatitis B patients with YMDD mutation after lamivudine therapy. J. Zheijang Univ. SCIENCE B 2005;6(12):1182-7. 19. Naumann H., Schaefer S., Yoshida C.F., et al. Identification of a new hepatitis B virus (HBV) genotype from Brazil that expresses HBV surface antigen subtype adw4. 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Tonetto P.A., Gonçales N.S.L., Souza D.S., et al. Genótipos e subtipos do vírus da hepatite B (VHB) em pacientes da região de Campinas-SP. The Brazilian Journal of Infectious Diseases 2005;9:S43-S43. 31. Weber B. Genetic variability of the S gene of hepatitis B virus: clinical and diagnostic impact. J Clin Virol 2005;32:102-12. 32. Whalley S.A., Murray J.M., Brown D., et al. Kinetics of Acute Hepatitis B Virus Infection in Humans. J Exp Med 2001;193:847-53. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) 33. Yamamoto K., Horikita M., Tsuda F., et al. Naturally occurring escape mutants of hepatitis B with various mutation in the S gene in carriers seropositive for antibody to hepatitis B surface antigen. J Virol 1994;68:2671-6. 34. Yoo B.C., Park J., Kim H.J., et al. Precore and Core Promoter Mutations of Hepatitis B Virus and Hepatitis B e AntigenNegative Chronic Hepatitis B in Korea. 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Em áreas de baixa prevalência do VHB tem sido registrado em cifras que variam de 1 a 4% da população [2]. Entretanto, em áreas com elevada prevalência, tais como China(70%) e Gana(83,6%), verificamse elevadas taxas de prevalência de anti-HBcAg isolado, alcançando 2,7% e 12,7%, respectivamente [3]. No Brasil, ao lado de áreas com prevalência elevada na região Norte, foram encontrados níveis de 3,3% no Sul [4], de 6% no Sudesten [1] e de 2,7% no Nordeste [5]. Os casos de “anti-HBcAg isolado” podem ser devidos aos seguintes fatores: 1) reações sorológicas falso-positivas: geralmente associadas ao tipo de “kit” utilizado, são mais freqüentes nas regiões com baixa prevalência da infecção pelo VHB e devem ser suspeitadas quando ocorrem em títulos baixos nas reações imunoenzimáticas, com densidade óptica da amostra próxima ao ponto de corte da reação; 2) fase de “janela imunológica”: observada nas infecções agudas em resolução, quando o HBsAg já se negativou e o anti-HBsAg ainda não é detectado, surgindo algumas semanas depois; 3) expressão de imunidade tardia: quando os níveis do anti-HBsAg decaem abaixo do limite de detecção dos testes e o anti-HBcAg permanece positivo, provavelmente em razão da maior imunogenicidade do HBcAg; 4) infecção crônica, onde a positividade do anti-HBcAg pode ocorrer concomitantemente com uma carga viral baixa do VHB, e o HBsAg não é detectado pelos métodos sorológicos habituais. Estes casos têm sido rotulados com “infecção oculta pelo VHB” (IOB) [3,6,7]. Em Taiwan, onde a cerca de 80% da população adulta apresenta o antecedente de infecção prévia pelo VHB, estima-se que aproximadamente 3% dessa população apresentem IOB [8]. Gonçales et. al detectou a presença de VHB-DNA em 4% de um grupo de doadores de sangue que apresentavam exclusivamente Anti-HBcAg positivo [9]. Conclui-se, portanto, que as IOBs são de grande importância epidemiológica - por sua capacidade potencial de transmissão do vírus [7,10-13], e constituem-se hoje o maior risco de infecção pós-transfusional pelo VHB em diversos países [8]. Vários estudos evidenciaram infecção pós-transfusão de hemoderivados e transplante de órgãos sólidos adquiridos a partir de doadores anti-HBcAg isolados [3,7,12-14], com taxas de infectividade alcançando 17% [12]. Observou-se, entretanto, que hemoderivados contendo ambos anti-HBcAg e anti-HBsAg positivos apresentariam por sua vez baixa infectividade [12]. Vale ressaltar que em certas situações nas IOBs, tanto os anticorpos anti-HBsAg quanto anti-HBcAg podem estar indetectáveis, sendo o VHB-DNA o único marcador passível de detecção [3]. Em determinadas áreas de alta prevalência pela infecção pelo VHB, observou-se através da detecção de VHB-DNA através do nucleic acid amplification test (NAT) que 3%-30% de indivíduos com infecção prévia pelo VHB com HBsAg negativo e de 3%-15% de indivíduos com anti-HBsAg e anti-HBcAg positivos mantinham o VHB-DNA circulante [8]. Nalpas et al. demonstrou a presença de VHB-DNA mesmo em indivíduos com anti-HBsAg isoladamente positivos [1,15]. A partir das situações supracitadas fica nítido o significativo papel das IOBs enquanto potenciais fontes de infecção [15]. Clinicamente, a IOB em indivíduos aparentemente saudáveis associa-se a quatro condições: 1) recuperação da infecção, definida pela presença do anti-HbsAg; 2) hepatite crônica, com infecção relacionada à presença de cepas mutantes não detectadas pelos testes sorológicos convencionais; 3) hepatite crônica em portadores em fase assintomáticos que apresentam anti-HBcAg detectável, com ou sem a presença de anti-HbeAg; 4) hepatite crônica ou portadores assintomáticos que têm no VHB-DNA o único marcador detectável [3]. Ainda hoje, pouco se sabe sobre a evolução a longo prazo desses indivíduos. Como a IOB cursa, na maioria das vezes com viremia baixa [1,16] - frequentemente com níveis de VHB-DNA < 1000IU/mL [7] - os pacientes evoluem freqüentemente como portadores assintomáticos do vírus [10], sem necessidade de tratamento específico para a hepatite B. No entanto, algumas publicações sugerem risco aumentado em indivíduos com IOB de progressão para cirrose [6] e hepatocarcinoma [6] - principalmente quando em associação com o HCV [17] – e reativação viral em vigência de imunossupressão [6]. Assim, com o objetivo de aumentar a segurança das transfusões de sangue, a pesquisa do HBsAg e do anti-HBcAg é obrigatória nos Bancos de Sangue no Brasil, o que tem levado a uma considerável taxa de rejeição do sangue doado[5], além de suscitar discussão sobre o encaminhamento e aconselhamento do doador com anti-HBcAg isolado. Estudo recente em doadores de sangue brasileiros com anti-HBcAg isolado [1] avaliou o resultado da vacinação www.bjid.com.br 30 Sociedade Brasileira de Infectologia contra a hepatite B em relação à soroconversão para antiHBsAg e à presença do DNA do VHB. Após três doses da vacina específica, 90% dos doadores de sangue exibiram níveis de anti-HBsAg acima de 10mIU/mL. Além disso, todos os doadores portadores de infecção oculta que foram vacinados apresentaram, em teste PCR com limite de detecção de 100 cópias de DNA/mL, resultado negativo na pesquisa do DNA viral, sugerindo a possibilidade da eliminação do estado de portador oculto do VHB após a vacinação. Tais achados permitem considerar que o estímulo imunológico desencadeado pela imunização contra o VHB poderia cursar tanto com a resolução de IOBs, quanto a soroconversão do Anti-HBsAg em indivíduos anti-HBcAg isolados. Atualmente o screening utilizando a detecção combinada do HBsAg e do anti-HBcAg constitui-se em importante estratégia na triagem e exclusão de doadores na grande maioria das IOBs [3,9,18] em diversos países, sobretudo em áreas de baixa prevalência (< 3%) para o VHB - mostrando-se ineficiente sobretudo em situações de “janela imunológica” [8]. Entretanto, em países com elevada prevalência de positividade para o antiHBcAg a utilização deste marcador poderia implicar tanto na exclusão de vários potenciais doadores - levando a uma eventual escassez de hemoderivados em várias regiões – como na falha em bloquear eventuais doadores com IOB – mantendo presente o risco de infecção pós-transfusional pelo VHB [8]. Como alternativas, vêm sendo propostos a realização da titulação de anti-HBsAg [3], avaliação da resposta (titulação de anti-HBsAg) pós-estímulo com administração de vacina contra hepatite B [1,19] e a utilização de técnicas de detecção do VHB-DNA em doadores anti-HBcAg isolados e em outras potenciais situações de IOBs [3,7,8,15]. Em relação a possíveis técnicas de detecção do VHBDNA, o NAT vem recebendo crescente atenção, já sendo considerado por muitos autores como a tecnologia a ser utilizada na rotina sobretudo de países com alta prevalência de infecção pelo VHB. É mandatório, entretanto, considerar que para vários países em que a introdução da detecção do VHB-DNA constituirse-ia um avanço na qualidade e segurança dos procedimentos transfusionais, a introdução de técnicas como NAT não seria factível, seja pelo custo ou pela carência de estrutura instalada. Do exposto acima, a identificação de portador do anti-HBcAg isolado em doadores de sangue implica no estabelecimento de condutas, viáveis, no sentido de garantir tanto a máxima segurança aos procedimentos transfusionais, quanto melhor esclarecer o caso, para eventual tomada de decisão em relação à infecção oculta pelo VHB. Uma proposta de abordagem desses pacientes acha-se resumida no algoritmo abaixo da Figura 1. Referências Bibliográficas 1. Pereira J.S.F., Gonçales N.S.L., Silva C., et al. HBV vaccination of HCV-infected patients with occult HBV infection and antiHBC-positive blood donors. Braz J Med Biol Res 2006;39:525-31. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) 2. McMahon B.J., Parkinson A.J. Clinical significance and management when antibodies to hepatitis B core antigen is the sole marker for HBV infection. Viral Hep Rev 2000;6:22939. 3. Allain J.P. Occult hepatitis B virus infection: implications in transfusion. Vox Sanguinis 2004;86:83-91. 4. Silva C.M.D., Costi C., Costa C., et al. Low rate of occult hepatitis B infection among anti-HBc positive blood donors living in a low prevalence region in Brazil. J Infect 2005;51:249. 5. Arraes L.C., Ximenes R., Andrieu J.R., et al. The biological meaning of anti-HBc positive result in blood donors: relation to HBV-DNA and other serological markers Rev Inst Med Trop São Paulo 2003;45:137-40. 6. Chemin I., Trepó C. Clinical impact of occult HBV infections. Journal of Clinical Virology 2005;34(suppl. I):S15-S21. 7. Zanetti A.R., Romanò L., Zappa A., et al. Changing patterns of hepatitis B infection in Italyand NAT testing for improving the safety of blood supply. Journal of Clinical Virology 2006;36(suppl. I) S51-S5. 8. Liu C.J., Lo S.C., Kao J.H., et al. Transmission of occult hepatitis B virus by transfusion to adult and pediatric recipients in Taiwan. Journal of Hepatology 2006;44:39-46. 9. Gonçales Jr. F.L., Pereira J.S.F., Silva C., et al. Hepatitis B virus DNA in sera of blood donors and of patients infected with hepatitis C virus and human immunodeficiency virus. Clinical and Diagnostic Laboratory Immunology 2004;10:718-20. 10. Grob P., Jilg W., Bornhak H., et al. Serological pattern “antiHBc alone”:report on a workshop. J Med Virol 2000;62:4505. 11. Hoofnagle J.H., Seefe L.B., Bales Z.B., et al. Type B hepatitis after transfusion wuith blood containing antibodies to hepatitis B core antigen. N Engl J Med 1978;298:1375-83. 12. Mosley J.W., Stevens C.E., Aach R.D., et al. Donor screening for antibodies to hepatitis B core antigen and hepatitis H virus infection in transfusion recipients. Transfusion 1995;35:5-12. 13. Yotsuyanagi H., Yasuda K., Moriya K., et al. Frequent presence of HBV in the sera of HBsAg-negative, anti-HBc-positive blood donors. Transfusion 2001;41:1093-6. 14. Uemoto S., Sugiyama K., Marusawa H., et al. Transmission of hepatitis B virus from hepatitis B core antibody-positive donors in living related liver transplants. Transplantation 1998;65:494-9. 15. Nalpas B., Berthelot P., Thiers V., et al. Hepatitis B virus multiplication in the absence of usual serological markers. A study of 146 chronic alcoholics. Journal of Hepatology 1985;1:89-97. 16. Hwo T.I., Wu J.C., Lee P.C., et al. Seroclearance of hepatitis B surface antigen in chronic carriers do not necessarily imply a good prognosis. Hepatology 1998;28:231-6. 17. Paterlini P., Driss F., Nalper B., et al. Persistence of hepatitis B and hepatitis C viral genomes in primary liver cancer from HBsAg negative patients: a study of a low-endemic area. Hepatology 1999;17:20-9. 18. Fang C.T. Blood screening for HBV DNA. Journal of Clinical Virology 2006;36(suppl. I):S30-2. 19. Allain J.P. Epidemiology of hepatitis B virus and genotype. Journal of Clinical Virology 2006;36(suppl. I):S12-7. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Figura 1. Abordagem de doadores de sangue Anti -HBcAg positivo HBsAg ne gativo Repetir o Teste Examinar D.O. Encaminhar para Unidade Básica de Saúde Positivo Encerrar o Caso Realizar Anti -HBsAg Negativo Vacinação (3 doses) Repetir anti -HBsAg (após 1 mês da última dose) Negativo Encaminhar para Serviço de Referência Quantificar o DNA do VHB www.bjid.com.br Positivo Encerrar o caso 31 32 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Mensuração do HBV DNA Ricardo S. Diaz1, João Silva de Mendonça2 Disciplina de Infectologia, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo; 2 Hospital do Servidor Público Estadual, São Paulo 1 A dinâmica da infecção pelo vírus da hepatite B (HBV) pode ser avaliada com o auxílio de parâmetros bioquímicos, anátomo-patológicos e virológicos. Como parâmetro virológico, a determinação basal da quantificação do DNA do vírus da hepatite B (carga viral para o HBV DNA) pode ser um indicador útil da atividade da doença e pode predizer de forma acurada a progressão da doença. Além disto é um determinador de infectividade e da necessidade de instituição de um tratamento. De forma longitudinal, a avaliação da carga viral é útil na determinação da resposta ao tratamento e da possibilidade de emergência de resistência ao tratamento. Deve se salientar, entretanto, que a carga viral para o DNA do HBV é somente um dos marcadores com utilidade para a avaliação longitudinal de um paciente, devendo ser feita conjuntamente com outros testes laboratoriais para determinação da patogenicidade e resposta ao tratamento. Mensuração do HBV DNA no Soro Pela sua importância, muitos esforços têm sido realizados para a obtenção de melhores desempenhos destes testes, principalmente com relação à sensibilidade. Em tempo, algumas terminologias relacionadas a estes tipos de testes laboratoriais devem ser conhecidas. A sensibilidade relacionase ao limite inferior de detecção do teste. Já a especificidade refere-se à habilidade do teste em detectar exclusivamente o DNA do HBV. A reprodutibilidade supõe que um mesmo teste quantitativo propiciará o mesmo resultado em uma mesma amostra quando repetido diversas vezes com o mesmo tipo de ensaio (intra-ensaio) ou com ensaios diferentes (interensaios), sendo que estes resultados são expressos como coeficientes de variação. A faixa dinâmica de detecção referese à diferença entre as concentrações máximas e mínimas que um teste pode detectar. A linearidade é a habilidade de um teste em fornecer resultados que sejam proporcionais às concentrações de DNA na amostra. É importante salientar que o entendimento da metodologia e das características relacionadas ao desempenho do teste favorece uma correta interpretação dos resultados. Os testes para carga viral do HBV licenciados atualmente nos Estados Unidos e União Européia são os testes da captura de híbridos (erroneamente chamados de captura híbrida em nosso meio) da empresa Digene, o PCR Cobas HBV Monitor da empresa Roche, e o teste Versanti HBV DNA 3.0 que utiliza a metodologia denominada branched-DNA ou b-DNA da empresa Bayer. Os testes comerciais da empresa Digene tiveram na sua primeira geração o teste denominado “HBV Digene HybridCapture I”, na sua segunda geração o teste “HBV Digene Hybrid-Capture II” e atualmente a empresa conta com o teste “Ultra-Sensitive Digene Hybrid-Capture II”. Resumidamente, no teste da captura de híbridos, o DNA do HBV é desnaturado, passando de um DNA de fita dupla para um DNA de fita simples. Em seguida ocorre a hibridização das fitas de DNA com pequenas seqüências (sondas ou probes) de RNA complementares a regiões específicas do DNA. Os híbridos de DNA e RNA são alvos da ligação de anticorpos marcados e capturados em uma placa. Os anticorpos marcados emitem luminosidade que é detectada e quantificada. A forca do sinal luminoso emitido é diretamente proporcional à quantidade de DNA na amostra. A metodologia do b-DNA utilizada pelos testes “VERSANT HBV DNA 1.0” (geração anterior) e “VERSANT HBV DNA 3.0” (atual) da Bayer também não amplificam o DNA, mas sim o sinal formado pela ligação do DNA com sondas alvo. Trata-se de uma técnica de hibridização sanduíche em fase sólida. Após a desnaturação, o DNA do HBV é capturado por sondas sintéticas de oligonucleotideos que foram fixadas em microplacas. Um segundo grupo de sondas conhecidas como sonda de extensão hibridizam no DNA capturado. Um terceiro grupo de sondas conhecidas como pré-amplificadoras hibridiza com as sondas de extensão. Um quarto grupo de sondas, as amplificadoras, hibridizam com as préamplificadoras, sendo que cada sonda pré-amplificadora pode hibridizar com 14 sondas amplificadoras. A união entre as sondas pré-amplidicadoras com as sondas amplificadoras formam uma estrutura que lembra uma árvore de natal, que originou o nome “branched-DNA”. Um último grupo de sondas é composto de sondas marcada, sendo que estas são conjugadas com a fosfatase alcalina. Um substrato de fosfatase alcalina quimioiluminescente é adicionada e após desfosforilada pela fosfatase alcalina, o substrato emite luz que pode ser detectada por um luminômetro e quantificada quando comparada a uma curva padrão. A metodologia da reação em cadeia pela polimerase (PCR) utilizada pela empresa Roche conta com os testes AMPLICOR HBV MONITOR (primeira geração) e COBAS HBV MONITOR (atual). Esta metodologia conta com algumas etapas fundamentais, onde a primeira delas é a desnaturação que transforma o DNA com fita dupla em DNA com fita única. Esta desnaturação é feita aumentando-se a temperatura para 94oC. Uma seqüência de 10-20 pares de base conhecida como www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) oligonucleotídeos iniciadores (primers) une-se de cada lado da seqüência a ser amplificada. Estes iniciadores são necessários porque a DNA polimerase requer um iniciador para sintetizar a nova fita de DNA. A união (anelamento) destes iniciadores às seqüências de DNA se dá quando ocorre uma diminuição de temperatura para 50 a 65oC (cada par de iniciadores conta com uma temperatura de anelamento ideal dentro desta faixa). A temperatura é então elevada para 72oC, permitindo que a DNA polimerase se ligue aos iniciadores e polimerise uma nova fita de DNA complementar, fase esta conhecida como extensão. Todo este ciclo é repetido por cerca de 20 a 40 vezes permitindo assim uma amplificação em escala exponencial do DNA contido na amostra. Interessante notar que este tipo de reação química só se possibilitou pelo uso de DNA polimerases termoestáveis e que não se degradem em altas temperaturas. A detecção e quantificação são feitas por hibridação reversa cuja leitura é feita em uma placa de ELISA. A quantificação é feita a partir da comparação do resultado obtido da amostra com o resultado obtido de um controlo interno. O controle interno é um DNA de quantidade conhecida que é adicionado à reação e coextraido e co-amplificado com a amostra do paciente. Em tempo, a primeira etapa de manipulação deste teste consiste na inclusão do controle interno e da amostra do paciente na reação. Após isto se efetua a extração do DNA contido na reação, que inclui o DNA do HBV e do controle interno. Mais recentemente, uma nova metodologia conhecida como PCR em Tempo Real (Real Time PCR) foi desenvolvida. Trata-se de uma reação de PCR cuja detecção dos amplicons (produtos da amplificação) é simultânea à amplificação. Apresenta como vantagens a alta sensibilidade, alta capacidade de amplificar grande número de amostras simultaneamente, baixo risco de contaminação por produtos de PCR, posto que a reação acontece em tubos fechados do início ao fim, larga faixa dinâmica de amplificação, alta precisão e reprodutibilidade, alem de baixos custos. No momento, este teste é de desenvolvimento próprio e fornecido por alguns laboratórios, devendo, entretanto as metodologias em tempo real ocupar o lugar de destaque entre as metodologias para quantificação de ácido nucléico. Provavelmente no futuro, a maioria das metodologias comerciais relacionadas a quantificação de acido nucléico devem migrar para as amplificações em tempo real. O grande desafio e problema das metodologias de desenvolvimento próprio para PCR em tempo real é a construção de um controle interno e a padronização de uma curva externa padrão. Principalmente sem um controle interno adequado, não se controla adequadamente para as alterações no desempenho da extração e amplificação do DNA. Desta forma, se a opção do clínico for pelo uso desta metodologia a partir de laboratórios clínicos que desenvolveram o teste, deve-se 33 sempre averiguar sobre a existência do controle interno. A PCR em tempo real conta com uma sonda que possui em uma das extremidades o reporter que emite luz e na outra o quencher que absorve esta luz. Enquanto ocorre a polimerização, uma enzima associada à polimerase que é uma exonuclease vai limpando o caminho para a ação da polimerase e no momento que esta enzima se aproxima da sonda, ela vai soltando os nucleotídeos um a um desta sonda, separando fisicamente o quencher do reporter e permitindo a emissão de luz que pode ser quantificada. Os testes de carga viral para o HBV pode ter o resultado relatado em números absolutos ou log10. É normalmente preferível a interpretação de acordo com o modelo logarítmico que permite a melhor diferenciação entre as alterações reais e as alterações relacionadas à reprodutibilidade do teste. Desta forma, considera-se uma alteração real aquela que for superior a 0.5 log10, visto que um teste realizado duas vezes na mesma amostra, no mesmo dia e pelo mesmo técnico de laboratório, pode ter uma variação de até 0.5 log10. Outro detalhe relaciona-se ao fato do exame poder ser relatado em cópias por mL de amostra ou em unidades internacionais por mL (UI) de amostra, sendo que esta última é preferível. As UI surgiram a partir da necessidade de padronização da quantificação, já que uma amostra tinha resultados consistentemente diferentes quando se usavam metodologias diferentes. Foram então introduzidos padrões de HBV DNA da Organização Mundial da Saúde. Desta forma são produzidos pelo National Institute for Biological Standards and Control (NIBSC) controles feitos a partir de amostras positivas para o HBV DNA com títulos altos de vírus [1]. Estas amostras foram diluídas em cripreservativos e liofilizadas e a quantidade de partículas virais dentro destas amostras foi arbitrariamente definidas em um valor de 1.000.000 de UI. Este valor não representa, portanto um número real de partículas virais, mas um valor arbitrário, como quilograma, por exemplo. Desta forma, as unidades de Conversão em UI para os testes diferentes é de 1UI/mL para cada 5,2 cópias de HBV/mL para o teste Versant HBV DNA 3.0 (bDNA) da Bayer sendo que 1UI/ mL equivale a 5,6 cópias de HBV/mL para o Cobas Amplicor HBV monitor da Roche. Não existe uma conversão para os testes de captura de híbridos da Digene. As novas versões dos testes comerciais melhoraram a sensibilidade e a faixa dinâmica de detecção dos testes. O teste de Captura de hibridos I da Digene apresenta a faixa de detecção de 106 a 108 enquanto que a Captura de hibridos II apresenta a faixa de detecção entre 105 a 108 e o Ultrasensível II entre 104 a 107. O Versant 1.0 da Bayer detecta entre 106 a 109, enquanto o Versant 3.0 detecta entre 103 a 107. O PCR da Roche AMPLICOR HBV MONITOR por sua vez detecta entre 103 a 106 enquanto o COBAS HBV MONITOR detecta entre 102-105UI/mL. É impressionante www.bjid.com.br 34 Sociedade Brasileira de Infectologia o fato de que a faixa dinâmica de detecção da PCR em tempo real variar entre 101 e 1010. HBV DNA como Marcador de Progressão e Gravidade de Doença Sabe-se que de forma geral, os portadores do HBV podem ser divididos em dois grupos; os HbeAg positivos ou os HbeAg negativos, estes últimos normalmente apresentando mutações no promotor pré-core ou core. Os pacientes HbeAg positivos normalmente apresentam níveis de carga viral superiores aos dos pacientes HbeAg negativos. Apesar de não existir uma correlação muito clara entre os níveis de carga viral para o HBV e progressão da doença entre os pacientes HbeAg positivos, esta correlação entre carga viral e progressão pode ser observada de forma mais evidente entre os indivíduos HbeAg negativos, onde os indivíduos com carga viral mais elevada tenderam a apresentar uma doença e lesão hepática mais grave [2]. Como exemplo de correlação entre os níveis de replicação viral e progressão da doença entre os HbeAg negativos, o estudo de Germanidis et al. [3] demonstraram que pacientes com metavir A0A1 apresentaram carga viral de 5,3 +/- 1,6 log10 enquanto que os pacientes A2A3 apresentaram carga viral de 6,2+/-1,3 (p=0,0009). Existem também evidencias de que a carga viral para o HBV DNA também está relacionada a soroconversão de HbeAg para anti-Hbe de forma espontânea ou associadas ao tratamento com interferon [3]. Da mesma forma, Yu et al. [4] demonstraram que para o genótipo que não seja C, o risco relativo para desenvolvimento de hepatocarcinoma para os pacientes com carga viral =4.22 log10 era de 1, para os com carga viral entre 4.23–5.90 era de 2.95 (intervalo de confiança entre ou IC entre 1.29–6.75) e os com carga viral =5.91 o risco era de 6.99 (IC = 2.97–16.49). Já para o genótipo C, o risco para os portadores de carga viral =4.22 log10 era de 6.55 (IC = 2.23–19.27), para os pacientes com carga viral entre 4.23–5.90 era de 13.00 (IC = 4.65–36.31) e para os com carga viral =5.91 era de 26.49 (IC = 10.41–67.42). Obviamente, o significado clínico do nível de HBV DNA no soro deve ser analisado junto aos dados clínicos e outros dados laboratoriais, tanto pontualmente quanto individualmente. HBV DNA e Tratamento Da mesma forma, recomenda-se que o tratamento seja considerado em pacientes com HBV DNA >105 cópias/mL ou 20.000 UI/mL. Considera-se uma resposta adequada ao tratamento aquela que proporciona uma queda de pelo menos 1 log10 na carga viral do paciente, sendo a potência do tratamento proporcional a queda da carga viral para um determinado paciente e esquema utilizado. A falha de tratamento primária é aquela onde não existe alteração na carga viral após a introdução da medicação e a falha de BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) tratamento secundária é aquela onde após um benefício inicial ocorre um retorno da carga viral aos níveis basais ou um aumento de pelo menos um log10 do nadir obtido. Observe que a sustentabilidade da recrudescência (falha do tratamento) deve ser confirmada por pelo menos 2 mensurações com pelo menos 1 mês de intervalo entre elas. Sugere-se também, principalmente quando os resultados não forem relatados em UI, que se acompanhe um paciente preferencialmente com mensurações de carga viral usando uma mesma metodologia. HBV DNA e Resistência aos Antivirais A carga viral basal para o HBV tem sido correlacionada como um preditor de emergência de resistência a vários antivirais; quanto mais elevada a carga viral basal, maior a chance de desenvolvimento de resistência. Por outro lado, baixos índices de resistência à lamivudina foram relatados entre pacientes com alto grau de supressão viral. O mesmo tipo de resultado foi detectado em estudos cuja intervenção foi com adefovir. Baseados nestes resultados, pode-se intuitivamente concluir que altos índices de replicação que refletiriam a carga viral basal elevada estariam relacionadas a menor probabilidade de redução efetiva da carga viral na vigência de tratamento aumentando assim os riscos de emergência de resistência. De forma semelhante, a probabilidade de seleção de mutantes resistentes durante o tratamento é diretamente proporcional a replicação viral residual na vigência deste tratamento. Assim sendo, as cepas resistentes seriam mais rapidamente selecionadas dentre aqueles pacientes em tratamento e com carga viral elevada. Este tipo de raciocínio joga luz à possibilidade de intensificação de tratamento com terapia antiviral combinada, maximizando assim a durabilidade do efeito antiviral. Considerações Finais Torna-se evidente que um dos avanços de maior repercussão na manipulação de doenças infecciosas relacionase ao advento dos testes de análise de ácidos nucléicos. Como mencionado neste texto, no caso da carga viral para o DNA do HBV, este teste é essencial para diagnóstico, prognóstico, decisões terapêuticas e monitoramento de resposta ao tratamento. Ainda existem limitações dos testes disponíveis, especialmente relacionados à faixa dinâmica de quantificação e automação. Outro problema ainda a ser definido inclui as relações entre entidades biológicas diferentes (genótipos) e desempenho destes testes, além da relação entre os genótipo e progressão da doença, padrões de resistência aos antivirais e resposta ao tratamento. Desta forma, nosso esforço deve sempre caminhar na tentativa de disponibilização ampla não só de medicamentos, mas de instrumentos laboratoriais úteis para abordagem de patologias como a infecção pelo HBV. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Referências Bibliográficas 2. 1. 3. Saldanha J, Gerlich W, Lelie N, Dawson P, Heermann K, Heath A. An international collaborative study to establish a World Health Organization international standard for hepatitis B virus DNA nucleic acid amplification techniques. Vox Sang 2001;80(1):6371. 4. 35 Lindh M., Horal P., Dhillon A.P., Norkrans G. Hepatitis B virus DNA levels, precore mutations, genotypes and histological activity in chronic hepatitis B. J Viral Hepat 2000;7(4):258-67. Chu C.J., Hussain M., Lok A.S. Quantitative serum HBV DNA levels during different stages of chronic hepatitis B infection. Hepatology 2002;36(6):1408-15. Yu M.W., Yeh S.H., Chen P.J., et al. Hepatitis B virus genotype and DNA level and hepatocellular carcinoma: a prospective study in men. J Natl Cancer Inst 2005;97(4):265-72. www.bjid.com.br 36 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Anatomia Patológica da Hepatite B Evandro Sobroza de Mello, Venâncio Avancini Ferreira Alves Divisão de Anatomia Patológica do Hospital das Clínicas de São Paulo/Faculdade de Medicina da USP e Laboratório CICAP/Hospital Alemão Oswaldo Cruz Aspectos Gerais Inflamação e lesão hepatocitária são as alterações histológicas essenciais das hepatites de qualquer causa – no caso das hepatites agudas, estas alterações são predominantemente lobulares (parenquimatosas), enquanto nas hepatites crônicas, apesar das lesões lobulares poderem estar presentes em graus variados, as lesões portais e periportais predominam (Tabela 1). No caso das infecções pelo VHB, há um largo espectro de alterações histológicas que podem ocorrer no fígado, desde a hepatite aguda, passando pelos fenômenos reacionais leves até as formas mais graves, que incluem as hepatites crônicas com graus variados de lesão histológica, a cirrose e o carcinoma hepatocelular. Existe uma relação aproximada dos achados histológicos no fígado com as fases clínico-sorológicas vistas na história natural da infecção pelo VHB (Figura 1) [1]. A hepatite aguda pelo VHB, identificada mais frequentemente nos pacientes adolescentes e adultos, apresenta os aspectos necroinflamatórios lobulares convencionais das outras hepatites agudas virais, com fenômenos particularmente proeminentes de peripolese (linfócitos aderidos à membrana dos hepatócitos) e de lesão centrolobular. Usualmente não se consegue detectar os antígenos virais no tecido (AgHBs e AgHBc) por imunohistoquímica nesta fase. Na fase imuno-tolerante, presente nos pacientes de zonas endêmicas muitas vezes por longos períodos, as alterações necro-inflamatórias são leves ou ausentes. Na fase imuno-ativa, pode ser identificada hepatite crônica de gravidade variável (leve - 24 a 63%; moderada ou grave - 44 a 63%; cirrose ativa -10 a 24%) [2-4]. Já no estado de portador crônico inativo, além dos achados sorológicos e virológicos (AgHBs +, ausência de HBeAg com anti-HBe +, HBV DNA indetectável ou com baixos níveis no PCR e transaminases repetidamente normais), a histologia se caracteriza pela ausência de alterações necro-inflamatórias significativas e fibrose mínima ou ausente [5,6]. Nesta fase, inclusive, ocorre regressão das alterações presentes na fase imuno-ativa, inclusive com melhora gradual da fibrose [7]. O prognóstico dos portadores inativos é usualmente benigno, mas raramente pode haver o desenvolvimento de carcinoma hepatocelular (CHC) [8], mesmo em pacientes não cirróticos. O achado histológico mais característico da infecção pelo VHB, que a distingue de outras causas de hepatite crônica, é a presença de hepatócitos com citoplasma em vidro fosco (“ground glass”). Este consiste na presença de proliferação do retículo endoplasmático liso proliferado abarrotado de antígeno de superfície do VHB (AgHBs). Por sua vez, a presença de núcleos pálidos e granulosos (“sanded nuclei”) parece corresponder a acúmulos do antígeno “core” do nucleocapsídeo (AgHBc). Outro marcador histológico muito freqüente da hepatite pelo VHB é a presença de anisonucleose - variação do tamanho e forma dos núcleos, muitas vezes refletindo-se na presença da chamada “displasia de grandes células”. A biópsia hepática, quando indicada, tem várias utilidades dentro do contexto da infecção pelo VHB: avaliar a necessidade da terapia antiviral, servir como base para a avaliação da progressão da doença em biópsias futuras, ajudando nas decisões terapêuticas, e excluir a presença de cirrose [9]. Uma vez realizada, sua avaliação inclui a graduação e o estadiamento das lesões de hepatite crônica, conforme detalhado no protocolo a seguir. Protocolo de Avaliação Histológica para Biópsias Hepáticas de Pacientes com Vírus da Hepatite B Esse protocolo pode ser aplicado às diversas etiologias de hepatite crônica, inclui, além da hepatite B, vírus da hepatite C, hepatite auto-imune e, menos freqüentemente, doença de Wilson ou hepatite medicamentosa. O protocolo está centrado nos critérios do Consenso Nacional das Hepatites Crônicas, da Sociedade Brasileira de Patologia (SBP) [10]. 1) Tipo de amostra: (biópsia por agulha, biópsia em cunha,peça cirúrgica de ressecção, outro 2) Tamanho da amostra Número de espaços-porta na biópsia: _____ 3) Variáveis histológicas: - Fibrose portal: ( ) 0 (ausente) ( ) 1 (discreta, sem formação de septos) ( ) 2 (com septos porta-porta) ( ) 3 (com septos porta-porta e porta-centro, esboçando formação de nódulos – em “ transformação nodular”) ( ) 4 (cirrose) - Inflamação portal ( ) 0 (ausente) ( ) 1 (discreta) ( ) 2 (moderada) ( ) 3 (acentuada) ( ) 4 (muito acentuada) - Atividade peri-portal (atividade de interface) ( ) 0 (ausente) ( ) 1 (presença apenas de “spill over”) www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 37 Tabela 1. Principais aspectos histológicos da hepatites aguda e crônica pelo VHB Hepatite Aguda Alterações centradas no parênquima Inflamação (células mononucleares, ativação de células dos sinusóides e peripolese), regeneração (duplicação de traves, multi nucleação e mitoses dos hepatócitos) alterações degenerativas dos hepatócitos (balonização, corpos apoptóticos e focos de necrose lítica) dispersos no lóbulo, por vezes mais proeminentes na região centrolobular Inflamação portal variável pode estar presente, até com “spill over” (extravasamento linfocitário), mas sem morte hepatocelular (Hepatite de Interface / “necrose em saca-bocados”) Fibrose ausente Vidro fosco ausente e Pesquisa Imuno-histoquímica negativa para AgHBs Hepatite Crônica Alterações centradas nos espaços-porta Atividade lobular, variável, usualmente pouco pronunciada, mas que pode se tornar importante nas crises de exacerbação – quando não há fibrose, pode ser difícil distinguir a hepatite crônica em exacerbação de uma hepatite hepatite aguda com base puramente histológica. Inflamação portal com linfócitos, histiócitos e plasmócitos; Atividade de interface / “necrose em saca-bocados”) está presente na maioria dos casos. É caracterizada pela presença de extensão do infiltrado inflamatório portal com “necrose” dos hepatócitos (na verdade desaparecimento dos hepatócitos na área do infiltrado, provavelmente por apoptose) Expansão portal por fibrose pode estar presente em graus variáveis, com septos até cirrose Vidro fosco variavelmente presente e pesquisa imuno-histoquímica positiva para AgHBs Figura 1. História natural da infecção pelo VHB com destaque para os aspectos histológicos vistos em cada fase da doença Áreas endêmicas 1-90% (subclínica) peri-natal ou infância precoce Fase imunotolerante - HBeAg+ e altos níveis de HBV DNA - Níveis normais de transaminases - atividade histológica mínima Décadas nas regiões endêmicas (30-50% hepatite aguda ictérica) Adolescentes e adultos -sexual -uso de drogas injetáveis 95-99% 70% Menos de 10% Outras áreas Fase imunoativa - HBeAg+ e diminuição dos níveis de HBV DNA - Aumento de transaminases - aumento da atividade histológica - hepatite leve 24-42%, moderada a severa 44-63% e cirrose ativa 10-24% Meses ou anos ro ra Parte dos pacientes Fase não replicativa (portador inativo) Po um om oc c u Hepatite B resolvida HBsAg- e anti-HBs + - HBV DNA em níveis muito baixos (soro ou tecido) - Transaminases e histologia sem alterações ( ) 2 (necrose em saca-bocados discreta – focos ocasionais em alguns espaços-porta) ( ) 3 (necrose em saca bocados moderada – focos ocasionais em muitos espaços-porta ou numerosos focos em poucos espaços-porta) ( ) 4 (necrose em saca-bocados acentuada - numerosos focos em muitos espaços-porta) - Atividade parenquimatosa ( ) 0 (ausente) ( ) 1 (tumefação, infiltrado linfocitário sinusoidal e ocasionais focos de necrose lítica hepatocitária) HBeAg- e anti-HBe + - Desaparecimento ou marcada diminuição dos níveis de HBV DNA - Normalização de transaminases - Resolução das alterações histológicas ( ) 2 (numerosos focos de necrose lítica hepatocitária) ( ) 3 (áreas de necrose confluente ocasionais) ( ) 4 (numerosas áreas de necrose confluente ou áreas de necrose pan-acinar) - Evidências histológicas de associação com outras condições: ( ) siderose grau ______ ( ) marcadores de esteato-hepatite ( ) outros:______ Além da classificação da SBP, dois outros sistemas têm sido amplamente utilizados em nosso meio: Metavir e de Ishak, www.bjid.com.br 38 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Tabela 2. Equivalência aproximada das classificações mais usadas no estadiamento e graduação das hepatites crônicas Alteração Arquitetural (Fibrose)* Atividade Inflamatória** SBP, 2000 e Ishak, 1995 SBP, 2000 Metavir, 1994 Atividade Periportal 0 1 2 3 4 0 1 2 3 4 Metavir, 1994 Ishak, 1995 0 1 ou 2 3 4 ou 5 6 0 ou 1 0 ou 1 2 2 2 3 3 4 Atividade Parenquimatosa A 0 1 ou 2 0–1 2 3–4 0–2 3–4 0–4 0 1 1 2 3 2 3 3 * na classificação de ISHAK, o escore de fibrose vai até 6, enquanto na METAVIR e na SBP vai até 4. ** correspondendo à atividade periportal e parenquimatosa independentemente para SBP e ISHAK, e um misto de periportal e lobular para METAVIR; na classificação de METAVIR, o escore de atividade vai até, 3 enquanto em ISHAK e SBP vai até 4. descritos em detalhes nas respectivas referências abaixo[11,12]. Uma tabela com a equivalência aproximada desses três sistemas de classificação está exposta na Tabela 2. Tipo de Amostra Para diagnóstico e estadiamento de hepatite, é fortemente recomendado o uso de amostras obtidas através de biópsia por agulha, mesmo durante cirurgias abdominais realizadas por outros motivos [13]. Isso se deve ao fato de que biópsias em cunha resultam em amostras subcapsulares, que contém espaços-porta volumosos característicos da região (que muitas vezes têm septos porta-porta ou em direção à cápsula), o que torna difícil o estadiamento arquitetural. No caso de biópsias hepáticas obtidas durante cirurgias abdominais, a realização da biópsia deve ser no início do ato cirúrgico, para evitar alterações associadas à manipulação (especialmente infiltrado neutrofílico sinusoidal). Tamanho da Amostra O comprimento mínimo recomendado para uma biópsia para diagnóstico e estadiamento de hepatite é de 1,5 cm ou 10 espaços porta. Biópsias com dimensões menores que 1,5 cm na maior parte das vezes resultam em um número menor de espaços-porta. O uso de agulhas que resultem em amostras muito finas também deve ser desencorajado, pois limita seriamente a avaliação arquitetural. Pessoalmente, preferimos as agulhas Trucut que as agulhas Menghini, em especial porque as primeiras produzem regularmente espécimes mais largos, facilitando a avaliação arquitetural. Está muito bem documentado em estudos recentes que quanto menor a biópsia, muito mais frequentemente será obtido o diagnóstico de uma doença hepática leve (quanto menor a biópsia, mais leve a hepatite, por problemas de amostragem) [14-16]. Associação com Outras Condições A biópsia hepática tem como uma de suas grandes utilidades a possibilidade de detecção incidental de outras doenças, que não a hepatite B. A principal delas nos dias atuais, sem dúvida, é a presen;ca de esteato-hepatite. Além da esteatose, a presença de balonização acentuada, corpúsculos de Mallory e, especialmente, fibrose peri-sinusoidal, são muito indicativos desta associação. Deve-se destacar, no entanto, que a histologia não permite diferenciação segura entre esteato-hepatite alcoólica ou não alcoólica. Atenção especial deve ser voltada para os casos AgHBe negativos que apresentam hepatopatia [3] – evidentemente, esta pode ser uma hepatite crônica por uma variante do vírus B, mas a biópsia é de grande utilidade para afastar outras doenças hepáticas, incluindo superinfecção com outros vírus, doen;cãs metabólicas, hepatopatia alcoólica, hepatotoxicidade por drogas e hepatite auto-imune. A busca ativa, mais do que o achado incidental, de um padrão histológico que indique outra etiologia é essencial nestes casos. Hepatite B no Transplante A hepatite B pode evoluir no transplante hepático de forma muito similar àquela vista no pré-transplante – inicialmente pode ou não ser identificado um quadro de hepatite aguda (hepatite lobular) e posteriormente de hepatite crônica estabelecida (inflamação portal com graus variáveis de fibrose e atividade) [17]. A severidade e a velocidade de evolução da doença, no entanto, são consideravelmente maiores do que no prétransplante. A hepatite colestática fibrosante é uma importante variação clínico-patológica de hepatite B que ocorre no enxerto hepático e, mais raramente, em outras condições em que há imunossupressão [18]. Esta é uma variante rapidamente progressiva e de prognóstico reservado de hepatite que tem www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) um aspecto histológico bastante característico, incluindo fibrose portal rapidamente progressiva com intensa reação ductular e bilirrubinostase ductular e canalicular. Detecção dos Antígenos do VHB no Tecido Através de ImunoHistoquímica Os vários antígenos do VHB podem ser detectados por imuno-histoquímica nos cortes histológicos de tecido hepático, com significados distintos de acordo com o seu padrão de expressão. O AgHBc é mais freqüentemente identificado no núcleo dos hepatócitos e reflete replicação viral [19]. Quando esta replicação é muito alta, este antígeno pode também ser identificado no citoplasma das células, às vezes com diminuição gradativa de sua expressão nuclear, fator associado com aumento da atividade inflamatória [20] e que possivelmente reflete a presença de maior regeneração celular. Mesmo nos casos de mutantes pré-core o AgHBc pode ser detectado no tecido, apesar da ausência de AgHBe no soro. A expressão do AgHBe no tecido também reflete replicação viral, mas não está claramente associada à atividade histológica. A expressão do AgHBs é vista no citoplasma ou menos freqüentemente na membrana celular, e é sinônimo de infecção. A expressão de membrana do AgHBs tem forte associação com a presença replicação viral [21], e para alguns pode ter relação com a produção do vírion completo. Nos portadores crônicos inativos, em que houve integração viral ao genoma do hospedeiro, tipicamente há desaparecimento do AgHBc com expressão variável, freqüentemente abundante, de AgHBs no citoplasma dos hepatócitos. Diante de evidências de integração do genoma do VHB ao do hepatócito infectado em fases mais avançadas de hepatite crônica, com ativação da expressão do gene X do VHB (AgHBx), tem crescido recentemente o interesse no estudo desse gene. A transativação de genes celulares e a inativação da proteína p53 pela proteína X do VHB são possíveis mecanismos de indução do carcinoma hepatocelular. Alguns anticorpos monoclonais têm se mostrado eficientes na detecção dessa proteína no tecido [22], existindo correlação direta de sua expressão com o estádio da hepatopatia crônica, sendo muito mais evidente nos casos de cirrose e carcinoma hepatocelular do que nos casos de doença leve. Referências Bibliográficas 1. Chu C.M., Liaw Y.F. 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Expression of hepatitis B virus X protein in HBV-infected human livers and hepatocellular carcinomas. Hepatology 1998;27:1109-20. www.bjid.com.br 40 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) História Natural e Manuseio do Carcinoma Hepatocelular no Paciente com Hepatite B 1 Marcel C. C. Machado1, André Cosme de Oliveira2 Professor Titular da Disciplina de Transplante e Cirurgia do Fígado HC-FMUSP; 2Médico Assistente e Coordenador do Ambulatório de Tumores Hepáticos da Disciplina de Transplante e Cirurgia do Fígado HC-FMUSP Mais de 400 milhões de pessoas, incluindo 1,25 milhões de Norte Americanos, têm hepatite B crônica [1]. Nos EUA, a infecção crônica pelo vírus da hepatite B é responsável por quase 5.000 óbitos por ano decorrentes da cirrose e do carcinoma hepatocelular (CHC) [1]. No Reino Unido 1.500 óbitos por ano são decorrentes do CHC [2]. A estimativa é que um terço da população mundial apresente evidência sorológica de infecção prévia pelo VHB e que o vírus cause mais de 1 milhão de mortes anuais [3]. Nos EUA a incidência de infecção pelo VHB apresentou uma queda de 14 casos por 100.000 habitantes em 1980, para 3 casos por 100.000 habitantes em 1998 [4]. O CHC é a neoplasia primária mais comum do fígado ocorrendo em alta freqüência no Sudeste da Ásia e na África Central, em áreas onde a infecção crônica pelo VHB é o principal fator de risco para o desenvolvimento do CHC, com uma incidência de 20 a 25% nos pacientes com VHB, aparecendo em 90% dos casos em pacientes com cirrose [5]. Na América Latina a incidência de CHC é de aproximadamente 0,7 a 9,9 casos por 100.000 habitantes por ano. De acordo com dados sobre mortalidade por câncer no Brasil de 1999, o CHC ocupava a sétima posição, sendo responsável por 4.682 óbitos. Beasley e col., em estudo controlado prospectivo demonstrou que a incidência anual de CHC em portadores do hepatite B era de 0.5% e nos pacientes sabidamente cirróticos era de 2,5% ao ano [6,7]. Sakuma e col. encontraram uma incidência de CHC em japoneses de 0,4% ao ano [8]. Dentro dos fatores que influenciam o risco de desenvolvimento de CHC temos [9]: (1) Sexo. O risco do desenvolvimento de CHC é muito maior no homem para a maioria das etiologias. Isto é independente do fato que os homens são mais prováveis de desenvolverem a hepatite crônica pelo VHB do que as mulheres, com uma proporção de 1,9:1. (2) Idade. No Reino Unido a idade média do desenvolvimento de CHC é 66 anos. Nas áreas de alta prevalência de VHB, o CHC tem uma distribuição bimodal da idade com picos nas idades 45 e 65 anos. (3) Cirrose hepática. Está presente na maioria dos pacientes com CHC no Reino Unido e na Europa, em 90 a 95% dos casos. De um modo geral, considera-se que um portador de cirrose tenha um risco de 5% ao ano de desenvolver CHC e nos pacientes não-cirróticos ocorre geralmente em jovens (variante fibrolamelar) e nas pessoas mais idosas (aparentemente carcinoma hepatocelular de novo,no qual um grupo de hepatócitos pode dar origem ao tumor). (4) Etiologia da doença hepática. A infecção crônica pelo VHB é o fator mais freqüentemente associado ao desenvolvimento do CHC em todo o mundo sendo que os mecanismos de desenvolvimento não são totalmente conhecidos, podendo ser que a injúria crônica – infecção, inflamação, regeneração e fibrose – levem à cirrose e então posteriormente ao CHC. No entanto, até 40% dos casos de CHC pelo VHB não estão associados à cirrose. O CHC pode ocorrer em pacientes não-cirróticos com doença viral no fígado, particularmente pelo VHB, onde ocorre a integração viral direta do DNA no genoma da célula hepática. Durante a infecção pelo VHB pode ocorrer a incorporação precoce do seu genoma ao DNA da célula hepática e mesmo a cura sorológica ou o tratamento eficaz, com o desaparecimento do VHB-DNA no sangue pode não ser o suficiente para erradicar este potencial oncogênico [10]. Elevados níveis sanguíneos de VHB-DNA (≥ 10.000 cópias/mL) pode ser também um forte preditor de risco de desenvolvimento de CHC [11]. Frente a estes fatos, a vigilância é recomendada principalmente no grupo de pacientes que apresentam um maior risco de desenvolvimento de CHC (Tabela 1). Tabela 1. Fatores de risco para desenvolvimento de CHC Portadores de VHB Homens asiáticos ≥ 40 anos Mulheres asiáticas ≥ 50 anos Todos os cirróticos portadores de VHB História familiar de CHC Africanos com mais de 20 anos Transmissão vertical Aquisição precoce do VHB (infância) * Para os portadores do VHB não listados acima, o risco de carcinoma hepatocelular varia de acordo com a severidade da doença do fígado e da intensidade da atividade inflamatória hepática. Os pacientes com concentrações elevadas de VHB-DNA e atividade inflamatória presente apresentam maior risco para o desenvolvimento de carcinoma hepatocelular. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Rastreamento O rastreamento do CHC nos pacientes com VHB, principalmente naquela população de risco, deve ser uma preocupação constante, uma vez que a instituição de um tratamento precoce aumenta o potencial de cura do mesmo. A American Association for the Study of Liver Disease (AASLD) recomenda o rastreamento do CHC a cada 6 meses nos pacientes de risco e anualmente naqueles de baixo risco. Diversas formas de rastreamento têm sido propostas e atualmente a mais utilizada, principalmente na Ásia e Europa, é a associação da dosagem sanguínea da alfa-fetoproteína e a realização de ultra-sonografia abdominal. A alfa-fetoproteína apresenta uma baixa sensibilidade para o diagnóstico de CHC (45 a 64%), porém tem ainda um grande papel diagnóstico naqueles pacientes cirróticos com nódulo hepático e níveis superiores a 200 ng/mL (Tabela 2). A combinação da alfa-fetoprotéina com a ultra-sonografia abdominal aumenta as taxas de diagnóstico de CHC, contudo também elevam os custos e as taxas de falso-positivos. A American Association for the Study of Liver Disease (AASLD) [12] sugere a utilização da ultra-sonografia abdominal para o rastreamento do carcinoma hepatocelular (Figura 1). Ultra-sonografia Abdominal A ultra-sonografia abdominal é um método acessível, de baixo custo e não invasivo. A ultra-sonografia abdominal apresenta uma sensibilidade entre 65% a 80% e especificidade acima dos 90% quando usada para o rastreamento do CHC [13]. O aspecto do carcinoma hepatocelular é variável, sendo que os pequenos geralmente são lesões sólidas hipoecogênicas, circunscritas, com diâmetros entre 0,6 e 3,0 cm. À medida que o tumor cresce torna-se mais vascularizado, com áreas de necrose, fibrose e transformação gordurosa, adquirindo um aspecto heterogêneo (Figura 2). Tomografia Computadorizada A tomografia computadorizada, com sensibilidade de 86,6%, permite avaliar algumas características do carcinoma hepatocelular, como o realce arterial pelo meio de contraste, a presença de cápsula peritumoral, o realce em mosaico, a infiltração de gordura, a presença de invasão vascular (principalmente da veia porta) e de fístulas arteriovenosas [12] (Figura 3). Ressonância Magnética O carcinoma hepatocelular na ressonância magnética geralmente apresenta hipersinal em T2, sinal variável em T1, com padrão de realce semelhante à tomografia computadorizada, apresentando uma sensibilidade de 90% 41 para o diagnóstico de CHC. Diferem dos nódulos regenerativos que normalmente demonstram hipossinal em T2 e ausência de realce arterial pós-contraste [12] (Figura 4) Tratamento do CHC A American Association for the Study of Liver Disease (AASLD) [12] sugere que a escolha da terapia deve estar sempre baseada no estadiamento do tumor no momento do diagnóstico (Tabela 3) e no grau de disfunção hepática, determinada pela classificação de Child-Pugh (Figura 5). Aproximadamente 15-20% dos pacientes são candidatos a condutas terapêuticas radicais e o restante destes receberão terapêuticas paliativas ou sintomáticos [14]. A biópsia do nódulo raramente é necessária e a disseminação pela punção pode ocorrer em 1 a 3% dos casos, devendo ser evitada quando a lesão é potencialmente operável [9]. Tratamento do Carcinoma Hepatocelular Opções de tratamento radical Ressecção cirúrgica Transplante de fígado Alcoolização Radiofreqüência Opções de tratamento paliativo Quimioembolização Ressecção Cirúrgica e Transplante de Fígado A ressecção cirúrgica é o tratamento mais eficaz para o CHC e a primeira opção para aqueles pacientes não cirróticos. Nos pacientes cirróticos apresenta uma alta morbidade e uma mortalidade operatória em torno de 10%, também com um alto risco de recidiva e aparecimento de outros focos no fígado remanescente que supera os 50% em cinco anos [12,14]. O paciente ideal para a ressecção cirúrgica é aquele com menos de 70 anos, em bom estado nutricional, com tumor pequeno, periférico, bilirrubina normal, sem invasão vascular, plaquetas acima de 100.000 e sem hipertensão portal. Somente pacientes cirróticos Child-Pugh A são candidatos à ressecção cirúrgica e ainda assim mais da metade destes evoluirá com descompensação no pós-operatório, principalmente com ascite [14]. O transplante de fígado é a única terapia curativa tanto para o CHC como da cirrose hepática subjacente, evitando assim a aparição de novos focos de CHC. Está indicado naqueles casos onde há um nódulo único até 5 cm de diâmetro, ou aqueles com até 3 nódulos, cada qual destes com até 3 cm de diâmetro, sem invasão vascular ou doença extra-hepática [12]. www.bjid.com.br 42 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Tabela 2. Trabalhos comparativos de sensibilidade e especificidade da alfa-fetoproteína Estudo Sherman Trevisani Gambarin-Gelwan Nguyen Peng Cedrone Limite de alfa-fetoprotéina (ng/mL) Sensibilidade (%) Especificidade (%) 20 20 200 400 20 50 20 20 20 64,3 60,0 22,4 17,1 58,0 47,0 63,0 65,0 55,0 91,4 89,4 99,4 99,4 91,0 96,0 80,0 87,0 88,0 Figura 1. Algoritmo sugerido pela AASLD durante o rastreamento do CHC. < 1,0 cm 1,0 – 2,0 cm Repetir USG a intervalos de 3-4 meses Dois estudos dinâmicos de imagem (TC/RM) Estável em 18-24 meses Aumentando Padrão vascular típico nos dois estudos dinâmicos Padrão vascular típico em um estudo dinâmico apenas > 2,0 cm Um estudo dinâmico de imagem (TC/RM) Padrão vascular atípico em ambos estudos dinâmicos Padrão vascular atípico Biópsia Diagnóstico de CHC Sem diagnóstico de CHC Outro diagnóstico Repetir a biópsia ou seguimento por imagem Mudança no tamanho ou no perfil Repetir estudo dinâmico de imagem ou a biópsia Positivo Negativo Tratar como carcinoma hepatocelular www.bjid.com.br Padrão vascular típico ou AFP > 200 ng/mL BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 43 Figura 2. Ultra-sonografia demonstrando uma lesão heterogêneo (A) e uma lesão hipoecogênica (B). Figura 3. Tomografia computadorizada demonstrando as fases sem contraste, arterial, portal e de equilíbrio. Figura 4. Ressonância magnética com carcinoma hepatocelular. Tabela 3. Estadios de performance da OMS Organização Mundial de Saúde Estadio 0 Estadio 1 Estadio 2 Estadio 3 Estadio 4 Atividade normal, capacidade de exercer todas as atividades pré-doença sem restrição. Restrição a atividades mais vigorosas, porém permanece ambulatorial, sendo capaz de trabalhos leves e de natureza sedentária. Capaz de cuidar de si próprio, mas incapaz de trabalhar. Ambulatorial e não-acamado em mais de 50% do tempo Capacidade limitada de cuidar-se; Confinado a cama ou cadeira em mais de 50% das horas diurnas. Ambulatorial 50% do tempo ou menos; Cuidados constantes. Acamado; Totalmente incapaz; Não consegue cuidar de si próprio; Pode necessitar de hospitalização. Tabela 4. Sobrevida após quimioembolização Autor Bruix et al. Quimioembolização Tratamento conservador Llovet J.M. et al. Quimioembolização Sobrevida (%) 1 ano 2 anos 3 anos 77 70 50 49 27 31 81 63 62 26 28 16 www.bjid.com.br 44 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Figura 5. Algoritmo sugerido pela AASLD para tratamento do CHC. Carcinoma hepatocelular Estadio 0, Child -Pugh A Estágio precoce Único < 2 cm Estadio 0-2, Child -Pugh A -B Estágio inicial Único até 5 cm ou 3 nódulos até 3 cm, Estadio 0 Estágio intermediário Multinodular, Estdio 0 Estadio > 2, Child -Pugh C Estágio avançado Invasão portal, N1, M1, Estadio 1 -2 Estágio terminal 3 nódulos ≤3 cm Único Pressão portal / bilirrubina Aumentado Normal (s/ varizes de esôfago, plaquetas > 100.000) Ressecção Transplante de fígado Invasão portal, N1, M1 Doenças associadas Não Sim Alcoolização Radiofreqüência Não Quimioembolização Tratamentos Curativos Novos agentes Trials controlados randomizados Injeção Percutânea de Etanol (Alcoolização) Sim Sintomáticos a ressecção cirúrgica e estimada acima dos 50% em três anos [12]. A alcoolização do nódulo de CHC provoca necrose coagulativa e trombose vascular transformando o nódulo tumoral em uma área necrótica avascular. Têm sido amplamente utilizada pela sua boa tolerância, baixo custo e facilidade de acesso em qualquer centro hospitalar [14]. Pode ser realizada em nódulos de 3/5 cm, presença de até 3 nódulos, ausência de ascite, ausência de coagulopatia grave (TP acima de 40%, plaquetas acima de 40.000), presença de “janela” ultrassonográfica segura para abordagem do nódulo e ausência de doença extrahepática [12,14]. A eficácia desta técnica varia com o tamanho do nódulo. Em nódulos com diâmetro igual ou inferior a 3 cm a resposta completa se obtém em até 80% dos casos. Em nódulos entre 3 e 5 cm a resposta cai para 50% e é menor ainda em nódulos maiores. Em pacientes cirróticos compensados com CHC menores que 5 cm apresentam uma taxa de sobrevida de 70-80% em três anos e 49-54% em cinco anos [14]. A recorrência de CHC com a alcoolização é tão alta quanto Radiofreqüência Usa-se uma agulha especial, em forma de guarda-chuva, acoplada a um equipamento que promove a morte das células tumorais através de lesão térmica. A energia emitida produz agitação iônica que se converte em calor e quando se alcança uma temperatura acima dos 50° C se induz necrose coagulativa mais homogênea e a lesão do tecido cirrótico ao redor é menor, quando comparada à alcoolização. Pode ser realizada por via percutânea guiada por ultrasom, por via laparoscópica e também durante cirurgia. Até quatro lesões de até no máximo 5 cm de diâmetro, rodeadas por parênquima hepático, situados a mais de 1 cm da cápsula de Glisson e a mais de 2 cm das veias hepáticas ou da veia porta podem ser tratados com radiofreqüência [14]. Em tumores menores que 3 cm ocorre uma resposta completa superior a 90%, ainda com a vantagem de necessitar de um número menor de sessões do que na alcoolização [14]. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) Quimioembolização Baseado no fato que o CHC apresenta uma rica vascularização arterial a quimioembolização intrarterial hepática é uma opção terapêutica não-radical quando os demais tratamentos não podem ser empregados. A cateterização da artéria hepática através da punção da artéria femural permite a identificação da artéria nutridora do nódulo e a administração de quimioterápicos no mesmo, combinados ou não com lipiodol. O lipiodol é captado seletivamente pelo tecido tumoral, não sendo captado pelo parênquima hepático. A oclusão subseqüente da artéria tumoral pode ser realizada com micropartículas ou gelfoam. As contra-indicações a quimioembolização são a presença de invasão vascular, disseminação extra-hepática, trombose de veia porta, insuficiência renal, ateromatose avançada, trombose de artéria hepática ou tronco celíaco e massa tumoral superior à 50% do volume hepático [14]. Atualmente se utiliza a quimioembolização em pacientes em lista de espera de transplante de fígado com o objetivo de se evitar o crescimento do CHC, o que poderia impedir a realização do mesmo [14]. Referências Bibliográficas 1. Lin K.W., Kirchner J.T. Hepatitis B. American Family Physician 2004; 69. 2. El-Serag H.B., Mason A.C. Rising Incidence of hepatocellular carcinoma in the United States. N Engl J Méd 1999;340:74550. 45 3. Zuckerman J.N., Zuckerman A.J. The epidemiology of hepatitis B. Clin Liver Dis 1999;3:179-87. 4. Goldstein S.T., Alter M.J., Williams I.T., et al. Incidence and risk factors for acute hepatitis B in the United States, 19821998: implications for vaccination programs. J Infect Dis 2002;185:713-9. 5. Lynch H.T., Srivatanskul P., Phornthutkul K., Lynch J.F. Familial hepatocellular carcinoma in na endemic área of Thailand. Câncer Genet. Cytogenet 1984;11:11-8. 6. Beasley R.P., Hwang L.Y., Lin C.C., Chien C.S. Hepatocellular carcinoma and hepatitis B vírus. A prospective study of 22707 men in Taiwan. Lancet 1981;2:1129-33. 7. Beasley R.P. Hepatitis B vírus as the etiologic agent in hepatocellular carcinoma. Hepatology 1982;2(Suppl):21S-6S. 8. Sakuma K., Saitoh N., Kasai M., et al. Relative risks of death due to liver disease among Japanese male adults having various statuses for hepatitis B and e antigen/ antibody in serum: a prospective study. Hepatology 1988:8:1642-6. 9. Ryder S.D. Guidelines for the diagnosis and treatment of hepatocellular carcinoma (HCC) in adults. Gut 2003;52:1-8. 10. Jeng J.E., Tsai J.F. Hepatitis B vírus antibody in hepatocellular carcinoma in Taiwan. J Méd Virol 1991;34:74-7. 11. Chen C.J., Yang H.I., Su J., et al. Risk of hepatocellular carcinoma across a biological gradient of serum hepatitis B vírus DNA level. Jama 2006;295:65-73. 12. Bruix J., Sherman M. Mangement of hepatocellular carcinoma. Hepatology 2005;42:1208. 13. Bolondi L., Sofia S., Siringo S., et al. Surveilance programme of cirrhotic patients for early diagnoses and treatment of hepatocellular carcinoma: a cost-effectiveness analysis. Gut 2001;48:251-9. 14. Antonana A.V., Polo I.O., Serrano A.L., Moreno-Osset E. Tratamiento del carcinoma hepatocelular. An Med Int 2002;19(10). www.bjid.com.br 46 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Indicações para o Transplante Hepático e Manuseio Pré e Pós-Transplante na Hepatite B Edson Abdala1, Fátima Mitiko Tengan2 Assistente-Doutor e Médico Responsável pelo Ambulatório do Serviço de Cirurgia e Transplante Hepático do HCFMUSP; 2Professora Assistente da Disciplina de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da FMUSP; Médica do Ambulatório e Laboratório de Hepatites/LIM 47 DMIP-HC-FMUSP 1 O vírus da hepatite B (VHB) é a causa de doença hepática em 5 a 10% dos pacientes submetidos a transplante de fígado (Tx) nos centros europeus e americanos [1,2]. Em nosso meio, corresponde a 8 a 10% dos pacientes em lista de espera para o Tx, e a 20% dos casos de Tx por hepatite fulminante. O Tx para a hepatite pelo VHB deve ser discutido sob uma perspectiva histórica. Os resultados do Tx nestes pacientes melhoraram significativamente durante as duas últimas décadas. A melhor evolução se deve à adoção de medidas profiláticas contra a recidiva da infecção e às possibilidades terapêuticas com drogas antivirais [1,3]. O risco de recidiva passou de até 80% para menos de 10%. Os fatores mais significativos foram, sucessivamente, o uso profilático de imunoglobulina anti-HBs (HBIG), o advento de análogos nucleosídeos e nucleotídeos e a combinação de HBIG com estes antivirais [1,4,5]. Desta maneira, a infecção pelo VHB, que no início dos anos 90 era tida como uma indicação marginal ao Tx, é atualmente considerada uma excelente indicação, com sobrevida do enxerto e do hospedeiro superior a outras doenças hepáticas, incluindo a infecção pelo vírus da hepatite C (VHC) [1]. Indicações de Transplante Hepático Hepatopatia Crônica O momento para a indicação do Tx depende de características clínicas e virológicas. A abordagem clínica inclui um estadiamento (Child-Pugh, MELD ou outro) e indicação do Tx baseado em probabilidade de sobrevida, considerando também os dados de sobrevida após o Tx [3]. Entretanto, na infecção crônica pelo VHB, a variação deste estadiamento durante o tempo de espera parece ser o fator mais importante para a decisão sobre o Tx. É bem definido que a presença de antígeno e (HBeAg) e a detecção de alta carga viral (acima de 105 cópias/mL) pré-Tx estão associadas a maior risco de recidiva da infecção no enxerto. Consequentemente, surgiu gradualmente um consenso de que a supressão da carga viral antes do Tx poderia ser um importante objetivo a ser atingido. O desenvolvimento de drogas antivirais tem possibilitado o tratamento de pacientes com cirrose em estágio final, permitindo atingir este objetivo. Entretanto, este tratamento pode, em até 6 meses, decorrer em melhora clínica do paciente, retardando ou mesmo evitando a indicação de Tx. Gera-se, portanto, muitas vezes a dúvida quanto à indicação de Tx em pacientes nos primeiros meses de terapia antiviral, com resposta virológica e ainda sem definição de melhora clínica. Este dilema torna-se maior em locais com curto período de espera [1]. Critérios para Inclusão em Lista de Transplante No Brasil, a inclusão em lista para Tx obedece aos seguintes critérios mínimos, estabelecidos e publicados em Portaria do Ministério da Saúde de 14 de maio de 2002 (Portaria MS541) [6]. 1. Cirrose hepática Child-Pugh A, desde que tenham apresentado uma das seguintes complicações: a) hemorragia digestiva alta, secundária à hipertensão portal, em dois ou mais episódios que tenham requerido transfusão de sangue; b) síndrome hepatopulmonar com manifestações clínicas; c) encefalopatia portossistêmica. 2. Cirrose hepática Child-Pugh B ou C, independentemente de complicações. 3. Carcinoma hepatocelular restrito ao fígado, com nódulo único de até 5 cm, ou com até três nódulos de 3 cm cada. O estadiamento por mapeamento ósseo e tomografia de tórax é obrigatório. 4. Alta suspeita de doença maligna, sem massa tumoral identificada, com alfa-fetoproteína acima de 250 ng/mL, ou acima de 100 ng/mL com aumento progressivo em três dosagens séricas consecutivas. Distribuição dos Órgãos A distribuição de fígado de doadores cadáveres, no Brasil, passou a seguir um critério de gravidade a partir de 30 de junho de 2006, segundo Portaria do Ministério da Saúde, publicada em 29 de maio de 2006 (Portaria MS1160) [7]. O critério adotado é o MELD (Model for End-stage Liver Disease), que possibilidade avaliação prognóstica em 3 meses e utiliza, em seu cálculo, parâmetros laboratoriais (bilirrubina, cretinina e INR). Hepatite Fulminante A indicação de Tx na hepatite aguda fulminante pelo VHB também é frequentemente fonte de incertezas [1]. Deve-se www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) proceder ao Tx quando o risco de óbito supera aquele esperado para o procedimento. Nestas situações, apesar de não demonstrado em estudos prospectivos controlados, os dados publicados sugerem que o tratamento com lamivudina pode ser benéfico, podendo evitar o Tx [8]. Para a indicação do Tx, no Brasil, o paciente deve preencher um dos seguintes critérios [7]: 1. Kings College a) TP>100 segundos ou INR>6,5; b) Três das seguintes: TP>50 segundos ou INR>3,5, idade menor de 10 ou maior de 40 anos, duração da icterícia maior que 7 dias antes do início da encefalopatia, concentração sérica de bilirrubina > 17,5mg/dL. 2. Clichy: fator V < 30% em maiores de 30 anos, e < 20% em indivíduos de até 30 anos. Tratamento do Vírus da Hepatite B em Cirróticos em Lista para Transplante O tratamento da infecção pelo VHB em cirróticos descompesnsados, em lista para Tx, tem dois objetivos: 1) melhorar a função hepática e, eventualmente, eliminar a necessidade de Tx; 2) diminuir o risco de recidiva após o Tx. Nestas duas situações, a chave é manter a supressão viral [1,3]. O interferon não é indicado para cirróticos descompensados, pelo risco de piora da função hepática durante um possível “flare” e de complicações infecciosas [3]. Os antivirais são bem tolerados por estes pacientes, embora os dados disponíveis sejam principalmente com o uso de lamivudina. A lamivudina tem-se mostrado eficaz em suprimir a replicação viral e, em muitos casos, em melhorar a função hepática. O maior problema do uso da lamivudina é o desenvolvimento de resistência durante o tratamento prolongado (até 70% em 4 anos), podendo haver agravamento da doença hepática nos pacientes que haviam obtido melhora clínica e aumento do risco de recidiva naqueles submetidos ao Tx [2,3]. O adefovir tem sido demonstrado como eficaz no tratamento de cirróticos descompensados com VHB resistente à lamivudina. No entanto, resistência ao adefovir também tem sido relatada nestes casos, com maior incidência com o uso isolado [2,3]. A melhor estratégia para a terapia antiviral dos casos com resistência à lamivudina parece ser a combinação de drogas, para diminuir o risco de resistência múltipla e de descompensação hepática. Embora não haja estudos controlados, o uso de entecavir e de tenofovir também pode ser considerado [2,3]. Recidiva da Infecção pelo VHB Após o Transplante – História Natural O risco de recidiva da infecção pelo VHB após o Tx correlaciona-se diretamente com a carga viral pré-Tx. A recidiva 47 pode ser: viral, sorológica (reaparecimento do HBsAg) e histológica [4]. A positividade do HBsAg após o transplante é o critério mais comumente utilizado para a definição, e está geralmente acompanhada por replicação viral. Apesar do significado clínico da detecção isolada de replicação viral não estar claro, ela reflete a persistência de infecção subclínica e pode ser o suficiente para induzir a mudança no esquema profilático adotado [7]. A incidência de recidiva, sem o uso de profilaxia, varia conforme o transplante, atingindo cerca de 60% dos pacientes transplantados por cirrose (80% naqueles com alta carga viral) e 15% nos Tx por hepatite fulminante [9]. Com as medidas profiláticas atuais, ocorre em menos de 10% dos pacientes [3]. Profilaxia da Recidiva após o Transplante Imunoprofilaxia com HBIG O uso de HBIG foi a primeira medida a mostrar eficácia em prevenir a recidiva da infecção pelo VHB após o Tx [10]. O mecanismo exato de ação não é conhecido, mas tem sido sugerido que a HBIG pode ligar-se ao vírus circulante e evitar a ligação a receptores dos hepatócitos. Demonstrou-se também, “in vitro”, que a HBIG pode entrar nos hepatócitos e ligar-se ao HBsAg, prevenindo a sua secreção celular e de vírions do VHB [2,3]. Os estudos iniciais constavam de altas doses de HBIG EV (10.000 UI) na fase anepática, e ulteriormente doses semanais e mensais, com o objetivo de manter altos níveis sanguíneos de ant-HBs. Determinou-se como nível adequado de anti-HBs pelo menos 100 UI/mL. O sucesso da profilaxia depende da administração de HBIG indefinidamente[10]. A maior limitação da profilaxia com HBIG isoladamente é o custo. Adicionalmente, há, com este esquema, até 20% de recidiva da infecção. A maioria destes casos corresponde ao desenvolvimento de resistência ao HBIG por mutação do determinante “a” do antígeno de superfície [1,3]. Profilaxia com Antivirais A estratégia profilática que se seguiu ao HBIG foi o uso de lamivudina para diminuir a carga viral antes do Tx, e continuar sua administração para manter a inibição da replicação viral após o Tx. Pacientes submetidos a esta medida, no entanto, apresentam índice de recidiva semelhante aos com HBIG. A recidiva deve-se basicamente ao desenvolvimento de resistência à lamivudina, causada por mutações no gene da transcriptase reversa, mais comumente no domínio C da polimerase no loco tirosina-metionina-aspartato-aspartato (YMDD) [1,3,5]. Alguns estudos têm demonstrado eficácia de adefovir, entecavir ou tenofovir na circunstância de recidiva por desenvolvimento de resistência à lamivudina. Nestas www.bjid.com.br 48 Sociedade Brasileira de Infectologia situações, como no paciente cirrótico pré-Tx, a combinação das drogas parece preferível à simples substituição [2,3]. A perspectiva de manutenção prolongada de profilaxia com dois antivirais é promissora, podendo possibilitar a retirada da HBIG em 1 a 2 anos após o Tx, em pacientes sob imunoprofilaxia [3]. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) O uso de tenofovir também tem se mostrado eficaz para o tratamento da infecção com vírus resistente à lamivudina pós-Tx, e estudos com entecavir estão em andamento [2]. Manuseio do VHB Pré e Pós-Transplante de Fígado – Recomendações Profilaxia Combinada com HBIG e Antiviral Pré-Transplante A profilaxia combinada com HBIG e antiviral foi o próximo passo a ser avaliado, e mostrou-se extremamente eficaz. O protocolo típico inicia-se com antiviral antes do Tx, e após o Tx associa-se a HBIG. A associação previne o desenvolvimento de resistência a ambos agentes. Além disto, proporciona a possibilidade de uso de doses significativamente menores de HBIG, diminuindo os inconvenientes de sua administração [1,3]. Protocolos utilizando profilaxia combinada com baixas doses de HBIG EV, e mesmo com HBIG IM, têm demonstrado mais de 90% de eficácia [11,12]. Mantém-se a dúvida, mesmo em pacientes sob profilaxia combinada, se o HBIG poderia ser suspenso após 1 a 2 anos do Tx. Alguns estudos têm demonstrado segurança desta medida. Nestes casos, a carga viral deve ser avaliada a curtos intervalos de tempo (3 meses). Uma estratégia mais segura pode ser a substituição da HBIG por uma segunda droga antiviral, e merece investigação [3,13]. O Papel da Vacina Contra o VHB A eficaz combinação de análogos nucleosídeos e/ou nucleotídeos tem desvantagens a longo prazo, como custo, efeitos colaterais e inconvenientes para o paciente. Portanto, estratégias para a manutenção da profilaxia, como a vacina contra o VHB, têm sido investigadas [1,3]. Várias vacinas e estratégias têm sido estudadas. A retirada da HBIG é necessária para que a vacina possa ter efeito. Alguns autores têm obtido resposta de anticorpos significativa, embora outros relatem resultados desapontadores [14,15]. Esta abordagem, portanto, requer maior investigação. Tratamento da Recidiva Com o desenvolvimento atual das medidas profiláticas, a recidiva deve ser observada raramente. A abordagem depende dos antivirais usados previamente. Atualmente, a maioria dos casos deve corresponder a pacientes com vírus resistente à lamivudina. O uso de adefovir tem demonstrado boa supressão viral e benefício clínico. Há um consenso de que a lamivudina deva ser mantida após a introdução do adefovir, e de que o tratamento combinado seja mantido indefinidamente [2,3]. a) Tratar todos os pacientes em lista que apresentarem detecção de DNA sanguíneo positiva; b) Iniciar o tratamento com entecavir, adefovir ou lamivudina; c) Monitorar carga viral a cada 3 meses; d) Pacientes com desenvolvimento de resistência à lamivudina: associar adefovir, e manter indefinidamente. Transplante a) HBIG IM, 800 a 1000UI, na fase anepática. Após o Transplante a) HBIG: manter dose semanal diária (800 A 100UI), IM; depois: dose mensal ou conforme demanda (se anti-HBs menor do que 100 UI/mL) por 1 ano; b) Lamivudina ou outro antiviral: manter o esquema pré-Tx ou iniciar logo após o Tx para os pacientes que não estavam em uso; c) Monitorar carga viral e sorologia a cada 3 meses. Tratamento da Recidiva a) Associar antivirais e manter indefinidamente. Referências Bibliográficas 1. Mutimer D. Review article: hepatitis B and liver transplantation. Aliment Pharmacol 2006;23:1031-41. 2. Schreibman I.R., Schiff E.R. Prevention and treatment of recurrent hepatitis B after liver transplantation: the current role of nucleoside and nucleotide analogues. Ann Clin Microbiol Antimicrob 2006;5:8. 3. Samuel D., Forns X., Berenguer M. et al. Report of the Monothematic EASL Conference on LiverTransplantation for Viral Hepatitis (Paris, France, January 12-14, 2006). 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Modifica os critérios de distribuição de fígado de doadores cadáveres para transplante, implantando o critério de gravidade de estado clínico do paciente. Brasília, DF, 31 de maio de 2006;seção 1. 8. Schmilovitz-Weiss H., Bem-Ari Z., Sikuler E., et al. Lamivudine treatment for acute severe hepatitis B: a pilot study. Liver Int 2004;24:547-551. 9. Samuel D., Muller R., Alexander G. et al. Liver Transplantation in European patients with the hepatitis B surface antigen. N Engl J Med 1993;329:1842-7. 10. McGory R.W., Ishitani M.B., Oliveira W.M., et al. Improved outcome of orthotopic liver transplantation for chronic hepatitis B cirrhosis with aggressive passive immunization. Transplantation 1996;61:1358-64. 49 11. Han S.H., Martin P., Edelstein M., et al. Conversion from intravenous to intramuscular hepatitis B immune globulin in combination with lamivudine is safe and cost-effective in patients receiving long-term prophylaxis to prevent hepatitis B recurrence after liver transplantation. Liver Transpl 2003;9:182-7. 12. Angus P.W., McCaughan G.W., Gane E.J., et al. Combination low-dose hepatitis B immune globulin and lamivudine therapy provides effective prophylaxis against posttransplantation hepatitis B. Liver Transpl 2000;6:429-33. 13. Buti M., Mas A., Prieto M., et al. A randomized study comparing lamivudine monotherapy after a short course of hepatitis B immune globulin (HBIg) and lamivudine with long-term lamivudine plus HBIg in the prevention of hepatitis B recurrence after liver transplantation. J Hepatol 2003;38:811-817. 14. Sanchez-Fueyo A., Rimola A., Grande L., et al. 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O conceito de insuficiência hepática aguda foi definido por Trey e Davidson como um quadro de icterícia, encefalopatia e coagulopatia. Introduziram os termos de insuficiência hepática fulminante e subfulminante. Classificação A insuficiência hepática aguda é classificada em 03 grupos, segundo O’ Grady e col. em hiperaguda, aguda e subaguda: - Hiperaguda: desenvolvimento de encefalopatia dentro de 07 dias após o início da icterícia, com sobrevida de 36%. - Aguda: aparecimento de encefalopatia entre 8 e 28 dias após o incio da icterícia, com sobrevida de 7%. - Subaguda: surgimento de encefalopatia no período de 5 a 26 semanas após o início da icterícia, com sobrevida de 14%. Apresentação Clínica As manifestações clínicas iniciais são inespecíficas: náuseas, vômitos, dor abdominal, desidratação e icterícia.Os casos de piora da encefalopatia, acidose metabólica e hipoglicemia devem ser removidos imediatamente para um Centro de transplante de Fígado. Estes pacientes evoluem com deterioração clínica rápida e devem ser submetidos à sedação e ventilação mecânica. O monitoramento do tempo de protrombina (TP) e da função renal constituem importantes fatores preditivos do prognóstico e também de critérios de transplante hepático. A identificação precoce da piora clínica é fundamental para a intervenção imediata, aumentando a sobrevida destes pacientes. Encefalopatia Hepática Fisiopatologia Resulta da falha da biotransformção e excreção de toxinas que são processadas no fígado. Ocorre principalmente pela elevação dos níveis plasmáticos de amônia e de outras substâncias como mercaptanos, ácidos graxos, aminóacidos de cadeia aromática, substâncias benzodiazepínicas-like, ácido aminobutírico e alguns metais. Classificação Grau I: alteração do ritmo de sono, euforia ou depressão, desorientação temporo-espacial, ideação lenta. Grau II: sonolência, agitação, agressão, asterixe. Grau III: maior sonolência, torpor, confusão mental. Grau IV: coma, sem resposta aos estímulos. Os pacientes com encefalopatia grau I e II têm melhor prognóstico. Nos graus III e IV, os pacientes desenvolvem edema cerebral, principal causa de óbito nos pacientes com IHAG. A deterioração do SNC pode explicar a forma clínica ou subclínica de atividade epileptiforme, indicando o uso de anticonvulsivantes, como fenitoína e tiopental. Edema Cerebral Cerca de 80% dos pacientes com encefalopatia grau IV têm edema cerebral, cursando com elevação da pressão intracraniana (PIC). As manifestações clínicas são: hipertensão arterial, bradicardia, alterações na pupila, postura de descerebração, convulsões e alteração do padrão respiratório. Tratamento a) Medidas gerais: todo paciente com encefalopatia grau III e IV deve ser sedado e submetido à ventilação mecânica. Estas medidas diminuem a irritação cerebral. Deve-se manter o decúbito elevado a 30 °, evitar, a medida do possível, estímulos de aspiração de vias aéreas. A hiperventilação criteriosa e hipotermia, mantendo a temperatura corpórea entre 32 a 33°C, também auxiliam no controle da hipertensão intracraniana. b) Farmacológico: manitol inibidores da ciclo-oxigenase 2 N- acetilcisteína prostaciclina. C) Monitoramento da PIC: através do implante do catéter de PIC, Doppler transcraniano, tomografia computadorizada de crânio, ressonância magnética de crânio e dosagem de www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) lactato cerebral. Nos casos em que a PIC ultrapassa 40 mmHg, têm mau prognóstico. O ideal é manter a PIC abaixo de 20 mmHg. Coagulopatia Na insuficiência hepática ocorre diminuição de produção e aumento de consumo dos fatores de coagulação, que são na maioria sintetizados no fígado. O tempo de protrombina (TP) é um importante marcador de prognóstico. Tratamento Para os casos com hemorragia ativa e/ou instabilidade hemodinâmica. - Vitamina K por via intravenosa. - Plasma fresco congelado. Os casos mais estáveis não devem ser tratados, para não perdermos o parâmetro do TP como fator de prognóstico. Alterações da Circulação Sistêmica Resultam da diminuição da auto-regulação do tônus vasogênico, levando à diminuição da resistência vascular periférica. Ocorre vasodilatação e hipotensão arterial, com elevação do débito cardíaco. Portanto, alterações hemodinâmicas tais como as que ocorrem no choque séptico. A diminuição do volume intravascular leva à hipoperfusão tecidual, hipóxia e acidose lática. Tratamento - Monitorar a pressão venosa central (PVC), mantendo em níveis de 8 a 10 cm de H2O. Monitoramento invasivo da pressão arterial. Expansão plasmática com albumina humana: uso controverso. Expansão com soluções cristalóides e colóides. Manter o sódio sérico em níveis normais para diminuir o risco de piora do edema cerebral. Uso de drogas vasoativas: noradrenalina, epinefrina. Monitoramento da artéria pulmonar: catéter de Swan- Ganz. 51 Tratamento - Expansão plasmática - Hemodiálise - Hemofiltração venosa continua: melhor método. Infecção O fígado é responsável pela síntese do sistema de complemento. Na IHAG, encontramos diminuição dos níveis de C3 e C5, associado à diminuição de opsonização de fungos e bactérias. Ocorre também disfunção das células polimorfonucleres e da fagocitose pelas células de Kupffer, facilitando a translocação bacteriana e a liberação de citocinas e endotoxinas, TNF-alfa e interleucina 6. A infecção pulmonar é a mais freqüente, em torno de 50% dos casos, segundo Rolando et al. Em 2º lugar, temos as bacteriemias e em 3º a infecção de trato urinário. O principal agente infeccioso é Estafilo aureus, E. coli e fungos (Candida albincans). Estes pacientes apresentam neutropenia e incapacidade de apresentar resposta pirogênica e leucocitose frente às infecções. A antibioticoterapia de largo espectro deve ser administrada precocemente. Transplante de Fígado O transplante hepático ortotópico constitui o tratamento definitivo da IHAG. Os critérios estabelecidos do King’s College Hospital são os seguintes: - TP > 100 segundos - Pelo menos 3 dos seguintes critérios: · Hepatite não A não B ou reação a drogas · Icterícia acima de 7 dias antes da encefalopatia · Idade < 10 anos ou > 40 anos · TP > 50” / INR > 3.5 · Bilirrubina > 17.6 mg/dL As contra-indicações ao transplante são as seguintes: - PIC elevada associada a danos cerebrais - hipotensão refratária - AIDS (doença) - doença cardiopulmonar avançada. Suporte Hepático Artificial Insuficiência Renal Ocorre em cerca de 50% dos casos de IHAG. É mutifatorial: hipovolemia, necrose tubular aguda, isquemia renal e síndrome hepato-renal. Esta última ocorre principalmente na doença hepática crônica. Devido às dificuldades e complexidade que envolvem o transplante hepático,surgiram opções terapêuticas que podem ser uma “ ponte “ para o transplante. Tais medidas melhoram o metabolismo, as funções de síntese e desintoxicação. www.bjid.com.br 52 · · · · · Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Tais medidas são: Reagudização da HVB (“Frare”) Hemodiálise Plamaferese Sistema de recirculação de adsorventes moleculares Perfusão extra-corpórea com hepatócitos humanos ou porcinos Transplante de hepatócitos Representa uma exacerbação aguda da infecção crônica pelo VHB. È definido como elevação abrupta dos níveis de ALT, pelo menos 3x os limites basais, associado a altos níveis de HBV-DNA. Pode levar à IHAG e morte. Pode ser espontânea ou após retirada do tratamento farmacológico da HVB crônica, como acontece na IHAG pela HVB. Os casos de reagudização espontânea ocorrem mais freqüentemente com pacientes HBeAg positivos, precedendo a negativação do HBeAg. Nos pacientes HBeAg negativos, a exacerbação aguda está associada ao aumento da replicação viral, e geralmente relacionada à reativação do HBeAg. Nos casos ocorridos após a retirada de interferom, a reagudização pode ser fator preditivo independente de resposta virológica sustentada em pacientes com altos níveis de HBV-DNA no pré-tratamento (acima de 100pg/mL)., segundo Estudo de Nair e Perrillo. Nos casos de flare após retirada do tratamento com lamivudina, segundo Estudo de Honkoop e col., a reintrodução de lamivudina, nos pacientes que apresentaram icterícia, mostrou benefício. IHAG pelo VHB (Vírus da Hepatite B) É a principal causa de IHAG em algumas regiões do mundo.O quadro clínico da IHAG na infecção aguda é idêntico aos casos de infecção crônica pelo VHB, portadores crônicos do HBsAg. Na infecção crônica, a IHAG ocorre nas seguintes situações: - reativação da doença crônica - perda espontânea do HBeAg com soroconversão para antiHbe - associação da HVB a outras infecções agudas: HVA, HVC, HVD. Na IHAG pelo VHB ocorre resposta imune exacerbada, levando a rápida eliminação do VHB, desencadeando necrose hepática maciça. Os pacientes com HVB crônica que apresentam maior risco de desenvolver IHAG são aqueles que evoluem com reativação grave da doença, que pode ser após a retirada do tratamento farmacológico (interferon ou anti-virais). Ocorre também naqueles pacientes com doença avançada. Diagnóstico Na HVB fulminante, ocorre rápido clareamento viral, dificultando o diagnóstico etiológico. Nos casos de HVB aguda,encontra-se altos níveis de anti-HBc IgM. Os outros marcadores sorológicos, como HBsAg e HBeAg, geralmente estão negativos. Nestes casos, encontramos apenas o HBVDNA no sangue ou no tecido hepático, pela técnica de PCR (reação de cadeia de polimerase). Os níveis de HBV-DNA podem ser baixos ou indetectáveis, devido à ausência de hepatócitos viáveis que possam sustentar a replicação viral. Nestes casos, estamos diante da infecção oculta pelo VHB. Tratamento com Lamiduvida na Descompensação Hepática Num Estudo, Chien et al. mostrou que o tratamento com lamivudina da reagudização de HVB, nos pacientes com níveis de bilirrubina (Bb) pré-tratamento < 20mg/dL,pode evitar a fatalidade.naqueles pacientes com níveis de Bb pré-tramento acima de 20mg/dL, o tratamento com lamivudina não mostrou benefício. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. Rahman T., Hodgson H.Clinical management of acute hepatic failure.Intensive Care Med 2001;27:467-76. Hepatology 2000;32:734-9. Hepatology 2000;32:635-9. Hepatology 2001;34:1021-6. Hepatology 2001; 33:972-6. Journal of Hepatology 2003; 38:322-7. Journal of Hepatology 2003;38:91-7. Tratado de Hepatites Virais. Roberto Focaccia, 2003. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 53 Terapia da Hepatite B Crônica: Como e Quando? Pacientes Virgens de Terapia Evaldo Stanislau Affonso de Araújo1, Antônio Alci Barone2 Assistente-Doutor da Divisão de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do HC-FMUSP, Médico do Ambulatório e Laboratório de Hepatites/LIM 47 DMIP-HC-FMUSP; 2Professor Titular da Disciplina de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da FMUSP, Chefe da Divisão de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do HC-FMUSP e do Ambulatório e Laboratório de Hepatites/LIM 47 do DMIP HC-FMUSP 1 O Vírus da Hepatite B (VHB) possuí duas formas clinicamente relevantes, selvagem e mutante (pré-core, corepromoter e induzidas pela terapia). Após a infecção, 3 a 5% dos adultos e até 95% das crianças infectadas vão se tornar portadores crônicos do VHB e, portanto, potenciais candidatos à terapia. A hepatite B crônica caracteriza-se pela positividade do HBsAg por mais de seis meses, HBV-DNA sérico >20.000 UI/mL, ALT/AST persistente ou transitoriamente elevadas e uma biópsia hepática evidenciando hepatite crônica.De forma prática, os candidatos à terapia podem ser alocados no subgrupo Hepatite B crônica HBeAg positivo (HBeAg+ e Anti HBe -) e HBeAg negativo (HBeAg- e AntiHBe+). Esse subgrupo pode, ainda, se dividir em HBeAg negativo com ALT normal (carreador inativo do HBsAg) e HBeAg negativo com ALT alterada, onde temos as formas mutantes. Tanto o HBeAg, quanto o HBV-DNA, se correlacionam com replicação viral que, por sua vez, se associa com a progressão da doença. Portanto, a razão da terapia é impedir a progressão da doença pela soroconversão HBeAg+ para HBeAg- e a redução do HBV DNA . Terapia da Hepatite B Crônica O principal objetivo da terapia, como já referido, é reduzir, e manter baixo, ao menor nível possível, o HBV DNA. Por conseguinte, obtém-se a melhora histológica e a normalização da ALT. Nos pacientes HBeAg+, a reversão para negatividade é ainda mais desejada pois, quando ocorre, está associada a um benefício duradouro que se mantém após o término da terapia. A perda do HBsAg é um objetivo raramente atingido. Um critério a se considerar ao definir o tipo de terapia é a análise da epidemiologia da população em questão. Em um paciente com aquisição perinatal – comum em asiáticos – há um padrão de tolerância imune caracterizado por persistência do HBeAg, ALT pouco elevada ou normal e HBV DNA elevado. Alguns podem desenvolver, após décadas, algum grau de resposta, com elevações persistentes ou intermitentes de ALT e negativação do HBeAg, sem no entanto, reduzir o risco de desenvolver uma forma crônica HBeAg-. Um segundo padrão é caracterizado pela transmissão na infância, pelo convívio social – padrão Mediterrâneo, Africano. As crianças apresentam HBeAg+ com ALT elevada e eventual soroconversão na adolescência. Finalmente, um terceiro padrão – ocidental – caracteriza-se pela aquisição na vida adulta e elevados níveis de ALT e HBV DNA, refletindo uma resposta imune vigorosa, baixo risco de cronicidade e melhor resposta à terapia. Embora nem sempre fidedignos e correlacionados com o grau de lesão hepatocítica, também devemos considerar os níveis de ALT/AST (em conjunto com o nível de HBV DNA e a idade) ao definir pela terapia. ALT elevada constituí-se num preditor de resposta sorológica (perda ou conversão do HBeAg). Pacientes com ALT normal porém, com HBV DNA ≥ 104 UI/mL, em particular se maiores que 35 a 40 anos, devem ser submetidos a uma biópsia hepática e avaliar o grau de fibrose e atividade inflamatória presente. Se houver lesão significativa, merecem tratamento. HBV DNA ≥ 104 UI/mL e ALT elevada, independentemente da biópsia, merecem terapia. Vale ressaltar que o limite superior do normal para ALT deve ser mais baixo que os estabelecidos por várias instituições. Assim valores de 30 UI/mL para homens e 19 UI/mL para mulheres são recomendáveis quando se avalia a indicação de terapia [1]. O nível de HBV DNA relevante deve ser discutido e considerado. Sabemos que existem flutuações do HBV DNA ao longo do tempo, porém, o limite de HBV DNA associado com a progressão da doença é desconhecido - e níveis abaixo de 20.000 UI/mL podem representar níveis elevados de cccDNA e HBV DNA intra-hepático, bem como manter o risco de progressão para o CHC. Há uma correlação direta dos níveis de HBV DNA – e sua alteração – com marcadores de atividade da doença (estadiamento histológico, resposta sorológica e bioquímica). Pacientes HBeAg+ tendem a possuir maiores níveis de HBV DNA (105 a 108 cp/mL) que pacientes HBeAge,devido as flutuações, pacientes HBeAg- com ALT normal, deveriam ser monitorados seriadamente para diferenciá-los entre carreadores sadios ou portadores de hepatite crônica HBeAg-. A fim de padronizar as medidas, os resultados devem ser expressos em UI/mL, sendo que cada UI equivale a, aproximadamente, 5 cópias (5,6 cópias). Assim, um resultado em cópias/mL deve ser dividido por 5 para sua conversão em UI/mL. Finalmente, o genótipo viral pode influenciar na decisão da terapia. Dados preliminares sugerem que os genótipos A e B possuem maiores taxas de resposta ao Interferon, em particular a soroconversão HBeAg do genótipo A após terapia com Interferon peguilado alfa 2a e maior taxa de perda do HBeAg após o uso do Interferon peguilado alfa 2b nos www.bjid.com.br 54 Sociedade Brasileira de Infectologia genótipos A e B. Os antivirais aparentemente não são influenciados pelos genótipos. A utilização rotineira da genotipagem nos parece ainda uma recomendação prematura. Estabelecidas as questões epidemiológicas, bioquímicas e virológicas, os esquemas propostos para a terapia, considerando as drogas licenciadas, encontram-se resumidos nas Tabelas 1 a 3 e no Fluxograma 1. Tabela 1. Pacientes HBeAg positivos [adaptado 1] HBV DNA ALT Normal Normal ≥ 20.000 UI/mL Elevada Monitorar a cada 6-12 meses* Considerar terapia baseado em biópsia** Terapia *** * No primeiro ano a cada 3 meses. ** Biópsia principalmente em pacientes com mais de 35-40 anos. Se terapia: Interferon ou PegInterferon. Pacientes com carga viral elevada preferir Adefovir ou Entecavir. *** Interferon ou PegInterferon. Pacientes com carga viral elevada preferir Adefovir ou Entecavir. Tabela 2. Pacientes HBeAg negativos [adaptado 1] ALT Recomendação Terapêutica < 20.000 UI/mL Normal ≥ 20.000 UI/mL Normal ≥ 20.000 UI/mL Elevada Monitorar a cada 6-12 meses* (carreador inativo) Biópsia para definir terapia ou monitorar ALT** Terapia *** * No primeiro ano a cada 3 meses. ** Se terapia: PegInterferon ou Entecavir, ou Adefovir. ***PegInterferon, ou Entecavir ou Adefovir. Tabela 3. Pacientes cirróticos [adaptado 1] HBeAg +/+/+/- HBV DNA < 2.000 UI/mL Entecavir. Outras drogas estão em desenvolvimento (Emtricitabina, Tenofovir, Telbivudina, Clevudina) ou podem ser utilizadas em situações de co-infecção com o HIV, quando serão discutidas [3-8]. A associação do Interferon Peguilado alfa-2b com a Lamivudina não foi superior à monoterapia com Peguilado [9], razão pela qual a associação não é considerada uma opção na terapia dos virgens de tratamento. A Tabela 4 faz uma comparação entre os diferentes medicamentos aprovados para terapia da Hepatite B. Recomendação Terapêutica < 20.000 UI/mL ≥ 20.000 UI/mL HBV DNA BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Cirrose Recomendação Terapêutica C* Monitorar ou tratar (Adefovir ou Entecavir) ≥ 2.000 UI/mL C Adefovir ou Entecavir Qualquer Em lista Associação Lamivudina + detecção (Tx) Adefovir (ou Entecavir) * C=compensada. Pacientes com mau e bom perfil são definidos de forma algo subjetiva, sendo os de mau perfil os cirróticos, mais idosos, portadores de co-morbidades e alta carga viral. Existem atualmente cinco drogas aprovadas para a terapia da Hepatite B crônica em pacientes monoinfectados pelo VHB [2]. São elas o Interferon alfa, o Interferon Peguilado alfa 2a e os antivirais Lamivudina, Adefovir e Prevenção da Resistência aos Antivirais A utilização de antivirais possuí como conseqüência o potencial aparecimento de resistência ao VHB, conforme demonstrado na Tabela 5. A caracterização da resistência se dá pelo incremento do DNA do VHB – 1 log10 em relação ao nadir obtido – caracterizando o breakthrough virológico, seguida da elevação da ALT (breakthrough bioquímico) e, eventualmente, da reversão dos benefícios histológicos e progressão e/ou exacerbações da doença hepática. As mutações associadas à terapia podem ser diagnosticadas de forma genotípica ou fenotípica, sendo identificadas mutações na polimerase ou transcriptase reversa viral [1,10]. As principais, são: YMDD (polimerase): mutação da polimerase viral com alteração do sítio de atividade, conferindo resistência a certos antivirais. Induzida por pressão seletiva de análogos nucleosídeos (p.ex. Lamivudina, Emtricitabina). Transcriptase reversa: A181V/T e/ou N236T – confere resistência ao Adefovir; I169, T184, S202, M250 – confere resistência fenotípica ao Entecavir em pacientes previamente expostos a Lamivudina e resistentes à mesma. A prevenção da resistência se dá pela utilização de agentes potentes com uma elevada barreira genética a resistência, alteração do esquema se a resposta precoce for inadequada, evitando-se monoterapia seqüencial e com a associação de compostos, promissora, se não como sinergia, potencialmente como estratégia para evitar a resistência. O aparecimento da resistência pode ser avaliado precocemente pelo tipo de resposta virológica precoce. Assim uma queda da carga viral nos primeiros seis meses de terapia maior que 4 log10 se associa, habitualmente, como boa resposta e pequena chance de aparecimento de resistência ao término de um ano, como demonstrado, p.ex., com a Telbivudina, mas aplicáveis aos demais antivirais [11]. A resistência viral é um tema que será objeto de discussão no próximo capítulo. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 55 Fluxograma 1. Esquema terapêutico a partir do status do HBeAg [3,6] HBeAg Positivo Bom Perfil Negativo PegIFN Entecavir(1) Adefovir(2) Mau Perfil IFN PegIFN Adefovir Entecavir Tabela 4. Comparação entre os medicamentos aprovados para terapia da Hepatite B [adaptado 1] IFN (vs. não-terapia) 12-24S PegIFNa2a (vs. Lamivudina) 48 sem Lamivudina (vs. placebo) 52 sem Adefovir (vs. placebo) 48S Entecavir (vs. Lamivudina) 48S Perda HBV DNA Perda HBeAg 37%(17%) 33%(12%) 25%(40%) 30%(22%) S48 34%(21%) S72 44%(16%) 32%(11%) 67%(36%) 22%(20%) Soroconversão HBeAg 18% 27%(20%) S48 32%(19%) S72 16-18%(4-6%) 50% com 5 anos 23% Sem dado Não 39%(62%) 38%(34%) S72 Não 41-72%(7-24%) 49-56%(23-25%) 14% a 65% 5 anos 21%(0) 24%(11%) 46% S96 53% S144 12%(6%) 33%S96 46%S144 48%(16%) 53%(25%) 0%1ano, Parâmetro Normalização ALT Melhora histológica Resistência Durabilidade da soroconversão Terapia tempo-finito Tolerância Posologia Via de administração 21%(18%) 68%(60%) 72%(62%) 0% anos 1 e 2 2% 2 anos, 15% 4 anos 91% na semana 55 82% na semana 24 80-90% em 5 anos Não disponível 77% aos 37 meses Sim Efeitos adversos 5M/dia ou 10M/TIW por 16 semanas SC Sim Efeitos adversos 180 mcg/sem 48 semanas ? Boa 100 mg dia ? Boa 10 mg dia ? Boa 0.5 mg dia SC VO VO VO Tabela 5. Aparecimento de resistência aos antivirais [adaptado 1] Medicamento Lamivudina Adefovir Entecavir (virgem LAM) Entecavir (LAM prévia) Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 24% 0% 0% 7% 42% 3% 0% 9% 53% 11% ND ND 70% 18% ND ND ND 29% ND ND www.bjid.com.br 56 Sociedade Brasileira de Infectologia Referências Bibliográficas 1. Keeffe E.B., Dieterich D.T., Han S.-H.B., et al. A treatment algorithm for the management of chronic hepatitis B virus infection in the United States: an update. Clinical Gastroenterology and Hepatology 2006;4(8):1-22. 2. Hoofnagle J.H. Hepatitis B – Preventable and now treatable. The New England J of Medicine 2006;354:1074-6. 3. Craxi A., Antonucci G., Cammà. Treatment options in HBV. J of Hepatology 2006;44:S77-S83. 4. Dienstag J.L. Looking to the future: New agents for chronic hepatitis B. American J Gastroenterology 2006;101:S19-S25. 5. Jacobsen I.M. Therapeutic options for chronic hepatitis B: considerations and controversies. American J Gastroenterology 2006;101:S13-S8. 6. Osborn M.K., Lok A.S.F. Antiviral options for the treatment of chronic hepatitis B. Journal of Antimicrobial Chemotherapy 2006;57:1030-4. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) 7. Saag M.S. Emtricitabine, a new antiretroviral agent with activity against HIV and Hepatitis B Virus. Clinical Infectious Diseases 2006;42:126-31. 8. Wong S.N., Lok A.S.F. Tenofovir Disoproxil Fumarate: role in hepatitis B treatment. Hepatology 2006;44:30911. 9. Janssen H.L.A., van Zonneveld M., Senturk H., et al. Pegylated interferon alfa-2b alone or in combination with lamivudine for HbeAg-positive chronic hepatitis B: a randomised trial. Lancet 2005;365:123-9. 10. Locarnini S., Mason W.S. Cellular and virological mechanisms of HBV drug resistance. J of Hepatology 2006;44:422-31. 11. Zeuzem S., Lai C.L., Gane E., et al. Optimal Virologic and Clinical efficacy at one year is associated with maximal early HBV supression in nucleoside-treated hepatitis B patients. 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Os principais guidelines são o da American Association of Study of Liver Diseases-AASLD [1], o da Conferência do National Institutes of Health [2], o Algoritmo Americano [3] , o Consenso da European Association of Study of Liver -EASL[4] e o Consenso da Asian Pacific Association of Study of Liver- APASL [5]. Dada o recente registro de novas drogas para tratamento da HVB, como o entecavir, por exemplo o algoritmo de tratamento dos EUA foi recentemente revisado pelos autores [6] (Tabela 1). De maneira geral todos os guidelines preconizam que devem estar presentes uma combinação de alterações laboratoriais bioquímicas (nível de ALT), sorológicas (presença ou ausência do HBeAg), moleculares (positividade e nível plasmático do DNA-VHB) e histopatológicas(grau das alterações necro-inflamatórias, estágio de fibrose e presença ou ausência de cirrose). Na Tabela 2 estão sumarizadas as recomendações básicas para uma adequada abordagem terapêutica inicial dos pacientes com hepatite B [1,7]. Como se nota a presença ou ausência do HBeAg e os níveis de ALT têm um papel fundamental na indicação terapêutica inicial. Talvez mais do que em outras doenças , na hepatite B crônica , é muito importante nesta abordagem terapêutica inicial definir a droga a ser utilizada (imunomodulador ou antiviral), o tempo de terapia, que pode sere finito ou infinito e estabelecer um adequado follow-up buscando manter o paciente sob controle e identificar possiveis complicações de longo prazo como o carcinoma hepatocelular , por exemplo. Diferentemente dos níveis de ALT e da presença ou ausência do HBeAg , ainda existe muita controvérsia sobre o real significado prático da pesquisa do DNA-VHB para guiar a terapêutica. Os guidelines existentes apontam diferentes níveis do DNA-VHB, por diferente métodos moleculares que seriam indicativos de início de terapêutica. Para pacientes HBeAg positivos este cut-off deveria ser de 105 cópias/mL e para pacientes HBeAg (-) de 104 cópias/mL [3]. Segundo outros este cut-off deveria ser de 4-5 log10 [7]. Revisão bastante recente considera que para pacientes HBeAg positivos este corte seria da ordem de 20.000 UI/mL [6]. Estes autores consideram que 1 UI/mL seria aproximadamente = 5,6 cópias/mL. O significado das flutuações dos níveis do DNA-VHB, ao longo do tempo, seja em pacientes evoluindo naturalmente ou em pacientes recebendo terapia específica, também tem sido bastante discutido.A relação entre níveis séricos do DNAVHB e desenvolvimento de hepatocarcinoma foi avaliada em um estudo recentemente publicado [9]. Neste estudo, realizado em Taiwan, de base populacional, prospectivo, foram seguidos 3653 pacientes HBsAg (+) por longo tempo. Ao final, observouse que elevadas concentrações séricas do DNA-VHB (≥ 10 000 cópias/mL) são preditivas de carcinoma hepatocelular, independentemente do HBeAg, da ALT sérica e da presença de cirrose hepática.Estudos realizados no Senegal também observaram um maior risco do desenvolvimento de carcinoma hepatocelular entre portadores do VHB com altos níveis séricos do DNA-VHB [10]. Baseados nisto, alguns autores começam a colocar em discussão a possibilidade de tratar-se pacientes com DNA-VHB elevado no soro, mesmo que não se acompanhe de elevações de ALT. Por outro lado , as críticas ao amplo estudo de Taiwan dizem respeito à metodologia empregada, pois, não houve um seguimento da carga viral do VHB nos pacientes ao longo do tempo, mas sim, apenas, uma medida basal inicial [9]. Além disto , com o perfil de resistência das drogas atualmente disponíveis (antivirais), na verdade, seriam utlizadas terapias sequenciais que atuando na mesma enzima, facilitariam a emergência de cepas resistentes em curtomédio espaço de tempo.Consideramos, portanto que no momento, pacientes que apresentam apenas elevações séricas do DNA-VHB não devem receber terapêutica até que disponhamos de outros agentes que associados aos atuais possam realmente manter uma supressão prolongada do DNAVHB no sentido de diminuir-se a evolução para o carcinoma hepatocelular. Na prática clínica , muitas vezes, os pacientes apresentam peculiaridades que devem ser cuidadosamente avaliadas para decidir-se sobre o início , a manutenção , a substituição ou a combinação dos antivirais.Em suma, devem ser tratados: 1. Todos os pacientes com aumentos de ALT > 2 x LSN; 2. Em pacientes maiores de 35 anos, com doença antiga, com altos níveis séricos da ALT(>104 UI/mL) a biópsia hepática www.bjid.com.br 58 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Tabela 1. Principais guidelines internacionais para o tratamento da hepatite B Guideline Ano AASLD (EUA) Conferência do NIH Algoritmo EUA EASL (Europa) APASL (Ásia) Autores 2001/2004 2000/2001 2004/2006 2003 2003 Lok ASF & MacMahon BJ Lok ASF et al. Keeffe EB et al. de Franchis R et al. Liaw YF et al. Referências 1 2 3/ 6 4 5 Tabela 2. Recomendações para tratamento inicial dos pacientes HBeAg (+) (adaptado das referências 6 e 7) HBeAg Positivo Positivo Negativo Negativo Cirrose compensada HBeAg (+) ou (-) Cirrose compensada HBeAg (+) ou (-) Cirrose descompensada HBeAg (+) ou (-) DNA-VHB > 5 log10 (UI/mL)* ALT** Positivo Positivo Negativo Positivo < 2 000 UI/mL* = 2 x LSN > 2 x LSN ≤ 2 x LSN > 2 x LSN - ≥ 2 000 UI/mL - < 200 - Recomendações Não tratar/ monitorar ALT e DNA-VHB a cada 3-6 meses Tratar (IFNs- ADV-ETV)# LAM ? Não tratar/ monitorar ALT e DNA-VHB a cada 6-12 meses Tratar (IFNs- ADV-ETV)*** Tratar ou observar Preferir ADV ou ETV Tratar (ADV ou ETV) Considerar terapia combinada Tratar (LAM ou ETV +ADV) Referir para Tx hepático * 1 UI/mL ≈ 5,6 cópias/mL. **LSN=Limite Superior da Normalidade. *** Lamivudina não deve ser considerada dado o longo tempo de terapia para pacientes HBeAg(-). #IFNs = interferon convencional ou peguilado; ADV= adefovir dipivoxil; ETV=entecavir; LAM=lamivudina 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. deve ser considerada e se houver doença hepática (fibrose estagio ≥ 2 ou necro-inflamação significante) os mesmos devem ser tratados; Pacientes que em um dado momento apresentarem ALT normal devem ser monitorados para detectar elevações da mesma e serem então convenientemente tratados; Pacientes que apresentarem flutuações dos níveis de ALT e do DNA-VHB no seguimento, devem realizar biópsia hepática, sendo indicado tratar os que apresentarem inflamação moderada/intensa e/ou os que apresentarem fibrose em ponte ou cirrose; O entecavir e o adefovir apresentam melhores perfis de resistência e devem ser preferidos à lamivudina para terapêutica de longo prazo ou prazo indefinido; A terapia combinada de lamivudine ou entecavir com o adefovir teria o benefício de reduzir o desenvolvimento de resistência à ambas as drogas; Pacientes com cirrose não devem receber tratamento com interferon convencional ou peguilado; Pacientes com cirrose compensada mesmo com pequenas elevações do DNA-VHB (≥ 2 000 UI/mL) devem ser tratados, cabendo ao médico a decisão de tratar ou apenas monitorar os pacientes com DNA-VHB < 2 000 UI/mL; Todos os pacientes com cirrose descompensda devem ser tratados mesmo que apresentem ALT normal ou DNAVHB muito baixo; 10. O tempo de tratamento dos cirróticos é longo e totalmente indefinido. Quem Seriam os Pacientes Experenciados que Deveriam ser Tratados ou Tetratados? Se convenientemente abordados no tratamento inicial a terapêutica substitutiva , combinada ou sequencial se justificaria nos não-respondedores aos inteferons, nos não respondedores aos antivirais e nos que desenvolvem resistência aos antivirais inicialmente prescritos. A abordagem a ser discutida aqui é eminentemente clínica , dadas as dificuldades e a total ausência de testes específicos , no momento, em nosso meio e na maioria dos países que sejam rotineiramente utilizados para a tomada de decisões. Na Tabela 3 estão colocados os principais resultados comparando as drogas aprovadas patra o tratamento da HVB crônica em pacientes HBeAg positivos. Como a maioria dos pacientes , em nossso meio, foram ou estão sendo tratados com interferon convencional , lamivudina ou adefovir abordaremos as opções terapêuticas dos pacientes não respondedores ou resistentes a estes medicamentos. Quando um paciente recebe tratamento com interferon convencional ou peguilado e não apresenta resposta terapêutica deve ser retratado com os antivirais. A escolha deve ser baseada em algumas propriedades como: www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 59 Tabela 3. Resultados da terapia com os interferons e antivirais nos pacientes HBeAg(+). (adaptado da referência 6) Parâmetros Perda do DNA-VHB Redução do DNA-VHB Perda do HBeAg IFN 12-24 semanas PEG-IFN α-2a 48 semanas Lamivudina 52 semanas Adefovir 48 semanas Entecavir 48 semanas 37% - 25% 4,5 log10 44% - 21% 3.52 log10 67% 6,9 log10 33% 30% (48 sem) 34% (72 sem) 32% 22% 21% Soroconversão do HBeAg 18% 27% (48 sem) 32% (sem 72) 16-18% 50% (5anos) Perda do HBsAg 11-25% (5 anos) 23% 3% (sem 72) - 24% 46% (sem 96) 53% (sem144) 12% 33% (sem 96) 46% (sem 144) - 39% 41-72% 48% 68% não 38%(sem72) não 49-56% 14% 69%(5 anos) 53% 0%(1 ano) 2%(2 anos) 15%(4 anos) 72% 0%(2 anos)* Duração da soroconversão do HBeAg 80-90% (4-8 anos) - 77%(3anos) Tempo de tratamento definido Doses sim sim ? 91% (55 semanas) ? 82% (semana 24) ? 10 MU 3x sem 16-24 semanas 180 mcg/ sem 48 semanas 100 mg 10 mg 0,5 mg Normalização da ALT Melhora histológica Desenvolvimento de resistência 2% Tabela 4. Incidência de resistência do VHB aos antivirais de acordo com o tempo de tratamento (adaptado da referência 6) Drogas Lamivudinaa Adefovirb Entecavir Pacientes virgens de tratamentoc Entecavir Pacientes resistentes à lamivudinac Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 24% 0% 42% 3% 53% 11% 70% 18% 29% 0% 0% ? ? ? 7% 9% - - - (a)Liaw Y.F., et al.Gastroenterology 2000;119:172-80. (b)Hadziyannis S., et al. Hepatology 2005;42:754A. (c) Colonno R., et al. Hepatology 2005;42:573-4A. 1. a atividade antiviral do composto; 2. a capacidade do mesmo em promover a negativação e/ou a soroconversão do HBeAg (pacientes HBeAg positivos); 3. a capacidade em promover a negativação ou diminuir os níveis do DNA-VHB (pacientes HBeAg positivos/ negativos); 4. a capacidade de promover a negativação do HBsAg com a consequente positivação do anti-HBsAg; 5. a capacidade de normalizar a ALT e promover a melhora histológica. Além destas características deve-se buscar drogas que se associem a um menor desenvolvimento de resistência. As drogas devem , ainda, serem capazes de induzir uma resposta terapêutica durável e, se possíivel , apresentarem tempo de tratamento definido e de preferência serem de baixo custo. É claro que esta droga ideal não existe na atualidade. A Tabela 3 permite conhecer as qualidades e limitações dos medicamentos disponíveis. Nota-se que os interferons , embora tenham tempo de tratamento definido,são capazes de promover 25-37% de soroconversão. Os que não alcançam a soroconversão para o www.bjid.com.br 60 Sociedade Brasileira de Infectologia anti-HBeAg (maioria) devem ser retratados com os antivirais atualmente registrados. Para pacientes com hepatite B e que são HBeAg negativos algumas considerações são importantes. Diferentemente do que ocorre com os pacientes HbeAg (+), para os pacientes HBeAg negativos não estão bem definidos os end-points do tratamento.A soroconversão para o anti-HBeAg ,por exemplo , não pode ser utilizada pela negatividade do HBeAg nestes pacientes. Inicialmente há uma boa reposta com queda da carga viral (cerca de 50% dos pacientes), com o DNA-VHB tornando-se indetectável e com normalização dos níveis da ALT sérica. A ocorrência de recaídas, no entanto, é bastante freqüente ao interromper-se a terapêutica após um ano (7090% dos casos). Por isto, nestes pacientes, são necessários tratamentos longos, talvez pela vida toda. A positividade do HBsAg deve ser monitorizada anualmente quando se usa lamivudina, adefovir ou entecavir e ao final da terapêutica quando se utiliza alguma das formulações do interferon. A terapia será suspensa nos pacientes que negativarem o HBsAg. O tempo de terapia com o interferon convencional tem variado de 6-12 meses, com alguns pesquisadores recomendando aumentar este período para cerca de 1-2 anos, no mínimo. Não existem avaliações objetivas sobre estes intervalos. A toxicidade e os efeitos colaterais são as maiores dificuldades encontradas para levar-se a cabo estas recomendações. Neste contexto, ganha força a opção pelos nucleosídeos/nucleotídeos análogos. A opção pela lamivudine, que até pouco tempo atrás, era a única possibilidade traz consigo o problema do desenvolvimento de resistência do tipo YMDD que chega a 50% após 3 anos de tratamento. Este é um problema sério porque os pacientes HBeAg (-) necessitam vários anos de tratamento. O adefovir dipivoxil se associa à menores taxas de resistência genotípica (3% após 2 anos) e por isto tornou-se uma melhor opção que a lamivudine para pacientes HBeAg (-). Em relação ao entecavir, que é a mais nova opção terapêutica para pacientes com HVB, não foi observado o desenvolvimento de resistência viral até 96 semanas em pacientes naives [11]. No entanto, cerca de 9 % de casos que já eram lamivudine-resistentes mostraram mutações virais capazes de conferir resistência genotípica ao entecavir. Estes aspectos devem ser considerado quando se decide utilizar lamivudine em pacientes com HVB, particularmente nos casos HBeAg (-) que, via de regra, vão ser tratados por longos períodos aumentando o risco de mutações de resistência A Abordagem da Resistência Antiviral O desenvolvimento de resistência se associa com a perda da resposta inicialmente obtida. Do ponto de vista clínico observa-se : aumento do DNA-VHB , aumento da ALT sérica, eventual reversão da melhora hepática obtida e ocorrência de descompensação hepática principalmente nos cirróticos. A BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) doença progredindo pode produzir “flares” intensos de ALT. A resistência genotípica se caracteriza pela detecção de mutações na polimerase do VHB, através do sequenciamento dos produtos da PCR. O breakthrough virológico se caracteriza por uma elevação no DNA-VHB sérico > 1 log10 em pacientes sob terapêutica contínua. O breakthrough bioquímico (flares) se caracteriza por uma nova elevação de ALT em pacientes sob tratamento que haviam obtido normalização da mesma. A resistência fenotípica é confirmada por ensaios baseados em culturas de células ou ensaios enzimáticos não utilizados rotineiramente [6]. Para evitar-se a resistência antiviral deve-se utilizar agentes com alta barreira genética para resistência e modificar-se a terapia se a inicialmente prescrita for sub-ótima. Considera-se que os pacientes que não obtiverem resposta após 12-24 semanas (negativação do DNA-VHB) devem receber uma nova droga, isolada ou associada à anterior [6].Deve-se evitar a monoterapia sequencial e buscar-se usar terapias combinadas tanto quando possivel. A resistência à lamivudina é a mais bem estudada (Tabela 4). Costuma ocorrer em todos os pacientes com o passar do tempo e é particularrmente grave nos cirróticos. Desenvolvese já no primeiro ano e progride rapidamente com a continuidade do tratamento chegando a ser de 70% por volta do quarto ano. Clinicamente ocorre elevação da ALT e do DNA-VHB nos pacientes que estão recebendo a droga.O sequenciamento detecta as mutações de resistência genotípica (mais comum é a YMDD). Sabe-se que sómente 8% dos pacientes que obtém supressão do DNA-VHB, para níveis menores que 200 cópias/mL após 24 semanas de terapêutica, desenvolvem resistência à lamivudina comparado com 13% dos pacientes cuja carga viral decresce para 200-1000 cópias/ mL. A taxa de resistência aumenta para 32% para aqueles cujo DNA-VHB fica entre 1000-10000 cópias/mL. Observa-se mais de 64% de resistência à lamivudina nos pacientes com DNAVHB > 104 cópias/mL após 24 semanas de tratamento [12]. Pacientes com resistência à lamivudina podem apresentar “ flares” de ALT mais intensos e um aumento na morbidade e descompensações hepáticas após 4 anos de tratamento continuado com a droga. A fibrose hepática , por sua vez, tende a se acentuar com o tempo de duração da resistência à lamivudina, embora possa ocorrer soroconversão para o antiHBeAg numa taxa menor do que a observada nos pacientes sem resistência [13-16]. O adefovir tem-se mostrado efetivo em suprimir a replicação do DNA-VHB (DNA-VHB < 1000 cópias/mL) em 79% dos pacientes com hepatite B crônica, HBeAg negativa tratados por 144 semanas [17]. Mutações de resistência genotípica ao adefovir desenvolvem-se mais lentamente que as da lamivudina, atingindo 3% ao redor do segundo ano (Tabela 4). Em pacientes tratados com adefovir e que apresentaram queda do DNA-VHB, para níveis <103 log10 cópias/mL, na www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) semana 48 de terapia , observou-se 4% de resistência na semana 144. Este baixo porcentual de resistência sobe para 26% nos pacientes cuja carga viral na semana 48 permaneceu entre 10 3 -106 log10 cópias/mL [18]. O adefovir tem se mostrado uma droga muito útil parara tratar pacientes com resistência à lamivudina. O uso sequencial destes agentes, no entanto, poderia levar a resistência à ambos. Dados recentes indicam que a combinação de lamivudina e adefovir se associa a menor desenvolvimento de resistência a ambas as drogas [6,19-21].Além disto, a adição do ADV à LAM se associa com uma significante supressão nos níveis de DNA-VHB nos pacientes com resistência à lamivudina [12]. Resistência ao ADV não tem sido observada em pacientes naives tratados com a combinação de ADV mais emtricitabine ou lamivudina [21,22].Um maior período de observação é necessário para conclusões mais aprofundadas. Em relação ao entecavir, não tem sido detectada resistência em pacientes naives tratados por até 96 semanas [6,11]. A resistência ao entecavir, no entanto, tem sido observada em pacientes com resistência prévia à lamivudina que desenvolveram mutações do tipo YMDD (cerca de 9%). A maioria dos rebotes virológicos foi observada em pacientes sob tratamento que não conseguiram reduzir o DNA-VHB para < 104 cópias/mL [11]. Em suma, os pacientes com HVB que desenvolvem resistência à lamivudina devem receber adefovir de preferência combinado à lamivudina. Em estudo recentemente publicado, sobre esta questão, os pacientes com resistência à lamivudina não apresentaram aumentos significativos da ALT sérica quando a mesma foi substituida pelo adefovir ou quando foi a ele combinada em seguimento de um ano [20]. Constatou-se recentemente, em outro estudo que a combinação de adefovir com lamivudina produz uma maior e mais consistente inibição do DNA-VHB sérico do que o adefovir utilizado isoladamente [23]. Assim, pela maior queda da carga viral , considera-se que a terapia combinada é capaz de prevenir ou retardar o desenvolvimento da resistência clínica [6,23] e deve ser fortemente considerada, principalmente nos pacientes cirróticos. Se na resistência à lamivudina ,a opção for pelo uso de entecavir , a lamivudina deve ser descontinuada [6]. No futuro, o tenofovir que atualmente não está registrado para o tratamento da hepatite B, pode ser uma boa opção, combinado ou em substituição à lamivudina. Se ocorrer resistência ao adefovir, este, também, pode ser substituído ou associado à lamivudina. O entecavir poderia substituir o adefovir se não houver resistência prévia à lamivudina. No futuro, o tenofovir pode ser uma boa opção nos resistentes ao adefovir.Resistência ao entecavir pode ser tratada pela combinação ou substituição pelo adefovir ou pelo tenofovir, se este for registrado para o tratamento da hepatite B. 61 Conclusão Finalizando, na HVB crônica devem ser utilizados agentes capazes de suprimir o DNA-VHB para o menor nível possivel, para tentar-se prevenir ou pelo menos retardar a emergência de cepas droga-resistentes.Nos pacientes HBeAg positivos, tratados com antivirais, se houver soroconversão para o anti-HBeAg o tratamento deve ser mantido mais 6 meses e então descontinuado. Se a soroconversão não ocorrer, o tratamento deve ser mantido indefinidamente.Os end-points para descontinuar a terapêutica nos pacientes HBeAg negativos não estão completamente definidos, por isto a terapêutica deve ser continuada indefinidamente. Nestes pacientes,sabe-se que a continuação da terapêutica pode produzir melhora histológica substancial. Na resistência à lamivudina ,quando se optar pela associação com o adefovir, alguns consideram deva a mesma ser mantida por pelo menos 3-6 meses para evitar-se a re-emergência das cepas selvagens que são lamivudina sensíveis. A emergência de resistência aos antivirais na HVB pode se associar a exacerbações da hepatite, descompensação e piora da doença hepática. A criteriosa seleção dos agentes no tratamento inicial e suas substituições ou combinações à posteriori, são fundamentais para evitar ou retardar o desenvolvimento de resistência isolada ou cruzada entre os medicamentos disponíveis. Referências Bibliográficas 1. 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Incidence and predictors of emergence of HBV mutations associated with ADV resistance during 4 years of ADV therapy for patients with chronic HBV. Program and abstracts of the 40 th Annual Meeting of the European Association for the Study of the Liver; April 13-17, 2005;Paris, France. Abstract 36. 19. Locarnini S., et al.Incidence and predictors of emergence of adefovir resistant HBV during 4 years of adefovir dipivoxi (ADV) therapy for patients with chronic hepatitis B. J Hepatol 2005;42:17. 20. Peters M., et al. Adefovir dipivoxil alone or in combination with lamivudine in patients with lamivudine resistance and chronic hepaytitis B. Gastroenterology 2004;126:91-101. 21. Lau G., et al.Randomized, double-blind study comparing ADV plus FTC combination therapy versus ADV alone in HBeAg(+) chronic hepatitis B: efficacy and mechanisms of treatment response. 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Especialista em Hepatologia (Sociedade Brasileira de Hepatologia) Partindo do pressuposto que não existe o estado de portador inativo do vírus da hepatite D (VHD) e que todo paciente com hepatite crônica D deva ser considerado como potencial candidato ao tratamento, o sucesso da terapêutica para a infecção crônica pelo VHD estaria baseado nos seguintes parâmetros: supressão sustentada da replicação do VHD, remissão histológica da doença hepática e melhora do processo clínico. Além do problema da infecção pelo VHD, deve-se levar em consideração o papel do vírus da hepatite B (VHB) na resposta deste tratamento, ou seja, qualquer indicação terapêutica teria que complementar ambos os vírus. Portanto, a negativação do antígeno de superfície do vírus da hepatite B (HBsAg) com soroconversão para o anti-HBs teria um papel importante, imprescindível mesmo, como resultado final do sucesso no tratamento da hepatite crônica D. Tratamento da Hepatite D Aguda O tratamento da hepatite D aguda requer apenas monitorização dos parâmetros clínicos e bioquímicos de função hepática. Tal monitoramento teria a finalidade de detectar a progressão para hepatite fulminante. Se o paciente evoluir para hepatite fulminante, o transplante hepático é o único tratamento indicado. No tratamento das formas fulminantes de hepatite B e Delta (coinfecção), o Foscarnet (trisodium phosphonoformate) foi administrado com relativo sucesso em três pacientes, todos se recuperaram. Esta droga teria um efeito inibitório na resposta imune e experimentalmente seria capaz de inibir in vitro a síntese do HBV-DNA. Paradoxalmente, estudos in vitro revelaram que o Foscarnet não inibiria a replicação do VHD. É provável que a recuperação dos três pacientes deva ter ocorrido por outros fatores e não pela ação do foscarnet. Interferon alfa 2c recombinante foi administrado em nove pacientes que evoluíram para hepatite fulminante D na Espanha. Oito morreram e o único sobrevivente evoluiu para hepatite crônica D e cirrose hepática, apesar de ter sido prolongado o tratamento com interferon alfa 2c por mais três meses. Tratamento da Hepatite D Crônica Nas formas crônicas de hepatite pelo VHD, a presença do anticorpo da classe IgM contra o VHD (anti-HD IgM) no soro estaria associada à replicação viral persistente e à lesão hepática. Quando reativa, a fração anti-HD IgM pode ser utilizada como marcador sorológico na monitorização do tratamento da hepatite crônica D, seja com drogas, como por exemplo o Interferon, ou pós-transplante hepático. A negativação do ácido ribonucléico do vírus da hepatite D (HDV-RNA) e a normalização da ALT ao fim do tratamento seriam consideradas como resposta virológica e bioquímica ao tratamento da hepatite crônica D. Todavia, além da negativação do HDV-RNA e normalização da ALT, a resposta virológica sustentada ao tratamento estaria baseada na regressão da lesão hepática, negativação do HBsAg e soroconversão para antiHBs. Não existe até o presente momento qualquer informação científica sobre a influência dos genótipos do VHD na resposta terapêutica ao Interferon. O Interferon alfa tem sido a única opção viável no tratamento das hepatites crônicas pelo VHD, já que o uso de outras drogas imuossupressoras (corticóide, azatioprina), imunoestimuladoras (levamisole) e antivirais, como a Ribavirina, Famciclovir e Lamivudina apresentou resultados não satisfatórios. Estudos recentes sugerem que a ineficácia da terapêutica com Lamivudina entre pacientes portadores de hepatite crônica D deve-se ao fato da não negativação do HBsAg, apesar da redução da replicação do VHB que a referida droga ocasiona. O VHD apresenta-se biologicamente como o único agente satélite e subviral humano que depende exclusivamente da “função ajuda” provida pelo ácido desoxirribonucléico do VHB (HBV-DNA) e de seu respectivo envelope de proteínas, o HBsAg, para completar o seu ciclo biológico, ou seja, de replicação, de transmissão, de infectividade, de penetração e replicação exclusiva nos hepatócitos. Considerando a rápida progressão da infecção Delta para a forma crônica de hepatite, o único fator preditivo e determinante da resposta ao IFN seria o tempo de duração da infecção por este vírus. Portanto, quanto mais precoce o diagnóstico e o início da terapêutica com o IFN, melhor o valor determinante da resposta. Na tentativa de uma resposta clínica, bioquímica, histológica e virológica à infecção pelo VHD, altas doses de IFN foram utilizadas no tratamento da hepatite crônica Delta. Neste sentido, estudo controlado e realizado com altas doses de Interferon alfa 2a, 9 milhões de unidades internacionais (9 MUI), três vezes por semana, por um período de sete meses, revelou que, apesar dos níveis de aminotransferases apresentarem-se normais durante o seguimento, da não detectação do HDV-RNA e da melhora histológica (redução da necrose periportal), a recaída do processo foi um fato comum após o final do tratamento. www.bjid.com.br 64 Sociedade Brasileira de Infectologia Estudos controlados com uso do Interferon alfa 2a (18 MUI/ diariamente) versus 3 MUI (diariamente) indicaram que, nos pacientes tratados com 18 MUI, ocorreu uma alta freqüência da normalização da ALT (31%), enquanto, nos pacientes que receberam 3MUI, a normalização da ALT foi de apenas 12%. Ao final do tratamento, a diminuição da replicação medida pela presença do HDV-RNA no soro ocorreu em 31% dos pacientes que utilizaram a dosagem de 18 MUI e de 25% no grupo que recebeu 3MUI. Neste estudo, os autores concluem que o uso do Interferon na dosagem de 18 MUI no tratamento da hepatite crônica Delta apresenta apenas benefício transitório. O uso prolongado do Interferon beta, em pacientes não respondedores ao Interferon alfa, demonstrou resultados mais satisfatórios, apesar do número pequeno de pacientes estudados. Neste estudo, foram tratados cinco pacientes com esta droga, na dosagem de 6 MUI e nove pacientes com 9 MUI, 3 x semana, intramuscular, durante 12 meses. Os resultados deste estudo revelaram ao fim do tratamento a normalização das aminotransferases que ocorreu em 7/9 (77,7%) dos pacientes, ao passo que 2 (22%) negativaram a fração anti-HD IgM. Um paciente clareou tanto a infecção pelo VHB como pelo VHD. Não foram observados efeitos colaterais e, segundo os autores, o Interferon beta em altas dosagens e por tempo prolongado seria uma nova opção terapêutica no tratamento da hepatite crônica pelo VHD. Em crianças portadoras de hepatite crônica Delta e tratadas com Interferon alfa, os resultados obtidos não diferem dos resultados encontrados nos adultos, ou seja, independentemente da dosagem utilizada e do tempo de tratamento, a resposta foi transitória, sem benefícios em termos de resposta virológica sustentada ou bioquímica. Em suma, o tratamento da hepatite crônica Delta com altas doses de IFN alfa ou beta, seja em adultos ou em crianças, revelou apenas a normalização das aminotransferases e diminuição da replicação viral durante o tratamento, com recaída após o término do tratamento. Por outro lado, estudos mais atuais revelaram que o uso do Interferon alfa, na dosagem de 9 MUI, 3x semana e por um tempo de 12 meses (esquema standard), comparado com doses de 3 MUI, foi capaz de influenciar a história natural da hepatite crônica Delta, com melhora acentuada dos aspectos clínicos e histopatológicos, apesar da contínua replicação do VHD. O relato científico de um caso na “cura” de uma hepatite crônica Delta, após 12 anos do uso diário do IFN alfa na dosagem de 5 MUI, reforçaria o conceito de que, no tratamento da hepatite crônica pelo VHD, o tempo, o emprego de altas doses e a continuidade do tratamento seria fatores importantíssimos na resolução do processo crônico. Todavia, em razão dos efeitos colaterais desta droga e dos próprios efeitos patogênicos do VHD, a indicação do IFN alfa ou beta em altas doses torna-se limitada na hepatite crônica Delta. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) A literatura e nossa experiência revelam que é notória a exacerbação aguda do VHD em pacientes com diagnóstico de hepatite crônica com alta atividade inflamatória e em fase de cirrotização, quando tratados com altas doses de interferon. Os pacientes apresentam sinais bioquímicos e clínicos de descompensação da função hepática, tais como: elevação acentuada das aminotransfeases, ascite e encefalopatia hepática crônica. A exacerbação aguda do VHD a altas doses de Interferon é observada com maior freqüência entre pacientes que soroconvertem do HBeAg para o anti-HBe durante a vigência do tratamento. Finalmente, contraindicamos o uso do IFN, independentemente da dose, em pacientes com hepatite crônica com alta atividade inflamatória e cirrose hepática estabelecida, mesmo que compensada clinicamente, em razão do risco de exacerbação do processo crônico e falência hepática, sendo o melhor caminho a indicação do transplante hepático. O tratamento da hepatite crônica pelo VHD com Inteferon alfa-2b em pacientes com infecção ou não pelo vírus humano da imunodeficiência (HIV) revelou resultados interessantes. Utilizando doses de 10 MUI 3x semana por seis meses e doses adicionais de 6 MUI 3x semana por mais 6 meses, os autores revelam uma normalização das aminotransferases em 19% dos pacientes infectados pelo HIV e de 14% em pacientes não infectados pelo HIV durante o primeiro ano. Dois anos após a suspensão da terapêutica, um paciente HIV positivo e dois HIV negativo mostraram resposta sustentada, tanto bioquímica, (aminotransferases), como virológica e histológica. Concluem os autores que o Interferon deve ser indicado em pacientes imunocompetentes coinfectados com o VHD e HIV, considerando a rápida evolução do VHD para doença hepática grave. A alternativa de transplante hepático em paciente com doença hepática crônica tipo B e Delta resultou em complicações gravíssimas, inclusive óbitos e reinfecção pelo VHD. A primeira tentativa de transplante hepático em pacientes com cirrose Delta foi realizada na Itália. O transplante de fígado em sete pacientes não foi satisfatório. Destes, dois clarearam o HBsAg e o HDAg, e, durante o seguimento de 14 e 15 meses, comportou-se clinicamente sem maiores alterações. Em cinco pacientes foi constatada a recorrência da infecção pelo VHD com quadro de hepatite em três, um foi a óbito e outro foi submetido a novo transplante, em razão da reinfecção pelo VHD. Neste grupo de sete pacientes, antes do transplante hepático, todos tinham a presença do anticorpo contra o HBsAg (anti-HBs), em função do uso da imunoglobulina antiHBs e da vacina contra o VHB. Concluem os autores que os pacientes transplantados com cirrose Delta facilmente desenvolvem reinfecção pelo VHD. Contrapondo os resultados iniciais observados na Itália, estudos mais recentes e de origem francesa revelaram que o transplante de fígado teria um bom prognóstico entre pacientes cirróticos infectados pelo VHD, com uma sobrevida de cinco www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) anos em 88% dos transplantados, e uma reativação do HBsAg em apenas 13,2% dos pacientes, associada à reativação da infecção pelo VHB + VHD. A tentativa do uso de novas drogas antivirais, como a Lamivudina, no tratamento do pré ou pós-transplante hepático em um paciente infectado cronicamente pelo VHB e VBD (coinfecção), resultou em resposta não satisfatória por decorrência da persistência da infecção Delta (anti-HD IgM reativo), apesar da negativação do HBV-DNA. Mais recentemente, estudos com a Lamivudina em pacientes com hepatite crônica Delta, na dose de 100mg dia, via oral e por um período de 12 meses, indicaram que esta droga é bem tolerada, com negativação do HBV-DNA em 80% dos casos. Porém, todos os pacientes tratados permaneciam positivos para o HBsAg e HDV-RNA ao fim do tratamento, sempre com ALT alterada e sem remissão do quadro histológico. Relatam ainda os autores que após suspensão da terapêutica o HBV-DNA voltou a ser detectado no soro. Finalmente, concluem os autores que a Lamivudina é um potente inibidor da replicação do VHB. Contudo, tal droga não teria qualquer atividade capaz de inibir a replicação do VHD ou impedir a atividade e progressão da doença em pacientes com hepatite crônica delta. Estudos mais recentes revelam que a associação da Lamivudina a altas doses de Inteferon por um período de 16 semanas foi incapaz de erradicar a infecção pelo vírus da hepatite D, apesar do efeito supressor da droga sobre o VHB. Recentemente, Ferenci P. et al. reportaram a manutenção da resposta virológica sustentada em um paciente com hepatite crônica D, utilizando o Interferon peguilado alfa-2a, na dosagem de 180mcg semanal e por um período de seis meses. Antes do tratamento, o HDV-RNA e anti-HD IgM sérico era positivo, enquanto para o VHB, o HBV-DNA e a fração anti- HBcIgM no soro foram negativos. Durante o tratamento e após seis meses do final do tratamento, o HDV-RNA apresentava-se negativo e a ALT encontrava-se normal. Um ano após o início de tratamento, a biópsia hepática revelou “cirrose hepática inativa”. Estudos experimentais com Clevudine, um novo nucleosideo análogo e potente inibidor dos hepadnavirus, revelam que tal droga seria capaz de inibir in vivo a viremia do VHD entre marmotas infectadas cronicamente. Finalmente, o uso do Interferon alfa em altas doses, 9 MUI ou 10 MUI, e utilizado por um longo período, seria o único agente terapêutico disponível com algum efeito benéfico no tratamento da hepatite crônica Delta. Tal droga seria capaz de suprimir a replicação do VHB, favorecendo assim o clareamento do VHD ou sua passagem para a fase não patogênica, como também contribuindo para o aumento da sobrevida dos pacientes e regressão da fibrose hepática. Conclusão O tratamento da hepatite crônica D requer uma atenção maior, em razão da dupla infecção pelos VHB e VHD. A 65 negativação da fração anti-HD IgM (se reativa no início do tratamento), do HDV-RNA e a normalização da ALT ao fim do tratamento seriam os parâmetros virológicos e bioquímicos utilizados na resposta sustentada a terapêutica. Se o paciente negativar o HBsAg com soro conversão para anti-HBs, a “cura virológica” deve ser considerada. O Interferon alfa (910 milhões de unidades, 3 x semana) até o presente momento seria a única droga que teria alguma ação no controle da infecção crônica pelo VHD. Em decorrência das altas doses de Interferon utilizadas e do tempo prolongado de tratamento, esses pacientes necessitam freqüentemente de um seguimento multidisciplinar e de uma monitorização vigilante, principalmente relacionado aos efeitos colaterais desta droga. Um alto e significativo percentual de pacientes com hepatite crônica D não respondem às drogas utilizadas e disponíveis no momento no tratamento da hepatite crônica B. Pacientes infectados pelo VHD e com cirrose hepática estabelecida e descompensada teriam como única opção de sobrevida o transplante hepático. Referências Bibliográficas 1. Rizzetto M., Macagno S., Chiaberge E., et al. Liver transplantation in hepatitis Delta virus disease. Lancet 1987;2:469-71. 2. Hansson B.G., Riesbeck K., Nordnfelt E., et al. Successful treatment of fulminant hepatitis B and Delta coinfection explaned by inhibitory effect on the immune response?. Progress Clinical Biologic Research 1991;364:421-7. 3. Farci P., Mandas A., Coiana A., et al. Treatment of chronic hepatitis D with IFN alpha-2a. New England Journal of Medicine 1994;330:88-94. 4. Garripoli A., Dimarco V., Cozzolongo R., et al. Ribavirin treatment for chronic hepatitis D: A pilot study. Liver 1994;14:154 -7. 5. Madejón M., Cotonat T., Bartolomé J., et al. 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The American Journal of Gastroenterology 2005;100:1626. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 67 Co-Infecção HIV-VHB Marcelo Simão Ferreira1,Roberto Focaccia2, Edgard de Bortholi Santos2, Maria Helena Postal Pavan3 1 Universidade Federal de Uberlândia, 2IIER, 3Unicamp A história natural da hepatite B(VHB) demonstra a evolução para a cronicidade em 5 a 10% dos indivíduos adultos imunocompetentes infectados por este vírus. Já nos pacientes infectados pelo HIV a cronificação desta virose é muito mais freqüente, cerca de 5 x mais, quando comparados com os imunoinfectados. A possível razão para esta ocorrência se deve a defeito de células T associada a infecção pelo HIV. A polarização para o tipo de resposta TH2 pode resultar na inibição dos mecanismos de defesa celular específica (ex. citotoxicicidade, produção de interferon γ e interleucina 2, e o padrão de proliferação de células T). Esses pacientes apresentam um aumento da imunotolerância, devido a baixa contagem de linfócitos T CD4, uma elevada carga viral e uma atividade citolítica pequena, apesar de um substancial número de pacientes desenvolverem severa fibrose e cirrose na presença de mínima atividade inflamatória [1]. Dados atuais indicam que fatores virais específicos, tais como a extensão da viremia, genótipos (A-H), ou a emergência de escapes mutantes não resulta em diferenças entre pacientes co-infectados HIV-VHB e indivíduos imunocompetentes, no entanto, Lacombe et al., demonstrou a importância da genotipagem do VHB no prognóstico e na resposta terapêutica no paciente co-infectado, definindo o genótipo G como indutor de uma rápida progressão da fibrose hepatica [2]. Com respeito a importância da genotipagem do vírus da hepatite B nos indivíduos de comportamento de risco o genótipo A acomete principalmente homossexuais homens que tendem a ser HBeAg positivos, sendo o genótipo D associado aos indivíduos usuários de drogas endovenosas e portadores do vírus mutante HBeAg negativo [1]. Os pacientes co-infectados HIV/VHB que foram submetidos ao esquema HAART (Highly Active Antiretroviral Therapy), alguns desenvolveram uma hepatite aguda grave, decorrente da restauração imune e a alta carga viral intra hepática. De forma a se evitar este fenômeno, o tratamento prévio da hepatite B se mostrou relevante antes da introdução dos antiretrovirais, e quando esta abordagem não for possível, na introdução terapêutica para o HIV, a utilização de medicamentos que ajam em ambos os vírus, é mandatória [3]. A terapia nos pacientes HIV com hepatite B crônica tem sido insuficientemente estudada. Muitos dos trabalhos publicados não foram randomizados, tiveram uma amostragem pequena, não consideraram os aspectos histológicos dentro dos parâmetros de resposta terapêutica e foram realizado principalmente na era pré HAART [3]. Terapêutica da Co-Infecção HIV-VHB O objetivo primeiro da terapêutica para a infecção da hepatite B é deter a progressão da doença da doença hepática, já que a infecção não é irradicável, previnindo o desenvolvimento da cirrose e hepatocarcinoma. Geralmente utilizam-se cinco parâmetros diferentes para valorizar o dano hepático e monitorizar a resposta terapêutica: DNA do VHB sérico, perfil sorológico com AgHBs, AgHBe, Anti HBe, alaninoaminotransferases (ALT) e a histologia hepática. Pacientes com infecção pelo HIV e hepatite B crônica que apresentam transaminases elevadas são candidatos à terapia contra VHB. As melhores respostas terapêuticas ao VHB são atingidas em indivíduos que expressam níveis de carga viral acima de 105 cópias/mL pela técnica da PCR, presença de HBeAg, transaminases elevadas e lesão hepática com alta atividade necroinflamatória. Uma redução da carga viral em pacientes tratados se correlaciona com a melhora histológica, soroconversão do AgHBe ou Ag HBs e redução do risco de desenvolvimento de resistência aos medicamentos. Na prática clínica, este objetivo é difícil de ser alcançado devido ao reservatório de ccc- DNA intranuclear, tanto em hepatócitos, quanto células extra hepáticas. Uma proposta para avaliação da indicação do tratamento da hepatite B em co-infectados pelo HIV é apresentada na Tabela 1. Paciente Sem Uso de Antiretrovirais Interferons A droga de escolha é o interferon alfa, agente antiviral e imunomodulador, com administração subcutânea na dose preconizada para o monoinfectado, 5 milhões de UI/diária ou 10 milhões UI/3xsemana. Pacientes portadores de HBeAg é recomendado 4 a 6 meses de terapêutica. Os pacientes HBeAg negativos, devido a incidência deste quadro ser menor, não se tem estudos que permitam determinar a validade da utilização deste fármaco, assim como, o tempo de seu uso. Esta terapêutica é mais efetiva nos indivíduos com altos títulos de ALT (> 2 x AVN), baixa carga viral (< 107 cópias/mL), HBeAg positivo e portadores do genótipo A. Estudos em pacientes co-infectados HIV-HBV são limitados, mas sugerem uma resposta inferior a esta terapêutica, tendo a possibilidade de soroconversão de HBeAg para AntiHBe ao redor de 6 a 15 % quando comparados aos grupos controle e frequentemente o www.bjid.com.br 68 Sociedade Brasileira de Infectologia HBV – DNA, assim como, o HBsAg, permanecem detectáveis. A vantagem na escolha deste tratamento é o tempo pré estabelecido, do início e término desta terapêutica [4]. O interferon peglado α 2a foi aprovado pela ANVISA para o tratamento em pacientes com hepatite crônica B HBeAg negativos, sua administração como monoterapia ou em associação com a lamivudina foi significativamente mais eficaz que a monoterapia com a lamivudina em termos de resposta virológica após 48 semanas de terapêutica, sendo semelhante os resultados do uso deste interferon quando comparado a lamivudina usada isoladamente nos pacientes com HBeAg positivos. Até o momento (julho 2006) não há dados definitivos do uso do interferon peglado em co-infectados, porém devido aos resultados encorajadores nos monoinfectados, acreditase ser uma indicação natural, também para os pacientes coinfectados. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) alguma resistência cruzada entre estas duas drogas existe, e desta forma a melhor eficácia do entecavir poderá ser obtida em pacientes sem o uso prévio da lamivudina [6]. Adefovir O adefovir (análogo nucleotídeo) poderá ter sua escolha preconizada nesta população, principalmente em pacientes não respondedores ao interferon ou aqueles que apresentem contra-indicação ou intolerância ao uso do interferon. O tratamento da hepatite B nesse grupo de pacientes poderá ser modificado em função da indicação do tratamento para a infecção causada pelo HIV, tendo a ressalva que o adefovir possui a possibilidade de indução de resistência ao tenofovir [7]. Telbivudina / Clevudina Análogos Nucleosídeos e Nucleotídeos Os análogos devem ser usados, tanto em pacientes HBeAg positivos, como HBeAg negativos. Os análogos nucleosídeos e nucleotídeo, lamivudina e o tenofovir, respectivamente, são ativos contra os dois vírus, não sendo indicado em pacientes sem indicação de HAART devido ao risco do desenvolvimento de resistência precoce ao HIV. Estudos utilizando os análogos, têm demonstrado uma importante queda da carga viral sérica, normalização das transaminases e melhora histológica, no entanto, os resultados são desanimadores quanto a obtenção da soroconversão de HBeAg para AntiHBe, negativação do HBeAg, negativação do HBsAg e eliminação do cccDNA do VHB (Tabela 2). Devido a estes fatores, e também, o desconhecimento do tempo para o surgimento de resistência do VHB aos análogos, não se tem até o momento dados para definir o seu tempo de uso. Os análogos nucleotídeos adefovir e tenofovir possuem a vantagem de suas altas barreiras genéticas ao desenvolvimento de resistência comparadas com os análogos nucleosídeos lamivudina e emtricitabina [5]. Entecavir O Entecavir é um análogo nucleosídeo da guanosina recentemente aprovado para o tratamento da hepatite B. Esta droga não possui ação sobre o HIV, não tendo até o momento nenhum trabalho que demonstrasse resistência cruzada com outros análogos antiretrovirais, assim como não demonstrou emergência de mutações de resistência em pacientes virgens de tratamento após dois anos de tratamento. Esta droga se apresenta como o fármaco de escolha em pacientes virgens de tratamento para o HIV, e que por qualquer motivo não está indicado a terapêutica com interferon. Embora o entecavir aja em pacientes portadores de vírus lamivudina – resistentes, A telbivudina ou a clevudina são medicamentos potentes anti HVB com nenhuma atividade para o HIV. Estes fármacos, em um futuro próximo, poderão ser de primeira escolha para pacientes co-infectados ainda virgens de tratamento [6]. Pacientes em Uso de Antiretrovirais Análogos Nucleosídeos e Nucleotídeos Lamivudina A lamivudina, análogo nucleosídeo, que faz parte do arsenal terapêutico contra o HIV, podem agir sobre o VHB reduzindo os níveis de DNA séricos e as aminotransferases, apesar de apresentar níveis baixos de soroconversão para antiHBeAg, semelhante a maioria dos análogos. O tempo de tratamento com a lamivudina dentro do esquema HAART contra o HIV em geral é prolongado, favorecendo a indução de mutante resistentes a lamivudina. Em caso de troca do esquema antiretroviral devido a falha de tratamento para o HIV, deve se manter a lamivudina na dose de 150 mg/dia associada aos novos antiretrovirais [8]. A ocorrência de mutação YMDD (manifestada pela elevação das transaminases e o reaparecimento do DNA/VHB nos coinfectados é superior aos monoinfectados, sendo estimado em 20% ao ano. As conseqüências clínicas nos pacientes com resistência do VHB à lamivudina são desconhecidas. No entanto, como observado nos pacientes monoinfectados, casos de evidências de replicação viral nas hepatites B crônicas e falência hepática têm sido demonstrado nos pacientes coinfectados com VHB resistente à lamivudina [8]. A interrupção da lamivudina pode acarretar uma exacerbação da atividade inflamatória hepática, por vezes fatal. Desta forma, sua retirada em pacientes co-infectados deve www.bjid.com.br 70 Sociedade Brasileira de Infectologia imune com contagem de linfócitos T CD4 acima de 350 células/ mm3. A resposta terapêutica da associação de interferon e lamivudina, aos pacientes não respondedores a monoterapia com estes fármacos, foi de 12 a 18%. Estudos iniciais na India com interferon peglado associado à lamivudina atingiu um patamar de resposta sustentada após 6 meses de tratamento, possibilitando em um futuro próximo, a introdução deste esquema terapêutico, aos pacientes não respondedores, aos diversos esquemas já preconizados [12-14]. Co-infecção HIV-HBV e HAART Aumentos das enzimas hepáticas nos pacientes co-infectados HIV-VHB recebendo esquema HAART podem ocorrer por diferentes causas, sendo necessário o cuidado na avaliação para discernir as possíveis etiologias para descontinuar ou mudar os antiretrovirais do regime terapêutico [8]. Primeiro, raros casos de hepatotoxicidade severa (ALT> 5 x AVN), foram publicados, inerente aos antiretrovirais, que se apresentaram reversíveis após 6 meses do início do esquema HAART. Pacientes co-infectados possuem um risco maior de esteatose hepática e acidose lática pelos análogos nucleosídeos, que pode ocorrer após anos de terapêutica. Secundo, aumento das enzimas hepáticas podem ocorrer após a soroconversão do HBeAg, não sendo necessário a mudança ou interrupção do HAART se isto ocorrer. Terceiro, a reconstituição imune têm sido uma evidência, após a introdução do HAART, em alguns pacientes, ocorrendo elevação das transaminases nos pacientes com hepatite B crônica. Quarto, ativação ou exacerbação do VHB após descontinuidade da lamivudina nos esquema HAART, assim como no surgimento de cepas resistentes a lamivudina. Quinto, reativação da replicação do VHB independente da suspensão da lamivudina ou a sua resistência. Sexto, superinfecção com outros vírus hepatotrópicos devem ser considerados. Acompanhamento Ambulatorial dos Pacientes Infectados pelo HIV, com Relação à Hepatite B - realização de sorologia para hepatite B em todos os pacientes; se todos os marcadores se mostrarem negativos e enzimas hepáticas normais, proceder à vacinação para hepatite B; se todos os marcadores se mostrarem negativos mas as enzimas hepáticas estiverem elevadas (afastadas outras infecções por vírus hepatotrópicos, hepatotoxicidade, etilismo e hepatite aguda pelo VHB) ou no caso de apenas o anti-HBc se mostrar positivo, submeter o paciente à realização do DNA do vírus B para afastar quadro de infecção oculta. Se DNA VHB negativo, proceder à vacinação para hepatite B. Se DNA VHB positivo, fazer seguimento do paciente como orientado para paciente HBsAg reagente. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) - - se paciente apresentar HBsAg positivo mas enzimas hepáticas repetidamente normais, repetir sorologia para hepatite B, além de provas bioquímicas como ALT, albumina, RNI, bem como dosagem de bilirrubina a cada 3 meses, pesquisar alfa feto proteína a cada 6 meses e realizar ultrasonografia de abdome no mínimo anualmente. se paciente apresentar HBsAg reagente e elevação de enzimas hepáticas, avaliar a possibilidade de: a) soroconversão (HBeAg para antiHBe ou HBsAg para anti-HBs) espontânea ou decorrente de restauração imunológica secundária ao uso de HAART, observar; b) ativação da doença: b.1 doença ativa compensada – exame histopatológico com alterações necroinflamatórias no mínimo moderadas e/ou imunohistoquímica evidenciando replicação viral – indicar tratamento; b.2 doença ativa descompensada – a indicação de terapêutica deverá ser avaliada, custo-benefício; c) desenvolvimento de resistência a agente anti-viral (particularmente à lamivudine por fazer parte de esquema HAART), há indicação de biópsia hepática para avaliação de grau de atividade e fibrose. Se paciente fizer uso crônico de lamivudine (maior que 6 meses) pesquisar presença de mutante YMDD. Profilaxia A necessidade de imunização contra o vírus da hepatite B nos pacientes com HIV é apoiada por diversos fatores: 1) atualmente é possível que populações de alto risco exponhamse ao HIV antes de desenvolverem imunidade específica ao vírus B. 2) Há perda acelerada do AntiHBs nos indivíduos HIV que tiveram soroconversão espontânea 3) existe um risco aumentado dos co-infectados de tornarem-se portadores crônicos do vírus B. A vacina recombinante contra a hepatite B em doses habituais nos pacientes com HIV promove resultados inferiores que em indivíduos soronegativos. A resposta anticórpica à vacina contra a hepatite B nas doses usuais em adultos com AIDS situa-se entre 20% a 50%, muito inferior ao observado em indivíduos soronegativos (95%). Este padrão de resposta é diretamente relacionado a contagem de linfócitos CD4, tendo um padrão de soroconversão de 70% nos indivíduos com CD4 superior a 500 células/mm3. Atualmente recomenda-se a quarta imunização (0,1,2,6 meses) e a duplicação da dose e avaliação sorológica pós vacinação. Critérios de Inclusão Semelhante para o monoinfectado. A biópsia hepática é fundamental na condução do caso, e deve ser realizada teóricamente em todos os pacientes co-infectados. www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) A indicação para tratamento da hepatite B nesse grupo de pacientes poderá ser modificada em função da indicação do tratamento para a infecção causada pelo HIV. As Tabelas 1 e 2 mostram os resultados das diversas terapias antivirais realizadas nestes pacientes e as diretrizes básicas para a condução terapêutica. A terapêutica dos pacientes co-infectados HIV/VHB e HIV/ VHC têm se tornado de grande interesse por parte dos infectologistas, pelo aumento da demanda deste pacientes em seus consultórios e ambulatórios, assim como, aumento do número de pacientes internados com cirrose e insuficiência hepática nos hospitais, e até o momento poucos serviços se prestam para a realização de transplante hepático, ficando os mesmos sem alternativa terapêutica, evoluindo na sua grande maioria para óbito. Referências Bibliográficas 1. Wasmuth J.C., Rockstroh J. HIV and HBV Coinfections. http:/ www.hivmedicine.com/testbook/hepb.htm 2. Lacombe K., et al. Major role of hepatitis B genotype in liver fibrosis during coinfection with HIV. AIDS 2006;20(3):41927. 3. Soriano V., Miro J.M., Garcia-Samaniego J., et al. Consensus conference on chronic viral hepatitis and HIV infection: updated Spanish recommendations. J Viral Hepatol 2004;11(1):2-17. 4. 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Em regiões onde a infecção pelo VHB é endêmica a maioria das infecções ocorre por transmissão vertical, de mãe para filho, no período periparto. Em regiões de baixa endemicidade as principais vias de transmissão são: sexual (múltiplos contatos sexuais) e parenteral (uso de drogas ilícitas por via endovenosa). Também há risco elevado de transmissão do VHB para indivíduos suscetíveis que fazem parte dos seguintes grupos: • Profissionais da área da saúde; • Profissionais de outras áreas com risco elevado de contato; com sangue e hemoderivados, como bombeiros, policiais, etc.; • Pacientes com hemoglobinopatias ou outras doenças que necessitam receber sangue e hemoderivados com freqüência; • Pacientes em programas de hemodiálise; • Pacientes com infecção pelo HIV ou Aids; • Pacientes com doenças sexualmente adquiridas; • Pacientes com infecção pelo vírus da hepatite C; • Homens que fazem sexo com homens e homens que fazem sexo com homens e mulheres; • Profissionais do sexo; • Profissionais e pacientes de instituições de saúde; • Profissionais e internos de instituições corretivas. As estratégias efetivas para prevenir a infecção pelo VHB incluem: • Evitar comportamentos de alto risco; • Prevenção em relação à exposição a sangue e fluidos corpóreos; • Evitar a transmissão materno infantil; • Imunização ativa pré-exposição; • Imunização ativa, ou imunização ativa e passiva pósexposição. Entretanto a proteção ideal consiste na vacinação contra hepatite B pré-exposição [1]. O uso da vacina contra hepatite B tem sido associado com acentuada diminuição da incidência de infecção pelo VHB e de carcinoma hepatocelular, nas áreas onde ela tem sido amplamente empregada [1]. O vírus da hepatite D é o único membro do gênero Deltavirus. Na natureza o vírus da hepatite D(VHD) somente é encontrado em pacientes que também são infectados pelo vírus da hepatite B (VHB). O VHD não se propaga sem o VHB [2]. Por este motivo a prevenção da infecção pelo VHD consiste na prevenção da infecção pelo VHB. A imunização ativa contra o VHB constitui o melhor procedimento para a redução da prevalência e incidência da infecção pelo VHD. Entretanto entre indivíduos portadores crônicos do VHB, residentes em áreas endêmicas de infecção pelo VHD, ou pertencentes a grupos de risco, a profilaxia da superinfecção pelo VHD continua representando um desafio [3]. Profilaxia Pré-Exposição Vacina Contra Hepatite B As vacinas contra hepatite B podem ser provenientes de plasma de pacientes portadores da partícula AgHBs ou obtidas através da tecnologia de DNA recombinante. As vacinas contra hepatite B disponíveis atualmente, no Brasil, são unicamente as produzidas por engenharia genética. Indicações O Programa Nacional de Imunização (PNI) brasileiro recomenda a vacinação universal contra hepatite B a partir do nascimento, para todas as crianças e adolescentes até 19 anos de idade. A primeira dose da vacina contra hepatite B deve ser aplicada nas primeiras 12 a 24 horas de vida, o que resulta em alta eficácia na prevenção da infecção transmitida verticalmente [4]. No Estado de São de Paulo as indicações para vacinação contra hepatite B gradativamente foram sendo ampliadas e atualmente estão contemplados com vacinação gratuita disponível na rede pública [5]: www.bjid.com.br BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) • Profissionais que exerçam atividade na área da saúde, preferencialmente nos cursos de graduação, do setor público ou privado; • Policiais civis e militares; • Podólogos e manicures; • Tatuadores; • Auxiliares de necropsia; • Profissionais de funerárias responsáveis pelo preparo dos corpos; • Coletores de lixo hospitalar e domiciliar; • Carcereiros de delegacias e penitenciárias; • Profissionais do sexo; • Pessoas com exposição a sangue de portadores de hepatite B; • Comunicantes sexuais de casos agudos de hepatite B; • Comunicantes domiciliares de portador crônico do vírus da Hepatite B; • População institucionalizada; • População penitenciária; • Vítimas de abuso sexual; • Pacientes com risco de transfusão múltipla em virtude de doença hematológica(hemofilia, talassemia, anemia, falciforme); • Pacientes em uso, ou aguardando hemodiálise; • Pessoas infectadas pelo HIV ou imunocomprometidos; • Portadores crônicos do vírus da Hepatite C; • Transplantados; • Doadores regulares de sangue. O Programa Nacional de Imunização (PNI) brasileiro além da vacinação universal contra hepatite B, para crianças e adolescentes, também disponibiliza esta vacina, nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIEs), para indivíduos suscetíveis, com alto risco de aquisição do VHB [6]. Indicações dos CRIEs para vacinação contra hepatite B: • Vítimas de abuso sexual; • Vítimas de acidentes com material biológico positivo ou fortemente suspeito de infecção por VHB; • Comunicantes sexuais de portadores de HVB; • Profissionais de saúde; • Hepatopatas crônicos e portadores do VHC; • Doadores de sangue; • Transplantados de órgãos sólidos ou de medula óssea; • Doadores de órgãos sólidos ou de medula óssea; • Potenciais receptores de múltiplas transfusões de sangue ou politransfundidos; • Nefropatas crônicos/ dialisados/ pacientes com síndrome nefrótica; • Indivíduos com convívio domiciliar contínuo com pessoas portadoras de VHB; • Pacientes com asplenia anatômica ou funcional e doenças relacionadas; 73 • Pacientes com fibrose cística (mucoviscidose); • Pacientes com doença de depósito; • Imunodeprimidos. Esquema Vacinal O esquema habitual de vacinação para indivíduos imunocompetentes consiste em três doses, com intervalos de 1 mês entre a primeira e a segunda dose e 6 meses entre a primeira e a terceira dose (0, 1 e 6 meses). Prematuros menores de 33 semanas ou 2000g deverão receber uma dose extra com dois meses de idade (0, 1, 2 e 6 meses). No caso dos candidatos a transplante de órgãos sólidos, devido à possibilidade do transplante ocorrer a qualquer momento, propõe-se um esquema acelerado de vacinação contra hepatite B: 0, 1, 2 e 6 meses e avaliação da necessidade de uso de dose dobrada de acordo com a situação clínica de base. As vacinas contra hepatite B devem ser administradas por via intramuscular, na região deltóide ou no vasto lateral da coxa, em crianças pequenas. Não devem ser aplicadas na região glútea, pois a adoção desse procedimento se associa com menor imunogenicidade. Excepcionalmente, em pessoas com doenças hemorrágicas, a via subcutânea pode ser utilizada. Imunogenicidade Três doses de vacina contra hepatite B induzem títulos protetores de anticorpos (anti-HBs ≥ 10 UI/mL) em mais de 90% dos adultos e jovens sadios, e em mais de 95% dos lactentes, crianças e adolescentes. A eficácia diminui com a idade e é menor em maiores de 40 anos, quando se situa em torno de 40 a 60%. Outros fatores, tais como tabagismo, obesidade e fatores genéticos ligados a determinados haplotipos de HLA são associados a resposta inadequada à vacinação contra infecção pelo vírus da hepatite B. Teste sorológico pré-vacinal (dosagem de AgHBs) não é rotineiramente indicado, exceto para gestantes. Teste pósvacinal (dosagem de anticorpos anti-HBs), também não é indicado para a população em geral, devido à alta eficácia da vacina [1]. Teste sorológico pós-vacinação, que deve ser realizado um a dois meses após a última dose, é recomendado para indivíduos com alto risco de exposição/infecção pelo VHB e para aqueles nos quais é observada resposta subótima, incluindo pacientes com insuficiência renal crônica (Quadro 1). A vacinação de crianças confere imunidade prolongada. A proteção contra a infecção persiste, mesmo com a queda de título de anticorpos que ocorre com o passar dos anos. Usualmente não são recomendadas doses de reforço da vacina contra hepatite B. Esta vacina também protege contra infecção pelo vírus da hepatite D, uma vez que este vírus só existe em pessoas infectadas pelo VHB. www.bjid.com.br 74 Sociedade Brasileira de Infectologia A imunogenicidade e eficácia da vacina contra hepatite B em pacientes imunodeprimidos, incluindo HIV/Aids assim como ocorre nos renais crônicos, são menores do que nos indivíduos saudáveis. Pacientes imunodeprimidos em geral (pacientes HIV-positivos [7], pacientes em uso de terapia imunossupressora) apresentam uma resposta sub-ótima às doses habituais de vacina contra hepatite B. Doses maiores e / ou número aumentado de doses são necessários para indução de anticorpos em níveis protetores. Por este motivo, são recomendadas quatro doses de vacina contra hepatite B, com o dobro da dose habitual e avaliação sorológica pós-vacinação (Quadros 1 e 2). Não Respondedores Indivíduos que apresentam títulos de anticorpos antiHBs < 10UI/mL, medidos 30 a 90 dias após a última dose do esquema básico de vacinação, são considerados não respondedores. Para os não respondedores ao esquema inicial (anti-HBs < 10 mUI/mL), re-vacinação com 3 doses adicionais é seguida de níveis protetores de anti-HBs em 30 a 50% dos casos [8]. Se o indivíduo não responder ao segundo esquema de vacinação é considerado verdadeiro não respondedor. Não há evidências de que doses adicionais (além das seis dos dois esquemas básicos completos) sejam capazes de induzir resposta humoral em pessoas saudáveis que não responderam após o segundo esquema vacinal completo [9]. É freqüente na prática se deparar com situação diversa da descrita acima. São indivíduos cujo teste para dosagem de anti-HBs é negativo, mas foi realizado decorridos mais de seis meses da terceira e última dose da vacina contra hepatite B. Não há como saber se este indivíduo é um não respondedor, ou se respondeu ao esquema básico, mas com a queda de título de anticorpos que ocorre com o passar dos anos, negativou a sorologia. Nestes casos propõe-se a conduta detalhada no Fluxograma 1. Profilaxia Pós-Exposição Imunoglobulina Humana Anti-Hepatite B (IGHHB) A imunoglobulina humana anti-hepatite B (IGHHB) é obtida de plasma de doadores selecionados, submetidos recentemente a imunização ativa contra hepatite B, com altos títulos de anticorpos específicos (anti-HBs). A IGHHB deve ser administrada na dose de 0,5mL para recém-nascidos ou 0,06mL/kg de peso corporal, máximo de 5mL, para as demais idades. A IGHHB deve ser aplicada por via intramuscular, inclusive na região glútea. Quando administrada simultaneamente com a vacina contra hepatite B, a aplicação deve ser feita em grupo muscular diferente. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Pós-Exposição Perinatal • A imunoglobulina humana anti-hepatite B (IGHHB) deve ser feita preferencialmente nas primeiras 12 a 24 horas de vida para recém-nascidos de qualquer peso ou idade gestacional, filhos de mãe AgHBs positivas. A dose da imunoglobulina é 0,5mL intramuscular no músculo vasto lateral e a vacina contra hepatite B deverá ser feita simultaneamente, na dose de 0,5mL, intramuscular, no músculo vasto lateral do outro membro. Embora a vacinação isolada nas primeiras 12 horas após o nascimento seja altamente eficaz na prevenção da transmissão vertical do VHB a adição de IGHHB confere proteção adicional [4]. • Se o perfil sorológico da mãe, em relação ao vírus da hepatite B, for desconhecido, o recém-nascido deverá ser imediatamente vacinado contra a hepatite B, independentemente do peso ou idade gestacional e, simultaneamente, solicitada a pesquisa do antígeno de superfície do VHB (AgHBs) materno, indicando-se a imunoglobulina até o 7º dia de vida se o resultado for positivo. • Crianças nascidas de mãe com perfil sorológico desconhecido para o VHB devem receber só a vacina. • O aleitamento materno não é contra-indicado para filhos de mãe AgHBs positivas, se eles tiverem recebido imunoprofilaxia adequada. Pós-Exposição Sexual Vítimas de agressão sexual: • A imunoglobulina humana anti-hepatite B (IGHHB) e vacina contra hepatite B devem ser administradas para pessoas presumidamente suscetíveis (não vacinadas) expostas, por agressão sexual, a indivíduos sabida ou potencialmente infectados pelo VHB, o mais precocemente possível, no máximo até duas semanas após a exposição. • Se a vítima não for vacinada ou estiver com vacinação incompleta contra hepatite B, vacinar ou completar a vacinação. • Não se recomenda o uso rotineiro de IGHHB, exceto se a vítima for suscetível e o agressor AgHBs positivo ou pertencente a grupo de risco (usuários de droga, por exemplo). Quando indicada, a IGHHB deve ser aplicada o mais precocemente possível, até no máximo 14 dias após a exposição. Comunicantes Sexuais de Casos Agudos de Hepatite B • Imunoglobulina humana anti-hepatite B (IGHHB) e vacina contra hepatite B estão indicadas para pessoas suscetíveis com exposição sexual a pacientes com hepatite B aguda. Deve-se, entretanto, tentar identificar a situação do exposto www.bjid.com.br 76 Sociedade Brasileira de Infectologia BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) Fluxograma 1. Vacina contra hepatite B 3 doses Teste sorológico (anti -HBs) > < 10 mUI/ml encerrar O teste foi realizado há > 6 meses após a última dose? sim não Aplicar 1 dose da vacina e repetir o anti -HBs 4 a 12 semanas após > 10 mUI/ml encerrar Administrar 2º esquema (3 doses) < 10 mUI/ml Completar 2º esquema Repetir o anti -HBs após 4 a 12 semanas < 10 mUI/ml Verdadeiro não respondedor www.bjid.com.br >10 mUI/ml encerrar BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) I Consenso para o Diagnóstico e Manuseio da Hepatite B (e Delta) 77 Quadro 3. Recomendações para profilaxia de hepatite B após exposição ocupacional a material biológico* S ituações Vacinal e Sorológica do Profissional de Saúde Exposto Paciente - fonte : AgHBs positivo AgHbs negativo AgHbs desconhecido ou não testado Não Vacinado IGHHB + iniciar vacinação Iniciar vacinação Iniciar vacinação1 C o m v a c in a ç ã o incompleta (< 3 doses) IGHHB + completar vacinação Completar vacinação Completar vacinação 1 Nenhuma medida específica Nenhuma medida específica Nenhuma medida específica • Sem resposta vacinal após a 1a série (3 doses) anti - HBs< 10UI/mL IGHHB + 1a dose da vacina contra hepatite B ou IGHHB (2x) 2 Iniciar nova série de vacina (3 doses) Iniciar nova série 1 de vacina (3 doses) • Sem resposta vacinal após 2 a série (6 doses) anti - HBs< 10UI/mL IGHHB (2x) 2 Nenhuma medida específica IGHHB (2x) • Testar o profissional de saúde: Testar o profissional de saúde: Testar o profissional de saúde: Se resposta vacinal adequada: nenhuma medida específica Se resposta vacinal adequada: nenhuma medida específica Se resposta vacinal adequada: nenhuma medida específica Previamente vacinado (3 doses) • Com resposta vacinal conhecida e adequada (anti HBs > 10UI/mL) Com resp osta vacinal desconhecida Se resposta vacinal inadequada: IGHHB + 1ª dose da vacina contra hepatite B Se resposta vacinal inadequada: seguir fluxograma 1 2 Se resposta vacinal inadequada 1 : seguir fluxograma 1 * Tanto a vacina quanto a imunoglobulina devem ser aplicadas dentro do período de 7 dias após o acidente, mas, idealmente, nas primeiras 24 horas após o acidente. 1 - Uso associado de imunoglobulina humana anti-hepatite B está indicado se o paciente-fonte tiver alto risco para infecção pelo HBV como: usuários de drogas injetáveis, pacientes em programas de diálise, contatos domiciliares e sexuais de portadores de AgHBs, pessoas que fazem sexo com pessoas do mesmo sexo, heterossexuais com vários parceiros e relações sexuais desprotegidas, história prévia de doenças sexualmente transmissíveis, pacientes provenientes de áreas geográficas de alta endemicidade para hepatite B, pacientes provenientes de prisões e de instituições de atendimento a pacientes com deficiência mental. 2 - IGHHB (2x) = 2 doses de imunoglobulina humana anti-hepatite B com intervalo de 1 mês entre as doses. Esta opção deve ser indicada para aqueles que já fizeram 2 séries de 3 doses da vacina, mas não apresentaram resposta vacinal, ou apresentem alergia grave à vacina. Obs: Para profissionais soronegativos que só realizaram teste sorológico muitos anos após a série vacinal original, uma dose adicional de vacina deve ser administrada e seguida de retestagem 4 a 8 semanas após. Se a sorologia for positiva o profissional será considerado imune, se negativa deverá completar o esquema com mais duas doses de vacina. Fonte 11: Recomendações para atendimento e acompanhamento de exposição ocupacional a material biológico: HIV e hepatites B e C – 2004. Disponível em < http://www.riscobiologico.org/bioinfo/pdsf/manal_acidentes.pdf > acesso em 16/08/2005 www.bjid.com.br 78 Sociedade Brasileira de Infectologia quanto à infecção pelo vírus da epatite B. Caso a pessoa exposta seja suscetível, estão indicadas a HB e a IGHHB, aplicadas o mais precocemente possível, no máximo até 14 dias depois da exposição. Pós-Exposição Ocupacional Ver Quadro 3. BJID 2006; 10 (Supplement 1-August) 2. 3. 4. Situações Especiais 5. • Imunodeprimidos devem receber IGHHB após exposição de risco, pois sua resposta à vacinação pode ser inadequada. • O uso da Imunoglobulina humana anti-hepatite B para transplantados de fígado que sejam portadores de AgHBs está regulamentada pela portaria nº 86, de 05 de fevereiro de 2002, da Secretaria de Assistência à Saúde. 6. 7. Referências Bibliográficas 8. 1. Poland G.A., Jacobson R.M. Prevention of Hepatites B with the hepatites B vaccine. N Engl J Med 2004;351:2832-8. Koziel M.J., Siddiqui A. Hepatitis B virus and hepatitis Delta virus. In: Mandell, Douglas, and Bennett’s principles and practice of infectious diseases / [edited by] Gerald L. Mandell, John E. Bennett, Raphael Dolin.- 6th ed. Elsevier Inc. 2005. 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