XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP Síndrome Mielodisplásica em cão: Relato de Caso Myelodysplastic syndrome in a dog: Case report Palavras-chave: Mielodisplasia, leucopenia, diseritropoiese Autores: PEREIRA, M.A.; TORRES, E.; HOJO, L.M.; XAVIER, M.N. Origem Institucional: Vet Quality Centro Veterinário Email [email protected] Revisão de literatura A síndrome mielodisplásica (SMD) é caracterizada por displasia, ou seja, um desenvolvimento anormal em uma ou mais linhagens hematopoiéticas. Esta condição é rara em cães, em gatos normalmente está associada com a infecção pelo vírus da leucemia felina (FelV) gerando macrocitose (MILLS, 2012). No sangue periférico encontramos citopenias como resultado da hematopoiese inefetiva (WEISS & AIRD, 2001). Esta síndrome é bem relatada em humanos e com potencial de evolução para leucemias. Com o advento do sequenciamento genético, mutações somáticas recorrentes em genes envolvidos na regulação epigenética foram identificados na SMD (GANGAT et al., 2016). A síndrome mielodisplásica pode ser primária ou secundária. Na primária suspeita-se de alteração genética nas células hematopoiéticas, enquanto a secundária pode resultar de doenças malignas e administração de medicamentos (WEISS & SMITH, 2000; OVERMANN & WEISS, 2012). Existem poucos estudos sobre tratamento da síndrome mielodisplásica em cães (MIYAMOTO, et al., 1999). Terapias para SMD em seres humanos também não são bem estabelecida, apesar de extenso estudo. Quimioterapias incluindo corticosteróides ou esteroides anabolizantes, são geralmente ineficazes. A terapia com transplante de célula tronco alogênica tem sido considerada umas das únicas possibilidades de cura em humanos (MIYAMOTO et al., 1999; GANGAT et al., 2016). 205 XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP Relato de caso Uma fêmea da raça West highland terrier com 10 anos foi encaminhada para a especialidade de hematologia por histórico de leucopenia persistente detectada em exames de rotina, a anamnese revelava apenas queixa de presença de carrapato, mas animal estava bem clinicamente sem alterações ao exame físico. Foi realizado pcr para Ehrlichia sp. (real time) negativo para parasita, e sorologia com titulação para Ehrlichia canis cujo resultado foi 1:20 (considerado negativo). Mesmo com estes resultados optou-se por realizar o tratamento com doxiciclina 5mg/kg bid por 30 dias sem melhora nos leucócitos (tabela 1). O primeiro mielograma foi realizado após o tratamento completo com doxiciclina e nova sorologia com titulação para Ehrlichia canis que novamente deu negativo. A citologia de medula óssea foi coletada do esterno após tranquilização prévia com acepromazina 0,02mg/kg e midazolam 0,5mg/kg intramuscular. A medula estava normocelular apresentando discreta hipercelularidade de série mieloide com observação de disgranulopoiese, discreta hipocelularidade de serie eritroide e megacariocitica e presença de plasmócitos reativos. Não foram observados agentes infecciosos na amostra. Achados sugeriram síndrome mielodisplásica. Para diferenciar de mielodisplasia primária ou secundária foram realizados demais exames como radiografias torácias e ultrassom, todos sem alterações. Paciente estava clinicamente estável, portanto optou-se por aguardar e repetir novo mielograma que foi realizado 7 meses depois. Nesta segunda avaliação a medula estava hipercelular por hipercelularidade da série mieloide com observação de disgranulopoiese, demais linhagens sem alterações em relação ao exame anterior confirmando o diagnóstico de SMD (figura 1). Como tratamento foram realizadas duas aplicações de células tronco mesenquimal com intervalo de 30 dias, a primeira aplicação foi intravenosa e a segunda intramedular com melhora discreta nos leucócitos. Não foram realizadas mais aplicações de célula tronco nem novo mielograma porém paciente permanece estável e assintomático. 206 XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP Discussão Por apresentar leucopenia persistente no sangue periférico sem causa aparente foi realizado mielograma para pesquisa de displasia na linhagem mieloide que justificasse a alteração no hemograma e confirmasse a suspeita da síndrome mielodisplásica. A SMD pode ser primária ou secundária a doenças, principalmente neoplasias malignas, ou uso de medicamentos como quimioterápicos (WEISS & SMITH, 2000; OVERMANN & WEISS, 2012). No caso relatado foi feito um diagnóstico presuntivo de síndrome mielodisplásica primária pelos achados dos aspirados de medula óssea, ausência de outras morbidades e pela exclusão de uso de drogas prévias que pudessem induzir a displasia. Em humanos testes genéticos tentam identificar mutações para diagnóstico da síndrome mielodisplásica primária (GANGAT et al., 2016), porém na medicina veterinária são necessários mais estudos para identificar genes envolvidos nas SMD. Tanto na medicina veterinária como em humanos, o tratamento desta síndrome ainda não foi bem estabelecido. Quando o quadro evolui para leucemia existe a possibilidade do tratamento com quimioterápicos embora seus efeitos na sobrevida do paciente sejam limitados. Em humanos a terapia com transplante de célula tronco alogênica tem sido considerada umas das únicas possibilidades de cura (MIYAMOTO et al., 1999; GANGAT et al., 2016). Por este motivo no presente relato foi realizado a aplicação de célula tronco mesenquimal alogênica, que atualmente é uma possibilidade terapêutica na medicina veterinária. Considerações Finais A síndrome mielodisplásica é considerada uma condição rara em cães, por este motivo o presente relato de caso é relevante para incluir esta síndrome como diagnóstico diferencial nos casos de citopenias sem causa aparente. O diagnóstico definitivo da SMD é feito pela análise da medula óssea, seja por biópsia ou citologia (mielograma). No relato optou-se pelo mielograma por ser uma análise mais simples, menos invasiva e que pode ser realizada apenas com tranquilização. O mielograma não diferencia se a mielodisplasia é primária ou secundária, para isso é necessário complementar o diagnóstico com exames de imagem, bioquímico e histórico completo. A síndrome mielodisplásica primária normalmente acontece por mutações 207 XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP genéticas nas células hematopoiéticas. Já existem estudos nesta área na medicina humana, porém na medicina veterinária necessita-se de mais estudos para correlacionar mutações genéticas em células hematopoiéticas com a ocorrência da SMD. Como o tratamento da SMD não é bem estabelecido e como no caso descrito animal estava bem clinicamente a conduta terapêutica foi acompanhar paciente com hemogramas mensais para avaliar outras alterações que pudessem sugerir uma evolução para leucemia, o que até o presente momento não ocorreu, e aplicação de célula tronco mesenquimal, baseado na indicação de tratamento com célula tronco que existe na medicina humana. Referências GANGAT, N.; PATNAIK, M.M.; TEFFERI, A. Myelodysplastic syndromes: Contemporary review and how we treat. American Journal of hematology, v. 91, p. 76-89, 2016 MILLS, J. BSAVA Manual of Canine and Feline Haematology and Transfusion Medicine, England, 2012. P38. MYIAMOTO, T. et al., Long-Term Case Study of Myelodysplastic Syndrome in a Dog. JOURNAL of the American Animal Hospital Association, v.35, p. 475-481, 1999 OVERMANN, J.A.; WEISS, D.J. BSAVA Manual of Canine and Feline Haematology and Transfusion Medicine, England, 2012. P. 86 WEISS, D. J.; AIRD, B. Cytologic Evaluation of Primary and Secondary Myelodysplastic Syndromes in the Dog. Veterinary Clinical Pathology, v. 30, p. 6775, 2001 WEISS, D.J.; SMITH, S.A. Primary Myelodysplastic Syndromes of Dogs: A Report of 12 Cases. Journal of veterinary internal medicine, v. 14, p. 491-494, 2000 208 XIV Congresso Paulista de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais - CONPAVEPA - São Paulo-SP 209