Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 REMEDIAÇÃO DE ÁGUAS CONTAMINADAS COM METAIS UTILIZANDO BIOSURFACTANTES Cristina Silva da Silva Pontifícia Universidade Católica de Campinas CEATEC [email protected] Resumo: Biossurfactantes são compostos de origem microbiana com alta atividade superficial, o que, a exemplo dos surfactantes sintéticos, lhes confere aplicações em diversas áreas. Além de apresentarem propriedades semelhantes a de vários surfactantes sintéticos, os biossurfactantes possuem baixa toxicidade e alta biodegrabilidade. Este trabalho visa avaliar a possibilidade de se produzir biossurfactantes, biomassa e derivados a partir do crescimento sustentável de Bacillus subtilis, utilizando meios de cultivo mais baratos. Foram avaliadas duas fontes de biossurfactantes com aplicações potenciais para a remediação de águas contaminadas por metais: (I) extratos de Bacillus subtilis contendo surfactina; (II) extratos de surfactantes derivados de amioácidos. Extratos contendo surfactina foram obtidos a partir da fermentação de B. subtilis em meio de Landy modificado e surfactantes derivados de aminoácidos foram obtidos a partir da hidrólise de proteína animal (carne moida). Ambos os surfactantes foram adicionados a soluções de cobre II e ferro II formando partículas insolúveis contendo íons de cobre e ferro adsorvidos. Acredita-se que a instabilidade das micelas de surfactinas, lipopeptídeos aniônicos, é o resultado da neutralização de cargas pela interação com cátions metálicos. Devido a esta neutralização as micelas perdem solubilidade e sedimentam arrastando os metais, o que facilita a sua remoção. Palavras-chave: Biossurfactantes, surfactina, Bacillus subtilis. Área do Conhecimento: Ciências Exatas e da Terra – Química dos Produtos Naturais. 1. INTRODUÇÃO Atividades antrópicas como a mineração e a atividade industrial são alguns dos responsáveis pela contaminação de corpos d´água com metais pesados [1]. O aumento da concentração de metais pesados Augusto Etchegaray Júnior Grupo de Química Ambiental e dos Materiais CEATEC [email protected] nas águas é preocupante devido ao risco que oferece ao meio ambiente e à população. Metais como cobre e ferro fazem parte do metabolismo do corpo humano, porém quando a concentração desses metais, especialmente cobre, é ultrapassada, acarreta em sérios riscos à saúde do indivíduo [2]. A utilização de Biossurfactantes para a remoção de metais de águas contaminadas é uma alternativa viável que além de contribuir para manter o equilíbrio do meio ambiente tornaria possível a recuperação desses metais para fins industriais e outras aplicações [3]. Biossurfactantes são compostos anfipáticos de origem microbiana, que apresentam atividade superficial, diminuindo a tensão superficial da água e facilitando a solubilização de compostos apolares [2]. Os surfactantes presentes no extrato de Bacillus Subitilis apresentam capacidade para a remoção de metais [4,5]. Foi determinado ainda um surfactante proveniente da hidrólise de proteína animal que também apresenta baixa toxicidade, com excelentes propriedades de superfície e atividade antimicrobiana considerável. As propriedades físicoquímicas dos compostos da invenção foram comparadas a outros surfactantes comerciais [6]. Neste trabalho apresentam-se duas fontes de biossurfactantes com aplicações potenciais para a remediação de águas contaminadas por metais: (I) extratos de B. subtilis contendo surfactina e (II) um surfactante derivado de aminoácidos. Os resultados demonstram a capacidade destes surfactantes aniônicos e biodegradáveis para a precipitação de Cu (II) e Fe (II). 2. METODOLOGIA 2.1. Materiais Todos os reagentes utilizados são de grau analítico. A bactéria B. subtilis cepa 0G foi isolada a partir de patógenos de feijão [7]. Para a síntese de surfactantes derivados de aminoácidos foi utilizada carne bovina (carne moída) como fonte de proteína e extrato de abacaxi como fonte de protease. Como ácido graxo foi utilizado ácido láurico, do qual foi Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 produzido cloreto de acila, utilizando-se cloreto de tionila. 2.2. Produção de biossurfactantes Os Biossurfactantes foram produzidos a partir do cultivo de Bacillus subtilis, cepa 0G, em meio de Landy [8]. Visando diminuir os custos da produção o meio de Landy foi alterado utilizando como fontes de carbono e nitrogênio respectivamente, resíduos de glicerol, obtidos no laboratório em experimentos de síntese de biodiesel, e aminoácidos como L-arginina ou derivados de hidrolisados proteicos, utilizando as fontes: salsicha, batata e/ou restos de alimentos. Ao término do crescimento, as células de B. subtilis foram removidas e o extrato livre de células foi utilizado como extrato de biossurfactantes. 2.3. Síntese de surfactante derivado de aminoácidos Também foi produzido um surfactante derivado de aminoácidos a partir da hidrólise da proteína da carne animal com a enzima Bromelina encontrada no abacaxi. Foram misturadas 200 g de carne moída com 200 g de abacaxi. A mistura foi triturada a temperatura ambiente e mantida em repouso por uma hora. Posteriormente a mistura foi incubada a 60ºC por 30 minutos e depois foi mantida sob fervura durante 5 minutos a fim de inativar a enzima bromelina derivada do abacaxi. O pH foi ajustado para 7,0 utilizando pastilhas de Hidróxido de Sódio e a mistura centrifugada (6.000 rpm) por 10 minutos. Ao sobrenadante foi adicionada acetona na proporção 1:1 e a amostra foi incubada por 30 minutos a 4ºC para precipitar excesso de proteína não digerida. A suspensão foi posteriormente centrifugada (6.000 rpm) durante 5 minutos. A um volume de 20 mL do sobrenadante foi adicionado Hidróxido de Potássio até o pH 9,0. Esta solução contendo hidrolisados protéicos foi colocada em um banho de gelo. Nestas condições foi foi adicionada gota a gota uma solução de cloreto de acila preparada a partir de 2,5 g de ácido láurico e 4 mL de cloreto de tionila. Esta mistura foi mantida sob agitação durante 24 horas e em seguida foi adicionado ácido clorídrico até pH 2,0. Nestas condições formou-se uma suspensão. O surfactante obtido foi extração com éter etílico. O éter foi evaporado com auxilio de uma chapa de aquecimento. Ao final do processo, obteve-se um óleo que ao ser colocado no dessecador por cerca de 20 dias formou um sólido correspondendo ao surfactante derivado do aminoácido. 2.4. Preparo das Soluções de Cobre (ll) e Ferro (II) Em balão volumétrico de 100 mL foi adicionado uma massa de 4,7405g de CuSO4.5H2O e 10,122g de FeNH4(SO4)2.12H2O completado os volumes dos balões com água deionizada, obtendo-se assim uma soluções com concentração de 0,2 mol/L. 2.5.Construção das Curvas Analíticas A soluções utilizadas para a construção das curvas analíticas nas faixas de 1 a 10 ppm foram feitas a partir da solução padrão de 1000 ppm de Cobre e Ferro. Foi utilizado Espectroscopia de Absorção Atômica para determinar a quantidade de metal residual e assim calcular a quantidade de metal adsorvido pelas micelas de surfactantes. 2.6. Remoção do Cobre (ll) e Ferro (II) Para verificar a capacidade de extratos de surfactina e do surfactante derivado de aminoácidos para a remoção dos metais, amostras de água contaminada artificialmente com cobre e/ou ferro foram misturadas numa proporção de (1:1) com o extrato de biossurfactantes. Após 1 hora em repouso as amostras foram centrifugadas, diluídas em água deionizada e analisadas por espectrofotometria de absorção atômica. Água contaminada com cobre foi preparada a partir da dissolução de CuSO4.5H2O em água para uma concentração final de 12.000 ppm. Da mesma forma, foi preparada uma solução 12.000 ppm de ferro dissolvendo-se FeNH4(SO4)2.12H2O em água. Para os testes de extração de metais foram misturados 2mL de uma solução de 12.000 ppm de cada metal com 2mL da solução contendo biossurfactantes em tubos de ensaio obtendo-se assim uma concentração de 6.000 ppm de metal. Esta mistura foi mantida na temperatura ambiente por um período de 1 hora e depois centrifugada. Do sobrenadante foram retirados 200 μL para diluição em balão volumétrico de 100 mL a fim de se obter uma concentração adequada para a leitura utilizando a curva analítica. As diluições foram todas analisadas por espectroscopia de absorção atômica utilizando o equipamento marca Perkin Elmer modelo Analyst 300. Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Este trabalho apresenta o potencial de biossurfactantes contendo surfactinas derivados de extratos de B. subtilis e surfactantes derivados de aminoácidos para remoção de cobre e ferro através da adsorção em micelas. Absorbância (u.a) 3.1. Curvas Analíticas As Figuras 1 e 2 correspondem respectivamente às curvas analíticas utilizadas para a determinação de cobre e ferro residuais após o tratamento com os extratos de biossurfactantes. 0.40 0.35 0.30 0.25 0.20 0.15 0.10 0.05 0.00 Tabela 3. Remoção de cobre (II) e Ferro (II) a partir do tratamento com surfactantes aniônicos. Os experimentos foram realizados com soluções contendo inicialmente 6.000 ppm do metal. R² = 0.9995 0 5 10 Concentração (ppm) 3.2. Precipitação e Remoção dos Metais A solução de metal foi misturada com um volume idêntico de extrato de B. subtilis contendo surfactina e surfactantes derivados de aminoácidos. Verificouse inicialmente uma turvação no meio. Esta turvação indica a precipitação de partículas coloidais, causada provavelmente pela adsorção de íons cobre/ferro nas duplas camadas elétricas das micelas dos surfactantes. Já que em pH maior que 5,0 a surfactina tem caracteristicas aniônicas devido á presença dos aminoácidos glutâmico e aspártico em sua estrutura [9]. Acredita-se que estes ânions interagem com os cátions metálicos Cu(II) e Fe (II). Após a centrifugação, obtém-se grande remoção do metal da fase aquosa. A determinação do metal residual foi feita a partir de espectroscopia de absorção atômica. Os resultados obtidos estão apresentados na Tabela 3. 15 Metal Extração (%) Cobre 91% Ferro 89% Figura 1. Curva analítica para a determinação de Cobre Absorbância (u.a) 0.30 0.25 0.20 0.15 0.10 R² = 0.9955 0.05 0.00 0.00 5.00 10.00 Concentração (ppm) 15.00 Figura 2. Curva analítica para a determinação de Ferro Considerando-se o custo da produção de surfactinas, os principais surfactantes produzidos por Bacillus subtilis que podem contribuir para a remoção de metais por interações eletrostáticas, outro objetivo deste trabalho foi buscar a utilização da biomassa para produção de outros surfactantes biodegradáveis. O objetivo desta reciclagem de materiais seria o de diminuir o custo da produção de surfactinas agregando valor à biomassa, normalmente descartada, pois os biossurfactantes são excretados para o meio de cultura durante o crescimento [9]. Entretanto, a biomassa de B. subtilis obtida neste trabalho não continha material suficiente para a síntese de surfactantes derivados de aminoácidos. Desta forma, utilizamos como alternativa carne bovina (carne moída) uma excelente fonte de proteínas que pode estar presente em resíduos de alimentos. Seguindo este racional, utilizamos carne moída (200 g), a qual foi tratada com protease (extrato bruto de abacaxi contendo bromelina, 200g) conforme descrito na metodologia. O extrato obtido foi misturado com uma solução contendo cloreto de duodecanoila, produto da reação de ácido láurico com cloreto de tionila. Como Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 resultado obtivemos um surfactante derivado de aminoácidos, precipitado ao final da reação pelo tratamento com ácido clorídrico, sugerindo que a estrutura possui cargas negativas (possivelmente ácido glutâmico ou fragmentos peptídicos contendo este aminoácido). Considerando-se a natureza aniônica deste surfactante e baseado nos resultados descritos acima para extratos contendo surfactinas, foi preparada uma solução deste surfactante dissolvendo-se 40 mg em 4 mL de água, obtendo-se uma solução de surfactante com valor de pH 5,5. Nestas condições, o extrato foi utilizado para verificar suas potencialidades para remoção de íons cobre. A análise preliminar envolveu o tratamento da solução de 12.000 ppm de cobre com o extrato do surfactante na concentração de 10 mg/mL. Os controles, solução de cobre e suspensão de surfactante foram centrifugados e não produziram precipitados. Entretanto, a mistura de surfactante com a solução de cobre produziu um precipitado, sugerindo que este extrato também pode remover íons cobre II. Os resultados são apresentados na Figura 3. A fotografia demonstra que a solução de cobre II e o extrato de surfactantes derivados de aminoácidos apenas precipitam quando misturados. Figura 3. Resultados do tratamento de uma solução de cobre 12.000 ppm com uma solução de surfactante derivado de aminoácido. 4. CONCLUSÕES Meios alternativos para a produção de biossurfactantes podem ser preparados utilizando glicerol como fonte de carbono e hidrolisados protéicos como fonte de nitrogênio. Esta é uma estratégia de crescimento sustentável, haja vista a possibilidade de utilizar resíduos de glicerol obtido a partir da produção de biodiesel. Outra forma de se obter surfactantes com características biodegradáveis é a partir da reação de hidrolisados protéicos com ácidos graxos. Neste trabalho demonstramos que este tipo de surfactante pode ser produzido a partir de carne bovina tratada com extratos de bromelina produzidos a partir do abacaxi. Tanto os biossurfactantes de Bacillus subtilis como aqueles derivados de aminoácidos apresentam potencialidades para remediação ambiental. Neste trabalho demonstramos que estes surfactantes podem ser utilizados para descontaminação de águas contaminadas com cobre e ferro. AGRADECIMENTOS À PUC-Campinas pela infraestrutura e pela bolsa de iniciação científica. REFERÊNCIAS [1] González-Toril, E., et. al. 2003, Microbial ecology of an extreme acidic environment, the Tinto River, Applied and Environmental Microbiology, vol. 69, n.8, p.4853-4865. [2] Brewer, G. J., 2010, Risks of copper and iron toxicity during aging in humans, Chemical Research in Toxicology, vol. 23, n.2, p.319-326. [3] Garae-Fathabd, E. (2011). Biosurfactants in Pharmaceutical Industry (A Mini-Review). Amer. J. Drug Discov. Develop., vol.1, p. 58-69. [4] Mulligan, C. N. et. al. (1999) On the use of biosurfactants for the removal of heavy metals from oil-contamined soil. Environ. Progr., vol. 18, p. 31-35. [5] Cooper, D. G. et.al. (1981) Enhanced production of surfactin from Bacillus subtilis by continous product removal and metal cation additions Appl. Environ. Microbiol., vol. 42, p. 408-412. [6] Matre, J. D.; Singare, P.U. (2012) Study of Synthesis and Physicochemical Properties of Arginine Derived Cationic Surfactants. Am. J. Org. Chem., vol. 2, n. 3, p. 41-44. [7] Etchegaray, A., et al. (2008), Effect of a highly concentrated lipopetide extract of Bacillus subtilis on fungal and beacterial cells. Arch. Microbiol., vol. 190, p. 611-622. [8] Landy, M., et al., (1948), Bacillomycin: an antibiotic from Bacillus subtilis active against pathogenic fungi. Proc.Soc. Exp. Biol. Med., vol. 67, p. 539-541. Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 [9] Juang, R. S., et al. (2007), Separation of surfactin from fermentation broths by acid precipitation and two-stage dead-end ultrafiltration processes. J. Membr. Sc., vol. 299, p 114-121. Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012