UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLÓGICAS CURSO DE FARMÁCIA LETÍCIA HORTA RODRIGUES DE SOUZA FARMACOTERAPIA DE PACIENTES COM HANSENÍASE Anápolis 2014 1 LETÍCIA HORTA RODRIGUES DE SOUZA FARMACOTERAPIA DE PACIENTES COM HANSENÍASE Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Estadual de Goiás/UnUCET como requisito necessário à obtenção do título de Bacharel em Farmácia. Orientadora: Professora MSc. Fabiana Reis Anápolis 2014 2 Universidade Estadual de Goiás Pró-Reitoria de Graduação Coordenação Geral Coordenação Técnica Sistema Integrado de Bibliotecas Regionais (SIBRE) TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO Souza, Leticia Horta Rodrigues de Farmacoterapia de pacientes Fabiana Gonçalves Reis– 2014. com Hanseníase; 62 fls. Orientador: Prof. McS. Fabiana Gonçalves Reis TCC (Graduação), Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de Ciências Exatas e Tecnológicas, 2014. 1. Hanseníase. 2. Caracterização. 3. Farmacoterapia. 4. Efeitos Colaterais – Goiás (Estado). I. Reis, Fabiana Gonçalves. II. Mestre 3 4 Dedico este trabalho a todos os pacientes acometidos pela Hanseníase para que de alguma forma seja de grande valia na adesão ao tratamento da doença. 5 AGRADECIMENTO Agradeço primeiramente a Deus, meu sustentáculo, meu maior Mestre, que me amparou e me fortaleceu nos momentos mais difíceis dessa jornada. A meus pais Gilmara Regina e Antônio Carlos pela paciência, dedicação e sustento que me proporcionaram em todos esses anos. À minha irmã Leliane por estar sempre comigo me apoiando. À minha família que mesmo longe souberam entender o motivo da minha ausência. À minha orientadora MsC Fabiana Gonçalves Reis pela disponibilidade, paciência e contribuição para a elaboração deste trabalho e por todo o corpo docente do curso de Farmácia pelos conhecimentos até aqui passados. Agradeço também a meus amigos e colegas de classe que conviveram comigo esses cinco anos tornando-se uma segunda família e aos profissionais da Unidade de Saúde Jundiaí do Núcleo Hanseníase/Tuberculose pela atenção e materiais e disponibilizados. 6 RESUMO Hanseníase é uma doença infecciosa causada pelo Mycobacterium leprae e sua transmissão é pelo sistema respiratório superior. Caracteriza-se por apresentar lesões na pele, como manchas e nódulos, sem sensibilidade e lesões nos nervos periféricos, como dor e espaçamento. A classificação segue dois sistemas, o de Ridley-Jopling e o da Organização Mundial de Saúde. O diagnóstico da doença é clínico, laboratorial e diferencial e o tratamento consiste no uso da Poliquimioterapia para o tratamento da doença e no uso de corticosteroides e talidomida para os surtos reacionais. Na atenção farmacêutica o papel do profissional é melhorar a vida do paciente no que se refere a medicamentos. No caso da Hanseníase, o farmacêutico deve atuar orientando o paciente e encaminhando, se for o caso, para o Centro de Referência do tratamento da doença caso ele manifeste algum efeito colateral devido ao uso dos medicamentos. O presente trabalho tem como objetivo observar a orientação dada aos pacientes sobre o uso dos medicamentos para hanseníase e quanto à importância do acompanhamento do farmacêutico durante o tratamento da doença. Trata-se de uma revisão literária, com foco nas características clínicas da doença e no tratamento com suas possíveis reações. A presença de um farmacêutico no centro de referência seria de grande importância para a saúde pública, pois com suas orientações a adesão ao tratamento seria mais adequado e facilitado. Palavras chave: Hanseníase, epidemiologia, tratamento, atenção farmacêutica 7 ABSTRACT Leprosy is an infectious disease caused by Mycobacterium leprae and its transmission is the upper respiratory system. It is characterized by skin lesions present as nodules and stains without sensitivity and peripheral nerve injuries such as pain and spacing. The classification follows two systems, the RidleyJopling and the World Health Organization.'s Disease diagnosis is clinical, and laboratory and differential treatment is the use of multidrug therapy for the treatment of disease and use of corticosteroids and thalidomide for the lepra reactions. In the pharmaceutical care professional's role is to improve the life of the patient in relation to medicines. In the case of leprosy, the pharmacist must act by guiding patients and referring, where appropriate, for the Reference Center of the treatment of the disease if it expresses any side effects due to use of medications. This paper aims to educate patients about the use of medicines for leprosy as the importance of monitoring the pharmacist during treatment of the disease. This is a literature review, focusing on clinical aspects and treatment with its possible reactions. The presence of a pharmacist in the center of reference would be of great importance to public health, because with their adherence to treatment guidelines would be easier. Keywords: leprosy, epidemiology, treatment, pharmaceutical care 8 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 10 1.1 OBJETIVO..........................................................................................................11 2 METODOLOGIA........................................................................................................... 12 3 HANSENÍASE .............................................................................................................. 14 3.1 HISTÓRICO........................................................................................................... 14 3.2 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS ...................................................................... 17 3.3 CARACTERIZAÇÃO DA HANSENÍASE............................................................. 18 3.3.1 Agente etiológico ...................................................................................... 18 3.4- TRANSMISSÃO ...................................................................................................... 19 3.5- ASPECTOS CLÍNICOS ........................................................................................... 20 3.6- DIAGNÓSTICO ........................................................................................................ 26 3.6.1 Diagnóstico clínico .......................................................................................... 27 3.6.2 Diagnóstico laboratorial ................................................................................. 28 3.6.3 Diagnóstico diferencial ................................................................................... 31 3.7- TRATAMENTO ......................................................................................................... 33 4 ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA AO PACIENTE COM HANSENÍASE ............... 36 4.1- ATENÇÃO FARMACÊUTICA ................................................................................. 36 4.2- PACIENTE COM HANSENÍASE EM FOCO .......................................................... 39 4.2.1 Conduta em relação aos efeitos colaterais dos medicamentos ......... 42 4.2.2 Acompanhamento das intercorrências pós-alta e de familiares ......... 43 5 RESULTADO E DISCUSSÃO .................................................................................... 44 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 47 REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 48 ANEXOS ....................................................................................................................... 53 9 INDICE DE FIGURAS, QUADROS E TABELAS Gráfico 1 Figura 1 Figura 2 Figura 3 Figura 4 Figura 5 Figura 6 Figura 7 Figura 8 Quadro 1 Quadro 2 Quadro 3 Dados notificados à OMS dos casos de ------Hanseníase Fotografia microscópica do Mycobacterium leprae obtido a partir de - - - - - - uma lesão cutânea de Hanseníase Tipos de lesões dermatológicas ------causadas pela Hanseníase Espectro Clínico da Hanseníase Lesões dermatológicas caracteristicas da Hanseníase Virchowiana Esquema terapêutico de tratamento para a forma Paucibacilar (PB) Esquema terapêutico de tratamento para a forma Multibacilar (MB) Esquema terapêutico para tratamento infantil Folder informativo Pag 18 Pag 19 Pag 21 ------- Pag 23 ------- Pag 26 ------- Pag 35 ------- Pag 36 ------- Pag 36 ------- Pag 47 Classiicação de Hanseníase segundo ------Ridley-Jopling X OMS Doenças que podem ser confundidas ------com Hanseníase Doenças que podem ser confundidas com reações encontradas na - - - - - - Hanseníase Pag 24 Pag 31 Pag 32 Quadro 4 Diferença entre reação reversa e recidiva - - - - - - - Pag 33 Quadro 5 Tratamento utilizado atualmente para ------hanseníase Pag 34 Quadro 6 Efeitos colaterais da Rifampicina ------- Pag 39 Quadro 7 Efeitos colaterais da Clofazimina ------- Pag 40 Quadro 8 Efeitos colaterais da Dapsona ------- Pag 41 Quadro 9 Efeitos colaterias da Talidomida ------- Pag 41 Quadro 10 Efeitos colaterais dos Corticoides ------- Pag 41 Tabela 1 Quantidade de referências encontradas ------- Pag 12 Tabela 2 Quantificação de referências ------encontradas de acordo com sua origem Pag13 10 1 INTRODUÇÃO Hanseníase é uma doença granulomatosa infecciosa crônica produzida por um Bacilo Ácido Álcool-Resistente (B.A.A.R). É caracterizada por lesões da pele, nervos e vísceras que causam anestesia local, ulceração e grande variedade de lesões tróficas (MANSON-BAHR, 1943). Ela é classificada em cinco tipos: indeterminada, tuberculoide tórpida, tuberculoide reacional, dimorfa e virchoviana (Opromolla, 1981). Estima-se que em todo o país surgiram 33.741 novos casos de Hanseníase no ano de 2012 e a taxa de incidência foi de 17,39 em todo território brasileiro (BRASIL, 2013). O diagnóstico clínico da Hanseníase é realizado através do exame quando se busca os sinais dermatoneurológicos da doença e o diagnóstico laboratorial é feito pela baciloscopia, que é o exame onde se procura o Mycobacterium leprae em esfregaços das lesões hansênicas ou de outros locais de coleta selecionados, lóbulos auriculares e cotovelos (BRASIL, 2002). O tratamento específico da pessoa com Hanseníase, indicado pelo Ministério da Saúde, é a Poliquimioterapia (PQT) padronizada pela Organização Mundial de Saúde, devendo ser realizada nas unidades de saúde. A PQT é constituída pelo conjunto dos seguintes medicamentos: rifampicina, dapsona e clofazimina com administração associada. Essa associação evita a resistência medicamentosa e age matando o bacilo tornando-o inviável, que evita a evolução da doença, prevenindo as incapacidades e deformidades causadas por ela, levando à cura. O bacilo morto é incapaz de infectar outras pessoas, rompendo a cadeia epidemiológica da doença. Assim sendo, logo no início do tratamento, a transmissão da doença é interrompida, e, sendo realizado de forma completa e correta, garante a cura da doença (BRASIL, 2001b) Hepler e Strand (1990), definem atenção farmacêutica como: “provisão responsável de cuidados relacionados a medicamentos com o propósito de conseguir resultados definitivos que melhorem a qualidade de vida dos pacientes.” O farmacêutico pode através de direcionamento clínico melhorar os resultados farmacoterapêuticos, através de aconselhamento, programas educativos e motivacionais, e até com elaboração de protocolos clínicos, 11 baseados em evidências comprovadas, com estabelecimento dos melhores regimes terapêuticos e monitoração destes procedimentos (Bisson, 2007). O presente trabalho teve o objetivo de realizar uma revisão de literatura sobre a Hanseníase com foco nos aspectos patológicos, clínicos e no tratamento, visto que é longo e difícil, devido às reações adversas, o que dificulta a adesão do paciente, bem como discutir a atenção farmacêutica aos pacientes hansênicos. 1.1 OBJETIVO O objetivo principal do presente trabalho é discorrer colaterais e adversos sobre os efeitos que os medicamentos, podem trazer, bem como enfatizar que o acompanhamento farmacoterapêutico garante uma maior e melhor adesão do paciente portador da hanseníase ao tratamento. Para atingir tal objetivo é necessário buscar referências bibliográficas que abordam sobre a caracterização, classificação, diagnóstico, tratamento (efeitos colaterais e adversos) e interação medicamentosa. O objetivo também é confeccionar um folder contendo informações relevantes da doença, no intuito de informar as pessoas sobre a importância de estarem atentos a qualquer sintoma mencionado, e buscar orientação com profissionais adequados. 12 2 METODOLOGIA Trata-se de uma revisão da literatura que consistiu em um levantamento de informações e dados, tanto na literatura, quanto “in loco” e por meio de consulta eletrônica, utilizando a base de dados Scientific Electronic Library Online (SciELO), BIREME e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) por meio das palavras-chave contempladas nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): Hanseníase, Mycobacterium leprae e atenção farmacêutica. A pesquisa “in loco” foi realizada na unidade de saúde Jundiaí (Osego) na cidade de Anápolis, a qual é referência no munícipio e região para o tratamento da doença. O levantamento consistiu na busca de folders informativos, material de estudo e entrevistas com os profissionais que formam a equipe multiprofissional. Observou-se como é realizada a triagem, diagnóstico e como se procede a dispensação de medicamentos para a doença (poliquioterapia, prednisona e talidomida) e como é feito o acompanhamento do paciente durante o tratamento e pós alta. Durante a pesquisa bibliográfica sobre o tema, a maior parte foi encontrada em forma de cartilhas elaboradas pelo Ministério da Saúde, variando entre os anos de 1960 a 2010. Também foram encontrados artigos provenientes da Revista Brasileira de Dermatologia e livros que abordavam sobre o tema. Foram encontrados artigos em português, inglês e espanhol. Sobre a fonte de dados foram encontrados referências desde o ano de 1943 até 2010. (Tabela 1) Tabela 1- Quantificação de referências encontradas. REFERÊNCIAS ENCONTRADAS SOBRE O TEMA ANO QUANTIDADE ATÉ 1970 4 1970-2000 8 2000-2010 34 13 A parte que consiste em caracterizar a doença, classificá-la, discorrer sobre métodos que a diagnosticam e sobre seu tratamento, foi obtida em sua maioria a partir das cartilhas do Ministério da Saúde, seguida de artigos científicos encontrados em banco de dados e de livros. A quantidade de cada uma delas está na Tabela 2. Sobre a atenção farmacêutica (pharmaceutical care) muitas informações foram encontradas em livros, seguidos de artigos. Dados sobre a epidemiologia foram retirados do site da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Ministério Saúde (Vigilância Epidemiológica). Os estudos bibliográficos da Hanseníase são pesquisas que foram feitas e escritas há muitos anos, logo, referências novas que falam sobre a doença são limitados. Encontram-se variados artigos falando sobre Hanseníase e há livros também, porém as informações contidas não apresentam novidade. Tabela 2 – Quantidade de referências encontradas de acordo com sua origem Origem das referências encontradas Fontes Quantidade Porcentagem Livros 8 19% Artigos 28 60% Cartilhas 11 21% Total 47 100% 14 3 HANSENÍASE 3.1 HISTÓRICO De acordo com Opromolla (1981, p.1), É difícil afirmar, com certeza, a época do aparecimento de uma doença baseada em textos antigos, a não ser que haja uma descrição razoável da mesma com citações dos aspectos que lhe são mais característicos. Se não for assim, e se nos basearmos apenas em dados fragmentários e em suposições dos tradutores daqueles textos, o assunto se torna confuso e gera uma série de falsas interpretações. É o que acontece com a Hanseníase, sem uma descrição clara e precisa de sua clínica nos textos antigos não é possível saber com certeza sua história e evolução pelo mundo ao longo dos tempos (Eidt, 2004). Os registros mais antigos sobre a lepra (denominação antiga da hanseníase) estão descritos no chamado Papiros de Berlin 6619, datado em 2160- 1700 a.C. durante o império egípcio (Celis, 2003). Também encontramse registros no Antigo Testamento da Bíblia nos livros de Jó e dos Números e no Novo Testamento, há importantes alusões à lepra entre eles na parábola onde Jesus cura dez leprosos, descrito em Lucas (16: 19-31) (Castro e Berrío, 2011). Quando você tem em sua carne alguma mancha escamosa, ou um conjunto deles, ou uma mancha branca, brilhante e a praga na pele é lepra, será levado a Arão. O sacerdote examinará a peste e se ele vê que os cabelos se tornaram brancos e o lado afetado é mais profundo do que o resto da pele, é a praga da lepra. (Biblia Sagrada, Lv 13,1, p.155) Acredita-se que o foco principal da doença foi na faixa setentrional da África Central, pois ainda hoje constitui a área no mundo mais afetada pela doença (Brasil, 1960). Outros autores acreditam que ela é originária da Ásia (Jopling e McDougall, 1991) e até hoje discute-se a origem da Hanseníase Conforme Opromolla (1981), no livro “Nei Ching Wen”, cuja autoria é atribuída ao Imperador chinês Huang Tin, traduzido entre 2698-2598 a.C., aparece o termo li-feng para designar paralisia grave e descrever um estado patológico que provoca queda de sobrancelhas, nódulos, ulcerações, dormência, mudança de cor da pele e desabamento do nariz. 15 Outra possível referência, na literatura chinesa antiga, é encontrada no livro “Analects”, datado de 600 a.C., época da dinastia Chou. Neste escrito há referências que um dos discípulos de Confúcio sofria de uma doença parecida com a Hanseníase virchowiana, mas a descrição da mesma é imprecisa e restam dúvidas a respeito. Nesta época a doença era conhecida como lai ping e Ta Feng (Opromolla, 1981). Nos “Vedas” (1400 a.C.) a Hanseníase é mencionada como kushtha e, segundo Lowe (1947), alguns autores afirmam que nas “Leis de Manu” (1300500 a.C.) há instruções sobre a profilaxia da Hanseníase (Eidt, 2004). Na Babilônia há referência da doença como lepra, cujo significado é de uma doença escamosa. O mesmo acontece no império assírio, grego e egípcio na qual o nome da enfermidade é traduzida como uma doença escamosa (Opromolla, 1981). Há hipótese de que a lepra foi levada à Europa Oriental pelos exércitos persas e mais tarde pelos romanos. Foi também espalhada na Europa pelos sarracenos e pelos cruzados e no ocidente, pelos espanhóis e portugueses (MONOT M et al, 2005). Os documentos das antigas civilizações mencionam a lepra com nomes diferentes: nos Vedas a lepra é chamada com o nome de Kushtka, os persas já a chamavam de Zind, Preso Piso e Pisaga, na china de, Lai-fon, Aristoteles a nomeou de Satyriasis (Rodriguez, 2010). A Hanseníase foi uma das primeiras doenças infecciosas a ser relacionada a um microorganismo, o Mycobacterium leprae, identificado pelo médico norueguês Gerhard A. Hanse, em 1874 (Rongazy, 2008) No Brasil, a lepra aportou com a vinda dos portugueses e sua disseminação foi feita pelos escravos africanos. O padre Antônio Manuel, fundou um asilo para doentes de lepra no Recife, em 1714. Esse asilo deu origem ao Hospital de Lázaro em 1789 e funcionou até 1941 (Brasil,1989). Os primeiros doentes de lepra foram observados no Rio de Janeiro e foi edificada a primeira instalação Tósta pelo Capitão General Gomes Freire de Andrade, Conde de Bobadella, Governador do Rio de Janeiro, e foi mantido até a sua morte. A Bahia foi um dos grandes focos e foi calculado cerca de 3000 doentes de lepra em 1789. A situação já era tão grave que D. Rodrigo José de Meneses, fundou com o auxílio do povo o Hospital de São Cristóvão dos 16 Lázaros, na Quinta dos Jesuitas, em Salvador e que prestou humanitários serviços até 1947 (Brasil,1989). No início do século XX, com a descoberta do bacilo e seu contágio, os hospitais passaram a ser locais inadequados ao tratamento e em busca da „‟higienização da sociedade‟‟ surge um decreto que obriga os doentes a se confinarem em locais distantes das pessoas sadias em uma ilha (Queiroz e Puntel, 1997). O indivíduo leproso era segregado de seu meio familiar, levado a uma colônia, proibido de desenvolver qualquer contato com qualquer indivíduo de fora e submetido a um tratamento médico doloroso e comprovadamente inútil. As visitas eram realizadas sob um controle estrito no qual se evitava o contato; a simples aproximação do visitante o obrigava a um processo de fumigação esterilizante. Os filhos de pacientes confinados eram imediatamente retirados do convívio com os pais e internados em orfanatos especiais. O rigor aplicado no confinamento no Estado de São Paulo foi em geral muito mais estrito do que em outros estados do Brasil (Queiroz e Puntel, 1997, p. 35) Em 1920 surge o departamento nacional de Saúde Pública que pelo decreto de nº14, foi instituída a Inspetoria de Profilaxia da Lepra e Doenças Venéreas, que pela primeira vez tratara com respeito o problema da lepra e foram criados dez leprosários em diversos estados do País. (Queiroz e Puntel, 1997). A partir de 1934 os serviços de dispensários passaram a ser feitos nos centros de saúde, devido à reforma dos serviços de saúde pública. Então criou-se a Diretoria dos Serviços Sanitários nos Estados, tendo entre outras atribuições a de cuidar do problema da lepra (Ministério da Saúde, Brasil,1989). Na década de 40 com o advento da sulfona a sociedade científica acreditava ser possível o controle da doença e dessa forma foram feitas mudanças nas políticas de controle da Hanseníase e o isolamento compulsório foi abolido (Nogueira et al,1995). Em 1941 foi criado o Serviço Nacional de Lepra, do Departamento Nacional de Saúde e em 1956 o governo federal instituiu, sob a forma de campanha de competência nacional, um novo estilo de ação profilático, dinâmico e quantitativo, objetivando finalidades essencialmente preventivas (BRASIL, 1960). 17 O sistema representa uma feliz associação de esforços entre o leprologista e o médico sanitarista ou clínico geral. Esse conjunto, formado de um leprologista e determinado número de unidades médicas, selecionadas segundo a importância epidemiológica das áreas onde se acham sediadas, constitui o que denominamos grupo de trabalho (BRASIL,2000). Uma unidade médica pode ser o dermatologista de um Centro de Saúde, de um ambulatório ou de um hospital geral, os médicos de institutos de previdência ou órgãos para-estatais, ou seja, qualquer elemento credenciado e dedicado que se proponha a colaborar na campanha. Essas unidades médicas, devidamente orientadas e preparadas, tem função de tratar os casos de lepra conhecidos e residentes nos locais de seu âmbito de ação. Podem também atender àqueles que funcionalmente lhes competem assistir; reexaminar periodicamente os respectivos; encaminhar ao leprologista os casos que julgarem duvidosos ou difíceis de diagnosticar; instruindo-os a respeito dos aspectos clínicos e sanitários da lepra e realizando a educação sanitária dos doentes e da população em geral (Brasil,1989). 3.2 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS Doença de Hansen ou Hanseníase é uma infecção bacteriana granulomatosa crônica que atinge a pele e os nervos periféricos. A doença é causada obrigatoriamente por um bacilo intracelular, Mycobacterium leprae, que foi identificado no século XIX, pelo médico norueguês Gerhard Henrik Armauer Hansen (Eichelmann, 2013). A prevalência global de Hanseníase registrados no início do ano de 2011 foi de 192.246 casos e no ano de 2010 foram detectados mais 228.474 novos casos no mundo (OMS, 2014). Em 2012 foram notificados a OMS 232.847 casos no mundo, sendo que o país que mais teve novos casos foi a Índia com 134.752 notificações (OMS, 2014). O controle da Hanseníase tem melhorado significativamente devido a campanhas nacionais e subnacionais na maioria dos países endêmicos. Houve uma integração de serviços primários com colaborações e parcerias eficazes que levaram a uma redução considerável nos casos de Hanseníase. As 18 atividades focalizadas na intensificação do tratamento com múltiplas drogas foi um dos responsáveis pela redução dos casos (OMS, 2012). O tempo médio de incubação da doença é de 5 anos e para aparecer os primeiros sintomas pode demorar até 20 anos, fato que atrapalha na redução dos casos da doença e prejudica sua irradicação no mundo (OMS, 2014). . Os casos de Hanseníase no ano de 2009 em comparação com 2011 diminuíram consideravelmente como apresentado no Gráfico 1. Na América do Sul e na África houveram mais casos de ocorrência da doença e o Brasil é o segundo país no mundo em incidência da doença (Sandra, 2013). Dos casos notificados a OMS no mundo, houve um aumento de casos em 2012, que pode estar relacionada o tempo de incubação da doença e o aumento de casos em países endêmicos, como a Índia (OMS, 2013). Gráfico 1: Dados notificados à OMS dos casos de Hanseníase no mundo. n ú m e r o 300.100 200.020 230.357 190.975 d e c a s o s 2009 2010 2011 2012 Anos Fonte: OMS ,2014 3.3 CARACTERIZAÇÃO DA HANSENÍASE 3.3.1 Agente etiológico O Mycobacterium leprae é um bacilo álcool-ácido resistente que se apresenta em forma de bastonete reto ou ligeiramente curvo, que tem em torno 19 de 1,5 a 8 micra de comprimento e 0,2 a 0,5 micron de largura (Figura 1) (TORTORA et al, 2005), conforme figura abaixo. Trata-se de um microrganismo intracelular obrigatório que tem afinidade por células cutâneas e nervos periféricos (Brasil,2005). De acordo com TORTORA (2005) o M. leprae é visto em grupo, isolado ou em arranjos globais em esfregaços histopatológicos. Figura 1: Fotografia microscópica de Mycobacterium leprae obtido a partir de uma lesão cutânea de Hanseníase 1 3 2 Legenda: 1= Mycobacterium leprae isolado; 2= Mycobacterium leprae em globias (em grupo); 3= células sanguíneas Fonte: RINALDI, 2005 3.4- TRANSMISSÃO O homem é a fonte de infecção, que através das vias aéreas superiores, eliminam os bacilos para o meio externo. É possível também a transmissão por via cutânea, se houver lesão de continuidade da pele (JOPLING & Mc DOUGALL, 1991). A forma multibacilar é a principal fonte de infecção, pois, apresenta elevada carga bacilar na derme e em mucosas e pode disseminar bacilos para o meio externo (FOSS, 1999). Para adquirí-la é necessário o 20 contato direto com uma pessoa contaminada não tratada, apesar de nem todos que entrarem em contato com o agente chegarem a desenvolver a doença (ANDRADE, 2007). Não há estudo elucidado, mas há possibilidade de ocorrer infecção transplacentária (JOPLING & Mc DOUGALL, 1991). Secreções como leite, suor, secreção vaginal e esperma podem eliminar bacilos, mas não possuem importância na disseminação da infecção (ARAÚJO, 2003). Vários estudos têm demonstrado que, diante da contaminação, a maioria dos indivíduos oferece resistência ao M. leprae, não desenvolvendo a doença, situação que pode ser alterada, em função da relação entre agente, meio ambiente e hospedeiro (JOPLING & Mc DOUGALL, 1991). A Hanseníase pode atingir pessoas de todas as idades, de ambos os sexos, no entanto, raramente ocorre em crianças. Observa-se que crianças e menores de quinze anos, adoecem mais quando há uma maior endemicidade da doença. Há uma incidência maior da doença nos homens do que nas mulheres, na maioria das regiões do mundo (BRASIL, 2002). Além das condições individuais, outros fatores relacionados aos níveis de endemia e às condições socioeconômicas desfavoráveis, assim como condições precárias de vida e de saúde e o elevado número de pessoas convivendo em um mesmo ambiente, influem no risco de adoecer (BRASIL, 2002). A Hanseníase apresenta longo período de incubação; em média, de dois a sete anos. Há referência a períodos mais curtos, de sete meses, como também de mais de dez anos (BRASIL, 2005). 3.5- ASPECTOS CLÍNICOS Os sinais e sintomas da Hanseníase manifestam-se através de alterações no quadro dermatológico e neurológico que levam a suspeitar da doença. As alterações dermatológicas apresentam uma diminuição ou ausência de sensibilidade na pele, o que diferencia a Hanseníase de outras doenças de pele. Já as lesões neurológicas se não forem diagnosticadas e tratadas adequadamente, podem causar incapacidades físicas que podem evoluir para deformidades (Brasil, 2002). 21 As lesões dermatológicas mais comuns são: a) nódulo (caroço, lesão sólida, circunscrita, elevada ou não, de 1 a 3 cm de tamanho. É processo patológico que se localiza na epiderme, derme e/ou hipoderme. Pode ser lesão mais palpável que visível), b) manchas pigmentares ou discrômicas (são resultantes da ausência, diminuição ou aumento de melanina ou depósito de outros pigmentos ou substâncias na pele), c) placa (é a lesão que se estende em superfície por vários centímetros, podendo ser individual ou constituir aglomerados), d) infiltração (é o aumento da espessura e consistência da pele, com menor evidência dos sulcos, limites imprecisos, acompanhando-se, às vezes, de eritema discreto). Essas lesões ocorrem com maior frequência na face, orelhas, nádegas, braços, pernas e costas, mas podem aparecer em qualquer região do corpo (BRASIL, 2002). As lesões dermatológicas mais comuns estão ilustradas na Figura 2. Figura 2: Tipos de lesões dermatológicas causadas pela Hanseníase a) b) c) d) Fonte: Brasil, 2002 Além das lesões de pele a Hanseníase manifesta-se também através de lesões nos nervos periféricos decorrentes de processos inflamatórios desses nervos (neurites) e podem ser causados tanto pela ação do bacilo nos nervos como pela reação do organismo ao bacilo ou por ambas. Elas manifestam-se através de dor e espessamento dos nervos periféricos, perda de sensibilidade nas áreas inervadas por esses nervos, principalmente nos olhos, mãos e pés, 22 perda de força nos músculos inervados por esses nervos principalmente nas pálpebras e nos membros superiores e inferiores ( BRASIL, 2002). A neurite, geralmente, manifesta-se através de um processo inflamatório agudo, acompanhado de dor intensa e edema. No início, não há evidência de comprometimento funcional do nervo, mas, frequentemente, a neurite torna-se crônica e passa a evidenciar esse comprometimento, através da perda da capacidade de suar, causando ressecamento na pele (BRASIL, 2002). Há perda de sensibilidade, causando dormência e há perda da força muscular, causando paralisia nas áreas inervadas pelos nervos comprometidos. Quando o acometimento neural não é tratado pode provocar incapacidades e deformidades pela alteração de sensibilidade nas áreas inervadas pelos nervos comprometidos (BRASIL, 2002). O M. leprae é um bacilo com alto poder infectante e baixo poder patogênico. Depois da sua entrada no organismo, não ocorrendo a sua destruição, este irá se localizar na célula de Schwann e na pele. Sua disseminação para outros tecidos pode ocorrer nas formas mais graves da doença, nas quais o agente infectante não encontra resistência contra a sua multiplicação. Nesse caso, os linfonodos, olhos, testículos e fígado podem abrigar grande quantidade do bacilo (ARAUJO, 2003). Entre os aspectos imunopatológicos da Hanseníase sabe-se que apesar da produção de anticorpos específicos contra o M. leprae, mesmo em grande quantidade, é ineficaz para a eliminação dos bacilos nas formas multibacilares. A defesa é efetuada pela resposta imunológica celular, capaz de fagocitar e destruir os bacilos, mediada por citocinas (TNF-alfa, IFN-gama) e mediadores da oxidação, como os reativos intermediários do oxigênio (ROI), e do nitrogênio (RNI) fundamentais na destruição bacilar no interior dos macrófagos (VAN BEER, WIT, KLASTER, 1996). Nas lesões tuberculoides há predomínio de células T auxiliares CD4+, e citocinas Th1, como IL-2 e IFN-gama, enquanto nas lesões virchowianas o predomínio é de células T supressoras, CD8+ e citocinas Th2, como IL-4, IL-5 e IL-10 (FOSS, 1999). Na Hanseníase tuberculoide, a exacerbação da imunidade celular e a produção de citocinas pró-inflamatórias (IL-1 e TNF-alfa) impedem a proliferação bacilar, mas pode se tornar lesiva ao organismo, causando lesões cutâneas e neurais, pela ausência de fatores reguladores. Na Hanseníase 23 virchowiana, a produção dos antígenos PGL-1 e LAM pelo bacilo, no interior do macrófago, favorece o escape do mesmo à oxidação intramacrofágica, pois estes possuem função supressora da atividade do macrófago e favorecem a sua disseminação (FOSS, 1999). O sistema de classificação de Ridley-Jopling é o mais usado e é feito com base no estado clínico e imunológico do paciente (RIDLEY, 1966). A doença é dividida em 3 classes e um estado intermediário, referindo-se a Virchowiana, Hanseníase tubercoloide e dimorfa, respectivamente. A Hanseníase indeterminada é usada para representar a fase inicial da doença, na qual pode ser curada naturalmente ou pode mover em direção a uns dos tipos citados acima, podendo-se encaixar no polo virchowiano ou tuberculoide. (EICHELMANN, 2013). A classificação de Ridley-Jopling é derivada do espectro clínico da Hanseníase (Figura 3) que mostra como ocorre à evolução da doença. Figura 3: Espectro clínico da Hanseníase. Legenda: TT = tuberculoid (tuberculoide), BT= Borderline-tuberculoid (dimorfa-tuberculoide), BB = Mid-Bordeline (dimorfa-dimorfa). BL = Bordeline-lepromatous (dimorfa virchowiana), LL= Lepromatous (Virchowiana) Fonte: BOGGILD; KEYSTONE; KAIN, 2004 24 A OMS classifica a Hanseníase em 2 tipos: Paucibacilar e multibacilar. O Tipo Paucibacilar (PB) apresenta de 1 a 5 lesões cutâneas enquanto a Multibacilar (MB) apresenta mais de 5 lesões. Essa classificação facilita a forma de oferecer o tratamento ao paciente (RONGAZY, 2008). O Quadro 1 ilustra uma comparação entre a classificação de Ridley-Jopling e da OMS. Quadro 1: Classificação da Hanseníase segundo Ridley-Jopling X OMS Classificação Ridley-Jopling Indeterminada (I) Tuberculoide (TT) OMS Paucibacilar 1 a 5 lesões cutâneas Dimorfa-tuberculoide (BT) Dimorfa-dimorfa(BB) Dimorfa virchowiana ( BL) Multibacilar < 5 lesões cutâneas Virchowiana (LL) Fonte: Rongazy, 2008 Hanseníase Indeterminada (I): Corresponde à fase inicial, nas quais as características clínicas e histopatológicas impedem classificá-la. Caracteriza-se por ter uma lesão tipo mancha hipopigmentada, com anestesia ou hipoestesia local (tático, térmica e dolorosa). Esse tipo pode progredir para as fases seguintes ou curar espontaneamente. Na histopatologia não há evidências de granulomas e o infiltrado inflamatório é inespecífico (RONGAZY, 2008). Hanseníase Tuberculoide (TT): É resultado de uma boa resposta imunológica do hospedeiro que é capaz de destruir grande número de bacilos, caracterizada pela formação de granulomas epiteliodais que circunda os elementos dos nervos, com um denso infiltrado linfócítico que se estende até a pele. Clinicamente se apresentam como manchas hipopigmentadas ou placas eritromastosas, de bordas elevadas perfeitamente definidas e insensíveis (RONGAZY, 2008). Nesta fase os danos causados às terminações nervosas da derme são precoces, pois as lesões normalmente tem forte declínio de sensibilidade, além 25 de danos de um ou dois troncos nervosos nas proximidades, que pode aumentar de tamanho e associar-se com o motor sensitivo da zona inervada (RONGAZY, 2008). Finalmente a doença se caracteriza por remissões duradouras e reativações periódicas. (LUIS FERNÁNDEZ; RANGEL MAYORAK; LISO RUBIO, 2004). Hanseníase virchowiana (LL): Encontra-se no outro extremo do espectro clínico já que reflete uma resposta imune muito fraca, sendo os bacilos abundantes na pele e na mucosa nasal. Começa como manchas simétricas, ligeiramente eritematosas, mal definidas ou elevadas, que progridem para uma infiltração generalizada por toda a pele, maior nas áreas mais frias onde pode haver nódulos, cedendo à face o aspecto de “face leonina.” Também, há perda de sobrancelhas e cílios, mas raramente produz perda de cabelo, já que o couro cabeludo é um lugar de maior temperatura (RONGAZY, 2008). Produz engrossamento e ictiose nas pernas e, por vezes, a pele pode sofrer ulcerações e, como não há formação de granulomas, o comprometimento neural pode ser tardio, mas muitas vezes longo, e a função motora, em geral, é conservada (RONGAZY, 2008). Hanseníase dimorfa: As formas dimorfas compreende um espectro intermediário entre a Hanseníase tuberculoide, com uma boa resposta imunológica do hospedeiro, e a Hanseníase virchowiana, com uma resposta quase nula. A Hanseníase dimorfa-tuberculoide (BT) é similar à tuberculoide, mas as lesões são mais numerosas (RONGAZY, 2008). A Hanseníase dimorfa-virchowiana (BL) difere da virchowiana porque as lesões são mais definidas, assimétrica, e com áreas de pele saudável entre elas. A dimorfa-dimorfa (BB) é uma forma instável, que pode variar de BT ou BL, e se caracteriza pela presença de placas com bordas elevadas, com ilhas de pele aparentemente saudáveis, de bordas bem definidas (RONGAZY, 2008). A figura 4 ilustra algumas lesões dermatológicas características da Hanseníase virchowiana. Na Figura 4a observa-se a presença de placas e pápulas eritematosas na face interna do membro superior e na Figura 4b observa-se a presença de placa eritematosa com bordas externas mal definidas e região central do abdômen. 26 Figura 4: Lesões dermatológicas características da Hanseníase virchowiana. 4a 4b Fonte: Mitsuo et al, 2010 Fonte: Mitsuo et al, 2010 Em 1982, um grupo de estudos da OMS para programas de controle recomendou que a classificação de todos os pacientes fosse baseada na classificação Ridley-Jopling e na carga bacteriana dos esfregaços de pele da mancha. Os pacientes TT e BT que tiveram um índice bacilar (BI) ≤ 2+ eram classificados como doença paucibacilar (PB) e BB, BL e pacientes LL que tiveram um BI ≥ 2+ eram classificados como doença multibacilar (MB). O BI reflete o número de bacilos ácidos-resistentes por área média de óleo de imersão, e é expresso numa escala semilogarítima de 0- a 6+; BI de 2+ é a presença de 1 a 10 bacilos por 10 áreas de óleo de imersão (DHARMENDRA,1985). Em 1988, a comissão de Especialistas da Hanseníase, a fim de evitar a continuação na falha do tratamento dos pacientes PB com esfregaços de pele positivos, recomendou que tais casos fossem classificados como doença multibacilar, e consequentemente, qualquer paciente com uma baciloscopia de pele positiva é classificado como doença MB. (MOSCHELLA, 2004). Em geral, doença PB (equivalente à doença indeterminada, e às formas TT e BT) é definida como menos de 6 lesões cutâneas e baciloscopia negativa, e doença MB (equivale às formas BB, BL, LL) é caracterizada por 6 ou mais lesões com ou sem baciloscopia positiva (BOGGILD, KEYSTONE, KAIN, 2004). 3.6- DIAGNÓSTICO A Hanseníase é uma doença infecciosa lentamente progressiva por reações de hipersensibilidade (reações hansênicas) (MOSCHELLA,2004). O 27 diagnóstico é realizado através de um exame clínico buscando sinais dermatoneurológicos da doença, como lesões na pele com alteração da sensibilidade, acometimento do nervo com espessamento neural, baciloscopia positiva (BRASIL, 2002). É necessário realizar o diagnóstico diferencial com outras doenças dermatológicas com sinais e sintomas semelhantes a Hanseníase (BRASIL, 2001a). O diagnóstico da doença e sua classificação entre paucibacilar e multibacilar é importante para que seja escolhido o tratamento adequado. Se o paciente tiver até cinco lesões de pele e/ou apenas um tronco nervoso comprometido, a Hanseníase é classificada como paucibacilar. Se o paciente tiver mais de cinco lesões e/ou mais de um tronco acometido, a Hanseníase é classificada como multibacilar (BRASIL, 2001a). Para uma orientação de cuidados ao paciente faz-se necessário identificar o comportamento neural e a incapacidade física do paciente (BRASIL, 2001a). 3.6.1- Diagnóstico Clínico O diagnóstico clínico é realizado através do exame físico por meio de uma avaliação dermatoneurológica. Este tem início com uma anamnese, ou seja, colhendo informações sobre a história clínica (presença de sinais e sintomas) e da história epidemiológica (fonte de infecção) do paciente. O roteiro do diagnóstico segue a seguinte ordem: 1. Anamnese - obtenção da história clínica e epidemiológica; 2. Avaliação dermatológica - identificação de lesões de pele com alteração de sensibilidade; 3. Avaliação neurológica - identificação de neurites, incapacidades e deformidades. A anamnese é realizada em uma conversa com o paciente com objetivo de saber se ele realmente tem os sinais e sintomas característicos da doença, como: dor nos nervos da mão (nervo ulnar, radial e medial) e nos nervos do pé (nervo tibial posterior e fibular), obter informações que levem à epidemiologia da doença (se ele viajou pra algum lugar; se teve contato com algum 28 hansênico; se conhecia alguém que tem ou já teve a doença); observar se ele vai reclamar ou se tem alguma mancha, nódulo, dormência e sensibilidade (BRASIL, 2010). Na avaliação dermatológica são analisadas as características das manchas: se estão infiltradas e se apresentam hipocromia; da pele: se estão ressecadas, descamando, presença de pelo, rachaduras (BRASIL, 2008b). Pode ser feita uma avaliação oftalmológica, analisando a sensibilidade e opacidade da córnea, se o paciente apresenta triquíase e ectrópico, avaliar a força de contração dos olhos (BRASIL, 2008a). Na avalição neurológica é observada a situação das neurites com apalpação dos nervos e analisando a espessura dos nervos, com objetivo de pesquisar possíveis alterações neurológicas provocadas pela Hanseníase. É feita a apalpação dos troncos nervosos acessíveis e a avaliação funcional (sensitiva, motora e autonômica) daqueles mais frequentemente comprometidos pela doença (ARAÚJO, 2003). Além disso, é avaliada a força e sensibilidade dos membros irrigados por esses nervos. No teste de sensibilidade usa-se um instrumento chamado de estesiômetro. As avaliações das complicações neurológicas e dermatológicas estão presentes no ANEXO 1 (pgs 55,56,57). 3.6.2- Diagnóstico Laboratorial A baciloscopia serve como um apoio para o diagnóstico e é também um dos critérios de confirmação (ANEXO 2 pg.58. É um apoio para o diagnóstico e também serve como um dos critérios de confirmação recidiva quando comparado ao resultado no momento do diagnóstico e da cura. Se a baciloscopia for negativa não descarta o diagnóstico da Hanseníase (BRASIL, 2002). O diagnóstico da Hanseníase é clínico e não se deve esperar o resultado de exames acessórios para iniciar o tratamento. O tratamento é iniciado imediatamente após o diagnóstico da doença e sua classificação no paciente baseada no número de lesões na pele ou quantidade dos nervos acometidos (BRASIL, 2002). 29 A baciloscopia é um procedimento de baixo custo e de fácil execução, o que permite que qualquer laboratório do SUS possa executá-lo. O exame consiste em fazer em uma lâmina previamente identificada, um esfregaço do material (raspado dérmico) colhido no lóbulo direito da orelha, seguido do lóbulo esquerdo, cotovelo direito do paciente, seguido do esquerdo e/ou das lesões (quando houver e em lâmina separada) (BRASIL, 2010). A coleta nestes locais é uma determinação da OMS, visto que o Mycobacterium leprae tem tropismo por lugares frios do corpo, como nervos mais superficiais e pele (BRASIL, 2002). Após a coleta, deixar a lâmina secar em temperatura ambiente por cerca de 5 a 10 minutos e em seguida iniciar a fixação e coloração da mesma pelo método de Ziehl-Neelsen (BRASIL, 2010). Inicialmente a lâmina é colocada em um suporte apropriado, passando sob ela, com o esfregaço voltado para cima, uma chama de lamparina ou bico de Bunsen, 2 ou 3 vezes rapidamente, para fixar o esfregaço. Posteriomente o esfregaço é encoberto com solução de fucsina de Ziehl-Neelsen, previamente filtrada deixando-a agir por 20 min. Após os 20 minutos a lâmina é retirada do suporte e lavada em água corrente sob baixa pressão. O esfregaço é descorado com solução de álcool-ácido a 1%, até que o mesmo fique com uma coloração rosada. Novamente a lâmina é lavada em água corrente sob baixa pressão. O esfregaço é coberto com uma solução de azul de metileno a 0,3% por 1 minuto. É feita nova lavagem em água corrente sob baixa pressão e deixada à temperatura ambiente para secar. O procedimento microscópico é realizado para visualização ou não do bacilo (BRASIL, 2010). Há outros exames laboratoriais para o diagnóstico de Hanseníase como teste sorológico, reação em cadeia da polimerase (PCR), e a reação de Mitsuda (ANDERSON et al, 2007). A análise sorológica visa detectar glicolipídio fenólico 1, que acredita-se ser específico para M. Leprae (SUGITA,1995). O anti-glicolipídio-fenólico 1Ab corresponde à carga bacteriana, sendo maior em casos virchowianos do que em casos tuberculoides, apresentando alta sensibilidade e especificidade na identificação dos casos MB, e detectando apenas 40% a 60% dos PB. Pode ser útil para classificar pacientes com doença clinicamente manifestada e para 30 o acompanhamento da quimioterapia, devido à correlação entre a positividade do teste e a carga bacilar (MARTELLI et al, 2002). A introdução recente da PCR forneceu oportunidade sem precedentes para a detecção específica, sensível (para 1 a 10 organismos) e rápida de modo que os pacientes com Hanseníase tem demonstrado que a técnica de PCR é capaz de aumentar a sensibilidade da detecção do M. leprae sugerindo vantagem da técnica quando comparada ao exame histopatológico e baciloscópico convencionais (MARTELLI et al., 2002). A reação em cadeia da polimerase (PCR) é positiva em quase todos os casos de BL/LL. Porém sua utilidade em casos paucibacilar é controversa. A desvantagem para a sensibilidade da PCR é que detecta DNA de bacilos mortos e o sinal persiste mesmo após o tratamento, e, na diferenciação de reações tardias de recaídas (KATOCH, 2002). Nos países desenvolvidos, a técnica de PCR para DNA de M. leprae tem sido utilizada para auxiliar diagnóstico de casos mais difíceis. Entretanto, o alto custo e a sofisticação tecnológica empregados são entraves para sua incorporação no diagnóstico de rotina na Hanseníase, permanecendo ainda como importante instrumento de pesquisa para auxiliar a compreender a epidemiologia da Hanseníase na comunidade (MARTELLI et al., 2002). A reação de Mitsuda é um exame feito através da injeção intradérmica de 0,1 ml de mitsudina. Em hansenianos e em seus contatos intradomiciliares, a leitura da reação é feita quatro semanas após a inoculação da mitsumina, mas em indivíduos que não possuem contatos domiciliares com hansenianos a reação tardia à injeção de mitsumina pode levar mais tempo para se expressar clinicamente. A ausência de resposta clínica é denominada reação negativa, enquanto que uma infiltração franca, pápula ou nódulo com mais de 3 milímetros de diâmetro, é denominada reação positiva, a qual pode ser +(3 a 5 mm), ++(mais de 5mm) e +++(infiltração nodular ulcerada). Uma infiltração discreta com menos de 3 mm de diâmetro é considerada duvidosa (+/-) (BEIGUELMAN, 2002). O teste de mitsuda não pode ser usado para diagnosticar ou confirmar Hanseníase confiantemente, mas pode reconhecimento de casos (SEHGAL, 1994). ajudar na classificação e 31 3.6.3- Diagnóstico Diferencial Devido aos sinais e sintomas da Hanseníase serem por manifestações cutâneas e neurológicas a doença pode ser confundida com outra, como também outra doença pode ser confundida com a Hanseníase. O diagnóstico diferencial tem o objetivo de eliminar outras doenças que podem ser confundidas com a Hanseníase, como psoríase, linfoma, granuloma anular, entre outras (GUINTO et al.,1990). Esse diagnóstico leva em consideração as manifestações dermatológicas, neurológicas, as doenças deformantes e doenças sistêmicas nos períodos reacionais. Essas situações estão ilustradas nos quadros 2 e 3 abaixo (ARAUJO, 2003). Quadro 2 – Doenças que podem ser confundidas com Hanseníase Tipos de Hanseníase Hanseníase Indeterminada Hanseníase Tuberculoide Hanseníase Virchowiana Hanseníase Dimorfa Manifestações Neurológicas Diagnósticos Conflitantes Pitiríase versicolor, pitiríase alba, vitiligo, nervo acrômico, dermatite seborréica, dermatose solar hipocromiante, pinta e manchas hipocrômicas residuais, sensibilidade alterada, excepcionalmente poder ser normal da face. Reação persistente a picada de inseto, tinha do corpo, granuloma anular, sarcoidose, dermatite seborréica, sífilis secundária ou terciária, líquen plano, alopécia areata, alopécia mucinosa, farmacodermias, esclerodermia em placas, psoríase, leishmaniose tegumentar americana, esporotricose, tuberculose cutânea, paracoccidioidomicose e cromomicose, sensibilidade alterada (tende a ser fracamene anestésica), exceto lesões iniciais na face e espessamento de troncos nervosos. Sífilis secundária, farmacodermias, xantomatose, neurofibromatose, linfomas cutâneos, ictioses, alopécia areata, lupus eritematoso sistêmico, paracoccidioidomicose, doença de Jorge Lobo, leishmaniose difusa anérgica, sensibilidade alterada, espessamento de troncos nervosos, baciloscopia positiva. Urticária, linfomas, psoríase, farmacodermias, sífilis secundária ou terciária, pitiríase, rósea de Gilbert, eritemas figurados e os demais diferenciais possíveis para TT e LL, sensibilidade alterada, espessamento de troncos nervosos, baciloscopia positiva ou negativa. Neuropatias periféricas do diabetes, alcoolismo, infecção pelo HIV, induzidas por drogas; tumores dos nervos periféricos; síndromes compressivas do desfiladeiro, túnel do carpo, meralgia parestésica; doenças familiares, acropatia úlcero-multilante, neurite intersticial hipertrófica, Charcot-Marie e outras; siringomielia, tabes dorsalis e traumatismos. 32 Doenças Deformantes Camptodactilia, doença de Dupuytrem, artrite reumatóide e psoriásica, esclerose sistêmica, epidermólise bolhosa, tromboangeíte obliterante. Fonte: Araújo, 2003 Quadro 3 – Doenças que podem ser confundidas com as reações encontradas na Hanseníase. Tipos de reações secundárias Reação tipo 1 Reação tipo 2 do Diagnósticos Conflitantes Erispela, celulite, farmacodermias, urticárias, psoríase, sarcoidose, linfomas e paralisias súbitas - facial do tipo periférico, garras, pé caído, mão caída e a própria recidiva da Hanseníase. Febre de origem indeterminada, linfomas, lúpus eritematoso sistêmico, vasculites necrotizantes, diferencial do eritema nodoso (sarcoidose, do tuberculose, estreptococcias e drogas), diferencial das episclerites e iridociclites (colagenoses, toxoplasmose, tuberculoide, infecções viróticas). Fonte: Araújo, 2003 Considera-se recidiva quando o quadro observado em paciente que completa com êxito o tratamento, mas que posteriormente desenvolve novos sinais e sintomas da doença. As recidivas são raras e, geralmente, ocorrem nos casos que receberam poliquimioterapia inadequada para a sua forma clínica. Na maioria, os bacilos são sensíveis aos medicamentos e os pacientes podem ser retratados com os regimes originais (ARAUJO, 2003). Os critérios para o diagnóstico de recidiva em Hanseníase ainda não estão bem definidos. Atualmente, de acordo com o Ministério da Saúde, para o diagnóstico de recidiva após a PQT/OMS faz-se necessária a utilização de critérios de suspeição e de confirmação (BRASIL,2000). Para os pacientes paucibacilares (PB), os critérios de suspeição e confirmação são estritamente clínicos e aplicados nos casos que, após alta por cura, apresentarem lesões dermatoneurológicas novas ou exacerbação de lesões antigas, dor neural ou naqueles que apresentarem novas alterações de sensibilidade após alta por cura, não tendo respondido ao tratamento com corticosteroides (BRASIL,2000). Para os pacientes multibacilares (MB), os critérios são clínicos para a suspeição, e clínico e laboratorial para confirmação. São suspeitos os pacientes que apresentarem os sinais cutâneos e neurológicos e que não responderem ao tratamento com talidomida e ou corticosteroides nas doses e 33 prazos recomendados. Para a confirmação deve ser utilizado o critério clínico de ausência de resposta às drogas anti-reacionais e os critérios laboratoriais dos exames baciloscópico e histopatológico. Se o exame baciloscópico apresentar bacilos íntegros ou se for observado um aumento de dois logs em qualquer sítio, quando comparado com o exame de alta, confirma-se a recidiva. No exame histopatológico a confirmação é feita pela presença de padrão multibacilar (BRASIL,2000). É de grande importância a diferenciação entre um quadro reacional tipo I e uma recidiva, pois, clinicamente, os quadros podem ser muito semelhantes (ARAUJO,2003), as diferenças estão descritas no quadro 4. Quadro 4: Diferenças entre reação reversa e recidiva Reação tipo I (reversa) Recidiva Geralmente durante a PQT ou dentro de 6 meses após o tratamento Início súbito e inesperado Pode vir acompanhado de febre e mal-estar Lesões antigas se tornam eritematosas, brilhantes, infiltradas Pode haver ulcerações das lesões Em geral várias lesões novas Regressão com descamação Pode acometer vários troncos nervosos rapidamente, com dor, alteração da sensibilidade e função motora Excelente resposta a corticosteroides. Normalmente muito depois do término da PQT, acima de um ano de intervalo de tratamento Início lento e insidioso Geralmente sem sintomatologia geral Lesões antigas podem apresentar bordas eritematosas Ulceração é rara Poucas lesões novas Não há descamação Pode acometer um único nervo e as alterações motoras ocorrem muito lentamente Não responde bem aos corticosteroides. Fonte: Araújo, 2003 3.7- TRATAMENTO O tratamento do paciente com Hanseníase é fundamental para o controle da endemia, para eliminar essa doença como um problema de saúde pública e compreende na cura do doente, interrompendo a cadeia de transmissão (BRASIL,2002). O tratamento integral de um caso de Hanseníase compreende o tratamento quimioterápico específico - a poliquimioterapia (PQT), supressão dos surtos reacionais, prevenção de incapacidades físicas, reabilitação física e psicossocial (ARAÚJO, 2003). Além desses ainda é necessário fazer um 34 acompanhamento do paciente a fim de identificar e tratar as possíveis intercorrências e complicações da doença (BRASIL,2002). A terapia é feita à base de antimicrobianos para eliminar a micobactéria e de corticoide (prednisona) ou talidomida para os surtos reacionais. O esquema terapêutico varia de acordo com o tipo de Hanseníase e consiste basicamente com o uso da Dapsona, Rifampicina e Clofazimina, conforme o quadro 5. O motivo para fazer a combinação de fármacos é para reduzir a resistência, para ter uma terapia adequada quando já existe uma resistência primária e para o tratamento ter um menor tempo de duração (Goodman & Gilmar, 2005). Quadro 5: Tratamento Utilizado Atualmente para Hanseníase Formas Paucibacilares: tuberculoide, dimorfa tuberculoide e indeterminada: 2 drogas (Figura 5) DROGA DOSE DURAÇÃO 600mg/mensal -- supervisionada Rifampicina (RFM) - cápsulas, 300mg (*) 6 meses Sulfona (DDS-Dapsona) - comprimidos, 100mg 100mg/dia -- auto-administrada 6 meses (**)Clofazimina (CFZ) - drágeas, 50mg e 100mg Alternados 6 meses (*) -- Usada sob supervisão da unidade laboratorial (**)-- A CFZ seria a droga alternativa nos casos de resistência bacteriana, hipersensibilidade ou intolerância a sulfona Formas Multibacilares: virchoviana, dimorfa, virchoviana e dimorfa central: 3 drogas (Figura 6) DROGA DOSE DURAÇÃO Rifampicina (RFM) - cápsulas, 300mg 600mg/mensal – supervisionada 12 meses Sulfona (DDS-Dapsona) - comprimidos, 100mg 100mg/dia -- auto-administrada 12 meses Clofazimina (CFZ) - drágeas, 50mg e 100mg 300 mg/mensal – supervisionada 12 meses Doses para crianças (Figura 7) RFM -- 100mg/kg -- até 35kg DDS--1,5 mg/kg -- 50mg/dia CFZ -- 1,5 mg/kg -- 450mg/dia Nas crianças com peso acima de 35 kg, a dose é a mesma do adulto Fonte: Silva, 2006 Para as reações hansênicas tipo I utiliza-se corticosteroides, no caso a prednisona com dose de 40 a 60mg/dia, ajustando as doses de acordo com a melhora do quadro ou com os efeitos adversos sentidos pelo paciente em tratamento. Para as reações hansênicas tipo II a droga mais utilizada é a talidomida com dose de 100 a 400mg/dia, dependendo da gravidade da reação. De acordo com a progressão do quadro pode ser feita a retirada gradual da medicação, em alguns casos, é necessário usá-la, 35 ininterruptamente, durante meses. A segundo opção de tratamento para a reação tipo II é o uso de pentoxifilina (Silva, 2006). O uso da talidomida necessita de um termo de responsabilidade para o paciente utilizá-la (ANEXO 3 pg. 54). Figura 5: Esquema terapêutico de tratamento para a forma Paucibacilar (PB) Rifampicina- 300 mg Dapsona- 100mg Fonte: Própria autora, Anápolis, 2014 Figura 6: Esquema terapêutico tratamento para a forma Multibacilar (MB) Clofazimina – 100 mg Rifampicina – 300mg Clofazimina – 50 mg Fonte: Própria autora ,anápolis, 2014 Dapsona – 100 mg 36 Figura 7: Esquema terapêutico para tratamento infantil Rifampicina – 300mg Dapsona – 100 mg Fonte: Própria autora Anápolis, 2014 4 ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA AO PACIENTE COM HANSENÍASE 4.1- ATENÇÃO FARMACÊUTICA O conceito de atenção ou cuidado é o de propiciar bem-estar aos pacientes, e o farmacêutico dentro desse contexto deve utilizar seus conhecimentos e habilidades para propiciar ao paciente um resultado otimizado na utilização de medicamentos (BISSON, 2007). O farmacêutico é o último profissional que intervém antes que o usuário tome seu medicamento e isso deve ser aproveitado em benefício das pessoas assistidas pelo sistema de saúde (BONAL, 2001). O profissional farmacêutico pode fazê-lo realizando atendimento com o uso ou não de medicamentos, através de escuta ativa, tomada de decisões, identificação de necessidades, orientações, avaliações, entre outras, e fazendo intervenção, caso seja necessário, junto com outro profissional de saúde, visando resolver problemas 37 que podem interferir na farmacoterapia (BISSON, 2007). Sendo assim, o farmacêutico deve se aproximar do usuário de medicamento e recuperar sua importância no contexto de assistência a saúde (OPAS, 2002). A assistência farmacêutica compreende um conjunto de atitudes, valores éticos, comportamentos, habilidade, compromissos e coresponsabilidade na prevenção de doenças, promoção e recuperação da saúde, de forma integrada à equipe de saúde (OMS,1986) A assistência farmacêutica visa uma farmacoterapia racional e a obtenção de resultados definidos e mensuráveis, ou seja, é uma interação direta do farmacêutico com o usuário, e visa a melhoria da qualidade de vida desses. Essa interação também deve envolver as concepções dos seus sujeitos, respeitadas as especificidades bio-psico-sociais, sob a ótica da integralidade das ações de saúde (OMS, 1986). A atuação do farmacêutico em uma unidade básica de saúde, farmácias, drogarias e em hospitais traz uma redução de gasto com a saúde e resulta em benefícios para a população realizando ações como orientação sobre o uso correto de medicamentos; educação sanitária de pacientes, especialmente na falha de adesão ao tratamento ou reações adversas a medicamentos para os pacientes acometidos farmacoterapêutico profissionais para prescritores; pela Hanseníase; determinados elaboração pacientes comprometimento com e os contato do perfil com resultados os dos tratamentos farmacológicos (GOMES,2003). O desenvolvimento da atenção farmacêutica tem o objetivo principal de elaborar um uso racional dos medicamentos, mas para isso é necessário que o médico realize um diagnóstico correto da doença e prescreva, se for necessário, o tratamento farmacológico mais adequado para o caso. Os medicamentos prescritos devem estar disponíveis em qualidade e ter a qualidade assegurada. Além disso, os mesmos deverão ser dispensados, preparados e administrados de acordo com as informações prescritas pelo médico (GOMES, 2003). É recomendado que o farmacêutico possa desenvolver algumas funções complementares, com enfoque nos problemas medicamentosos prováveis, como: reações adversas que são aquelas não previsíveis (reação alérgicas), e 38 as que são previsíveis (efeito colateral e efeito tóxico do uso de medicamento); erros de medicação que podem ocorrer em decorrência de erro humano ou erro de falha no sistema, os erros mais comuns são dosagem e frequência de administração incorreta, via de administração imprópria, uso de medicamento inapropriado para as condições clínicas, falta de monitoramento de efeitos adversos de medicamentos e comunicação inadequada entre o médico, outros membros da equipe de saúde e o paciente (Robert, 2006). Oferecer uma atenção maior para mulheres grávidas avaliando o risco/benefício do tratamento medicamentoso; em crianças: avaliar as questões no que se refere ao regime terapêutico lembrando que as mesmas tem um metabolismo reduzido, a barreira hematoencefálica é mais permeável e que os rins e o fígado estão em desenvolvimento o que acarreta redução na taxa de eliminação dos mesmos; em pacientes com enfermidades crônicas é necessário um ajuste no perfil terapêutico de medicamentos de acordo com suas características individuais (Robert, 2006). Para pacientes de terceira idade a probabilidade de ocorrência de reações adversas, redução na adesão ao tratamento e ao seu mal uso é explicado pelo alto consumo, em quantidade e variedade de medicamentos, além disso, esses pacientes apresentam absorção (redução do fluxo diminuição da capacidade de sanguíneo e motilidade gastrointestinal), distribuição (diminuição do peso, da água corpórea, das proteínas plasmáticas, quantidade de receptores e aumento da quantidade de tecido adiposo), metabolização (diminuição do fluxo sanguíneo no fígado e redução da atividade enzimática) e excreção ( redução da função renal) dos fármacos, assim como em crianças a dose deve ser ajustadas para evitar acumulo de fármaco no organismo (GOMES, 2003). De acordo com Bisson (2007), a prática farmacêutica deve ser focada no paciente. Para as tarefas administrativas, compras, planejamento e armazenamento de insumos, realização de escala de trabalho é recomendado que seja contratado outro farmacêutico para desempenhar essa função. Bisson (2007) ainda diz que o “farmacêutico deve conferir todas as prescrições que chegam até ele, e com seus conhecimentos relativos a efeitos adversos, farmacoterapêuticos, farmacocinéticos e do perfil clinico do paciente, ele deve buscar o melhor para o paciente”. 39 4.2- PACIENTE COM HANSENÍASE EM FOCO Assim como qualquer medicamento, aqueles utilizados na poliquimioterapia e no tratamento dos surtos reacionais podem provocar efeitos colaterais. Existem trabalhos que permitem assegurar que o tratamento PQT/OMS raramente precisa ser interrompido devido os efeitos colaterais. A equipe da unidade básica precisa ficar atenta para essas situações e encaminhar a pessoa à unidade de referência para receber o tratamento adequado (BRASIL, 2007). Caso a paciente esteja grávida, ela deve apresentar poucas complicações exceto pela anemia que é comum nessas doenças crônicas. Algumas drogas são excretadas pelo leite, mas não causam efeitos adversos. Os recémnascidos, porém, podem apresentar a pele hiperpigmentada pela clofazimina, ocorrendo regressão gradual da pigmentação após a parada da PQT/OMS ou da amamentação. Em geral, a gravidez e o aleitamento materno não contraindicam a administração dos esquemas poliquimioterápicos da Hanseníase, que são seguros tanto para a mãe como para a criança (BRASIL, 2007). Em pacientes com AIDS o esquema PQT/OMS não deve ser alterado, pois os medicamentos não interferem nos inibidores de proteases utilizados no tratamento de indivíduos com AIDS (BRASIL, 2001b). As tabelas abaixo, quadros 6, 7,8 e 9 mostram os efeitos colaterais que o PQT/OMS causam (rifampizina, clofazimina e dapsona) e dos medicamentos utilizados nos surtos reacionais (talidomida e corticosteroides), respectivamente (BRASIL, 2007). Quadro 6: Efeitos colaterais da Rifampicina Aréa/Tecido/Sistema afetado Principais reações observadas Cutâneos rubor de face e pescoço, prurido e rash cutâneo generalizado Gastrointestinais diminuição do apetite e náuseas. Ocasionalmente, podem ocorrer vômitos, diarréias e dor adbominal leve 40 Hepáticos mal-estar, perda do apetite, náuseas, podendo também ocorrer icterícia. Caso o paciente apresente transaminase e/ou bilirrubina aumentadas mais de duas vezes o valor normal a medicação deve ser suspensa e o paciente encaminhado à unidade de referência. Hematopoéticos Trombocitopenia, púrpuras ou sangramentos anormais, como epistaxes. Caso ocorra hemorragias gengivais e uterinas o paciente deve ser encaminhado ao hospital. Anemia hemolítica Tremores, febre, náuses, cefaléia e às vezes, choque, podendo também ocorrer icterícia leve. Fonte: Brasil, 2007 Pode ocorrer uma síndrome “pseudogripal” quando o paciente apresenta: febre, calafrios, mialgias, cefaleia, dores ósseas, podendo o quadro evoluir para eosinofilia, nefrite intersticial, necrose tubular aguda, anemia hemolítica e choque. Esta síndrome é muito rara e se manifesta a partir da 2ª ou 4ª dose supervisionada, devido à hipersensibilidade por formação de anticorpos anti-rifampicina, quando o medicamento é utilizado em dose intermitente (BRASIL, 2007). Quadro 7: Efeitos colaterais da Clofazimina Sistema/Tecido afetado Principais reações observadas Cutâneos Ressecamento da pele, podendo evoluir para ictiose, alteração na coloração da pele e suor. * Gastrointesinais Diminuição da peristalse e dor abdminal, devido ao depósito de cristais de clofazimina nas submucosas e linfonodos intestinais, resultando na inflamação da porção terminal do intestino delgado. ** *Nas pessoas de pele escura, a cor pode se acentuar; nas pessoas claras, apele pode ficar com uma coloração avermelhada ou adquirir um tom acinzentado, devido à impregnação e ao ressecamento. Esses efeitos regridem muito lentamente, após a suspensão do medicamento. ** Os efeitos citados poderão ser encontrados com maior frequência na utilização de doses de 300mg/dia por periodos prolongados, superiores a 90 dias. Fonte: Brasil, 2007 41 Quadro 8: Efeitos colaterais da Dapsona Área/Sistema/ Afetado Cutâneos Hepáticos Principais reações observadas Síndrome de Stevens-Johnson, dermatie esfoliativa ou eritroderma Icterícia, náuseas e vômitos Hemolíticos Tremores, febre, náuseas, às vezes choque, podendo ocorrer icterícia leve, metaemoglobulinemia, cianose, dispnéia, taquicardia, cefaleia, fadiga, desmaios, anorexia e vômitos Outros Outros efeitos colaterais raros podem ocorrer, tais como insônia e neuropatia motora periférica. Fonte: Brasil, 2007 Quadro 9: Efeitos colaterais da Talidomida Principais reações observadas com o uso de Talidomida Teratogenecidade; Sonolência; Edema unilateral dos membros inferiores; Constipação intestinal; Secura de mucosas; Linfopenia (raramente) Fonte: Brasil, 2007 Quadro 10: Efeitos colaterais dos corticoides Principais reações observadas com o uso de Corticoides Hipertensão arterial; Disseminação de infestação por Strongyloides stercoralis; Disseminação de tuberculose pulmonar; Gastrointestinais: Gastrite e úlcera péptica; Redução de Sódio e potássio, aumento da taxa de glicose no sangue, alteração do metabolismo do cálcio, levando à osteoporose e à síndrome de Cushing; Outros: agravamento de infecções latente, acne cortisônica e psicoses. Fonte: Brasil, 2007 O diagnóstico desses efeitos colaterais é fundamentalmente baseado nos sinais e sintomas por eles provocados (BRASIL, 2007). 42 Os medicamentos podem interagir com alimentos, bebidas e/ou outros medicamentos retardando, potencializando ou inibindo os seus efeitos. As interações que podem ocorrer estão presentes no ANEXO 5 pg 60,61,62. 4.2.1 Conduta em relação aos efeitos colaterais dos medicamentos A equipe multiprofissional responsável pelo acompanhamento e tratamento da Hanseníase deve estar sempre atenta para a possibilidade de efeito colateral dos medicamentos utilizados na PQT e no tratamento dos estados reacionais (BRASIL, 2007). Em caso de náuseas e vômitos incontroláveis deve-se: suspender o tratamento, encaminhar o paciente para a unidade de saúde de referência, solicitar exames complementares, para realizar diagnóstico diferencial com outras causas, investigar e informar à unidade de referência se estes efeitos ocorrem após a ingestão da dose supervisionada da rifampicina, ou após as doses auto-administradas de dapsona (BRASIL, 2007). Caso seja necessária a interrupção da Dapsona devido a seus efeitos colaterais deve-se trocar o antimicrobiano pela primeira droga de escolha que é a Clofazimina e dessa forma prosseguir com o tratamento do doente. Em caso de icterícia deve-se: suspender o tratamento se houver alteração das provas de função hepática, como valores superiores a duas vezes os normais, encaminhar o paciente à unidade de referência, fazer a avaliação da história pregressa de alcoolismo, hepatite e outras doenças hepáticas, solicitar exames complementares necessários para realizar diagnóstico diferencial, investigar se a ocorrência deste efeito está relacionada com a dose supervisionada de rifampicina ou com as doses auto-administrada de dapsona (BRASIL, 2001b). Em caso de anemia hemolítica deve-se: suspender o tratamento, encaminhar o paciente à unidade de referência ou a um hematologista para avaliação e conduta, investigar se a ocorrência deste efeito está relacionada com a dose supervisionada de rifampicina ou com as doses auto-administradas de dapsona (BRASIL, 2007). Em caso de metaemoglobinemia, se for leve, deve-se suspender o medicamento e encaminhar o paciente para unidade de referência, observar, 43 pois geralmente ela desaparece, gradualmente, com a suspensão do medicamento. Porém, se a metaemoglobinemia for grave deve encaminhar o paciente para uma internação hospitalar (BRASIL, 2001b). Caso o paciente tenha a gripe pseudogripal é necessário suspender a rifampicina imediatamente, encaminhar o paciente para unidade de referência e avaliar a gravidade do quadro. Nos quadros leves, administrar anti-histamínico, antitérmico e deixar o paciente sob observação por pelo menos 6 horas e nos casos moderados e graves encaminhar o paciente à unidade de referência para administrar corticosteroides (hidrocortisona, 500mg/250mL de soro fisiológico – 30 gotas/minuto, via intravenosa e, em seguida, prednisona via oral, com redução progressiva da dose até a retirada completa) (BRASIL,2007). Nos efeitos cutâneos provocados pelas clofazimina deve-se evitar exposição solar para minimizar os efeitos e prescrever a aplicação diária de óleo mineral ou cremes de uréia, após banho (BRASIL, 2001b). Para farmacodermia leve até síndrome de Stevens-Johnson, dermatite esfoliativa ou eritrodermia provocados pela dapsona deve-se definitivamente interromper o tratamento e encaminhar o paciente à unidade de referência (BRASIL, 2007). Se o paciente apresentar efeitos colaterais aos corticoides é necessário observar as precauções ao uso de corticosteroides e encaminhar imediatamente à unidade de referência (Silva, 2006). Caso seja necessário trocar algum medicamento do PQT/OMS os medicamentos alternativos estão descritos no ANEXO 4 pg 59. 4.2.2 Acompanhamento das intercorrências pós-alta e de familiares O acompanhamento dos casos pós-alta consiste no atendimento às possíveis intercorrências que possam ocorrer com a pessoas que já concluíram o tratamento PQT/OMS (BRASIL,2001b). As pessoas que apresentaram intercorrências pós-alta deverão ser tratadas na unidade básica de saúde, por profissional de saúde capacitado, ou em uma unidade de referência ambulatorial, por médico treinado. Somente os casos graves, bem como os que apresentarem reações reversas graves, deverão ser encaminhados para hospitalização. É importante diferenciar um 44 quadro de estado reacional de um caso de recidiva. No caso de estados reacionais, a pessoa deverá receber tratamento anti-reacional, sem reiniciar porém, o tratamento PQT/OMS. No caso de recidiva, o tratamento PQT/OMS deve ser reiniciado (BRASIL,2001b). Quando um paciente novo é diagnosticado pede-se o exame de contato de todos os familiares próximos como esposo (a), filho (a)(s), mãe, pai, para avaliar se eles foram infectados pelo Mycobacterium leprae. Caso alguém da família apresente os sintomas da doença faz-se o diagnóstico confirmatório, mas, se estiver infectado e for assintomático todos os parentes próximos devem tomar BCG para aumentar a imunidade e diminuir a patogenicidade do Mycobacterium ( BRASIL, 2001b). 5 RESULTADO E DISCUSSÃO O farmacêutico deve atuar como fonte de informação sobre os medicamentos para a equipe e os pacientes, sendo o responsável pelo controle do uso racional e seguro do medicamento (Angonesi e Sevalho, 2010). Assim, a Assistência Farmacêutica é conceituada como um grupo de atividades relacionadas com o medicamento, destinadas a apoiar as ações de saúde demandadas por uma comunidade. Envolve o abastecimento de medicamentos em todas e em cada uma de suas etapas constitutivas, a conservação e controle de qualidade, a segurança e a eficácia terapêutica dos medicamentos, o acompanhamento e avaliação da utilização, a obtenção e a difusão de informação sobre medicamentos e a educação permanente dos profissionais de saúde, do paciente e da comunidade para assegurar o uso racional de medicamentos (BRASIL, 1998). A atenção farmacêutica é um termo relativamente novo que surgiu com a união da equipe multiprofissional e visa formas de melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento, diminuindo os efeitos colaterais dos medicamentos. Na base de dados utilizada não havia muitas referências descritas sobre o assunto, ainda que a atenção farmacêutica seja um trabalho do dia-a-dia e ainda não há fórmula para executá-la. 45 Nos centros de referência a equipe multidisciplinar é composta por um médico dermatologista, um fisioterapeuta, um enfermeiro, um técnico em laboratório de análises clínicas e um assistente social. Ter um farmacêutico compondo essa equipe é de extrema importância, pois é ele quem pode informar com maior conhecimento as devidas interações e efeitos colaterais que os medicamentos podem causar. Atualmente ele é responsável somente pela dispensação da Talidomida, pois esse medicamento se encaixa na portaria 344/98 da ANVISA (ANVISA,1988). Nos centros de referência o profissional encarregado pela dispensação da poliquimioterapia (PQT) é o enfermeiro responsável, porém ter o farmacêutico com essa função, dando assistência aos infectados e a seus familiares seria de grande valia a fim de melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento e no controle da qualidade e no armazenamento dos medicamentos. São necessários novos estudos acerca do assunto, projetos a fim de diminuir a epidemiologia da doença e mais fontes bibliográfias que delineiem o que é e qual a melhor forma de executar o cuidado que o paciente hansênico precisa. O Ministério da Saúde criou o programa de atenção ao controle da Hanseníase com o objetivo de descentralizar as ações para controle da Hanseníase. Além disso, muito se tem investido para capacitação de profissionais de saúde que atuam na rede básica, porém há uma grande fragilidade da integração entre as ações de controle e a atenção básica devido à precariedade da execução a nível municipal. O que se tem hoje é uma desvalorização na atenção à Hanseníase devido à falta de informação sobre a doença. Ela precisa ser vista como prioridade, tanto pelo poder público, quanto pelos profissionais da saúde e ser cobrada pela população através dos conselhos municipais. Para melhorar a atenção farmacêutica seria interessante criar Núcleos de Assistência a Saúde da Família (NASF) de acordo com o perfil epidemiológico local e garantir unidades de referência para o atendimento das complicações e reabilitação dos portadores, com fluxo reconhecido e acessível a portadores, familiares e profissionais. Formação de Conselhos Gestores Comunitários e Conselheiros Municipais de Saúde sobre a Hanseníase e sua inserção nas políticas de saúde. Além de criar mais projetos a fim de informar e 46 conscientizar a população sobre a importância do diagnóstico precoce da doença e a sua importância no cenário da saúde pública. Este trabalho gerou um folder informativo (figura 8) que contém os principais sintomas da doença e quais os principais efeitos colaterais causados pelo uso dos medicamentos utilizados no tratamento da Hanseníase, que será muito interessante se for divulgado nos Postos de Saúde, hospitais, escolas objetivando a informação e conscientização quanto à procurar atendimento médico caso haja suspeita da doença. Geralmente, durante o tratamento nos centros de referência, não existe um profissional farmacêutico qualificado na equipe multiprofissional para dar suporte ao paciente durante o tratamento da doença e para conversar com o mesmo a fim de orientar a criar meios para diminuir os efeitos indesejáveis que o medicamento pode causar, como metaemoglobinemia, anemia, náusea, icterícia, escurecimento da pele, entre outros. Figura 8: Folder informativo Fonte: Própria autora 47 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS . A Hanseníase ainda é um grande problema de saúde pública, apesar da diminuição de seus índices epidemiológicos. Falta ao governo fazer campanhas de informação sobre a doença, falta informação à população de como é importante o tratamento pois com ele se chega à cura e se evita a transmissão da doença, visto que qualquer pessoa pode ser contaminada independente da idades, sexo e/ou classe social. O tratamento é fornecido pelo SUS e é gratuito, mas como trata-se de uma combinação de antibióticos é necessário um cuidado especial, não só pela possibilidade de resistência da micobactéria ao medicamento como também aos efeitos indesejáveis que estes medicamentos podem trazer. A presença de um farmacêutico no centro de referência seria de grande valia, pois possibilitaria um controle mais eficaz sobre o armazenamento adequado dos medicamentos e a sua dispensação seria feita de forma otimizada informando aos pacientes todos os cuidados que ele deveria ter. O acompanhamento dos acometidos pela doença deve ser feito de forma mais próxima, a fim de minimizar os efeitos indesejáveis que eles podem ter e melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento . 48 REFERÊNCIAS ANGONESI, D. SEVALHO. G.; Atenção Farmacêutica: fundamentação conceitual e crítica para um modelo brasileiro. revista Ciência & Saúde Coletiva, pag, 3603-3614, 2010 ANDERSON, .H et al. Hansen Disease in the United States in the 21st century. Archives of Patology and Laboraratory Medicine, v.131, n.6, p. 982- 986, June 2007. ANDRADE, V.L.G. Acessibilidade ao diagnóstico, tratamento e reabilitação física da Hanseníase: uma responsabilidade de todos. 2007. ARAÚJO, M. G. Hanseníase no Brasil. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, Uberaba, v. 36(3), p.373-382, maio/jun. 2003.. BEIGUELMAN, B., Genética e Hanseníase. Ciência & Saúde Coletiva, v.7, n.1, p. 117-128, 2002. 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