MINISTÉRIO DA SAÚDE FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ INSTITUTO OSWALDO CRUZ Mestrado em Programa de Pós-Graduação em Biologia Parasitária ANÁLISE DO CONTROLE VIRAL E CARACTERIZAÇÃO DE SUBPOPULAÇÕES DE CÉLULAS IMUNES EM INFECÇÕES PELO VÍRUS DA HEPATITE E GENÓTIPO 3 DE ORIGEM SUÍNA E HUMANA EM MACACOS CYNOMOLGUS (Macaca fascicularis) NA FASE DE CONVALESCÊNCIA. DIANA CHAVES PEREIRA MEJIDO Rio de Janeiro Abril de 2014 INSTITUTO OSWALDO CRUZ Programa de Pós-Graduação em Biologia Parasitária DIANA CHAVES PEREIRA MEJIDO Análise do controle viral e caracterização de subpopulações de células imunes em infecções pelo Vírus da hepatite E genótipo 3 de origem suína e humana em macacos cynomolgus (Macaca fascicularis) na fase de convalescência. Dissertação apresentada ao Instituto Oswaldo Cruz como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Biologia Parasitária Orientador (es): Prof. Dr. Marcelo Alves Pinto RIO DE JANEIRO Abril de 2014 ii INSTITUTO OSWALDO CRUZ Programa de Pós-Graduação em Biologia Parasitária DIANA CHAVES PEREIRA MEJIDO ANÁLISE DO CONTROLE VIRAL E CARACTERIZAÇÃO DE SUBPOPULAÇÕES DE CÉLULAS IMUNES EM INFECÇÕES PELO VÍRUS DA HEPATITE E GENÓTIPO 3 DE ORIGEM SUÍNA E HUMANA EM MACACOS CYNOMOLGUS (Macaca fascicularis) NA FASE DE CONVALESCÊNCIA. ORIENTADOR (ES): Prof. Dr. Marcelo Alves Pinto Aprovada em: 16 / 04 / 2014 EXAMINADORES: Profa. Dra. Luzia Maria de Oliveira Pinto - Presidente (IOC/Fiocruz) Profa. Dra. Rita de Cássia Nasser Cubel Garcia (UFF) Profa. Dr. Eduardo de Mello Volotão (IOC/Fiocruz) Prof. Dra. Adriana de Abreu Corrêa (UFF) Prof. Dr. Túlio Machado Fumian (IOC/Fiocruz) Rio de Janeiro, 16 de abril de 2014 iii Dedico este trabalho à minha eterna coragem de lutar pelo que acredito e à legitimidade do desejo do jovem por transformação. iv AGRADECIMENTOS Aos meus pais, João Marcelo Ferreira Mejido e Rosa Maria Chaves Pereira Mejido, pelo amor e apoio incondicionais. Ao meu noivo, Rodrigo Chaloub Dieguez, por todo amor, companheirismo e compreensão sempre. À minha grande amiga, Monique Ribeiro de Lima, pela fraternidade, apoio e amizade em todos os momentos. Ao Dr. Renato Marchevsky, pelo exemplo profissional, por toda a solidariedade, amizade e apoio, fundamentais para a concretização deste trabalho. Ao meu orientador, Dr. Marcelo Alves Pinto, pela oportunidade, por todo o suporte, incentivo e ensinamentos fundamentais à realização deste trabalho. À amiga Noemi Rovaris Gardinali do Laboratório de Desenvolvimento Tecnológico em Virologia – IOC, pelo imenso auxílio no desenvolvimento das atividades referentes a este projeto e por todo o companheirismo. Aos companheiros do Laboratório Desenvolvimento Tecnológico em Virologia – IOC, em especial a Natália Lanzarini, Yohan Kevorkian, Juliana Guimarães e Juliana Melgaço pelo companheirismo e auxílio prestado em vários momentos no decorrer do mestrado. À amiga Ana Carolina Carajavile pela cumplicidade, amizade e apoio profissional. Às amigas Michelle Menezes e Nilcéia Ramos por todo carinho, suporte e palavras de motivação, sem as quais, dificilmente, eu teria conseguido finalizar este trabalho. Aos amigos de turma Geovane Lopes, André Dias e Milene Yoko pela cumplicidade no curso deste mestrado. Ao Dr. Túlio Fumian do Laboratório de Virologia Comparativa e Ambiental – IOC, pelo auxílio no desenvolvimento do PCR em tempo real. Às equipe do Laboratório de Microscopia confocal da UERJ e do Laboratório de Pesquisa sobre o Timo – IOC, pelo auxílio nas atividades de imunofluorescência. v A todos àqueles que contribuíram diretamente ou indiretamente para a realização deste trabalho. Ao Instituto Oswaldo Cruz – IOC e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, pelo auxílio financeiro que possibilitou a realização deste trabalho. vi INSTITUTO OSWALDO CRUZ ANÁLISE DO CONTROLE VIRAL E CARACTERIZAÇÃO DE SUBPOPULAÇÕES DE CÉLULAS IMUNES EM INFECÇÕES PELO VÍRUS DA HEPATITE E GENÓTIPO 3 DE ORIGEM SUÍNA E HUMANA EM MACACOS CYNOMOLGUS (Macaca fascicularis) NA FASE DE CONVALESCÊNCIA. RESUMO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM BIOLOGIA PARASITÁRIA Diana Chaves Pereira Mejido O vírus da Hepatite E (HEV) apresenta-se relacionado à crescente ocorrência de casos da doença em países industrializados. Os achados deste em inúmeras espécies animais e sua transmissão associada ao consumo de produtos de origem animal, o definem como um agente zoonótico de importância para a Saúde Pública. Frente à escassez de informações sobre a patogenia da hepatite E, optou-se por avaliar o controle viral e caracterizar as células imunes envolvidas na resposta intra-hepática na fase de convalescência da infecção experimental com o HEV3 recuperado de suínos e humanos em macacos cynomolgus (Macaca fascicularis). No diagnóstico molecular por qRT-PCR em tecidos coletados 67 dpi, pôde-se detectar o RNA viral indicativo de permanência do vírus no trato biliar de dois animais e no fígado de um animal, inoculados com HEV suíno. Em imunomarcações específicas para a detecção do antígeno viral, todos os animais expressaram HEV Ag na fase tardia de infecção, principalmente em células sinusoidais. A discordância na detecção do HEV RNA e do HEV Ag sugere sensibilidades diferentes dos ensaios durante a fase da convalescência. A hiperplasia das células de Kupffer não foi observada no período de estudo, entretanto, a frequência elevada de células de kupffer comarcadas com HEV no grupo suíno sugere uma maior imunoreatividade tecidual ao HEV3 suíno em fase tardia da infecção. Quanto à expressão da enzima iNOS, observou-se pouca presença em células de Kupffer e maior expressão em células circulantes sinusoidais e hepatócitos, envolvidos na resposta inflamatória convalescente da hepatite E, com maior produção de iNOS nos animais inoculados com HEV suíno. O envolvimento significativo de linfócitos TCD4 e TCD8 foi observado na resposta imune celular, com predominância da população de TCD8. Concluímos que infecções com HEV3 de diferentes origens produzem padrões distintos de imunoreatividade hepática. A interação de células de Kupffer com o antígeno viral frente à infecção com o HEV3 varia com a origem dos inóculos. Assim como a produção de NO parenquimal, que parece atuar no controle do binômio infecção/dano tecidual na convalescência, predominantemente no grupo infectado com HEV3 de origem suína. O envolvimento das células TCD4 e TCD8 na resposta imune intra-hepática também mostrou-se influenciado pelo inóculo, com uma frequência maior destes linfócitos no grupo infectado com o HEV3 suíno. Sendo assim, a distância filogenética entre as espécies origem dos inóculos (suínos ou humanos) e a espécie hospedeira (primatas), parece influenciar na mediação do processo inflamatório para a resolução da hepatite E. vii INSTITUTO OSWALDO CRUZ ANALYSIS OF VIRAL CONTROL AND CHARACTERIZATION OF IMMUNE CELL SUBPOPULATIONS IN INFECTIONS BY HEPATITIS E GENOTYPE 3 OF SWINE AND HUMAN ORIGIN IN CYNOMOLGUS MONKEYS (MACACA FASCICULARIS) IN CONVALESCENCE PHASE. ABSTRACT MASTER DISSERTATION IN BIOLOGIA PARASITÁRIA Diana Chaves Pereira Mejido Hepatitis E virus (HEV) is presented related to the increasing occurrence of the disease in industrialized countries. The findings of this in several animal species and their associated transmission by consumption of animal products, define it as a zoonotic agent of importance to public health. Facing the lacking of information on the pathogenesis of hepatitis E, we chose to evaluate the viral control and characterize the immune cells involved in intrahepatic response during convalescence phase of experimental infection with HEV3 recovered from pigs and humans in cynomolgus monkeys (Macaca fascicularis). Through molecular diagnostics by qRT - PCR in tissues collected 67 dpi, we could detect viral RNA indicative of virus persistence in the biliary tract of two animals and the liver of one animal inoculated with swine HEV. In specific immunostaining for the detection of viral antigen, all animals expressed HEV Ag in the late phase of infection, especially sinusoidal cells. The discrepancy in the detection of HEV RNA and HEV Ag suggests different sensitivities of the tests during the period of convalescence. The hyperplasia of Kupffer cells was not observed during the study period, however, the high frequency of Kupffer cells stained with HEV in the swine group suggests a greater tissue immunoreactivity for swine HEV3 in late stage of infection. Regarding the expression of iNOS, low presence was observed on Kupffer cells and higher expression in sinusoidal circulating cells and hepatocytes, involved in the inflammatory response of convalescent hepatitis E, with greater production of iNOS in animals inoculated with swine HEV. Meaningful involvement of CD4 and CD8 T lymphocytes was observed in the cellular immune response, with predominance of CD8 population. We conclude that infections with HEV3 from different sources produce distinct patterns of immunoreactivity in the liver. The interaction of Kupffer cells with viral antigen in response of infection with HEV3 varies with the source of inoculum. As parenchymal NO production, which seems to control the binomial infection / tissue damage during convalescence, predominantly in HEV3 infected with swine origin group. The involvement of CD4 and CD8 T cells in the intrahepatic immune response also proved to be influenced by inoculum with a higher frequency of these lymphocytes in group infected with swine HEV3. Thus, the phylogenetic distance between the species origin of inocula (porcine or human) and the host species (primates) seemed to influence the mediation of the inflammatory process for the resolution of hepatitis E. viii ÍNDICE RESUMO...................................................................................................... viii ABSTRACT.................................................................................................. ix 1 INTRODUÇÃO......................................................................................... 1 1.1 A Hepatite E ................................................................................. 1 1.1.1 O vírus da Hepatite E (HEV)..................................................... 1 1.1.2 Histórico, padrões epidemiológicos e modos de transmissão... 4 1.1.3 Cenário atual – Do diagnóstico aos aspectos clínicos e prevenção ........................................................................................ 8 1.2 Imunopatogênese da infecção pelo vírus da Hepatite E............ 12 1.2.1 O curso da hepatite E............................................................... 12 1.2.2 Patogenia - os mecanismos de lesão hepática....................... 14 1.2.3 Resposta imune....................................................................... 18 1.3 Genótipo 3 - Potencial zoonótico e impacto na Saúde Pública.. 22 1.4 Primatas não humanos como modelos experimentais para a Hepatite E............................................................................................. 24 2 JUSTIFICATIVA........................................................................................ 26 3 OBJETIVOS............................................................................................. 27 3.1 Objetivo Geral............................................................................... 27 3.2 Objetivos Específicos................................................................... 27 4 MATERIAL E MÉTODOS......................................................................... 28 4.1 Animais.......................................................................................... 28 4.2 Infecção experimental de macacos cynomolgus com HEV genótipo 3............................................................................................. 28 4.3 Detecção do RNA viral do HEV e quantificação da carga viral em fase tardia de infecção.................................................................. 31 4.3.1 Detecção e quantificação do RNA do HEV através de PCR em tempo real (qRT-PCR)...................................................................... 31 4.3.2 Detecção do RNA genôminco e do RNA intermediário replicativo do HEV por Nested-PCR / sequenciamento.................... 34 4.4 Imunomarcação em amostras de tecidos hepáticos................. 35 4.4.1 Detecção do antígeno viral do HEV por imunofluorescência indireta.............................................................................................. 35 ix 4.4.2 Análise e quantificação fenotípica celular e da produção de óxido nítrico por imunomarcações simultâneas em amostras hepáticas........................................................................................... 38 4.4.2.1 Quantificação das imunomarcações com o software ImageJ. 40 4.5 Análise estatística.......................................................................... 41 5 RESULTADOS......................................................................................... 42 5.1 Detecção do RNA do HEV por qRT-PCR e Nested-PCR ........... 42 5.2 Detecção do antígeno viral do HEV por imunofluorescência indireta em amostras hepáticas.......................................................... 43 5.3 Quantificação dos fenótipos celulares e da expressão da enzima óxido nítrico sintetase induzida (iNOS) em amostras de tecido hepático .................................................................................... 5.3.1 Detecção de células de Kupffer e de células de Kuffer positivas para o HEV Ag durante o período de resolução da hepatite E........................................................................................................ 5.3.2 Análise da expressão de iNOS em fase tardia de infecção pelo HEV................................................................................................... 45 45 47 5.3.3 Análise fenotípica para a identificação das populações de linfócitos TCD4 e TCD8 em fase tardia de infecção........................... 49 6 DISCUSSÃO............................................................................................ 54 7 CONCLUSÕES....................................................................................... 61 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................ 63 APÊNDICES................................................................................................ 76 x ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1.1 Organização genômica do HEV .................................................. 2 Figura 1.2 Região epidêmica no Vale de Caxemira, Índia, 1978.................... 5 Figura 1.3 Linha do tempo com o histórico do vírus da hepatite E.................. 5 Figura 1.4 Curso da infecção pelo HEV......................................................... 14 Figura 1.5 Ciclo replicativo do HEV................................................................ 16 Figura 4.1 Desenho experimental da infecção de macacos cynomolgus com o HEV3, realizado por Carvalho et al., 2013 ....................... 30 Figura 5.1 Detecção do RNA do HEV por Nested-PCR................................. 43 Figura 5.2 Detecção do antígeno viral do HEV (proteína de capsídeo viral ORF2) por imunofluorescência indireta em amostras hepáticas de cynomolgus, coletadas em fase tardia de infecção (67 dpi)................................................................................................ 44 Figura 5.3 Detecção de células de Kupffer (CD68+) por imunofluorescência indireta no parênquima hepático de cynomolgus, em fase tardia de infecção................................................................................... 45 Figura 5.4 Frequência de células de Kupffer (CD68+) no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais avaliados (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2)....................................................................... 46 Figura 5.5 Detecção de células de Kupffer infectadas com o HEV (CD68+HEV+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção........................................................................................ 46 Figura 5.6 Frequência de células de Kupffer comarcadas com o HEV (CD68+HEV+) no parênquima hepático dos animais dos grupos inoculados com HEV suíno n=6 e com HEV humano n=2............. 47 Figura 5.7 Detecção de células produtoras de óxido nítrico (iNOS+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção............... 48 Figura 5.8 Frequência de células produtoras de iNOS no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2).............................................................................................. 48 Figura 5.9 Frequência de células HEV+iNOS+ no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais (inoculado com HEV suíno n=6 e HEV humano n=2) ................................................... Figura 5.10 49 Detecção de células CD4+ e de linfócitos TCD4 (CD3+CD4+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção........................................................................................ 50 xi Figura 5.11 Frequência de células CD4+ e de linfócitos T CD4 (CD3+CD4+) no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2)....................................................................... 50 Figura 5.12 Detecção de células CD8+ e de linfócitos T CD8 (CD3+CD8+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção........................................................................................ 51 Figura 5.13 Frequência de células CD8+ e de linfócitos T CD8 (CD3+CD8+) no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais avaliados (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2) ......................................................... 52 Figura 5.14 Frequência de linfócitos T CD8 (CD3+CD8+) e T CD4 (CD3+CD4+) no parênquima hepático dos animais infectados experimentalmente e dos animais controle................................... 53 Figura 5.15 Frequência das subpopulações celulares avaliadas no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2) 67 dpi............................................................. 53 xii LISTA DE TABELAS Tabela 1.1 Classificação proposta para o vírus da hepatite E....................... 3 Tabela 1.2 Características epidemiológicas e clínicas dos genótipos do HEV............................................................................................. 7 Grupos experimentais, parâmetros histopatológicos e virológicos.................................................................................... 29 Descrição dos primers e sonda utilizados no qRT-PCR para detecção do HEV RNA (Jothikumar et al., 2006) ....................... 33 Descrição dos primers utilizados na PCR (1° round) e Nested (2° round) para detecção do genótipo 3 do HEV.......................... 34 Descrição dos anticorpos primário e secundário utilizados e das respectivas diluições empregadas na marcação anti-HEV por imunofluorescência indireta......................................................... 37 Descrição dos anticorpos primários e secundários utilizados nas marcações duplas por imunofluorescência, com as diluições empregadas e as diferentes espécies onde os anticorpos foram produzidos (Hosts)....................................................................... 39 Detecção quantitativa (qRT-PCR) e qualitativa (Nested-PCR) do genoma do HEV em diferentes tecidos obtidos de macacos cynomolgos aos 67 dias de infecção .......................................... 42 Tabela 4.1 Tabela 4.2 Tabela 4.3 Tabela 4.4 Tabela 4.5 Tabela 5.1 xiii LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ºC Grau Celsius L Microlitro m Micrometro ALT Enzima alanina aminotransferase BSA Albumina do soro bovino (do inglês bovine serum albumin) CD3 Cluster of diferenciation 3 CD4 Cluster of diferenciation 4 CD8 Cluster of diferenciation 8 CD68 Cluster of diferenciation 8 CD69 Cluster of diferenciation 69 cDNA DNA complementar ao mRNA CECAL Centro de Criação de Animais de Laboratório CEUA Comissão de Ética no Uso de Animais DAPI 4’-6-diamidino-2-fenilindol Dntp Desoxinucleotídeos trifosfatados dpi dias pós infecção DTT Ditiotreitol ELISA Enzyme-linked immunosorbent assay eNOS Óxido nítrico sintase endotelial ET-NANBH Enterically transmitted non-A, non-B hepatitis FITC Isotiocianato de fluoresceína g Força centrífuga relativa à aceleração padrão de gravidade G1 Genótipo 1 G2 Genótipo 2 G3 Genótipo 3 G4 Genótipo 4 Grp78 chaperona etc HAV Vírus da hepatite A HBV Vírus da hepatite B HCV Vírus da hepatite C HEV Vírus da hepatite E xiv HEV3 Vírus da Hepatite E genótipo 3 HIV Vírus da imunodeficiência humana HSPGs Proteoglicanos sulfatados de heparina ICTV Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus IFN- Interferon-gama IgA Imunoglobulina A IgG Imunoglobulina G IgM Imunoglobulina M IHA insuficiência hepática aguda IL-1 Interleucina-1 IL-4 Interleucina-4 iNOS Óxido nítrico sintase induzida IV Intravenosa kDa kilodaltons LADTV Laboratório de Desenvolvimento Tecnológico em Virologia LPS Lipopolissacarídeo MFI Média de intensidade de fluorescência MgCl2 Cloreto de magnésio mRNA Ácido ribonucleico mensageiro NBA Nível de Biossegurança Animal NCBI National Center for Biotechnology Information NIH National Institutes of Health NK Células “natural killer” NKT Células T “natural killer” NO Óxido nítrico OMS Organização Mundial de Saúde ORF Fase de leitura aberta (do inglês Open reading frames) p Probabilidade de significância (valor-p) pb Pares de bases PBMC Células mononucleares de sangue periférico PBS Solução tamponada fosfato salina PBST Solução tamponada fosfato salina Tween PCR Reação em cadeia da polimerase PDTIS Programa de Desenvolvimento Tecnológico em Insumos para Saúde xv PTN Proteína p/v Peso por volume qRT-PCR Reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa em tempo real RdRp RNA polimerase dependente de RNA RE Retículo endoplasmático RNA Ácido ribonucléico RNAss RNA de fita simples SCPRIM Serviço de Criação de Primatas do CECAL SFDA State Food and Drug Administration SIV Vírus da imunodeficiência símia SRV/D Retrovírus tipo D dos símios TGI Trato gastrointestinal TNF- Fator de necrose tumoral-alfa UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro xvi Mejido, DCP Introdução 1 INTRODUÇÃO 1.1 A Hepatite E 1.1.1 O vírus da Hepatite E (HEV) A hepatite E foi caracterizada, há somente três décadas, como uma virose emergente de transmissão entérica, associada a inúmeros surtos epidêmicos precedentes de origem etiológica desconhecida. Em virtude da complexidade de sua patogenia e epidemiologia, esta doença multifacetada tem atraído cada vez mais a atenção da comunidade científica, já que são escassas as informações acerca da biologia do vírus, como agente etiológico, e da própria infecção, que hoje ganha importância mundial. Em países em desenvolvimento, especialmente na Ásia e na África, são comuns surtos de hepatite E aguda, enquanto em países industrializados, na Europa, Ásia e América do Norte, casos esporádicos e autóctones da doença têm sido cada vez mais frequentes. Sendo assim, apesar de se apresentar como uma enfermidade autolimitante, crescentes epidemias e casos eventuais da doença a tornam uma das principais causas de hepatites entéricas atualmente, com enorme impacto na saúde pública global (Kumar et al., 2013; Yugo e Meng, 2013). Descrições históricas de epidemias apontam a existência da hepatite E tempos antes desta ter sido reconhecida como uma nova hepatite viral (Purcell e Emerson, 2008; Aggarwal, 2011 e Kmush et al., 2013). Sendo assim, a real identificação e caracterização do vírus da Hepatite E (Hepatitis E virus - HEV) se deu apenas em 1990, em um trabalho realizado por Reyes e colaboradores. Este trabalho inicial permitiu a caracterização do recém descoberto vírus através do isolamento de partículas virais da bile de macacos cynomolgus infectados experimentalmente com o vírus desconhecido oriundo de casos de hepatite entérica, constituindo um marco para estudos conseguintes sobre a hepatite E (Reyes et al., 1990). Após a identificação do HEV, abordagens moleculares foram utilizadas para a caracterização da partícula viral e o sequenciamento completo do genoma do vírus foi realizado. O HEV apresenta partícula viral icosaédrica não envelopada, com genoma de aproximadamente 7,2 Kb, composto por uma fita simples de RNA com polaridade positiva. No genoma foram identificadas três sequências de leitura aberta, open reading frames (ORFs), responsáveis pela expressão de proteínas estruturais e não 1 Mejido, DCP Introdução estruturais do vírus (Figura 1.1). A região ORF1, presente na extremidade 5’, possui 1.693 aminoácidos e codifica para uma poliproteína não estrutural (~ 180 kDa), que sofre modificações pós-traducionais, produzindo cinco proteínas distintas: uma metiltransferase, um domínio y, uma protease cisteína (papain-like), uma helicase e uma RNA polimerase dependente de RNA. A região identificada como ORF2, presente na extremidade 3’, possui 660 aminoácidos e codifica a principal proteína estrutural que compõe o capsídeo viral (região não glicosilada com ~ 74 kDa e região glicosilada com ~ 88 kDa). E, a região ORF3, sobreposta às demais, com apenas 114 aminoácidos, codificando uma pequena fosfoproteína imunogênica (~ 13 kDa), que associada ao citoesqueleto, efetua papel fundamental na montagem de novas partículas virais (Tam et al., 1991; Chandra et al., 2008; Ahmad et al., 2011; Holla et al., 2013). Figura 1.1 - Organização genômica do HEV. O genoma do HEV, apresenta uma fita de RNA simples de polaridade positiva, com três ORFs. O RNA apresenta um cap 7mG no terminal 5` e uma cauda poli A no terminal 3`, com pequenas regiões não codificantes em cada terminal. A região ORF1 codifica para uma poliproteína, gerando as PTNs: metiltransferase, domínio y, protease cisteína, domínios, V e X, helicase e RNA polimerase dependente de RNA. A região ORF2 codifica para PTNs do capsídeo. A região ORF3 se sobrepõe às demais e apresenta dois domínios maiores na extremidade N, D1 e D2, e outros dois ricos em prolina na extremidade C, P1 e P2, codificando uma fosfoproteína imunogênica. Fonte: Adaptação de Holla et al., 2013. O Comitê Internacional para Taxonomia de Viroses (International Committee for Taxonomy of Viruses, ICTV) classifica o HEV como o único membro do gênero 2 Mejido, DCP Introdução Hepevirus, pertencente à família Hepeviridae (King et al., 2012). Na classificação de Baltimore, o vírus se encontra no grupo V, por ser RNA fita simples de polaridade positiva (Baltimore, 1971). Contudo, com base no sequenciamento do genoma do HEV a partir de isolados de diferentes localizações geográficas, foi possível a identificação de quatro genótipos distintos, denominados 1, 2, 3 e 4 (Kumar et al., 2013 e Holla et al., 2013). À partir da caracterização genética do HEV, novas linhagens foram identificadas em mamíferos (humanos, suínos, mangustos, cervos, ratos, coelhos e furão). Recentemente, outras linhagens, genética e filogeneticamente distintas, foram identificadas em várias outras espécies animais, como morcegos e até mesmo galinhas e peixes. Desta forma, a fim de otimizar a classificação taxonômica existente, foi proposto um novo arranjo na nomenclatura atual (Tabela 1.1), no qual as linhagens e os genótipos encontram-se categorizados em gêneros de acordo com as diferentes espécies hospedeiras relacionadas (Meng, 2013). Tabela 1.1 - Classificação proposta para o vírus da hepatite E. Sugestão de modificação da nomenclatura atual, com a inclusão de gêneros distintos do HEV relacionados às espécies hospedeiras. Fonte: Adaptação com tradução de tabela de Meng, 2013. Gêneros Propostos Hospedeiros naturais Orthohepevirus Genótipo 1 Genótipo 2 Genótipo 3 Genótipo 4 Genótipo 5 sugestivo Genótipo 6 sugestivo Espécies relacionadas Homem Homem Homem, porco doméstico e selvagem, cervo, mangusto, coelho e rato Homem, porco doméstico e selvagem, gado e ovelha Rato e furão Porco selvagem Avihepevirus Genótipo 1 Genótipo 2 Genótipo 3 Espécies relacionadas Galinha (Austrália e Coreia) Galinha (Estados Unidos e Canadá) Galinha (Europa e China) Piscihepevirus Espécies relacionadas Vírus da HE de trutas Trutas Chiropteranhepevirus Espécies relacionadas Vírus da HE de Morcego Morcego 3 Mejido, DCP Introdução 1.1.2 Histórico, padrões epidemiológicos e modos de transmissão A hepatite E é inúmeras vezes referida na literatura como uma doença emergente, devido ao seu recente reconhecimento, na década de 90. No entanto, há evidências de focos históricos, documentados e datados de 1794 até o primeiro surto com relação etiológica confirmada em 1955-56, consistentes com o caráter epidemiológico da doença (Purcell e Emerson, 2008; Aggarwal, 2011 e Kmush et al., 2013). A primeira epidemia bem documentado de hepatite E ocorreu em 1955-1956 em Nova Délhi, na Índia, devido à contaminação da água potável local, acometendo, nesta ocasião, cerca de 29.000 pessoas (Vishwanathan, 1957). Naquela época, considerou-se esta epidemia como de hepatite A, devido à transmissão entérica e às manifestações clínicas observadas. Entretanto, em 1980, a análise retrospectiva dos soros armazenados dos pacientes afetados neste surto indicou o envolvimento de um novo agente viral infeccioso. Ainda no século XX, após este primeiro relato epidêmico, especialmente entre as décadas de 70 e 90, inúmeros surtos passaram a ser relacionados à um agente etiológico até então desconhecido, causador de hepatite entérica, designado inicialmente como vírus da hepatite entérica não-A e não-B (enterically transmitted non-A, non-B hepatitis - ET-NANBH), devido à similaridade da infecção e apresentação clínica com os já conhecidos vírus da hepatite A e B (Wong et al., 1980 e Kumar et al., 2013). Em 1978, outra epidemia de grande porte no Vale da Caxemira, na Índia (Figura 1.2), chamou a atenção dos pesquisadores por apresentar características clínicas e epidemiológicas únicas, semelhantes às hepatites virais, sem que houvesse, no entanto, a presença dos marcadores sorológicos conhecidos de hepatite A ou B (Khuroo, 1980a). Sendo assim, a existência de uma nova forma do vírus como provável causa desta epidemia foi apresentada em uma Reunião Anual da Sociedade Indiana de Gastroenterologia, em 1979, e em seguida, amplamente comunicada em trabalhos científicos (Khuroo, 1980a; Khuroo, 1980b e Khuroo, 2011). 4 Mejido, DCP Introdução Figura 1.2 – Região epidêmica no Vale de Caxemira, Índia, 1978. A imagem ilustra a precariedade das fontes de água de abastecimento à população, em um canal, que recebia o esgoto e lixo de toda localidade. Na mesma fonte de água, utensílios e roupas eram lavados e a pesca era realizada. A epidemia causou um número estimado de 52.000 casos de hepatite com manifestações ictéricas e cerca de 1.700 óbitos. Fonte: Khuroo, 2011. A Figura 1.3 apresenta uma série histórica dos surtos epidêmicos de hepatite E, desde os primeiros relatos no século XVIII, quando as epidemias de icterícia passaram a ser documentadas, até a sua identificação em 1983 por Balayan e caracterização em 1990 por Reyes e colaboradores (Balayan et al., 1983 e Reyes et al., 1990). Figura 1.3 – Linha do tempo com o histórico do vírus da hepatite E. Dados históricos coletados desde os primeiros surtos epidêmicos possivelmente relacionados ao HEV no Século XVIII, até a sua caracterização no Século XX. Fonte: Balayan et al., 1983; Reyes et al., 1990 e Teo, 2012. 5 Mejido, DCP Introdução Após a descoberta da hepatite E e a caracterização molecular e genética de seu agente etiológico, há um crescente interesse nas últimas décadas em ampliar os conhecimentos acerca dos aspectos únicos de sua epidemiologia e transmissão. A epidemiologia da hepatite E, norteada pelos quatro genótipos principais da doença e sua distribuição geográfica, abrange desde casos esporádicos e infecções subclínicas até surtos de grande magnitude com milhares de casos (Kmush et al., 2013). Discrepâncias epidemiológicas e clínicas são observadas entre os locais onde há a ocorrência de hepatite E, como em países em desenvolvimento, onde a hepatite E é endêmica e em países desenvolvidos, nos quais casos esporádicos têm sido relatados (Aggarwal, 2011). A hepatite E afeta preferencialmente jovens adultos, com faixa etária de 15 à 30 anos, e apresenta morbidade e mortalidade elevada entre gestantes (Scobie e Dalton, 2013). Sua transmissão ocorre majoritariamente por via oro-fecal, seja por meio hídrico ou através da contaminação de alimentos. Entretanto, formas alternativas de transmissão foram descritas, principalmente em locais não endêmicos, como as formas zoonótica, vertical e transfusional (Emerson e Purcell, 2003; Kumar, 2013 e Kmush et al., 2013). Os quatro genótipos identificados do vírus foram relacionados a dois padrões epidemiológicos distintos da HE. Os genótipos 1 (G1) e 2 (G2) do HEV se encontram disseminados em países em desenvolvimento, em áreas com condições precárias de saneamento, onde a HE é endêmica. O genótipo 1, identificado na Ásia e na África e o Genótipo 2, descrito no México e na África, são restritos ao homem e a sua transmissão ocorre principalmente via veiculação hídrica. Já os genótipos 3 (G3) e 4 (G4), encontram-se relacionados aos casos esporádicos de hepatite E em países desenvolvidos. O genótipo 3, com ampla distribuição geográfica, e o Genótipo 4, encontrado na China, na Europa e no Japão, associam-se à transmissão por consumo de carnes cruas ou mal cozidas de animais tidos como reservatórios da hepatite E, como os suínos (Bradley, 1992; Harrison, 1999; Ahmad et al., 2011; Kumar et al., 2013 e Scobie e Dalton, 2013). A relação entre os genótipos do HEV, suas formas de transmissão e aspectos epidemiológicos e clínicos encontra-se sumarizada na Tabela 1.2. 6 Mejido, DCP Introdução Tabela 1.2 – Características epidemiológicas e clínicas dos genótipos do HEV. Fonte: Arends et al., 2014. Genótipos G1-G2 G3-G4 Reservatórios Humanos. Possível zoonose (G1 foi demonstrado em suínos). Porcos e outras espécies de animais. Zoonose. Transmissão Oro-fecal. Transmissão hídrica (maioria) ou via alimentos contaminados. Outras formas descritas: nosocomial, vertical e via contato direto pessoa a pessoa (escassa descrição). Distribuição Países em desenvolvimento. G1: principalmente na Ásia. G2: África e México. Demografia (Indivíduos infectados) Jovens adultos, gestantes e viajantes. Transmissão via ingestão de alimentos de origem animal crus ou mal cozidos (especialmente carne de porco). Outras formas descritas: transfusão de sangue, transplante de órgãos. Principalmente em países desenvolvidos. G3: distribuição cosmopolita. G4: Ásia (principalmente). Mais comumente em indivíduos de meia-idade e homens idosos. Pessoas com doença hepática ou imunossuprimidos. Doença em humanos Geralmente HE assintomática ou infecções agudas autolimitantes (semelhantes a hepatite A). Pode ocorrer a forma grave da doença em mulheres grávidas ou em indivíduos que já possuam doença hepática crônica. HE aguda autolimitante (forma mais comum). HE crônica em indivíduos imunossuprimidos (portadores do HIV ou recém transplantados). Nos locais onde hepatite E é endêmica, como na China, no subcontinente indiano, nas regiões sudeste e central da Ásia, no Oriente Médio e em partes do nordeste e oeste da África, epidemias são recorrentes. Apesar de haver pouca informação sobre a transmissão por contato direto pessoa a pessoa, como ocorre em outras infecções entéricas, os surtos de HE são geralmente de grande proporção, afetando milhares de pessoas (Kumar, 2013). Atualmente, o HEV é considerado o maior causador de hepatite aguda clínica dentre adultos, com a presença dos genótipos 1 e 2 na região Central e no Sudeste da Ásia. Já nas regiões Norte e Leste da África, apenas o Vírus da Hepatite B (HBV) supera o HEV em número de casos (Kmush et al., 2013 e Purcell e Emerson, 2008). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), anualmente, cerca de 20 milhões de infecções, mais de 3 milhões de casos agudos e aproximadamente 57.000 mortes têm sido relacionadas somente aos genótipos 1 e 2 do HEV (WHO, 2013). Em muitos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Inglaterra, França, Holanda, Áustria, Espanha, Grécia, Japão, Taiwan, Hong Kong e Austrália, dentre outros, a Hepatite E é vista apenas em casos ocasionais de hepatite aguda (Aggarwal, 2011). Entretanto, nestes países tornam-se cada vez mais frequentes os relatos de 7 Mejido, DCP Introdução casos autóctones zoonóticos de HE, causados pelos genótipos 3 e 4 (Arends et al., 2014). A fim de compreender a real ameaça do HEV como agente zoonótico emergente, estudos sobre a presença dos genótipos 3 e 4 vêm ganhando visibilidade entre inúmeros países industrializados. As particularidades do genótipo 3, os pormenores de sua relação com a forma crônica da hepatite E e o seu impacto na saúde pública serão detalhados no tópico 1.3 da Introdução, tendo em vista o tema central desta dissertação. 1.1.3 Cenário atual – Do diagnóstico aos aspectos clínicos e prevenção Sabe-se que a infecção pelo HEV é considerada uma importante causa de hepatite aguda em epidemias e casos esporádicos de hepatites virais entéricas, através da transmissão fecal-oral. O diagnóstico de rotina da hepatite E baseia-se na detecção de anticorpos anti-HEV IgM e/ou IgG (testes sorológicos) ou na detecção direta do RNA viral, a partir de amostras biológicas (fezes, bile, sangue, soro, plasma, biópsia hepática) (Arends et al., 2014). Atualmente, os imunoensaios sorológicos comercialmente disponíveis para o diagnóstico da Hepatite E diferem em sensibilidade e especificidade, apresentando resultados variáveis e pouco confiáveis (Drobeniuc et al., 2010). Em função da falta de padronização nos testes sorológicos disponíveis, os resultados obtidos em estudos de soroprevalência realizados em diferentes localizações geográficas variam drasticamente. Esta dificuldade no diagnóstico da hepatite E tem constituído um dos grandes desafios para a identificação de casos isolados ou focos da doença, inviabilizando o tratamento precoce e a obtenção de informações fidedignas a partir de inquéritos soroepidemiológicos (Yugo e Meng, 2013). Na prática, os obstáculos para o desenvolvimento de ensaios sorológicos padronizados para a Hepatite E são atribuídos à variabilidade genética e antigênica do HEV (Mushahwar, 2008). Desta forma, o desempenho falho dos ensaios diagnósticos disponíveis pode ser contornado pela seleção de alvos antigênicos comuns aos quatro genótipos do vírus, como a região pORF2 (Okamoto, 2007). Ensaios baseados em sistemas recombinantes, por exemplo, utilizam bactérias ou outros vírus para a expressão de antígenos chaves para a resposta imune frente ao HEV, como a região pORF2 supracitada. Neste sentido, estas novas abordagens vêm sendo empregadas a fim de produzir um teste diagnóstico mais preciso para HEV, que 8 Mejido, DCP Introdução atenda às necessidades de triagem clínica e epidemiológica da doença (Drobeniuc et al., 2010). Apesar dos avanços atuais em busca de um ensaio imunológico padronizado para o diagnóstico de HE, ainda se faz necessária a confirmação dos resultados sorológicos por técnicas moleculares, a fim de minimizar falsos-negativos ou positivos. Estas ferramentas de diagnóstico molecular, em especial o PCR para a detecção do RNA viral, ainda são imprescindíveis para o diagnóstico da hepatite E, assegurando resultados mais confiáveis (Arends et al., 2014). No que concerne o curso clínico da doença, sabe-se que a hepatite E se assemelha às demais hepatites virais, em especial à Hepatite A, com sintomatologia branda e muitas vezes inespecífica. Sintomas como febre, perda do apetite, dor abdominal, náuseas e fezes esbranquiçadas são comuns na forma aguda da doença, podendo progredir com icterícia e hepatomegalia, ou até mesmo insuficiência hepática aguda (IHA) em casos mais graves (Teo, 2010 e Aggarwal, 2011). De modo geral, a forma subclínica da hepatite E, com leve infecção seguida de autoresolução, afeta adultos jovens, de 15 a 45 anos, e a doença grave, com casos de insuficiência hepática fulminante, acomete indivíduos imunossuprimidos e mulheres grávidas (Taneja et al., 2009). A taxa de letalidade geral de hepatite E aguda pode variar de 0,5-1% em adultos à 20-25% entre as mulheres grávidas (Jaiswal et al., 2001). Esta mortalidade elevada em gestantes ocorre normalmente no terceiro trimestre da gravidez e ganha destaque como uma característica importante da infecção pelo HEV (Arends et al., 2014). Acredita-se que a gravidade da doença em pacientes grávidas pode ser atribuída a alterações na resposta imunológica, ou à mudanças hormonais características da gravidez (Navaneethan et al., 2008 e Bose et al., 2011). Como ocorre em todos os aspectos da hepatite E, as manifestações clínicas da doença também estão associadas ao genótipo viral envolvido na infecção. Observouse que os genótipos 1 e 2 causam infecções que acometem, em sua maioria, adolescentes e jovens adultos, enquanto os genótipos 3 e 4 são mais comumente observados entre homens de meia idade e idosos (Arends et al., 2014). Como particularidade da infecção pelo G3, por exemplo, pode-se citar casos da forma crônica da HE em indivíduos imunossuprimidos, nos quais há persistência do RNA viral no organismo (soro e fezes) por 6 meses ou mais. Ainda não há relatos da doença em sua forma crônica associada aos genótipos 1 ou 2 do vírus (Kamar et al., 2012). 9 Mejido, DCP Introdução Apesar do caráter hepatotrópico do HEV, manifestações extra-hepáticas raras da doença também vêm sendo relatadas, relacionadas à infecções causadas pelos genótipos 1 e 3 do vírus. Casos de distúrbios neurológicos (Polirradiculopatia, síndrome de Guillain-Barré, paralisia oculomotora, convulsões e neurite braquial bilateral), disfunções renais (glomerulonefrite), pancreatite aguda e anormalidades hematológicas foram observados tanto em países hiperendêmicos, como em países desenvolvidos, em casos esporádicos (Kamar et al., 2012; Kamara, Izopetb e Rostaing, 2013 e Arends et al., 2014). Quanto ao tratamento da HE, este é indicado em casos agudos graves, em indivíduos com doença hepática crônica pré-existente ou imunossuprimidos, e/ou quando não há a autoresolução esperada dos sintomas. A terapia antiviral mais aceita atualmente é a administração de Rivavirina, que promove o clearance viral dentro de uma a duas semanas após o início do tratamento. O uso da ribavirina parece apresentar alta eficácia na resolução da HE, até mesmo em sua forma crônica e este tratamento vêm sendo utilizado na maior parte dos casos que requerem intervenção. A maior limitação no uso da ribavirina ocorre em grávidas, sendo contraindicado o seu uso durante toda a gestação (Gerolami et al., 2013; Alric et al., 2011 e Scobie e Dalton, 2013). Apesar do sucesso alcançado no uso de antivirais para o tratamento da HE, a melhor forma de combater a doença ainda é a prevenção. As medidas profiláticas, neste caso, devem ser direcionadas para combater os diferentes modos de transmissão do HEV. Em países endêmicos, a prevenção consiste basicamente na adoção de políticas públicas que assegurem o saneamento básico, com o fornecimento de água potável e a conscientização da população local, com educação sanitária e divulgação da doença. Medidas de ação individuais, como a melhoria das condições de higiene pessoal, também são essenciais no combate à doença. Já em países desenvolvidos, a prevenção da transmissão zoonótica consiste na adoção de vigilância sanitária de produtos de origem animal, em especial para o rastreamento da infecção pelo HEV entre criações comerciais de suínos. O incentivo ao cozimento adequado da carne também é fundamental em áreas onde há a transmissão zoonótica da doença (Hendrickx, Vorsters e Damme, 2012). As dificuldades inerentes ao estabelecimento de um modelo de cultivo celular para o HEV atrasou em anos a produção de uma vacina eficaz contra a Hepatite E. Em consequência da ausência de um modelo in vitro de infecção do HEV, reprodutível 10 Mejido, DCP Introdução o suficiente para o desenvolvimento de vacinas atenuadas ou inativadas, o desenvolvimento de uma vacina recombinante passou a ser a abordagem alternativa mais viável (Hendrickx, Vorsters e Damme, 2012). Desta forma, até o presente momento, apenas uma vacina profilática foi licenciada para a HE, a HEV 239 ou Hecolin®, como é comercialmente conhecida. Esta foi produzida na China, pela empresa Xiamen Innovax, e aprovada pela State Food and Drug Administration (SFDA) do país apenas em 2011. A Hecolin® utiliza a bactéria Escherichia Coli como plataforma recombinante para a expressão do antígeno de interesse do HEV, uma proteína de capsídeo (epítopo da região ORF2). Os estudos clínicos em humanos, comprovaram sua eficácia, efeito protetor e segurança e, assim, sua administração passou a ser recomendada em países de alto risco de transmissão e endemicidade (Wu et al., 2012; Zhang et al., 2013 e Arends et al., 2014). Muito ainda se discute quanto ao planejamento ideal para a administração da vacina para Hepatite E entre as regiões consideradas endêmicas ou não-endêmicas. Em áreas não endêmicas, sugere-se que a vacina seria útil para viajantes com destino às regiões consideradas endêmicas para Hepatite E ou para indivíduos imussuprimidos e recém transplantados. Por outro lado, em áreas endêmicas, a vacina seria imprescindível para mulheres grávidas, nas quais o tratamento é contraindicado, e pessoas com doença hepática crônica pré-existente, devido à suscetibilidade à forma grave da doença. Atualmente, a utilização da vacina para a HE ainda parece restrita à China, onde foi produzida. A comercialização da única vacina licenciada para a Hepatite E não alcançou as demais regiões, onde programas de imunização bem definidos precisam ser implementados (Wu et al., 2012 e Kumar et al., 2013). O potencial zoonótico do HEV também deve ser levado em consideração quando tratamos de formas de prevenção da doença. Devido aos crescentes relatos de infecções zoonóticas relacionadas à Hepatite E, passou-se a questionar sobre a necessidade de implementação de medidas de controle da transmissão por reservatórios animais. Frente à este cenário, atualmente alguns autores têm discutido a implementação da imunização em rebanhos de suínos, como uma estratégia alternativa de prevenção da doença nas regiões não endêmicas. O controle da circulação do HEV em criações de suínos, por meio da vacinação, poderia minimizar o risco de infecção em países industrializados, aumentando a segurança no consumo 11 Mejido, DCP Introdução de produtos de origem animal e prevenindo casos de transmissão ocupacional. (Pavio, Meng e Renou, 2010 e Meng, 2013). 1.2 Imunopatogênese da infecção pelo vírus da Hepatite E 1.2.1 O curso da hepatite E Os mecanismos que norteiam a patogenia da Hepatite E ainda não foram completamente elucidados. As informações disponíveis atualmente sobre a Hepatite E, obtidas a partir de estudos realizados em voluntários, da observação de casos em surtos da doença ou através de infecções experimentais em modelos animais, foram fundamentais para a compreensão das características da infecção. Entretanto, estes trabalhos responderam parcialmente às inúmeras questões quanto à patogênese da doença, que ainda permanecem em aberto, tornando imprescindível a realização de trabalhos com descrições mais robustas da interação HEV/organismo hospedeiro. Atualmente, sabe-se que o HEV é um vírus hepatotrópico, que utiliza a via oral para entrada no hospedeiro. O tropismo do vírus pelo fígado foi documentado em inúmeros trabalhos e, teoricamente, seu acesso ao órgão ocorre através da circulação portal. Todavia, o trajeto do vírus no organismo, do trato gastrointestinal até o seu órgão alvo ainda não foi propriamente descrito (Krawczynski, Meng e Rybczynska, 2011). Os primeiros estudos de infecção experimental com o HEV, com voluntários humanos ou com primatas, geraram a maior parte das informações disponíveis sobre o curso da doença. Nestes trabalhos, observou-se um período de incubação médio de 4 a 6 semanas antes do aparecimento dos sintomas (Balayan et al., 1983; Chauhan et al., 1993 e Arankalle et al.,1993). Entretanto, o intervalo de incubação do HEV parece variar em determinadas circunstâncias. No estudo realizado por Arankalle e colaboradores (1993), por exemplo, observou-se um período de incubação bem mais curto, de 9 à 13 dias, em rhesus grávidas inoculadas experimentalmente com o G1 do vírus por via intravenosa, se comparado aos 40 dias de incubação do grupo controle de rhesus inoculadas não grávidas. Períodos de incubação mais extensos, com até 2 meses de duração também foram descritos (Labrique, Kuniholm e Nelson, 2010 e Krain, Nelson e Labrique, 2014). 12 Mejido, DCP Introdução Chauhan e sua equipe (1993) realizaram um estudo de infecção experimental com o HEV em um voluntário humano, no qual foi possível correlacionar as características clínicas e o perfil bioquímico pós infecção. Os sintomas puderam ser observados 30 dias pós-inoculação. Já a avaliação da função hepática através da detecção dos níveis da enzima alanina aminotransferase (ALT) demonstrou um pico na produção de ALT no dia 46 pós infecção. O pico na detecção de ALT ocorre quase concomitantemente ao aparecimento dos sintomas clínicos, que se agravaram após a elevação na produção da enzima, revelando uma relação direta entre o aumento de ALT e as manifestações clínicas da doença. Em casos de Hepatite E aguda humanos, a viremia foi detectada precocemente, na fase inicial da doença, durando até um mês após o aparecimento dos primeiros sintomas (Krawczynski Meng e Rybczynska, 2011; Lu et al., 2013; Krain, Nelson e Labrique, 2014 e Kamar et al., 2014. Em alguns destes casos de Hepatite E aguda, relatou-se a persistência da viremia por mais de um mês, com duração que ultrapassa a normalização das transaminases hepáticas, indicando que as lesões hepática não estão atreladas à replicação viral. A resolução clínica da doença no fígado, portanto, não implica na eliminação do vírus do organismo e a viremia prolongada nestes casos pode estar relacionada à existência de sítios extra-hepáticos de replicação do vírus (Zhang et al., 2002 e Chandra et al., 2010). A detecção do HEV no fígado, na bile e nas fezes de indivíduos infectados parece ocorrer de forma simultânea, antes ou durante a elevação de ALT. Sendo assim, novas partículas virais podem ser liberadas nas fezes antes do início das alterações patológicas no fígado (Krawczynski e Bradley, 1989). Conforme descrito em inúmeros trabalhos, a detecção do RNA do vírus nas fezes inicia-se aproximadamente uma semana antes do surgimento dos sintomas, podendo permanecer detectável até cerca de duas semanas após o mesmo (Balayan et al., 1983; Chauhan et al., 1993. e Krawczynski, Meng e Rybczynska, 2011). No curso da infecção por HEV, a produção de anticorpos específicos coincide com o início dos sintomas e com o declínio na carga viral. O aparecimento de IgM anti-HEV ocorre em paralelo ao início dos sinais clínicos e ao pico de ALT. A avaliação da cinética de resposta humoral em pacientes com HE aguda, realizada por Huang e colaboradores (2010), demonstrou títulos elevados de IgM na fase aguda por até 8 semanas, que diminuem completamente, com níveis praticamente indetectáveis após 32 semanas. Logo em seguida ao aparecimento de IgM, anticorpos IgG são 13 Mejido, DCP Introdução produzidos, podendo ser detectados durante as fases aguda e de convalescência. A produção de IgG permanece elevada por 1 ano, reduzindo apenas após a resolução clínica da doença (Arends et al., 2014). A Figura 1.4 apresenta de forma esquemática o curso da HE de forma resumida, a fim de facilitar a compreensão da sequência de eventos pós infecção em humanos. Figura 1.4 – Curso da infecção pelo HEV. A figura aponta os eventos pós infecção típicos da HE. O período da sintomatologia coincide com o pico nos níveis séricos de ALT, indicativo de lesão hepática. O RNA viral pode ser detectado no soro e fezes no início da infecção, com durações diferentes (vide as barras indicativas). A produção de IgM anti-HEV aumenta rapidamente com o iniciar dos agravos ao fígado, diminuindo ao longo das semanas após a infecção, enquanto os títulos de IgG específicos aumentam gradativamente, durante a fase de convalescência, permanecendo detectável por anos. Adaptação de Krain, Nelson e Labrique, 2014. 1.2.2 Patogenia - os mecanismos de lesão hepática Atualmente, inúmeras lacunas ainda persistem no entendimento dos mecanismos patogênicos do HEV. Os empasses teóricos quanto ao ciclo de replicação do vírus parecem dificultar ainda mais a compreensão de sua patogenia. Além disso, a dificuldade no estabelecimento de modelos eficientes em cultura de células para a avaliação da infecção pelo HEV, inviabilizou, por muitos anos, a 14 Mejido, DCP Introdução compreensão do ciclo replicativo do vírus (Rogée et al., 2013). Entretanto, hoje, com os avanços no cultivo celular do HEV e com os crescentes estudos em modelos animais, pode-se considerar que a compreensão da patogenia da Hepatite E tem progredido. Inúmeros trabalhos têm proposto modelos recém desenvolvidos de sistemas de cultivo celular para HEV, que constituem uma ferramenta fundamental para a investigação não só da replicação viral, como para a avaliação dos fatores de virulência do vírus. Grande parte das informações que se têm atualmente sobre o ciclo replicativo do HEV provem de estudos pontuais em linhagens de células transformadas, tanto de origem hepática, como de origens diferenciadas, como a A549 de carcinoma pulmonar ou a Caco-2 de carcinoma de cólon (Cao e Meng, 2012 e Holla et al., 2013). Um recente estudo publicado por Rogée e colaboradores (2013), por exemplo, apresenta dois novos modelos de cultivo celular in vitro do HEV, uma linhagem derivada de hepatoma humano, a HepaRG, e outra linhagem de células tronco embrionárias de suínos, a PICM-19. Estas linhagens foram selecionadas por apresentar morfologia e expressão gênica semelhantes aos hepátocitos, o que permite mimetizar as interações HEV / célula-alvo com maior precisão. Os resultados demonstraram que ambas as linhagens suportam a replicação completa do vírus, não observada em outros modelos, propostos em trabalhos anteriores. Com base em estudos in vitro como este, foi possível avaliar a expressão de algumas das proteínas virais envolvidas nas etapas de replicação (Cao e Meng, 2012). Inicialmente, em seu ciclo, o HEV se liga ao hepatócito por receptores ainda desconhecidos. Sabe-se que a proteína HEV 239 de capsídeo viral, altamente conservada entre os genótipos do HEV em mamíferos, pode se ligar à receptores de superfície do tipo proteoglicanos sulfatados de heparina (HSPGs) (He et al., 2008) e chaperonas, como a Grp78 (Yu et al., 2011), entretanto, a participação destes e o de outros receptores permanece incerta (Cao e Meng, 2012 e Holla et al., 2013). Aparentemente, após sua adsorção na superfície da célula-alvo, por ligação a receptores específicos, o HEV penetra na célula por endocitose mediada por clatrina (Kapur et al., 2012). No citoplasma, ocorre o desnudamento do capsídeo, seguido da liberação do RNA viral. A primeira etapa do processo de replicação envolve a tradução da região gênica ORF1 em poliproteína precursora, originando, dentre outras PTNs não estruturais, a replicase de RNA (RdRp), responsável pela síntese do RNA 15 Mejido, DCP Introdução intermediário replicativo de fita negativa, complementar ao RNA genômico. A replicação se dá no retículo endoplasmático, onde a forma intermediária de RNA servirá de molde para a síntese de novas partículas virais positivas. Estas fitas positivas, por sua vez, irão codificar para as proteínas e ORF2 e ORF3, envolvidas no empacotamento do RNA genômico em vírions maduros. Por fim, as recém formadas partículas do HEV saem por brotamento a partir da membrana apical do hepatócito, sendo conduzidas aos ductos biliares, bile, vesícula biliar e ao intestino, alcançando o ambiente nas fezes (Cao e Meng, 2012; Holla et al., 2013 e Arends et al., 2014). A Figura 1.5 abaixo representa de forma esquemática as etapas de replicação do HEV. Figura 1.5 - Ciclo replicativo do HEV. a.) Primeiramente, o HEV se liga à superfície do hepatócito através de receptores específicos. b.) O vírus penetra na célula por endocitose mediada por clatrina, liberando seu genoma de RNA fita simples positiva (RNAss + em verde) no citoplasma. c.) O RNA genômico serve como molde para a tradução da poliproteína ORF1. d.) A RNA polimerase dependente de RNA produzida sintetiza o RNA intermediário replicativo fita negativa (RNAss - em azul). e.) A forma intermediária serve de molde para a produção de novas fitas positivas de RNA. f.) A partir do RNAss + sintetizado, ocorre a tradução e codificação das PTNs ORF2 e ORF3. g.) No retículo endoplasmático, a PTN ORF2 participa do empacotamento do RNA genômico no capsídeo viral e na montagem de novas partículas virais. h.) Os vírions recém formados são transportados, com o auxílio da PTN ORF3, até a membrana apical. i.) Finalmente, os novos vírions maduros infectantes são liberados dos hepatócitos infectados, completando o ciclo. Adaptado de Holla et al., 2013. 16 Mejido, DCP Introdução Dentre os níveis de complexidade envolvidos no surgimento de uma doença viral, sabe-se que o estudo da estrutura das populações virais torna-se imprescindível ao entendimento da interação agente (linhagens e quasispécies) / hospedeiro. Eventos moleculares, como mutações, recombinações e rearranjos genômicos, produzem a diversidade populacional de vírus e de suas estruturas, gerando inúmeras possibilidades de mecanismos de ação, de replicação e transmissão viral (Domingo, 2010 e Wargo e Kurath, 2012). Na tentativa de elucidar os mecanismos envolvidos na patogênese da hepatite E, busca-se atualmente um maior entendimento sobre o fitness replicativo do HEV, ou seja, sobre a sua funcionalidade viral, como a capacidade de produzir progênies infecciosas. Feng e colaboradores (2014), em um estudo recente sobre fitness viral, apontaram evidências de que o HEV, considerado até então não envelopado, possa adquirir envelope através sequestro de membrana do hospedeiro, como uma forma de “camuflagem” ao sistema imune. Esta estratégia de sequestro de membranas de células hospedeiras foi descrita no vírus da hepatite A, como um mecanismo de escape à ação de anticorpos neutralizantes (Feng et al., 2013). O trabalho sugere, portanto, que os vírus da hepatite A e E, filogeneticamente isolados entre si, circulam no sangue recobertos com a membrana hospedeira, ou “pseudoenvelopados”, e são liberados nas fezes na forma não envelopada, que confere resistência aos fatores ambientais, facilitando, assim, sua propagação. A realização de estudos como o último, sobre a virulência do HEV e seus mecanismos de interação com o sistema imune hospedeiro agrega valiosas informações sobre a patogênese da hepatite E, ainda pouco compreendida. Além disso, a confirmação da aquisição de envelope por vírus não envelopados, como os vírus das hepatites A e E, poderá indicar um novo paradigma para a classificação usual dos vírus, até então dicotômica (Takahashi et al., 2010; Feng e Lemon, 2014). Apesar das inúmeras questões em aberto no que diz respeito à infecção e patogenia do HEV, sabe-se que o vírus não é citopático, e que as lesões hepáticas podem ser atribuídas a danos imunomediados por células T citotóxicas e células natural killer (Prabhu et. al, 2011). A resposta imune frente ao HEV, gera uma doença inflamatória, com a ocorrência de necroses focais no parênquima hepático, hepatócitos abaloados, corpos acidofílicos e infiltrados inflamatórios ao redor das veias centro lobulares e também nos espaços porta. Além destes achados histopatológicos, áreas de necrose associada a infiltrados inflamatórios intra17 Mejido, DCP Introdução lobulares, infiltrados linfocitários e hipertrofia e acúmulo de macrófagos e células de Kupffer têm sido observados tanto no homem, quanto em primatas não humanos infectados experimentalmente com o vírus (Mitsui et al., 2004; Ohnishi et al., 2006; Arankalle et al., 2007 e Taniguchi et al., 2009). Por fim, ainda que o HEV seja considerado um vírus tipicamente hepatotrópico, estudos anteriores apontam a sua capacidade de replicação em outros órgãos, especialmente ao longo do trato gastrointestinal (TGI), como em linfonodos e em segmentos do intestino delgado e grosso (kamar et al., 2014). Nestes trabalhos, a identificação de sítios extra-hepáticos de replicação do HEV foi realizada através da detecção molecular do RNA intermediário replicativo, de polaridade negativa em localizações não usuais, tanto em suínos inoculados experimentalmente (Williams et al., 2001), como em suínos (Choi e Chae, 2003) e galinhas (Billam et al., 2008) infectados naturalmente (via oral). Não se sabe ao certo quais seriam as implicâncias destes achados para a patogenia da HE, mas sugere-se que a presença do HEV em diversos tecidos de suínos pode indicar uma via alternativa de transmissão interespecífica, por meio de xenotransplantes (Murphy, 1996). 1.2.3 Resposta imune Apesar dos avanços nos estudos atuais sobre a hepatite E, as informações sobre a resposta imune do hospedeiro frente à infecção pelo HEV ainda são limitadas. A maior parte dos estudos disponíveis sobre a resposta imunomediada pelo HEV se baseia em análises em sangue periférico de pacientes ou animais experimentalmente infectados. Entretanto, alguns fatores devem ser considerados quando estuda-se hepatites virais (Wedemeyer et al., 2013). A composição de células envolvidas na resposta imune varia enormemente entre o sangue e o fígado. As células NK, por exemplo, representam apenas 10 a 15% das células mononucleares de sangue periférico (PBMC) contra mais de 40% das células imunes hepáticas (Lunemann et al., 2012). Além disso, o ambiente tolerogênico do fígado, torna ainda mais complexa a resposta imune mediada por vírus hepatotrópicos (Protzer, Maini e Knolle, 2012). Sendo assim, pouco ainda se sabe sobre a resposta imune intra-hepática específica ao HEV, crucial ao 18 Mejido, DCP Introdução entendimento dos mecanismos de ação do mesmo em seu sítio preferencial no organismo. Em relação à imunidade inata, sabe-se que as células NK, os seus subtipos e as células NKT desempenham um papel importante na fase aguda da HE. Estes achados foram observados por Srisvatava e colaboradores (2008), que descreveram uma aumento significativo no número de células NK e NKT e na ativação das mesmas em PBMC de pacientes com hepatite E aguda em comparação a indivíduos saudáveis. A resposta humoral específica anti-HEV é caracterizada pela presença de anticorpos IgM e IgG, com atividade neutralizante, que conferem proteção durante a infecção natural e/ou por meio de imunização (Schofield et al., 2000 e Wedemeyer et al., 2013). Estudos demonstraram que PTNs do capsídeo viral, codificadas por ORF2, constituem os principais alvos antigênicos para anticorpos neutralizantes (Zhang et al., 2005). Liu et al. (2003) e Wong et al. (2004) encontraram uma alta sensibilidade e especificidade na detecção de IgM anti-HEV na fase aguda da doença, reafirmando a importância deste anticorpo como marcador do estágio inicial da doença. Na infecção aguda pelo HEV, os níveis de IgM específicos podem não apresentar correlação com a viremia, o que pode indicar a infecção por genótipos diferentes do vírus (Wu et al., 2009). Em outro estudo, Saravanabalaji e colaboradores (2009) demonstraram que, nas duas primeiras semanas após o início do aparecimento de icterícia, os títulos de anticorpos IgM e IgG anti-HEV são significativamente maiores em pacientes com insuficiência hepática fulminante do que em pacientes com HE aguda autolimitante, sugerindo, assim, o envolvimento relevante da resposta imune humoral em casos graves da doença. A resposta imunomediada por células é altamente sensível e de longa duração após infecções virais subclínicas, conforme demonstrado para os vírus da Hepatite C (HCV) (Al-Sherbiny et al., 2005) e HIV (Alimonti et al., 2006). A imunidade conferida por células de memória na hepatite C, por exemplo, também é de longa permanência e pode ser detectada até 20-30 anos após a exposição, apesar da diminuição da resposta imune humoral (Takaki et al., 2000). Em inúmeros trabalhos, estabeleceu-se uma relação entre a recuperação de hepatites agudas do tipo B e C e a resposta marcante de células T específicas. Embora haja poucos estudos sobre a imunopatogênese da HE, os resultados destes apontam um perfil de resposta celular 19 Mejido, DCP Introdução semelhante aos das demais hepatites virais. (Krawczynski, Meng e Rybczynska, 2011 e Wedemeyer et al., 2013). Srivastava e colaboradores (2007) estudaram as frequências de células TCD4 e TCD8 produtoras de IFN-, TNF- e IL-4, em pacientes com hepatite E aguda após a estimulação com a proteína de capsídeo do HEV, ORF2. Embora houvesse um aumento no total de células CD4+, as proporções de células TCD4 e TCD8 ativadas, visualizadas pelo marcador de ativação CD69, permaneceram inalteradas em resposta ao estímulo com ORF2. No entanto, os níveis de IFN- e transcrições de mRNA para IFN- encontravam-se elevados em PBMC frente ao estímulo com ORF2. Este estudo sugeriu que o aumento observado da produção de IFN- em pacientes com hepatite E aguda pode ser importante tanto para a resposta protetora, como na patogênese da infecção, visto que em outras hepatites virais (hepatite B e C) o IFN- pode exercer diretamente atividade anti-viral ou pode promover danos teciduais pela morte de células infectadas (recrutamento de neutrófilos, macrófagos, células NK e células NKT). No mesmo trabalho, os autores sugerem que a reatividade imunológica limitada em PBMC, como não terem sido detectadas células CD8+ específicas ao HEV ou a ativação de linfócitos mediante estímulo, pode estar relacionada ao “sequestro” de eventos imunológicos para o compartimento intra-hepático. Em um trabalho mais recente, o mesmo grupo de pesquisadores relatou uma expansão mais acentuada de células B secretoras de IgG anti-HEV em pacientes com HE fulminante, quando comparados a pacientes com infecções assintomáticas e pacientes do grupo controle. Estes achados sugerem que respostas imunes celulares antivirais menos acentuadas e resposta antivirais do tipo humoral elevadas estão associadas com uma doença mais grave durante a infecção por HEV (Srivastava et al., 2011). Husain et al. (2011) estudaram as células mononucleares do sangue periférico (PBMC) de pacientes com hepatite E aguda assintomática e de indivíduos saudáveis (negativos em triagem para anticorpos anti-HEV), para a caracterização dos subtipos de células T presentes (por citometria de fluxo) e avaliação de suas respostas efetoras específicas ao HEV, pela produção de IFN- (por ELISPOT). Os indivíduos doentes apresentaram um aumento no número de células TCD8 e TCD4 específicas em comparação com aos indivíduos saudáveis do grupo controle. A produção específica de IFN- em resposta ao estímulo com as proteínas ORF2 e ORF3 recombinantes do 20 Mejido, DCP Introdução HEV também mostrou-se maior nos pacientes do que nos indivíduos saudáveis. A partir destes resultados foram mapeadas as regiões imunodominantes, correspondentes aos aminoácidos 181-249 e 301-489 da proteína ORF2 do vírus. Estes dados fornecem evidências quanto à ativação de células T efetoras durante a fase aguda da hepatite E e, como estas respostas podem desempenhar um papel importante na eliminação viral. Pouco ainda se sabe sobre as características da resposta adaptativa intrahepática específica ao HEV, considerando-se as particularidades da imunidade tecidual. Prabhu et al. (2011) e Drebber et al. (2013) descreveram a predominância da população de células TCD8 em biópsias hepáticas de pacientes com HE grave, com falência hepática, e com HE aguda respectivamente, através de análises por imunohistoquímica. Estes estudos sugeriram que a resposta imune adaptativa constitui a maior linha de defesa ao HEV em seu sítio de replicação, sendo esta, responsável pelos danos hepáticos durante a infecção. Dentre as moléculas do sistema imune envolvidas nos processos inflamatórios e na capacidade de destruição de microrganismos intracelulares como os vírus, podese destacar o óxido nítrico (NO) (Feldman et. al., 1993). A sua isoforma induzida (iNOS), que libera quantidades micromolares de NO é expressa transitoriamente por meio de estímulos antigênicos e inflamatórios, de endotoxinas como o LPS e de citocinas como IL-1, TNF- e IFN-, que podem agir individualmente ou em conjunto (Kajita et al., 2011). A enzima iNOS é induzida como uma primeira linha de defesa, mediando a citotoxicidade não-específica de macrófagos contra patógenos e células tumorais e regulando as respostas específicas das células T, através da supressão da proliferação alogênica e mitogênica dos linfócitos. Entretanto, uma grande quantidade de NO pode lesar os tecidos circunjacentes, direta ou indiretamente, através da geração de produtos de oxidação como o peroxinitrito ou o íon hidroxila (Hoey et al., 1997). Um estudo recente realizado por Hazam e colaboradores (2013) correlacionou a frequência dos genes das isoformas iNOS (óxido nítrico sintetase induzível) e eNOS (óxido nítrico sintetase endotelial) e seus polimorfismos aos níveis de gravidade da hepatite E. Mostrou-se um aumento significativo da frequência de iNOS e eNOS no grupo de indivíduos com insuficiência hepática, quando comparados ao grupo de pacientes com HE aguda e ao grupo controle com indivíduos saudáveis. Sendo assim, 21 Mejido, DCP Introdução foi possível sugerir que iNOS e eNOS podem constituir marcadores importantes na avaliação da gravidade da infecção pelo HEV. A realização de estudos mais robustos sobre a resposta imunológica dirigida ao HEV, especialmente em tecido hepático, torna-se fundamental à compreensão da patogenia da doença, bem como ao estabelecimento de formas de tratamento e ao delineamento de estratégias vacinais. 1.3 Genótipo 3 - Potencial zoonótico e impacto na Saúde Pública Atualmente, o genótipo 3 do HEV (HEV3) apresenta-se relacionado à crescente ocorrência de casos de hepatite E em países industrializados. Os achados deste genótipo em inúmeras espécies de mamíferos e sua transmissão geralmente associada ao consumo de produtos de origem animal o definem como um agente zoonótico de importância para a Saúde Pública. (Bradley et al., 1992; Harrison, 1999; Ahmad et al., 2011; Kumar et al., 2013). As taxas cada vez mais elevadas de soroprevalência da hepatite E em países desenvolvidos, na Europa, na América do Norte, e no Leste da Ásia, estão relacionadas a infecções assintomáticas causadas pelo G3 (Arends et al., 2014). Os casos de hepatite E autóctones nestes países têm sido cada vez mais frequentes e representam uma ameaça silenciosa à indivíduos imunossuprimidos ou com doenças hepáticas crônicas pré-estabelecidas (Krain et al., 2014). Em sua maioria, as infecções causadas pelo HEV3 ocorrem através do consumo da carne mal cozida de porco ou de outros animais reservatórios, especialmente de fígado, embutidos ou carnes de outras vísceras, contaminadas com o vírus. Conforme dito anteriormente, o G3 têm sido identificado em uma gama cada vez maior de reservatórios animais, incluindo além de suínos (porcos doméstico e javalis), outras espécies, como cervos, mangustos e ratos. A infecção em ostras e mariscos provenientes de águas contaminadas com esgoto também foi descrita como uma possível fonte de infecção do HEV3. A circulação urbana e silvestre do G3 entre espécies animais continua sendo investigada, para a avaliação do atual risco zoonótico do HEV (Meng, 2013; Kamar et al., 2014 e Krain et al., 2014). Estudos sobre a viabilidade do HEV em carnes através da ingestão de carnes cruas ou mal passadas têm sido realizados, a fim de determinar formas de prevenção 22 Mejido, DCP Introdução da infecção. Em relação à estabilidade térmica do vírus, sabe-se que este permanece viável por uma hora, mesmo após o aquecimento da carne a 56°C e que o cozimento das carnes a 71°C por 20 minutos parece ser eficaz para a inativação do vírus por completo (Emerson, Arankalle e Purcell, 2005; Barnaud et al., 2012 e Scobie e Dalton, 2013). Além dos cuidados no manejo dos alimentos, medidas de controle, através da inspeção sanitária de produtos de origem animal, devem ser preconizadas para a contenção da hepatite E, já que inúmeros casos assintomáticos relacionados ao G3 têm sido descritos. O HEV3 encontra-se amplamente disseminado em granjas comerciais de suínos nos países industrializados, atingindo soroprevalências elevadas, de aproximadamente 80 a 100%, em países como os Estados Unidos, a Espanha e o Brasil. Esta circulação expressiva do HEV entre criações de suínos representa um problema econômico uma nova ameaça à segurança alimentar e saúde pública mundial (Yugo e Meng, 2013). Outras vias possíveis de transmissão do HEV3 foram descritas, como a transmissão ocupacional, por contato direto com animais infectados (Meng et al., 2002; Perez-Gracia et al., 2007 e Galiana et al., 2008); a transmissão através da doação de sangue, por doadores infectados que encontram-se em período virêmico (Baylis et al., 2012) e a transmissão via transplantes, alogênicos (Kamar et al., 2011 e Krain et al., 2014) ou xenotransplantes (Meng, 2003). A transmissão ocupacional geralmente afeta indivíduos que trabalham diretamente com animais, como veterinários e trabalhadores de abatedouros. Entretanto, estudos recentes têm sugerido a transmissão da hepatite E através do contato direto com animais de estimação, aumentando a gama de indivíduos afetados (Krain et al., 2014). Okamoto e colaboradores (2004), por exemplo, encontraram uma elevada soropositividade para HEV em gatos criados como pet no Japão. Estas inferências sobre o risco zoonótico do HEV3, ainda que escassas, demonstram que pouco ainda se sabe sobre a gama de hospedeiro do vírus e seus mecanismos de propagação. No Brasil, o HEV foi detectado em amostras coletadas a partir de diferentes espécies animais. Estudos preliminares realizados no país demonstraram que o HEV3 encontra-se amplamente disseminado entre rebanhos comerciais de suínos, o que não reflete o número de infecções relatadas, já que apenas um caso humano de hepatite E aguda, associada ao genótipo 3, foi descrito no Brasil (dos Santos et al, 23 Mejido, DCP Introdução 2009; Gardinali et al., 2012). Como evidências da circulação do HEV no país pode-se citar a recente identificação do único caso humano autóctone descrito de hepatite E e a presença de marcadores sorológicos anti-HEV na população, relacionado ao consumo de carne suína (Lopes et al., 2010). Além de sua relevância como agente zoonótico, o HEV3 apresenta-se como o único causador da forma crônica da hepatite E em países desenvolvidos. A cronicidade na hepatite E pode ser considerada quando ocorre a persistência na replicação do vírus no organismo por mais de 3 meses, sem que haja a resolução na fase aguda (Kamar et al., 2013). Estes casos crônicos ocorrem em sua maioria em receptores de transplantes de órgãos sólidos, mas inúmeros casos também têm sido observados em indivíduos HIV positivos e em indivíduos tratados com quimioterapia (Kamar et al., 2014). Geralmente, a via de transmissão do HEV em indivíduos transplantados ocorre através da ingestão de alimentos cárneos oriundos de animais infectados. Entretanto, alguns casos de transmissão do vírus pelo órgão enxertado também foram relatados. Os mecanismos de permanência do HEV3 no organismo permanecem desconhecidos, mas sabe-se que a reativação viral ocorre após o transplante, devido ao tratamento imunossupressor que evita a rejeição do órgão pelo receptor. A atenção para a infecção pelo HEV em pacientes transplantados deve ser redobrada, uma vez que a doença crônica nestes casos pode rapidamente evoluir para cirrose e insuficiência hepática (Kamar et al., 2008 e Fujiwara et al., 2014). A relação do G3 com a forma crônica da hepatite E levanta questões quando aos mecanismos que tornam possível sua permanência no organismo. Desse modo, faz-se necessária a investigação de fatores intrínsecos à patogênese da infecção, como a avaliação do tempo de permanência do vírus no hospedeiro, a possibilidade de evasão do sistema imune ou até mesmo de latência, que permitam entender como se dá a evolução para a cronicidade. 1.4 Primatas não humanos como modelos experimentais para a Hepatite E Quando empregam-se animais no estudo de doenças humanas, busca-se modelos com maior proximidade genética, anatômica e fisiológica ao homem, a fim de mimetizar a infecção que se deseja estudar. Na tentativa de acessar as características de infectividade e patogenicidade do HEV, inúmeros estudos em 24 Mejido, DCP Introdução modelos animais foram realizados desde a sua descoberta. Os primeiros estudos nos quais tentou-se estabelecer a infecção experimental com o HEV foram realizados em primatas não humanos e em voluntários humanos. Nesta época, a avaliação da susceptibilidade à hepatite E em modelos animais baseava-se na reprodução clínica da doença, tal qual em humanos, já que o vírus sequer havia sido caracterizado por estudos moleculares (Purcell e Emerson, 2001). Infecções experimentais com o HEV foram bem sucedidas em espécies de primatas do velho mundo, como macacos rhesus, cynomolgus (gênero Macaca), chimpanzés e macacos verdes africanos, e do novo mundo, como saguis e macacos da noite. Os primatas reproduzem com similaridade os mecanismos envolvidos no processo necroinflamatório hepático característico da hepatite E em humanos. A partir de estudos com infecção experimental nestes animais, foi possível observar evidências da infecção, como a produção de anticorpos, alterações bioquímicas decorrentes das lesões hepáticas, alterações histopatológicas no fígado e a eliminação de partículas virais nas fezes (Tsarev et al., 1993 e Purcell e Emerson, 2001). Apesar do sucesso na reprodução da infecção por todos os genótipos do HEV em primatas não humanos, observou-se algumas limitações no uso destes modelos. O processo inflamatório hepático decorrente da infecção com HEV mostra-se mais brando em primatas e não se observa a hiperbilirrubinemia comum em humanos (Krawczynski, Meng e Rybczynska, 2011). O estabelecimento da forma grave da doença em rhesus grávidas inoculadas com o genótipo 1 do HEV não obteve sucesso (Tsarev et al., 1995) e, até o momento, também não foi possível estabelecer um modelo para HE crônica em primatas. Vários outros modelos animais, incluindo porcos, coelhos e galinhas, foram estabelecidos para o estudo de múltiplos aspectos da infecção pelo HEV (Krawczynski, Meng e Rybczynska, 2011). Desde a descoberta do potencial zoonótico do HEV, os suínos têm sido utilizados como modelos animais para a infecção pelos genótipos 3 e 4 do HEV (Meng et al., 1998). Entretanto, mesmo com os recentes avanços na proposição de novos modelos animais e o estabelecimento de cultivos celulares para a avaliação da infecção pelo HEV, a utilização de primatas, principalmente de macacos rhesus e cynomolgus, permanece como a alternativa mais viável para o entendimento da patogenia da hepatite E e para testes de imunogenicidade em estudos vacinais. 25 Mejido, DCP Justificativa 2 Justificativa O crescente número de casos da hepatite E em áreas endêmicas e em outras regiões, com surtos esporádicos e casos fatais, atesta a relevância de estudos sobre o HEV, como patógeno emergente. Atualmente, dentre os genótipos caracterizados do HEV, o G3 têm-se destacado como um importante agente zoonótico causador da hepatite E em países desenvolvidos (Teo, 2010; Leblanc et al., 2010 e Krain, Nelson e Labrique, 2014). Apesar da baixa prevalência da doença no Brasil, a comprovação da circulação do HEV3 em criações comerciais de suínos no país apresenta uma alerta relevante à saúde pública, quanto ao risco de um aumento no número de casos de hepatite E por transmissão zoonótica (dos Santos et al., 2009 e Gardinali et al., 2012). Sabe-se que a hepatite E apresenta-se como uma doença hepatotrópica de caráter necroinflamatório característico durante a fase aguda (Kmush et al., 2013). Todavia, atualmente, ainda são escassas as informações disponíveis na literatura sobre esta virose, em especial no que tange a imunopatogenia da infecção. O envolvimento da imunidade celular, por exemplo, permanece parcialmente compreendido em análises em PBMC de humanos infectados, durante a fase aguda da hepatite E. Além disso, pouco se sabe sobre os eventos imunopatogênicos no fígado. Os crescentes relatos de casos de infecção persistente e cronicidade em indivíduos imunossuprimidos, relacionados à infecção pelo HEV3, atestam a importância de estudos mais contundentes sobre a fase tardia da infecção. A proposta do presente estudo se fundamenta, portanto, na caracterização de subpopulações de células imunes envolvidas no controle viral em fase tardia de infecção em primatas não humanos inoculados com o HEV3 de diferentes origens. Serão utilizadas amostras teciduais obtidas durante a fase de convalescência (67 dpi), coletadas a partir das necrópsias de macacos cynomolgus infectados com o HEV3 de origem suína e humana. Através desta abordagem, pretende-se avaliar a permanência do vírus no organismo e os eventos imunológicos compartimentalizados no fígado durante a fase de convalescência, bem como caracterizar a resposta imune celular nesta fase da infecção considerando-se as origens dos inóculos utilizados. Sendo assim, este projeto contribuirá para a elucidação da resposta imune intra-hepática envolvida no controle viral em fase tardia de infecção pelo HEV3, cujo entendimento será de suma importância para a compreensão do curso da doença. 26 Mejido, DCP Objetivos 3 OBJETIVOS 3.1 Objetivo geral Avaliar o controle viral e caracterizar as células envolvidas na resposta imunológica intra-hepática frente à infecção experimental com o HEV3 de origem suína e humana em macacos cynomolgus (Macaca fascicularis) durante a fase de convalescência. 3.2 Objetivos específicos Detectar o HEV RNA e sua carga viral em amostras de fígado, baço, intestino (duodeno), vesícula biliar, bile, soro, fezes e urina, coletadas 67 dias pós infecção (dpi); Detectar o antígeno viral, HEV Ag, no parênquima hepático em fase de convalescência da infecção; Avaliar as frequências de células de Kupffer, de linfócitos TCD4 e TCD8 e caracterizar o envolvimento destas populações celulares na resposta imunológica intra-hepática durante a fase tardia de infecção pelo HEV3 suíno e humano; Avaliar a produção de óxido nítrico no parênquima hepático através da determinação da frequência de células produtoras de iNOS (óxido nítrico sintetase induzível), como resposta tardia frente à infecção produzida pelo HEV3 suíno e humano. 27 Mejido, DCP Material e Métodos 4 MATERIAL E MÉTODOS 4.1 Animais As amostras de tecidos, soro, bile, urina e fezes utilizadas no presente estudo foram previamente coletadas dos primatas utilizados no primeiro trabalho do LADTV envolvendo infecção experimental pelo HEV. Este estudo foi realizado no ano de 2009, intitulado “Experimental infection with human and swine genotype 3 hepatitis E virus induces hematological changes in cynomolgus monkeys Macaca fascicularis” (Carvalho et al., 2013). Para a infecção experimental, doze macacos cynomolgos adultos jovens, com peso médio entre 1,5 - 6,0 kg, foram fornecidos pelo Serviço de Criação de Primatas do Cecal - SCPRIM. Os animais foram previamente triados, tendo estabelecido como critério de exclusão a sorologia positiva para o vírus da imunodeficiência símia (SIV), o retrovírus tipo D (SRV/D) e o Vírus da Hepatite A (HAV). Nesta fase pré-estudo, apenas animais hígidos, soronegativos para o HEV e sem quaisquer alterações inflamatórias hepáticas prévias foram incluídos. Os animais foram alojados indoor no Biotério de Experimentação de Primatas do IOC (NBA 2) e mantidos em gaiolas individuais sob condições controladas (temperatura: 22 ± 1 ° C, umidade: 55 ± 5% e ciclos de luz/escuro de 12h). Para a realização deste trabalho, o protocolo experimental foi aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Fiocruz (CEUA / Fiocruz), sob a Licença L-0033/07. 4.2 Infecção experimental de macacos cynomolgus com HEV genótipo 3 Na infecção experimental realizada por Carvalho et al. (2013), dez macacos cynomolgus (Macaca fascicularis) foram inoculados por via intravenosa e distribuídos entre três grupos distintos de acordo com os inóculos: 1) seis animais inoculados com o HEV3 recuperado de suínos (natural ou experimentalmente infectados); 2) dois animais inoculados com o HEV3 isolados de casos humanos (pacientes com Hepatite E aguda ou fulminante) e 3) controle negativo, de dois animais inoculados com solução tamponada fosfato-salina (PBS a 10%). 28 Mejido, DCP Material e Métodos A Tabela 4.1 abaixo apresenta a distribuição de animais por grupo experimental, bem como os parâmetros histopatológicos e de detecção molecular do RNA viral determinados por Carvalho e colaboradores (2013). Tabela 4.1 – Grupos experimentais, parâmetros histopatológicos e virológicos. Animais (ID) Idade (anos) Danos hepáticos 67 dpi (scores)* I3 15 Q11 18 Grupo inoculado com HEV3 suíno X15 O1 G3 F3 Grupo inoculado com HEV3 humano Grupos Grupo controle Detecção do RNA do HEV (dpi)** Soro Fezes 2 39 - 53 21 - 53 2 11 17 19 1 2 1 1 1 14 ---14 7 - 14 ---- 7 - 21 14 - 21 5 - 18 7 - 18 ---- R7 7 0 ---- 14 - 27 J3 14 1 ---- ---- I2 Q12 16 18 0 ---- ---- 0 ---- ---- * Classificação das lesões inflamatórias com base no número de infiltrados de células mononucleares focais por 10 lóbulos hepáticos: 0 = ausência de inflamação, 1 = 1-2 infiltrados focais (fraco), 2 = 2 a 5 infiltrados focais (leve), 3 = 6 a 10 infiltrados focais (moderada) e 4 = mais de 10 infiltrados focais (grave) (Halbur et al., 2001). ** Dias pós infecção onde foi detectado o RNA viral (Carvalho et al., 2013). O experimento teve duração de 67 dias, contados a partir dia 0 de infecção. A confirmação da infecção com o HEV3 realizou-se a partir da detecção do RNA viral no soro e fezes, da avaliação da função hepática e confirmação de hepatite E subclínica nos animais. Ao longo do experimento, os parâmetros hematológicos, bioquímicos e virológicos dos animais foram continuamente avaliados. O desenho experimental da infecção encontra-se representado de forma resumida na Figura 4.1. 29 Mejido, DCP Dia 0 Infecção com o HEV3 (Administração do inóculo por via IV) Material e Métodos - Coleta de sangue total; - Coleta de fezes e saliva; - Realização de biópsias hepáticas; Confirmação da infecção: detecção do RNA viral por PCR e detecção de anticorpos antiHEV por ELISA no soro. Monitoramento clínico, avaliação da função hepática e da resposta imune humoral frente à infecção. 67 dpi Eutanásia e necropsia dos animais. Necrópsia: - Coleta de sangue, urina e bile; - Obtenção de fragmentos de tecidos (fígado, baço, intestino, vesícula biliar). Figura 4.1 – Desenho experimental da infecção de macacos cynomolgus com o HEV3, realizada por Carvalho et al., 2013. Durante os 67 dias do experimento, os animais foram monitorados clinicamente por veterinários, com intervalo semanal, para aferição de temperatura, pesagem e avaliação de anormalidades clínicas e laboratoriais e/ou sintomas específicos. Amostras de sangue total foram coletadas por punção venosa (0, 7, 14, 25, 32, 39, 46, 53 e 67 dpi) para a detecção molecular do RNA genômico do HEV e para a detecção sorológica de anticorpos específicos anti-HEV. Também foi realizada a coleta das fezes dos animais (0, 5, 7, 12, 14, 18, 21, 25, 27, 32, 35, 39, 42, 49, 53, 56, 63 e 67 dpi) para a detecção do RNA do HEV e quantificação da carga viral. As amostras de soro e fezes foram armazenadas em freezer à -20 °C até o seu processamento. Para a detecção de IgA, foram coletadas amostras de saliva dos animais (0, 7, 14, 21, 28, 35, 42, e 53), com os dispositivos de coleta OraSure® (OraSure Technologies Incorporated, Pennsylvania, EUA). Durante as coletas das amostras, os animais foram anestesiados com cloridrato de cetamina a 20 mg/kg (Vetanarcol, König, Argentina) em associação com cloridrato de xilazina a 0,1 mg/kg (Syntec Brasil, São Paulo, Brasil). Ao final do experimento (67dpi), todos os animais foram eutanasiados com overdose de tiopental de sódico a 2,5% (25 mg/kg) (Thiopentax, Cristália, São Paulo, Brasil), por via intravenosa, seguida de exsanguinação por punção cardíaca. Durante a necropsia, foram coletadas amostras 30 Mejido, DCP Material e Métodos de bile, urina, fezes, e fragmentos de linfonodos, glândula salivar, baço, estômago, vesícula biliar, fígado, intestino delgado e intestino grosso (Carvalho et al., 2013). No presente estudo, foram utilizadas amostras coletadas em fase de convalescência da infecção, ou seja, à partir de 55 dpi, quando os níveis de IgM e ALT já decresceram no soro e não há a detecção do RNA viral no soro e/ou nas fezes. Foram utilizadas as amostras congeladas de soro, urina (freezer a -20°C), bile e fragmentos de fígado, baço, duodeno e vesícula biliar (nitrogênio líquido) coletados a partir das necropsias dos animais infectados, 67 dpi. Amostras de fezes congeladas (freezer a -20°C) também foram utilizadas no atual estudo, entretanto, estas só foram coletadas até 64 dpi, antecedendo em três dias o final do experimento (67 dpi). 4.3 Detecção do RNA viral do HEV e quantificação da carga viral em fase tardia de infecção 4.3.1 Detecção e quantificação do RNA do HEV através de PCR em tempo real (qRT-PCR) Para avaliar a presença HEV em fase tardia da infecção, realizou-se a detecção do RNA genômico. A quantificação da carga viral foi realizada em amostras de fígado, baço, duodeno, vesícula biliar, soro, urina e bile, no momento da necropsia, 67 dpi, e em amostras de fezes, 64 dpi. Todas as amostras encontravam-se mantidas congeladas até o seu processamento. Para a extração do RNA, algumas amostras foram processadas previamente, atendendo às recomendações dos kits comerciais utilizados. As amostras de fezes foram processadas para a obtenção de suspensões fecais a 10% p/v, obtidas a partir da diluição de 1g de fezes em 10 mL de tampão fosfato salino (PBS, 0,01M, pH 6,8). As suspensões foram clarificadas por centrifugação (4.800 × g por 20 min a 4°C), filtradas (microfiltro de 0,45 μm) e estocadas a - 20°C em criotubos de 2 mL. Em função da viscosidade natural das amostras de bile, estas foram descongeladas e diluídas em água RNAse free (1:10), no mesmo dia da extração. Os fragmentos de tecidos congelados foram seccionados e pesados previamente em balança analítica, para a obtenção de fragmentos de 30mg, requeridos para a extração, conforme indicado pelo kit. A fim de assegurar a integridade dos tecidos congelados, estes foram mantidos em gelo seco, durante as etapas de corte e pesagem. 31 Mejido, DCP Material e Métodos A extração do RNA de amostras de soro, urina, bile e suspensões fecais (suspenções) foi realizada com o kit comercial Qiamp Viral RNA kit (Qiagen, Valencia, CA, EUA), enquanto para fragmentos de tecidos, utilizou-se o kit RNAeasy Minikit da Quiagen (Qiagen, Valencia, CA, EUA), seguindo as instruções do fabricante. O RNA total foi extraído a partir de 140 µL das amostras de soro, bile e das suspenções fecais e de 30mg dos fragmentos de tecidos selecionados. Em todas as extrações, também foram utilizados amostras controle, negativas e positivas, para validação do ensaio. Como controle positivo na extração das suspenções (soro, bile e suspensões fecais), foi utilizada uma amostra de suspensão fecal de suínos sabidamente infectados com HEV, obtidas em um trabalho anterior realizado pela equipe do LADTV (dos Santos et al., 2009). Já na extração das amostras de fragmentos teciduais, foi utilizada como controle uma amostra positiva de biópsia hepática de suíno infectado experimentalmente com HEV, cedida pelo Departamento de Veterinária, do Instituto da Universidade de Wageningen e Centro de Pesquisa, Wageningen, Holanda (Van Der Poel et al., 2001). Com 25 µL do RNA extraído de cada amostra, foi realizada a transcrição reversa para a obtenção do DNA complementar (cDNA). Nesta etapa, o mix acrescido à reação foi preparado previamente com a enzima Superscript® III Reverse Transcriptase (200 U/mL - Invitrogen, CA, EUA), primer randômico (200 U/mL Invitrogen, CA, USA) e demais reagentes, como água RNAse free, tampão FS (1X), DTT (3,5 mM), dNTP (0,2 mM) e RNAsin Ribonuclease Inhibitor (0,6mM). A reação, de volume final de 50 µL (25 µL de RNA da amostra + 25 µL do mix), foi submetida a ciclos de 25 ºC por 5 min, 50 ºC por 60 minutos e 70 ºC por 20 min (programados em termociclador). Posteriormente, os respectivos cDNAs sintetizados de cada amostras foram amplificados pela reação de PCR em tempo real (qRT-PCR) com marcador TaqMan®, de acordo com o protocolo descrito por Jothikumar et al. (2006). Foi utilizado o equipamento 7500 Real-Time PCR System (Applied Biosystems, Foster City, CA, EUA). As sequências dos primers e da sonda utilizados, descritos por Jothikumar et al. (2006) anelam-se em uma região altamente conservada de ORF3, constando na tabela 4.2. 32 Mejido, DCP Material e Métodos Tabela 4.2 – Descrição dos primers e sonda utilizados no qRT-PCR para detecção do HEV RNA (Jothikumar et al., 2006). Primers Sequências JVHEVF (foward) 5′-GGTGGTTTCTGGGGTGAC-3′ JVHEVR (reverse) 5′-AGGGGTTGGTTGGATGAA-3′ JVHEVP (sonda) 5′-TGATTCTCAGCCCTTCGC-3′ Posição no genoma (região ORF3) 5261–5330 As reações de qRT-PCR foram realizadas em duplicata por amostra, com um volume final de 25 µL de reação, sendo 12,5 µL de Universal PCR Master Mix (Life Technologies Corp, EUA), 6,5 µL de água RNAse free, 0,25 µL dos primers, 0,5 µL da sonda TaqMan® e 5 µL de cDNA (Jothikumar et al., 2006). No programa de amplificação para a qRT-PCR, foram utilizadas as seguintes condições: um ciclo de 50 °C por 2 minutos, outro ciclo inicial de desnaturação a 95 °C por 15 minutos e 45 ciclos seguidos de desnaturação a 95 °C por 10 segundos e de hibridação / extensão a 55 °C por 1 minuto. Neste ensaio de qRT-PCR, utilizou-se diluições seriadas (101-106) de um clone de plasmídeo previamente gerado a partir de uma estirpe do HEV3 isolado de suínos do Brasil, caracterizado em um trabalho anterior do grupo do LADTV realizado por dos Santos et al. (2009). O plasmídeo foi clonado com o kit TOPO® TA cloning® (Invitrogen, Carlsbad, CA, EUA) e os primers descritos por Jothikumar et al., 2006 e, em seguida, purificado utilizando o kit QIAprep spin miniprep (QIAgen, CA, EUA) para a quantificação com o Nanodrop ND-1000 de acordo com instruções do fabricante (Wilmington, DE). Desta forma, uma curva padrão foi gerada utilizando as diluições em série do plasmídeo, para fornecer os parâmetros necessários à quantificação da carga viral. Os dados da amplificação do cDNA das amostras foram coletados e analisados com o Software v2.0 da Applied Biosystems 7500®. As amostras foram consideradas positivas de acordo com o valor de CT, ou seja, quando o sinal emitido cruzou a linha de limiar (threshold) apresentando uma curva sigmóide característica. O número de cópias do genoma viral foi determinado para cada amostra, ajustando os valores de acordo com os volumes ou massa utilizados em cada etapa, desde a extração até o qRT-PCR. 33 Mejido, DCP Material e Métodos 4.3.2 Detecção do RNA genôminco e do RNA intermediário replicativo do HEV por Nested-PCR / sequenciamento O Nested-PCR foi realizado para a confirmação dos resultados obtidos no qRT-PCR, nas amostras consideradas positivas, seguindo uma adaptação do protocolo estabelecido por Wang et al. (1999). Além da detecção do RNA genômico, também foi realizada a detecção do RNA intermediário replicativo, ou seja, da fita negativa complementar, sintetizada apenas no momento da replicação. Para a detecção do HEV RNA foi realizado o 1° round de amplificação com o PCR convencional a partir do cDNA das amostras. O mix contendo os reagentes para a RTPCR foi preparado com água RNAse free, tampão para PCR 1X, MgCl2 (3,5 mM), dNTP (0,4 mM), primers foward 1 (ORF1-F1) e reverse 1 (ORF1-R1) específicos para a região ORF1 (0,6 µM) e a enzima Taq platinum DNA polimerase (5 U). A reação de 50 µL totais (42 µL de mix + 8 µL de cDNA) foi submetida à amplificação com um ciclo inicial de desnaturação a 94 °C por 2 minutos, 40 ciclos de 94 °C por 1 minuto, 50 °C por 1 minuto e 72 °C por 1 min e um ciclo de extensão de 72 °C por 7 minutos. Com o produto amplificado no 1° round da PCR, foi realizado o 2° round da Nested PCR. Nesta etapa, utilizou-se dos mesmos reagentes da primeira amplificação no mix, exceto pelos primers, utilizando-se agora os primers foward 2 (ORF1-F2) e reverse 2 (ORF1-R2). Nesta segunda etapa, uma reação de 50 µL (47 µL de mix + 3 µL do produto amplificado no 1° round) foi amplificada com um ciclo inicial de desnaturação a 94 °C por 2 minutos, 30 ciclos de 94 °C por 1 minuto, 50 °C por 1 minuto e 72 °C por 1 min e um ciclo de extensão final de 72 °C por 7 minutos. As sequências dos primers utilizados no 1° e no 2°round de amplificação encontram-se dispostos na tabela 4.3. Tabela 4.3 – Descrição dos primers utilizados na PCR (1° round) e Nested (2° round) para detecção do genótipo 3 do HEV. Sequências Posição no genoma ORF1-F1 (foward) 5’- CTGGCATYACTACTGCYATTGAGC-3’ 56 - 79 ORF1-R1 (reverse) 5’- CCATCRARRCAGTAAGTGCGGTC-3’ 451 - 473 ORF1-F2 (foward) 5’- CTGCCYTKGCGAATGCTGTGG-3 104 - 124 ORF1-R2 (reverse) 5’- GGCAGWRTACCARCGCTGAACATC-3 367 - 389 Primers 34 Tamanho do produto 418 pb 287 pb Mejido, DCP Material e Métodos Para a detecção do RNA intermediário replicativo, o cDNA foi obtido de forma diferente à citada no item 4.3.1. Nesta etapa, foi utilizado apenas o primer foward ORF1-F1 e a enzima MMLV (Life Technology, USA) e seus reagentes. Em uma primeira etapa, realizou-se banho de gelo por 5 minutos, adicionando 5 μL do RNA a 5 μL do primer mix (1 μL de forward e 4 μL de água ultrapura), seguindo com a desnaturação em um ciclo de 95 ºC por 5 min. Em seguida adicionou-se 10 μL do mix RT a 5 μL do desnaturado e os tubos foram submetidos à ciclos de 42 ºC /30 min e 94 ºC /5 min, procedendo-se com o PCR e a Nested, conforme o protocolo descrito anteriormente. Por fim, foi realizada a eletroforese em gel de agarose (1,5%) dos produtos amplificados, a 90 volts (V) por aproximadamente 40 minutos. Ao fim da corrida o gel foi foto documentado para a análise dos resultados. Os fragmentos correspondentes a amostras positivas foram excisados do gel para purificação com o kit QIAquick PCR purification (Qiagen, CA, EUA) e sequenciamento. A reação de sequenciamento foi feita acrescentando-se 2 µL dos primers foward e reverse (4 pmol), 3 µL das amostras e 2,5 µL de água, chegando a um volume final de reação de 7,5 µL. Os produtos foram enviados à Plataforma Multi-usuário de sequenciamento – PDTIS/ Fiocruz, onde foram sequenciados no equipamento ABI PRISM 3100 (Applied Biosystems). As sequências foram analisadas no programa BLAST® (NCBI – NIH). 4.4 Imunomarcação em amostras de tecidos hepáticos 4.4.1 Detecção do antígeno viral do HEV por imunofluorescência indireta O ensaio de imunofluorescência indireta foi empregado em amostras congeladas de fígados dos cynomolgus submetidos à infecção experimental com o HEV3, coletadas 67 dpi. Para a detecção do antígeno viral (HEV Ag), especificamente da região ORF2, que compõe as proteínas de capsídeo do HEV, foram realizadas marcações simples em secções hepáticas. Para a realização da imunomarcação, os fragmentos de fígado, mantidos em nitrogênio líquido desde a sua obtenção, foram seccionados e emblocados congelados em moldes plásticos com utilização de resina Cryo glue® (Carl Zeiss, 35 Mejido, DCP Material e Métodos Alemanha). Durante todo o processamento, os fragmentos de fígado permaneceram em gelo seco, afim de evitar seu descongelamento. Após o endurecimento da resina, os blocos foram retirados dos moldes, envoltos com papel alumínio e papel de filtro identificado e armazenados em nitrogênio líquido até seu processamento. Os blocos contendo os fragmentos de fígados dos animais foram seccionados em criostato de bancada modelo MTC (Slee Mainz, Alemanha) a -27 °C, para a obtenção de cortes histológicos de 5 μm de espessura. A fim de garantir a aderência dos cortes, foram utilizadas lâminas com superfície aderente laminas Superfrost plus® (Easypath, Brasil). As lâmina previamente identificadas com a data e a identificação dos animais, foram confeccionadas com dois cortes (em duplicata), imediatamente fixadas com acetona gelada (-10°C) por 3 minutos e armazenadas em freezer a -70°C por curto período de tempo até o seu processamento. Para detecção do HEV Ag, foi realizada a imunofluorescência com marcação simples nos cortes histológicos dos fígados de todos os animais. Inicialmente, as lâminas foram retiradas do freezer a -70°C e alocadas em suporte contendo PBS pH 7.2, para lavagem e retirada da resina que recobre o tecido. O entorno dos cortes foi delimitado com lápis hidrofóbico (quadrados em volta dos cortes), formando “poços”, que retêm a solução de bloqueio ou os anticorpos na área do tecido. Em seguida, realizou-se o bloqueio das lâminas para evitar ligações inespecíficas, recobrindo os cortes com 100 µL de solução de bloqueio previamente preparada (leite em pó molico desnatado 1%, BSA 2,5%, soro fetal bovino 8% e volume completar de PBS pH 7.2 para 50 mL (alíquotas de 1mL foram mantidas congeladas em freezer a -20°C até o uso)). As lâminas com o bloqueio foram acondicionadas em câmara úmida vedada com parafilme e incubadas durante 3 horas em estufa à 37°C. Durante o tempo de incubação com o bloqueio, foram preparadas as diluições dos anticorpos primários e secundários em PBS, apresentados na tabela 4.4. 36 Mejido, DCP Material e Métodos Tabela 4.4 – Descrição dos anticorpos primário e secundário utilizados e das respectivas diluições empregadas na marcação anti-HEV por imunofluorescência indireta. Anticorpo primário Anticorpo (Host) Marca (Catálogo) Anticorpo policlonal anti-HEV Ag (Coelho) Fitzgerald Industries International® (70R-HR003) Anticorpo Secundário Diluição Anticorpo (Host) Anticorpo policlonal secundário anti-IgG de coelho conjugado a FITC (Cabra) 1:150 Marca (Catálogo) Sigma® (F-0511) Diluição 1:500 Após o término do bloqueio, as lâminas foram alocadas em suporte para lavagem com imersão em PBS pH 7.2. O PBS foi trocado para a realização de três lavagens sucessivas. Em seguida, foram aplicados 100 µL do anticorpo primário antiHEV Ag (1:150) por corte e as lâminas foram acondicionadas em câmara úmida vedada com parafilme e incubadas por 3 horas à 37°C. Após o tempo de incubação com anticorpo primário, as lâminas foram novamente lavadas com PBS pH 7.2, com três lavagens sucessivas para a retirada do excesso de anticorpos não ligados. Após as lavagens, foram aplicados 100 µL de anticorpo secundário conjugado à Alexa Fluor® 488 (em escuro) por corte, repetindo-se a incubação das lâminas em câmara úmida 3 horas à 37°C. Logo após o término da incubação, as lâminas foram lavadas três vezes com imersão em PBS pH 7.2. Após as marcações com os anticorpos, os cortes foram recobertos com Azul de Evans 1:20.000 por aproximadamente 30 segundos, para contracorar o parênquima hepático. As lâminas foram lavadas uma vez com PBS pH 7.2 para eliminar o excesso do corante. Depois, aplicou-se 1 gota de SlowFade® Gold Antifade Reagent com DAPI (Life Technologies Corporation, EUA) sobre os cortes, para a marcação dos núcleos, manutenção da viabilidade dos cortes e proteção contra o enfraquecimento dos fluoróforos. Por fim, as lamínulas foram colocadas sobre os cortes e seladas nas bordas com esmalte. As lâminas prontas para a leitura foram então armazenadas no freezer à -20 °C no escuro. Em razão da indisponibilidade no uso do confocal da Plataforma PDTIS/Fiocruz, que encontra-se em manutenção, as leituras das lâminas confeccionadas neste ensaio foram realizadas no microscópio confocal LSM Meta 510 (Carl Zeiss, Alemanha) do Laboratório de Microscopia confocal da UERJ. As imagens foram capturadas com o auxílio do software Zen 2009 patch 2 (Carl Zeiss, Alemanha). 37 Mejido, DCP Material e Métodos 4.4.2 Análise e quantificação fenotípica celular e da produção de óxido nítrico por imunomarcações simultâneas em amostras hepáticas Para as imunomarcações duplas realizadas neste estudo, foram utilizados apenas anticorpos que apresentavam reação cruzada confirmada para macacos cynomolgus (Macaca fascicularis). Antes da aquisição dos anticorpos, consultou-se o site Nonhuman Primate Reagent Resource do NIH (http://www.nhpreagents.org/NHP/default.aspx), que recomenda a utilização de reagentes para as espécies de primatas não humanos utilizadas em pesquisa científica. As informações detalhadas de todos os anticorpos utilizados no presente trabalho encontram-se dispostas no Apêndice A. Cortes histológicos das amostras de fígado dos dez macacos cynomolgus utilizados neste estudo foram imunomarcados para a detecção de alguns subtipos celulares e avaliação da procução de óxido nítrico pela expressão de iNOS. As seguintes combinações de anticorpos primários foram utilizadas neste estudo: antiCD68/anti-HEV Ag, para a quantificação de células de Kupffer (CD68+) e de células de Kupffer comarcadas com o HEV Ag (CD68+/HEV Ag+); anti-CD68/anti-iNOS, para a quantificação de células de kupffer produtoras de iNOS (CD68+iNOS+); antiiNOS/anti-HEV, para a quantificação de células produtoras de óxido nítrico (iNOS+) e de células comarcadas para o antígeno viral produtoras de óxido nítrico (HEV Ag+iNOS+); anti-CD3/anti-CD4, para a quantificação de células CD4+ e de células CD3+CD4+; anti-CD3/anti-CD8, para a quantificação de células CD8+ e de células CD3+CD8+. As marcações foram realizadas nas lâminas previamente preparadas e congeladas com os cortes histológicos. A lavagem e processamento das lâminas até o bloqueio foram realizadas como no item 3.4.1. O bloqueio e as marcações duplas foram adaptados do protocolo Double immunofluorescence – simultaneous protocol (Abcam®), otimizando as marcações por imunofluorescência indireta, com a incubação simultânea dos anticorpos gerados em diferentes espécies (hosts). Para o bloqueio das lâminas, adicionou-se à cada corte de tecido 100 µL de solução de bloqueio com 1% de BSA em PBST (1mL de Tween 20 em 1L de PBS), por uma hora a temperatura ambiente. Durante o tempo de bloqueio, foram preparadas a mistura de anticorpos primários e a mistura de anticorpos secundários de acordo com a 38 Mejido, DCP Material e Métodos marcação desejada. Os anticorpos foram diluídos em solução de bloqueio (1% de BSA em PBST). A tabela 4.5 esquematiza as marcações duplas e as diluições empregadas para cada anticorpo. Tabela 4.5 – Descrição dos anticorpos primários e secundários utilizados nas marcações duplas por imunofluorescência, com as diluições empregadas e as diferentes espécies onde os anticorpos foram produzidos (Hosts). Esquema de marcações simultâneas Marcações Duplas CD68/iNOS Anticorpos primários Anticorpos secundários Anticorpo policlonal anti-IgG de coelho conjugado a Alexa Fluor® 647 (Burro) 1:500 Anticorpo policlonal anti-IgG de camundongo conjugado a Alexa Fluor® 488 (Cabra) 1:500 Anticorpo policlonal anti-IgG de coelho conjugado a Alexa Fluor® 647 (Burro) 1:500 Anticorpo policlonal anti-IgG de camundongo conjugado a Alexa Fluor® 488 (Cabra) 1:500 Anticorpo policlonal anti-IgG de camundongo conjugado a Alexa Fluor® 647 (Burro) 1:500 Anticorpo policlonal anti-IgG de coelho conjugado a FITC (Cabra) 1:500 Anticorpo polyclonal anti-IgG de rato conjugado a Alexa Fluor® 647 (cabra) 1:500 Anticorpo policlonal anti-IgG de camundongo conjugado a Alexa Fluor® 488 (Burro) 1:500 Anticorpo polyclonal anti-IgG de rato conjugado a Alexa Fluor® 647 (cabra) 1:500 Anticorpo policlonal anti-IgG de camundongo conjugado a Alexa Fluor® 488 (Burro) 1:500 Anti-CD68 (Coelho) 1:100 Anti-iNOS (Camundongo) 1:150 CD68/HEV Anti-CD68 (Coelho) 1:100 Anti-HEV (Camundongo) 1:150 iNOS/HEV Anti-iNOS (Camundongo) 1:150 Anti-HEV (Coelho) 1:150 Anti-CD3 (Rato) 1:100 CD3/CD4 Anti-CD4 (Camundongo) 1:100 CD3/CD8 Anti-CD3 (Rato) 1:100 Anti-CD8 (Camundongo) 1:100 Após o bloqueio, as lâminas foram lavadas três vezes com PBS (pH 7.2). Em seguida, foram aplicados 100 µL por corte da mistura de anticorpos primários desejados. As lâminas foram acondicionadas em câmara úmida e incubadas por 90 minutos à 37°C. Logo após, as lâminas foram novamente lavadas três vezes com PBS (pH 7.2). Procedeu-se com a incubação com 100 µL da mistura de anticorpos secundários por corte, em câmara úmida, por mais 90 minutos à 37°C (no escuro). 39 Mejido, DCP Material e Métodos Por fim, as lâminas foram lavadas três vezes com imersão em PBS pH 7.2 e montadas com SlowFade® Gold Antifade Reagent com DAPI, conforme descrito no item 3.4.1. As lâminas confeccionadas foram armazenadas no freezer à -20 °C no escuro até a sua leitura. As leituras das lâminas com marcação dupla foram realizadas em sua maioria no microscópio confocal LSM Meta 510 (Carl Zeiss, Alemanha) do Laboratório de Microscopia Confocal da UERJ. Para a quantificação das marcações, sete campos de cada lâmina, lidos à um aumento de 400x, foram aleatoriamente obtidos com o auxílio do software Zen 2009 patch 2 (Carl Zeiss, Alemanha). Em função de um período de manutenção do equipamento na UERJ, a continuidade das leituras das lâminas marcadas para CD3/CD4 e para CD3/CD8 foram realizadas no microscópio de imunofluorescência Imager.A2 (Carl Zeiss, Alemanha) no Laboratório de Pesquisas sobre o Timo do IOC/Fiocruz. 4.4.2.1 Quantificação das imunomarcações com o software ImageJ A quantificação realizada a partir das imagens capturadas foi realizada com o auxílio do software ImageJ (NIH, USA). Conforme citado no item 3.4.2, foram capturados aleatoriamente sete campos de cada lâmina, utilizando-se objetiva de 40X (aumento de 400X), ou seja, em campos microscópios de alto aumento (High Power Fields – HPF). Duas abordagens de quantificação foram realizadas a fim de aumentar a confiabilidade nas leituras. Na primeira abordagem, as células marcadas (marcação específica) e o total de células por campo (núcleos corados com DAPI) foram contados para estabelecer o valor percentual dos diferentes subtipos de células de interesse (% de células positivas por número total de células/campo). Além disso, foram determinadas as médias de intensidade de fluorescência (MFI) das células marcadas por campo, valor representativo do número de moléculas marcadas. Os valores médios obtidos de cinco seleções correspondentes ao background foram subtraídos dos MFI de cada marcação. Os resultados obtidos em MFI para cada molécula foram proporcionais as frequências de células marcadas pelo total de células/campo obtidas, assegurando a acurácia dos resultados por dois métodos distintos. 40 Mejido, DCP Material e Métodos Desta forma, os sete campos capturados de cada lâmina (animal), foram avaliados quanto à frequência (%) dos fenótipos celulares determinados por diferentes marcações (ex.: células CD68+, CD4+, linfócitos TCD8 (CD3+CD8+)). 4.5 Análise estatística Os resultados das quantificações fenotípicas por imunofluorescência foram analisados estatisticamente com o auxílio do programa Prism 5 (GraphPad software, San Diego, CA, USA), utilizando-se o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis, com a comparação múltipla de Dunn. O nível de significância adotado nesta análise foi p ≤ 0,05. 41 Mejido, DCP Resultados 5 RESULTADOS 5.1 Detecção do RNA do HEV por qRT-PCR e Nested-PCR A fim de avaliar a permanência do HEV no organismo dos animais 67 dpi, em fase de convalescência, pesquisou-se o RNA genômico e sua quantificação em amostras de soro, bile, fezes, urina, fígado, baço, duodeno, e vesícula biliar por qRTPCR, confirmando-se resultados positivos por Nested-PCR. Foi possível detectar carga viral em amostras de dois dos seis animais que receberam inoculo proveniente de suínos infectados (animais I3 e O1), conforme apontam os resultados dispostos na tabela 5.1. Nos grupos de animais inoculados com HEV3 de origem humana e no grupo controle negativo o RNA viral não foi detectado. Tabela 5.1 - Detecção quantitativa (qRT-PCR) e qualitativa (Nested-PCR) do genoma do HEV em diferentes tecidos obtidos de macacos cynomolgos aos 67 dias de infecção. Identificacao do animal Origem inoculo Resultados qRT-PCR Amostra de tecido positivas Carga viral (RNA/gr ou mL) CT* Nested -PCR Vesícula 6x101 40,7 + Bile 2,1x102 38,5 + Vesícula 5,3x103 34,3 + Fígado - - + I3 Suíno O1 *CT, Limiar do ciclo Inicialmente nenhum animal apresentou a detecção HEV RNA no fígado. Sendo assim, extraiu-se o RNA em triplicata das amostras de fígado, repetindo-se o qRTPCR. Neste ensaio, em uma das três amostras de fígado do animal O1, observou-se um resultado sugestivo (CT > 40), sem que fosse possível determinar a carga viral (Tabela 5.1). O Nested-PCR do cDNA desta triplicata foi realizado juntamente com as demais amostras consideradas positivas no qRT-PCR para a confirmação dos resultados e sequenciamento. Todas as amostras positivas no PCR em tempo real, tiveram seus resultados confirmados pela Nested-PCR, inclusive a amostra de fígado do animal O1 (Figura 5.1). 42 Mejido, DCP Resultados 1 2 3 4 5 6 pb 300 200 100 Figura 5.1 – Detecção do RNA do HEV por Nested-PCR. 1. Marcador de peso molecular em pares de base (pb); 2. Controle positivo de fígado infectado com HEV; 3. Bile do animal I3; 4. Vesícula biliar do animal I3; 5. Vesícula biliar do animal O1 e 6. Fígado do animal O1. O sequenciamento dos produtos amplificados foi realizado, confirmando que as sequências detectadas nas amostras correspondiam ao HEV. Para avaliar a hipótese de replicação viral ainda na fase tardia da infecção, foi realizado o Nested-PCR para a detecção do RNA intermediário replicativo em todas amostras consideradas positivas para o genoma viral. Não foi possível detectar o RNA intermediário replicativo nas amostras testadas. 5.2 Detecção do antígeno viral do HEV por imunofluorescência indireta em amostras hepáticas Na avaliação da presença do antígeno viral durante fase de convalescência da infecção, foram consideradas marcações positivas aquelas que apresentaram um padrão de coloração citoplasmática específica, não identificado nas lâminas sem anticorpo primário (controle de reação) e nos cortes de fígado de animais controles. Todos os animais infectados apresentaram marcações positivas do antígeno viral nas amostras de fígado durante a fase tardia da infecção pelo HEV3 (Figura 5.2). Através da detecção do HEV por imunofluorescência foi possível observar a presença do antígeno viral tanto em hepatócitos, como em células localizadas nos sinusóides hepáticos. Observou-se, entretanto, que as marcações positivas nos sinusóides eram mais frequentes, o que pode indicar a presença do vírus no interior de células de Kupffer, células epiteliais sinusoidais ou de outras tipos celulares circulantes, como macrófagos, linfócitos e células NK. Estes achados sugerem a 43 Mejido, DCP permanência Resultados do antígeno do HEV no fígado de primatas infectados experimentalmente em fase de convalescência. a b Q11 I3 X15 d R7 O1 g h i F3 F3 j J3 f e O1 G3 c l L Q12 m I2 Figure 5.2 – Detecção do antígeno viral do HEV (proteína de capsídeo viral - ORF2) por imunofluorescência indireta em amostras hepáticas de cynomolgus, coletadas em fase tardia de infecção (67 dpi). Setas brancas Q12 I2 indicam marcações positivas para HEV: a. Marcações no parênquima hepático e em células presentes no sinusóide do animal I3 – aumento de 400x; b, c e d. Marcações em células presentes nos sinusóides hepáticos dos animais Q11, X15 e R7 respectivamente - aumento de 400x; e e f. Marcação evidenciada no hepatócito (nucléolo característico) do animal O1 - aumento de 400x e CROP (zoom) respectivamente; g. Marcação em célula presente no sinusóide hepático do animal G3 - aumento de 400x; h e i. Marcações em células presentes no sinusóide hepático do animal F3 - aumento de 630x; j. Marcações em célula presente em infiltrado inflamatório no sinusóide hepático do animal J3 (retângulo pontilhado mostra células do infiltrado negativas) - aumento de 400x; m; l e m. ausência de marcações nos animais do grupo controle negativo Q12 e I2 respectivamente. A identificação do animal encontra-se no canto inferior esquerdo de cada imagem. Anticorpo anti-HEV/FITC (verde); Núcleos corados com DAPI (azul) e parênquima contra corado com Azul de Evans (vermelho). 44 Mejido, DCP Resultados 5.3 Quantificação dos fenótipos celulares e da expressão da enzima óxido nítrico sintetase induzida (iNOS) em amostras de tecido hepático 5.3.1 Detecção de células de Kupffer e de células de Kuffer positivas para o HEV Ag durante o período de resolução da hepatite E A análise quantitativa de células de Kupffer foi realizada com o objetivo de avaliar sua presença no leito sinusoidal e em infiltrados inflamatórios durante a fase de convalescência da infecção pelo HEV3. Concomitantemente, por marcação dupla, pesquisou-se o antígeno viral do HEV associado à estas células (Tabela 4.5). A Figura 5.3 apresenta as imagens capturadas das marcações de células de Kupffer (CD68+) nos grupos de animais infectados e controle. Quantitativamente, não observamos diferença significativa entre as populações de células de Kupffer (CD68+) dos grupos infectados e controle (p = 0,0583). Ao analisar a origem dos inóculos (suíno e humano), pôde-se observar a redução na frequência de células CD68+ no parênquima hepático nos animais inoculados com o HEV humano em relação aos animais inoculados com HEV suíno (0.01 ≤ p < 0.05) (Figura 5.4). a b X15 I3 F3 d R7 c e f I2 J3 Figura 5.3- Detecção de células de Kupffer (CD68+) por imunofluorescência indireta no parênquima hepático de cynomolgus, em fase tardia de infecção (imagens representativas de todos os grupos experimentais). Setas brancas indicam marcações positivas para CD68: a, b, e c. Células de Kupffer nos sinusóides hepáticos dos animais I3, X15, e F3 (grupo inoculado com HEV suíno) - aumento de 400x; d e e. Células de Kupffer nos sinusóides hepáticos dos animais R7 e J3 (grupo inoculado com HEV humano) - aumento de 400x e 630x respectivamente e f. Célula de kupffer evidenciada no sinusóide hepático do animal I2 (grupo controle não infectado com HEV) - aumento de 400x. A identificação dos animais encontra-se no canto inferior esquerdo de cada imagem. Anticorpo anti-CD68/Alexa fluor 647 (vermelho), anti-HEV/FITC (verde) e núcleos corados com DAPI (azul). As imagens apresentam seleções das áreas de interesse marcadas, para melhor visualização, respeitando-se os aumentos utilizados nas imagens originais. 45 Mejido, DCP Resultados * Frequência de células de Kupffer (CD68+) / campo (%) 4 3 2 1 0 HEV suíno HEV humano Controle Figura 5.4 – Frequência de células de Kupffer (CD68+) no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais avaliados (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2). As barras representam as médias entre os valores com erro padrão. A seleção marcada com * representa diferença significativa (0.01 ≤ p < 0.05). Também foi possível detectar células CD68+HEVAg+, evidenciadas apenas nos grupos de animais infectados (Figura 5.5). Quantitativamente, estas células comarcadas predominaram no grupo inoculado com HEV suíno (p = 0,0293) (Figura 5.6). a b Q11 I3 O1 d F3 c e R7 f J3 Figura 5.5 - Detecção de células de Kupffer infectadas com o HEV (CD68+HEV+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção (imagens representativas de todos os grupos experimentais). As setas brancas indicam as comarcações CD68+/HEV+: a, b, c e d. Células de Kupffer infectadas com o HEV nos sinusóides hepáticos dos animais I3, Q11, O1 e F3 (grupo inoculado com HEV suíno) - aumento de 400x; e e f. Células de Kupffer infectadas com o HEV nos animais R7 e J3 (grupo inoculado com HEV humano) aumento de 400x. A identificação dos animais encontra-se no canto inferior esquerdo de cada imagem. Anticorpo anti-CD68/Alexa fluor 647 (vermelho), anti-HEV/FITC (verde) e núcleos corados com DAPI (azul). As imagens apresentam seleções das áreas de interesse marcadas, para melhor visualização, respeitando-se os aumentos utilizados nas imagens originais. 46 Mejido, DCP Resultados Frequência de células CD68+ infectadas (CD68+HEV+) / campo (%) 2.5 * 2.0 1.5 1.0 0.5 0.0 HEV suíno HEV humano Figura 5.6 - Frequência de células de Kupffer comarcadas com o HEV (CD68+HEV+) no parênquima hepático dos animais dos grupos inoculados com HEV suíno n=6 e com HEV humano n=2. As barras representam as médias com erro padrão e a seleção marcada com * caracteriza uma diferença significativa entre os grupos (0.01 ≤ p < 0.05). A relação das células CD68+HEV+ sobre o total de células CD68+ (CD68+HEV+ / CD68+) mostrou-se quatro vezes maior no grupo inoculado com HEV suíno (0,52) se comparada ao grupo inoculado com HEV humano (0,13). Este dado aponta uma maior capacidade de associação das células de Kupffer ao antígeno viral na infecção pelo HEV3 suíno durante a fase de convalescência. 5.3.2 Análise da expressão de iNOS em fase tardia de infecção pelo HEV A frequência de células produtoras da enzima iNOS no parênquima hepático foi avaliada através de imunomarcações duplas (anticorpos indicados na Tabela 4.5). Em todos os animais foi possível detectar positividade para iNOS (Figura 5.7). A expressão desta enzima ocorreu predominantemente no grupo de animais infectados em relação ao controle (P< 0,0001). Quanto à origem do inoculo, a maior frequência de células iNOS+ ocorreu no grupo inoculado com o HEV suíno (0.001≤ p < 0.01) (Figura 5.8). Analisando a coexpressão simultânea de CD68 e produção de iNOS nos cortes hepáticos, observamos a ausência de comarcações iNOS+CD68+ em todas as amostras testadas. Quanto à presença de células HEVAg+iNOS+, não foram observadas diferenças significativas entre os grupos infectados (p=0,9867) (Figura 5.9). 47 Mejido, DCP Resultados a Q11 b X15 G3 d R7 c e f I2 J3 Figura 5.7 - Detecção de células produtoras de óxido nítrico (iNOS+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção (imagens representativas de todos os grupos experimentais). As setas brancas indicam as comarcações iNOS+: a, b, e c. Células produtoras de NO, no parênquima hepático dos animais Q11, X15 e G3 (grupo inoculado com HEV suíno) - aumento de 400x; d e e. Células produtoras de NO, no parênquima hepático dos animais R7 e J3 (grupo inoculado com HEV humano) - aumento de 400x e 630x respectivamente; f. Célula produtora de NO, no parênquima hepático do animal I2 (grupo controle não infectado) - aumento de 400x. A identificação dos animais encontra-se no canto inferior esquerdo de cada imagem. Anticorpo anti-iNOS/Alexa fluor 647 (vermelho), anti-HEV/FITC (verde) e núcleos corados com DAPI (azul). As imagens apresentam seleções das áreas de interesse marcadas, para melhor visualização, respeitandose os aumentos utilizados nas imagens originais. ** Frequência de células produtoras de óxido nítrico (iNOS+) / campo (%) 10 ** 8 6 4 2 0 HEV suíno HEV humano Controle Figura 5.8 Frequência de células produtoras de iNOS no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2). As barras representam as médias com erro padrão e a seleção marcada com * caracteriza uma diferença significativa entre os grupos (0.01 ≤ p < 0.05). 48 Mejido, DCP Resultados Frequência de células infectadas produtoras de óxido nítrico (HEV+ iNOS+) / campo (%) 0.5 0.4 0.3 0.2 0.1 0.0 HEV suíno HEV humano Figura 5.9 Frequência de células HEV+iNOS+ no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais (inoculado com HEV suíno n=6 e HEV humano n=2). As barras representam as médias com erro padrão e não foi observada diferença significativa entre os grupos (p = 0.9867). A relação entre as células HEV+iNOS+ sobre o total de células produtoras de iNOS (HEV+iNOS+ / iNOS+) mostrou-se maior no grupo inoculado com HEV humano (0,16) quando comparada ao grupo inoculado com HEV suíno (0,04). Embora tenha sido maior a frequência de células produtoras de iNOS no grupo inoculado com HEV suíno, observa-se uma maior capacidade da produção de iNOS por células associadas ao antígeno viral no grupo infectado com o HEV humano. 5.3.3 Análise fenotípica para a identificação das populações de linfócitos TCD4 e TCD8 em fase tardia de infecção Para acessar a resposta imune celular intra-hepática durante a fase de resolução da hepatite E em macacos cynomolgos (Tabela 3.4.2), as populações de células CD4+, CD8+, CD3+CD4+ e CD3+CD8+ foram identificadas e quantificadas no parênquima hepático. Foram observadas marcações positivas para células CD4+ e para linfócitos T CD4 (CD3+CD4+) nos três grupos experimentais (Figura 5.10). A frequência aumentada de células CD4+ foi observada entre os animais inoculados com o HEV (p = 0,0170), sendo que no grupo inoculado com HEV suíno foi observada uma frequência maior de células CD4+ em relação ao grupo inoculado com HEV humano (0.01 ≤ p < 0.05). A frequência de células CD3+CD4+ entre os grupos demonstrou-se significativamente aumentada nos animais infectados (p = 0,0085), com um aumento de células CD3+CD4+ no grupo inoculado com HEV suíno em relação ao grupo controle (0.01 ≤ p < 0.05) (Figura 5.11). 49 Mejido, DCP Resultados a Q11 I3 X15 d O1 c b e J3 f I2 Figura 5.10 - Detecção de células CD4+ e de linfócitos T CD4 (CD3+CD4+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção (imagens representativas de todos os grupos experimentais). As setas brancas indicam as células CD4+ e as setas amarelas indicam os linfócitos T CD4: a. Células CD4+ em infiltrado inflamatório – animal I3 (grupo inoculado com HEV suíno); b, c e d. Células CD4+ e linfócitos T CD4 no parênquima hepático e sinusóides – animais Q11, X15 e O1 (grupo inoculado com HEV suíno); e. Células CD4+ e linfócitos T CD4 no parênquima hepático – animal J3 (grupo inoculado com HEV humano) e f. Células CD4+ animal I2 (grupo controle não infectado). Aumento de 400x. A identificação dos animais encontra-se no canto inferior esquerdo de cada imagem. Anticorpo anti-CD3/Alexa fluor 647 (vermelho), anti-CD4/FITC (verde) e núcleos corados com DAPI (azul). As imagens apresentam seleções das áreas de interesse marcadas, para melhor visualização, respeitando-se os aumentos utilizados nas imagens originais. * Frequência de células CD4+ e de linfócitos TCD4 / campo (%) 10 * 8 6 4 2 0 HEV suíno HEV humano Células CD4+ Controle Linfócitos T CD4 células CD4+ linfócitos TCD8 (CD3+/CD8+) Figura 5.11 Frequência de células CD4+ e de linfócitos T CD4 (CD3+CD4+) no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais avaliados (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2). As barras representam as médias dos valores com erro padrão e a seleção marcada com * caracteriza uma diferença significativa entre os grupos (0.01 ≤ p < 0.05). 50 Mejido, DCP Resultados Também foram analisadas as marcações positivas para células CD8+ e CD3+CD8+, representadas na Figura 5.11. A frequência de células CD8+ demonstrou-se significativamente aumentada nos animais infectados com HEV (p = 0,0004). Em relação a origem do inoculo observou-se um aumento significativo de células CD8+ no grupo inoculado com HEV suíno em relação ao grupo controle (p < 0,001). O mesmo comportamento foi observado para células CD8+ no grupo de animais inoculados com HEV humano, mostrando-se significativamente maior que o grupo controle (0.01 ≤ p < 0.05) (Figura 5.12). As frequência de população de células CD3+CD8+ mostrou-se significativamente aumentada entre os animais infectados (p < 0,0001). Nesta análise, observou-se uma predominância de células CD3+CD8+ no grupo inoculado com HEV suíno, em relação ao grupo inoculado com o HEV de origem humana (p = 0.001 a 0.01), e em relação ao grupo controle (p < 0,001) (Figura 5.13). a I3 b G3 X15 e d F3 c f I2 J3 Figura 5.12 - Detecção de células CD8+ e de linfócitos T CD8 (CD3+CD8+) no parênquima hepático de macacos cynomolgus, por imunofluorescência indireta, em fase tardia de infecção (imagens representativas de todos os grupos experimentais). As setas brancas indicam as células CD8+ e as amarelas indicam os linfócitos T CD8: a. Linfócitos T CD8 em infiltrado inflamatório – animal I3 (grupo inoculado com HEV suíno); b, c e d. Células CD8+ e linfócitos T CD8 indicados no parênquima hepático e sinusóides – animais X15, G3 e F3 (grupo inoculado com HEV suíno); e. Linfócitos T CD4 no parênquima hepático – animal J3 (grupo inoculado com HEV humano) e f. Célula CD8+ - animal I2 (grupo controle não infectado). Aumento de 400x. A identificação dos animais encontra-se no canto inferior esquerdo de cada imagem. Anticorpo anti-CD3/Alexa fluor 647 (vermelho), anti-CD8/FITC (verde) e núcleos corados com DAPI (azul). As imagens apresentam seleções das áreas de interesse marcadas, para melhor visualização, respeitando-se os aumentos utilizados nas imagens originais. 51 Mejido, DCP Resultados *** * Frequência de células CD8+ e de linfócitos TCD8 / campo (%) 5 *** ** 4 3 2 1 0 HEV suíno HEV humano Células CD8+ células CD8+ Controle Linfócitos T CD8 linfócitos TCD8 (CD3+/CD8+) Figura 5.13 - Frequência de células CD8+ e de linfócitos T CD8 (CD3+CD8+) no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais avaliados (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2). As barras representam as médias com o erro padrão. As seleções com * (0.01 ≤ p < 0.05), ** (0.001≤ p < 0.01) e *** (p < 0.001) representam as diferenças significativas entre os grupos. As frequências de células CD3+CD8+ e CD3+CD4+ também foram avaliadas considerando-se todos os animais infectados, independente da origem dos inóculos. Nesta análise observou-se que a frequência da população CD3+CD4+ foi significativamente maior nos animais infectados em relação aos animais não infectados (0.001≤ p < 0.01). O mesmo comportamento foi observado em relação à população CD3+CD8+ (p < 0.001). Ao se comparar as frequências das populações de células CD3+CD4+ e CD3+CD8+ nos animais infectados, foi possível observar uma frequência significativamente maior da população de células CD3+CD8+ (0.001≤ p < 0.01) (Figura 5.14). A relação entre células TCD4 e TCD8 (CD3+CD4+ / CD3+CD8+) também mostra-se maior nos animais infectados com HEV suíno (0,59) e HEV humano (0,69) em relação ao grupo controle (0,012). 52 Mejido, DCP Resultados *** Frequência de linfócitos TCD4 e TCD8 / campo (%) 2.0 ** ** 1.5 1.0 0.5 0.0 Grupo de animais infectados com HEV3 Grupo controle linfócitos linfócitos TCD8 TCD8 (CD3+/CD8+) (CD3+/CD8+) linfócitos TCD4 (CD3+/CD4+) Linfócitos TCD8 (CD3+CD8+) Linfócitos T CD4 (CD3+CD4+) Figura 5.14 - Frequência de linfócitos T CD8 (CD3+CD8+) e T CD4 (CD3+CD4+) no parênquima hepático dos animais infectados experimentalmente e dos animais controle. As barras representam as médias com o erro padrão. As seleções com ** (0.001≤ p < 0.01) e *** (p < 0.001) representam as diferenças significativas entre os grupos. A Figura 5.15 apresenta os resultados sumarizados com as subpopulações de Frequência das subpopulações celulares (%) células imunes avaliadas no estudo para todos os grupos experimentais. 10 8 HEV suíno HEV humano 6 Controle 4 2 0 CD68 iNOS CD4 TCD4 CD8 TCD8 Figura 5.15 - Frequência das subpopulações celulares avaliadas no parênquima hepático dos animais dos grupos experimentais (inoculado com HEV suíno n=6, inoculado com HEV humano n=2 e controle n=2) 67 dpi. 53 Mejido, DCP Discussão 6 DISCUSSÃO Durante as últimas três décadas, a hepatite E, tradicionalmente considerada como uma doença endêmica em países em desenvolvimento, têm sido cada vez mais relacionada a casos autóctones de transmissão zoonótica em países industrializados. Nestes países, a hepatite E apresenta-se como enzoótica, com o HEV genótipo 3 presente em diversas espécies animais, em especial os suínos. A esporadicidade dos casos de hepatite E provocada pelo genótipo 3 em países desenvolvidos passou a ser questionada atualmente, visto que, em sua maioria, os casos são assintomáticos e sequer chegam a ser reportados. Além disso, os ensaios diagnósticos empregados nas triagens epidemiológicas apresentam sensibilidades variáveis, gerando resultados divergentes quanto a real prevalência do genótipo 3 nestas áreas (Teo, 2010). No Brasil, a presença do HEV em amostras de fígado e vísceras de suínos oriundos de granjas comerciais e em efluentes nos matadouros, mesmo os inspecionados pelos Serviços de Inspeção Federal (SIF), trazem uma alerta à saúde pública no país. No único caso autóctone humano identificado no país (Lopes dos Santos et al. 2010), a análise filogenética da linhagem isolada neste achado apontou a presença do genótipo 3b como causador, mesmo genótipo encontrado nas vísceras dos suínos em matadouros (Gardinali et al., 2012). Desta forma, é provável que a transmissão zoonótica do HEV3 esteja relacionada aos casos humanos de hepatite E no Brasil. Frente ao crescente número de casos de hepatite E atribuídos ao genótipo 3 em países industrializados, torna-se fundamental a realização de estudos que contribuam ao entendimento deste agente zoonótico, como patógeno emergente. No presente estudo, investigamos subtipos celulares envolvidos na resposta imunológica intra-hepática e o controle viral em fase de convalescência da infecção pelo HEV3 em macacos cynomolgos. A fim de avaliar a permanência do vírus no organismo em fase tardia de infecção, foram acessadas amostras de soro, bile, fezes, urina, fígado, baço, duodeno e vesícula biliar, coletadas no momento da necrópsia, testadas quantitativamente e qualitativamente para a presença do RNA viral. Os animais que apresentaram positividade para o RNA do HEV aos 67 dias pós inoculação, em amostras de bile e vesícula biliar, pertenciam ao grupo infectado com o HEV suíno. Em geral, a carga 54 Mejido, DCP Discussão viral era baixa, variando entre 101 - 103 cópias de RNA/ mL ou g (bile e vesícula biliar). A detecção do RNA viral no fígado por qRT-PCR só foi possível mediante a extração do RNA a partir de triplicatas dos fragmento hepáticos, sendo detectado em apenas uma das três amostras de fígado do animal O1 (baixa carga viral). Em estudo recente realizado pelo grupo do LADTV, Carvalho et al. (2013) abordaram principalmente a fase aguda desta infecção, detectando o RNA viral no soro e nas fezes destes animais até 67dpi. Neste trabalho, apenas o animal I3 apresentou detecção de RNA do HEV no soro e nas fezes até 53 dpi, enquanto no animal O1 a detecção do RNA viral nas mesmas amostras foi possível até 14 e 18 dpi, respectivamente (Tabela 4.1). Desta forma, os achados prévios e do estudo em questão indicam que apenas a ausência na detecção do RNA viral no soro e nas fezes não é suficiente para indicar a cura virológica desta infecção e apontam para a permanência do vírus nas vias biliares durante a fase de resolução, principalmente em animais que receberam inóculo suíno. Os dados encontrados corroboram os achados de Kawai et al. (1999), que estudaram a infecção pelo HEV em macacos rhesus, confirmando a ausência de RNA viral nos hepatócitos e positividade nas vias biliares durante a fase de convalescência. Outros autores também observaram a detecção do RNA do HEV em vias biliares de suínos infectados até 50 dpi, fato que confirmou a excreção viral para o ducto biliar e para as fezes na fase tardia da infecção (Lee et al., 2009). A persistência de carga viral nas vias biliares representa uma alerta importante à saúde publica, visto que a ingestão de fígado e vísceras de suínos mal processadas apresentam um risco de transmissão pelo HEV (Riveiro-Barciela et al., 2014). Para a confirmação da capacidade de replicação do HEV3, neste trabalho pesquisou-se também o RNA intermediário replicativo do vírus nas amostras positivas para a presença do RNA genômico. A presença da fita negativa não foi detectada em nenhuma das amostras aos 67 dpi, fato que sugere a baixa capacidade replicativa viral durante a fase de convalescência. Kawai e colaboradores (1999) detectaram a presença da fita replicativa do vírus apenas em fase aguda em macacos rhesus experimentalmente inoculados com o isolado de Myanmar, e ausência durante a recuperação da infecção, confirmando nossos achados. Trabalhos realizados em suínos, apontaram a presença da fita positiva do RNA do HEV em sítios extrahepáticos durante e logo após a fase aguda da infecção (Choi and Chae, 2003; Lee et al., 2009), contudo a detecção da fita de RNA replicativo parece ocorrer 55 Mejido, DCP Discussão exclusivamente durante a fase aguda da infecção (27 dpi) (Halbur et al., 2001; Williams et al., 2001). No presente trabalho, também foi realizada a detecção do antígeno do HEV (HEV Ag) por imunofluorescência indireta em amostras hepáticas (detecção de ORF2capsídeo viral). A presença do antígeno viral em hepatócitos e células circulantes sinusoidais do fígado, e a detecção do RNA viral nas vias biliares durante a fase de convalescência, mesmo sem evidencia de replicação, reforça a hipótese da existência de sítios de persistência do HEV no fígado e no trato biliar, suportado pelo perfil imunotolerante hepático (Invernizzi, 2013). Também não há descrições anteriores que indiquem a presença de vírus no epitélio biliar na vesícula durante a fase tardia da infecção pelo HEV3. A aparente discrepância entre a detecção do HEV Ag e do genoma viral pode ser justificada pelas diferentes sensibilidades destes ensaios diagnóstico nesta fase da infecção. Apesar do qRT-PCR ser considerado padrão ouro para diagnóstico do HEV, trabalhos anteriores sugerem a detecção do antígeno viral como marcador em fase aguda da infecção. Zhang et al. (2006) e Gupta et al. (2013) demonstraram alta concordância entre a detecção molecular do RNA do HEV (qRT-PCR) e do antígeno viral (imunoenzimática) no soro em fase aguda, sugerindo a detecção do último como marcador diagnóstico alternativo. Ha e Chae (2004) também encontraram resultados similares na detecção do RNA do HEV por qRT-PCR e do antígeno viral por imunohistoquímica, durante a fase aguda, em amostras hepáticas de suínos. Entretanto, ainda são escassas as informações sobre os marcadores diagnósticos para a detecção do vírus durante a fase de convalescência, onde existe baixa carga viral. Tendo em vista as mudanças dinâmicas nas relações entre os marcadores diagnósticos para HEV durante as fases da infecção (Zhang et al., 2006), o presente trabalho sugere que a diferença observada na detecção do HEV por qRT-PCR e por imunofluorescência no fígado, em fase convalescente, devem ser melhor investigadas em um maior número de amostras em trabalhos futuros. A detecção do antígeno ocorreu predominantemente em células localizadas nas paredes e no lúmen dos sinusóides hepáticos corroborando resultados anteriores (Asher et al., 1990). É importante ressaltar que células localizadas no compartimento sinusoidal correspondem à 40% do número total de células do fígado, como células endoteliais sinusoidais, células de Kupffer e células estreladas hepáticas, que 56 Mejido, DCP Discussão delimitam a parede sinusoidal, e linfócitos intra-hepáticos, células NKT hepáticas (pit cells), dentre outros tipos celulares circulantes no lúmen (Silva, 2011). Como pouco se sabe sobre a resposta imune frente à infecção pelo HEV em fase convalescente, neste estudo, foram avaliadas frequências de populações celulares de interesse e sua possível influência nos eventos intra-hepáticos 67 dpi. A fim de caracterizar as lesões inflamatórias presentes no parênquima hepático na fase de recuperação, identificamos, em todos os animais, a presença de células de Kupffer, células CD4+, CD8+, linfócitos TCD4 e TCD8, além da presença do iNOS como marcador da produção de óxido nítrico intrahepatico. Quanto à análise da frequência de células de kupffer (CD68+), não foi observada diferença significativa entre os grupos inoculados e controle (p = 0,0583). Nossos resultados confirmam os achados recentes de Drebber et al. (2013), que avaliaram casos humanos em fase aguda e não observaram diferenças na população de células de Kupffer entre indivívuos infectados com o HEV3 e não infectados. Contudo, Zhao et al. (2001) descreve o aumento deste tipo célular em pacientes com hepatite E aguda. Dados recentes do nosso grupo apontam para uma monocitose no sangue periférico de macacos cynomolgus na fase aguda da infecção pelo HEV3, principalmente quando a origem do inóculo era suína, contudo essa diferença não foi percebida durante a convalescência (Carvalho et al., 2013). Comparativamente, nossos dados apontam para uma baixa frequência de células de kupffer no microambiente hepático, principalmente no grupo inoculado com HEV humano em relação ao grupo com inóculo suíno. Ao avaliarmos a frequência de células de Kupffer comarcadas com o HEV Ag (CD68+HEVAg+), foi observada uma frequência elevada deste tipo celular no grupo inoculado com HEV suíno em relação ao grupo de indivíduos inoculados com HEV humano. Além disso, a relação entre células CD68+HEV+ e o total de células CD68+ (CD68+HEV+ / CD68+) também é maior no grupo inoculado com HEV suíno. De forma inédita esses resultados apontam, ainda de forma preliminar, possíveis diferenças quanto à capacidade imunorreativa destas células, observadas pela interação com o antígeno viral, frente à infecção com inóculos do HEV3 de origens distintas. Diferenças entre as lesões hepáticas produzidas pela infecção com inóculos de HEV suíno e humano também foram descritas em suínos por Halbur et al. (2001). A expressão de iNOS no grupo de animais inoculados com HEV é observada na fase de recuperação da infecção. Os poucos infiltrados inflamatórios observados 57 Mejido, DCP Discussão associados à redução da carga viral no plasma e no fígado nesta fase da infecção, sugerem que o óxido nítrico atuaria como um dos mecanismos de controle do dano tecidual e/ou da replicação viral. Foi constatada sua maior expressão no grupo inoculado com o HEV suíno se comparado ao grupo inoculado com HEV humano. Como justificativa para este achado, sugerimos que a distância filogenética entre as espécies "doadoras" dos inoculos (suínos ou humanos) e a espécie receptora (primatas não humanos) poderia modular a expressão de NO pela células produtoras no parênquima hepático e consequentemente seus efeitos biológicos em nível tecidual, tais como o antiviral e antinflamatório no período de convalescência. Quanto ao efeito citotóxico do NO, outros autores também relacionam a maior expressão de iNOS e eNOS nos casos humanos com maior dano hepático (hepatite aguda/falência hepática fulminante) (Hazam Deka & Kar 2013). Coincidentemente, nossos achados histopatológicos nesta fase da infecção relacionam uma maior atividade inflamatória hepática nos animais inoculados com HEV suíno do que nos inoculados com HEV de origem humana (scores de dano hepático apresentados na tabela 4.1) (Carvalho et al., 2013), esta relação também se preserva quando comparamos a expressão de iNOS entre estes grupos. A frequência observada de células comarcadas iNOS+CD68+ revelou de forma inesperada que as células de Kupffer estão pouco envolvidas na expressão de NO em fase de convalescência da infecção, sugerindo que outros tipos celulares, como macrófagos circulantes ou hepatócitos assumiriam a expressão iNOS, corroborando os achados de Kandemir, Polat e Kaya (2002). Contudo não observamos diferença na expressão de iNOS quando comparamos a frequência de células comarcadas para HEV Ag e iNOS (HEV Ag+iNOS+) entre os grupos inoculados com HEV suíno e HEV humano. Estes achados sugerem que a produção de iNOS não depende da presença do HEV Ag no citoplasma das células parenquimais, nem exclusivamente da ativação de células de Kupffer, o que relaciona a expressão de iNOS ao processo de resolução da infecção (cura virológica). A avaliação da presença de células CD4+ e CD8+ no parênquima hepático em fase de convalescência, aponta para uma frequência significativamente reduzida de células CD4+ no grupo inoculado com HEV humano em relação ao grupo inoculado com HEV suíno. Quanto à presença de células CD8+, os grupos inoculado com HEV suíno e humano mostraram um significante aumento em relação ao grupo controle. 58 Mejido, DCP Discussão Desta forma, pôde-se sugerir uma relação entre a população de células CD8+ e a resolução da infecção na fase de convalescência. A contagem de células CD3+CD4+ no parênquima hepático, durante a fase de convalescência, mostrou uma frequência elevada no grupo inoculado com HEV suíno em relação ao grupo controle. Quanto à contagem de células CD3+CD8+, esta foi significativamente maior no grupo inoculado com HEV suíno, tanto em relação ao grupo inoculado com o HEV de origem humana quanto em relação ao grupo de animais não infectados. No presente estudo, quando comparadas as frequências de células CD3+CD4+ e CD3+CD8+ na fase de convalescência, foi evidenciada a elevação destas populações nos animais infectados em relação aos animais controle. Quando comparadas as frequências das populações de células CD3+CD4+ e CD3+CD8+ nos animais infectados, demonstrou-se a predominância da população de células CD3+CD8+. Estes resultados confirmam o envolvimento da resposta imune celular intra-hepática na resolução da infecção pelo HEV 3, corroborando os achados de trabalhos anteriores em PBMC, quanto à contribuição das células T na patogênese da infecção pelo HEV (Naik et al, 2002; Srivastava et al, 2007 e Suneetha et al., 2012). Como exemplo, Wu e colaboradores (2008) avaliaram a resposta específica das células T em PBMC de pacientes durante a fase aguda da hepatite E até sua recuperação. Os resultados encontrados demonstraram que células T específicas ao HEV estão envolvidas na patogênese de infecção aguda e recuperação na hepatite E. Entretanto, há uma escassez de informação sobre a avaliação dos eventos imunológicos intra-hepáticos para a hepatite E. Quando observamos as relações entre linfócitos TCD4 e TCD8 (CD3+CD4+ / CD3+CD8+) também constatamos a predominância de linfócitos CD3+CD8+ em relação à CD3+CD4+ nos animais infectados com o HEV3, confirmando os resultados de Drebber e colaboradores (2013). Estes avaliaram a resposta imune celular em biópsias hepáticas de 11 pacientes com hepatite E aguda, infectados com o genótipo 3 do vírus. Neste, observou-se que grande parte das células presentes nos infiltrados correspondiam à linfócitos T (CD3), com elevada frequência da população de células CD3+CD8+, seguida de células CD3+CD4+. Diante do discutido acima, cabe ressaltar que este é o primeiro trabalho que associa e avalia os eventos imunológicos, virológicos e patológicos intra-hepáticos frente à infecção com o HEV3 durante o período de convalescência, fornecendo informações inéditas e relevantes sobre o curso da hepatite E no modelo cynomolgos. 59 Mejido, DCP Discussão Os parâmetros imunológicos estudados mostraram-se distintos quando testados quanto a origem do inoculo, mesmo sendo ambos HEV3, fato que pode ser resultante da distância filogenética do doador para o receptor. Finalizando, o presente trabalho propõe que a distância filogenética interespecífica pode resultar no aumento da intensidade na resposta imune do hospedeiro durante a resolução da infecção pelo HEV3. 60 Mejido, DCP Conclusões 7 CONCLUSÕES Neste trabalho, a avaliação da permanência do vírus no organismo e a caracterização das subpopulações celulares envolvidas na resposta imunológica intra-hepática e no controle viral em fase tardia da infecção pelo HEV3 suíno e humano em macacos cynomolgus (Macaca fascicularis) permitiu concluir que: A detecção do RNA do HEV durante a fase de resolução da infecção aponta a permanência do vírus no fígado e no trato biliar, apenas em animais que receberam inóculos provenientes de suínos. Em todos os animais infectados, foram observadas marcações positivas para o antígeno viral no fígado durante a fase de convalescência da infecção, especialmente em células sinusoidais. Houve discordância entre os resultados obtidos na detecção do RNA do HEV e do antígeno viral, apontando diferentes sensibilidades entre os ensaios na fase de convalescência da infecção. Não foi observado um envolvimento significativo das células de Kupffer durante a fase de convalescência da infecção pelo HEV, contudo, foram observadas diferenças quanto à interação destas células com o antígeno viral frente à infecção com inoculos HEV3 de origens distintas. Mediante a ausência da expressão de NO por células de Kupffer no parênquima hepático é evidente que outros tipos celulares são capazes de produzir NO na fase de convalescência, como macrófagos circulantes ou mesmo hepatócitos, contribuindo assim para o contrrrole viral no órgão alvo. A produção de óxido nítrico no fígado parece atuante como resposta inespecífica para o controle viral e, consequentemente, do dano tecidual em fase convalescente da infecção predominantemente em animais infectados com HEV suíno. Há um envolvimento importante de linfócitos TCD4 e TCD8 na resposta imune celular intra-hepática frente ao HEV3 durante a fase tardia de infecção, o que corrobora achados de trabalhos anteriores realizados em PBMC. Há uma predominância na frequência de linfócitos TCD8 em relação à de linfócitos TCD4 na resposta tardia frente ao HEV3, independente da origem do inóculo, em fase de convalescência. 61 Mejido, DCP Conclusões A distância filogenética entre as espécies da onde os inóculos foram originados (suínos ou humanos) e a espécie hospedeira (primatas) pode influenciar na produção de óxido nítrico, na gravidade do processo inflamatório hepático, nas respostas imunológicas e no tempo de permanência do vírus no organismo hospedeiro durante a resolução da hepatite E. 62 Mejido, DCP Referências Bibliográficas 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Aggarwal R. Clinical presentation of hepatitis E. Virus Research. 2011 mar; 161: 1522. Aggarwal R. 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Anticorpos primários para marcação por imunofluorescência Anticorpo Marca α-HEV LifeSpan BioSciences α-CD3 Purified α-CD4 - Purified α-CD8 Purified α-CD68 Purified Serotec BD Pharmingen™ BD Pharmingen™ abcam α-iNOS LifeSpan BioSciences Catálogo Alvo Hospedeiro Reatividade Clonalidade Marcadores dos fenótipos das células LS-C67673 HEV Camundongo Monoclonal Isotipo Clone IgG1 4B2 MCA1477T 562971 557084 ab125047 IgG1 IgG1, κ IgG1, κ IgG CD312 SK3 RPA-T8 CD3 Rato Monoclonal Cynomolgus Camundongo CD4 Monoclonal Camundongo CD8 Monoclonal CD68 Coelho Polyclonal Marcadores de ativação LS-C36859-1000 NOS2 / iNOS Camundongo Human Monoclonal IgG1, k Anticorpos secundários para marcação por imunofluorescência Anticorpo Goat polyclonal Secondary Antibody to Rat IgG (Alexa Fluor® 647) Goat polyclonal Secondary Antibody to Mouse IgG (Alexa Fluor® 488) Donkey polyclonal Secondary Antibody to Mouse IgG (Alexa Fluor® 488) Donkey polyclonal Secondary Antibody to Rabbit IgG (Alexa Fluor® 647) Donkey polyclonal Secondary Antibody to Rabbit IgG (Alexa Fluor® 488) 76 Marca abcam abcam abcam abcam abcam Catálogo ab150159 ab150113 ab150105 ab150075 ab150073 Reatividade Clonalidade Rato Camundongo Camundongo Policlonal Coelho Coelho