Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 1 2 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Diretoria SOCIEDADE PAULISTA DE PNEUMOLOGIA E TISIOLOGIA BIÊNIO 2016/2017 Presidente: Regina Maria de Carvalho Pinto Vice-Presidente: Roberto Rodrigues Júnior Secretária Geral: Silvia Carla Souza Rodrigues 1ª Secretária: Roberta Pulcheri Ramos Diretora de Finanças: Frederico Leon Arrabal Fernandes Diretor de Assuntos Científicos: Willian Salibe Filho Diretor de Divulgação: Angela Honda de Souza Diretor Assuntos do Interior: Ciro de Castro Botto Diretor de Informática: Claúdio Ricardo Frison Pediatria: Marina Buarque de Almeida Adyleia Aparecida Dalbo Contrera Toro Claudine Sarmento da Veiga COMISSÕES CONSELHO FISCAL Defesa Profissional: Lilia Azzi Collet da Rocha Camargo Ensino: Suzana Erico Tanni Minamoto Promoções: Luis Renato Alves Assuntos da Grande São Paulo: Lilian Ballini Caetano Publicações: Rodrigo Abensur Athanazio Efetivos: Élcio dos Santos Oliveira Vianna João Marcos Salge Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano DEPARTAMENTOS Cirurgia Torácica: Marcos Naoyuki Samano Celso Murilo Nálio Matias de Faria Erika Rymkiewicz Fisioterapia Respiratória: Luciana Dias Chiavegato Adriana Claudia Lunardi Lara Maris Nápolis Goulart Rodrigues Suplentes: Ricardo Mingarini Terra Liana Pinheiro dos Santos Maria Raquel Soares CONSELHO DELIBERATIVO Ex-Presidentes Endoscopia Respiratória: Evelise Lima Felipe Nominando Diniz Oliveira Viviane Rossi Figueiredo Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 3 REGIONAIS SUB-COMISSÕES Regional do ABC Presidente: Claudia Maria de Medeiros Pacheco Secretária: Mônica Silveira Lapa Asma - Maria Amélia Carvalho da Silva Santos Regional de Araraquara / Bauru / Botucatu Presidente: Marcos Abdo Arbex Secretário: José Eduardo Bergami Antunes Circulação - Caio Júlio Cesar dos Santos Fernandes Regional de Campinas Presidente: Mauricio Sousa de Toledo Leme Secretário: Paulo Roberto Tonidandel Câncer - Teresa Yae Takagaki Distúrbios Respiratórios do Sono - Pedro Rodrigues Genta Doenças Intersticiais - Regina Célia Carlos Tibana D.P.O.C. - José Gustavo Barian Romaldini Epidemiologia - Maria Cecília Nieves Teixeira Maiorano Regional de Marília Presidente: Gisele César de Rossi Agostinho Secretária: Maria de Lourdes Marmorato Botta Hafner Infecções Respiratórias e Micoses - Mauro Gomes Pleura - Ricardo Milinavicius Regional de Ribeirão Preto Presidente: Adriana Ignácio de Pádua Secretária: Fabíola Galhardo Rizzatti Regional de Santos Presidente: Alex Gonçalves Macedo Secretário: Thiago Fernandes Leomil Doenças Ambientais e Ocupacionais - Ubiratan de Paula Santos Tabagismo - Aldo Agra de Albuquerque Neto Terapia Intensiva - Eduardo Leite Vieira Costa Tuberculose - Suzana Pimenta Regional de São José dos Campos Presidente: José Eduardo de Oliveira Secretária: Márcio Adriano Leite Bastos Função Pulmonar - Andréa Gimenez Regional de São José do Rio Preto Presidente: Clélia Margarete Trindade Borralho Secretário: Leandro Cesar Salviano Doença Pulmonar Avançada - José Eduardo Afonso Júnior 4 Imagem - Gustavo de Souza Portes Meirelles Exercício e Atividade Física - André Luis Pereira de Albuquerque Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Apresentação Caros sócios, Este mês publicamos a segunda edição do ano da revista oficial da SPPT Pneumologia Paulista (PP). São diversos artigos de revisão envolvendo a relação entre Aspiração Pulmonar e doenças relacionadas. Esta edição é fruto de uma jornada prévia da SPPT quando o tema de Aspiração Pulmonar foi profundamente discutido e diversos especialistas na área contribuíram nas suas diversas áreas de expertise. Para visualização dos artigos, basta acessar o link oficial da nossa revista: http:// pneumologiapaulista.org.br Lá você poderá encontrar a nova edição do PP assim como todas edições anteriores. Boa leitura Editores Editor-chefe: Rodrigo Abensur Athanazio Editores-executivos: Roberto Rodrigues Junior William Salibe Filho Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 5 Índice Deglutição normal e efeitos do envelhecimento: Como avaliar clinicamente ............................................................................ 6 Normal swallowing and aging effects: How to evaluate clinically O papel da videofluoroscopia e da videoendoscopia na avaliação da deglutição .................................................................. 9 The role of videofluoroscopy and videoendoscopy in swallowing evaluation Como avaliar a segurança da reintrodução da alimentação oral pós- extubação? ................................................................ 14 How to assess safe oral intake introduction after endotracheal intubation? Doença do refluxo gastroesofágico e manifestações laringotraqueais .................................................................................... 19 Gastroesophageal reflux disease and laryngotracheal manifestations Cuidados odontológicos preventivos em aspiração para o doente grave ............................................................................... 25 Preventive dental care in aspiration for sick record Aspectos histológicos da doença pulmonar associada à aspiração ........................................................................................ 29 Histological aspects of aspiration related lung disease Associação entre doenças pulmonares intersticiais e aspiração ............................................................................................... 35 Association between interstitial lung disease and aspiration Quais as diferenças entre Pneumonia Aspirativa e Pneumonite Aspirativa? ........................................................................... 41 What are the differences between aspirative pneumonia and aspirative pneumonitis? Importância do controle do refluxo gastroesofágico no transplante de pulmão ................................................................... 46 Importance of gastroesophagic reflux control in lung transplantation Asma de Difícil Controle: quando investigar e tratar Doença do Refluxo Gastroesofágico? .............................................. 49 Difficult to control asthma: when investigating and treating gastroesophageal reflux disease? Aspiração pulmonar e Micobactéria não tuberculosa: realmente um fator de risco? ............................................................ 54 Pulmonary aspiration and nontuberculous mycobacteria: Is it a real risk factor? Existe relação entre bronquiectasias e aspiração? ...................................................................................................................... 57 Is there an association between bronchiectasis and aspiration? DPOC: pode a aspiração ser relacionada às exacerbações frequentes? ................................................................................. 61 COPD: can aspiration be related to frequent exacerbations? Estatística: Classificação e árvores de regressão (CART) ............................................................................................................... 66 6 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Deglutição normal e efeitos do envelhecimento: Como avaliar clinicamente Normal swallowing and aging effects: How to evaluate clinically Rosane de Deus Chaves Avellar Doutora em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Fonoaudióloga do CER IV – Centro Especializado em Reabilitação. Prefeitura do Município de Mauá RESUMO A deglutição é uma atividade complexa de ações voluntárias e involuntárias que tem por finalidade o transporte de líquidos e alimentos da cavidade oral até o estômago de forma segura. A dificuldade durante esse processo de alimentação, em qualquer fase da deglutição, é chamada de disfagia. As complicações decorrentes dessa dificuldade são desnutrição, desidratação e pneumonia. Durante o processo de envelhecimento ocorrem modificações anatômicas e fisiológicas, chamadas de presbifagia, que podem interferir na habilidade de deglutir de forma segura, comprometendo a coordenação dos eventos da deglutição, propiciando um alto risco para disfagia. Desta forma, é muito importante a identificação precoce de disfagia na população idosa, visando a prevenção de complicações e melhor qualidade de vida nessa população. Este artigo de revisão teve por objetivo caracterizar as alterações de deglutição decorrentes do processo de envelhecimento descritas na literatura, bem como descrever os principais sintomas clínicos de disfagia. Palavras chaves: deglutição, transtornos da deglutição, idoso, pneumonia aspirativa ABSTRACT Swallowing is a complex activity of voluntary and involuntary actions whose purpose is the transport of liquids and food from the oral cavity to the stomach safely. The difficulty during this feeding process at any stage of swallowing is called dysphagia. The complications of this difficulty are malnutrition, dehydration and pneumonia. During the aging process occur anatomical and physiological changes , called presbyphagia, which can interfere with the ability to swallow safely, compromising the coordination of swallowing events , providing a high risk for dysphagia. Thus, it is very important the early identification of dysphagia in the elderly people, aiming to prevent complications and better quality of life in this population. This review article aimed to characterize swallowing alterations resulting from the aging process described in the literature, and to describe the main clinical symptoms of dysphagia. Keywords: swallow, swallowing disorders, aging, aspirative pneumonia Introdução A deglutição é uma atividade complexa de ações voluntárias e involuntárias que tem por finalidade o transporte de líquidos e alimentos da cavidade oral até o estômago de forma segura, mantendo o estado nutricional e protegendo a via aérea1. Para isso é necessária uma coordenação precisa de diferentes músculos e áreas do cérebro2. Rosane de Deus Chaves Avellar [email protected] [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 A deglutição é descrita em 4 fases: preparatória oral, oral, faríngea e esofágica. Na fase preparatória oral ocorre a preparação do alimento dentro da cavidade oral, com a mastigação e a transformação em um bolo alimentar coeso, pronto para ser transportado posteriormente até a orofaringe. A fase oral inicia-se com a transferência do bolo alimentar da cavidade oral para a orofaringe, ultrapassando a arcada amigdaliana, caracterizando dessa forma a atividade voluntária final da deglutição3. A partir desse momento inicia-se a fase faríngea, com o transporte do bolo alimentar até o esôfago, envolvendo uma série de eventos involuntários, rápidos, coordenados e precisos. O palato mole eleva-se para vedar a nasofaringe, prevenindo o refluxo nasal. Simultaneamente, a língua e o 7 movimento da parede faríngea realizam a propulsão do bolo alimentar. Em seguida, ocorre a elevação e anteriorização da laringe, com a proteção da via aérea inferior por meio do fechamento das pregas vocais, fechamento das pregas vestibulares e do movimento descendente da epiglote. A musculatura da faringe se contrai, impulsionando o bolo alimentar em direção ao esôfago, até encontrar a transição faringoesofágica1,3,4. Na fase esofágica ocorre o transporte do bolo no sentido crânio-caudal, finalizando com o relaxamento do esfíncter esofágico inferior e a passagem do bolo alimentar para o interior do estômago3. A fase faríngea é talvez a principal etapa da deglutição, pois envolve parte da cavidade oral, músculos mastigatórios, músculos extrínsecos e intrínsecos da laringe e as estruturas da própria faringe3. Além disso, a faringe é uma via de passagem comum para a respiração e para a deglutição, sendo essencial a coordenação temporal entre essas duas funções para a prevenção da aspiração pulmonar5,6. A dificuldade durante o processo de alimentação, em qualquer fase da deglutição, é chamada de disfagia. Devido as dificuldades de deglutição que ocorrem durante o processo de alimentação, os indivíduos podem apresentar quadros de desidratação, desnutrição, aspiração pulmonar, pneumonias de repetição, depressão, problemas psicossociais e complicações que podem levar a quadros graves de morbidade7. As modificações anatômicas e fisiológicas decorrentes do processo de envelhecimento, chamadas de presbifagia, podem causar alterações no sistema sensitivo-motor, tornando a deglutição do idoso menos eficiente devido as alterações ocasionadas nas fases oral, faríngea e esofágica da deglutição. Essas alterações podem interferir na habilidade de deglutir de forma segura, comprometendo a coordenação dos eventos da deglutição, propiciando um alto risco para disfagia8,9. Estudos apontam que a prevalência de disfagia orofaríngea em idosos com mais de 65 anos é de 13%10,11, e em idosos hospitalizados é maior do que 51%, com grande impacto na morbidade, tempo de internação e custos hospitalares 11,12. Deglutição e o processo de envelhecimento O idoso pode apresentar dificuldades de deglutição devido ao processo natural de envelhecimento. A perda de massa e de função muscular, redução da elasticidade do tecido, alterações na coluna cervical, redução na produção da saliva, alterações dentárias, redução da sensibilidade oral e faríngea, alteração do olfato e paladar, e redução da capacidade compensatória do envelhecimento cerebral, são todas alterações que podem aumentar a susceptibilidade a disfagia13. A seguir serão apresentadas as principais modificações 8 anatômicas e funcionais relacionadas ao processo de envelhecimento descritas na literatura, nas diferentes fases da deglutição1,14,15: Fase oral - Trânsito oral lentificado; - Modificações na língua devido aumento do tecido conectivo e depósito de gordura; - Redução da massa muscular e diminuição das unidades motoras funcionais, com consequente alteração da força muscular; - Mobilidade e propulsão do bolo alimentar ineficiente; - Dificuldade de vedamento labial; - Problemas de mastigação causados pela deficiência da arcada dentária ou próteses dentárias mal adaptadas; - Diminuição da saliva devido ao uso de medicações e/ ou doenças associadas. Fase faríngea - Diminuição do tecido conjuntivo na musculatura infra e supra hioidea, resultando em uma redução da elevação e anteriorização laríngea; - Diminuição do diâmetro de abertura da transição faringoesofágica; - Fechamento ineficiente das vias aéreas; - Resíduos em valéculas e seios piriformes; - Diminuição da sensibilidade laringofaríngea; Fase esofágica - Duração aumentada devido ao maior tempo de relaxamento do esfíncter esofágico; - Alteração na peristalse esofágica; - Atraso do esvaziamento esofágico; Os sinais e sintomas que indicam a presença de disfagia e que devem ser cuidadosamente investigados e observados são: acúmulo de alimento na cavidade oral, modificações na mastigação, dificuldade em controlar o alimento ou saliva na boca, fadiga/dispneia durante a alimentação, tosses, engasgos, dificuldade em deglutir alimentos como grãos, alimentos secos e comprimidos, voz molhada após a deglutição, sensação de alimento parado na região da hipofaringe e recusa a determinadas consistências alimentares, principalmente sólidos e/ou líquidos 14. Avaliação clínica O fonoaudiólogo é o profissional habilitado para avaliar e tratar as alterações de deglutição. O conhecimento da anatomia e fisiologia do sistema miofuncional oral possibilita a realização da avaliação de forma mais objetiva, direcionando com maior propriedade o tratamento de reabilitação e a manutenção ou reintrodução da alimentação por via oral de forma mais segura. A utilização Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 de avaliações e tratamentos planejados, eficientes, preestabelecidos e controlados, possibilitará o diagnóstico, conduta e controle mais pertinentes para cada caso16. A avalição clínica é dividida em três partes: anamnese, avaliação do sistema sensório motor oral e avaliação da deglutição. Inicialmente é importante a realização de uma anamnese detalhada para levantamento do histórico clínico do paciente, como a presença de comorbidades associadas, medicações em uso, quadro nutricional e pulmonar, estado de alerta, quadro cognitivo e, principalmente, os sinais e sintomas de disfagia que estão presentes durante as alimentações3. A avaliação das estruturas do sistema sensório motor oral envolve a verificação da mobilidade, sensibilidade e tonicidade da musculatura facial, a avaliação do palato mole e dos reflexos orais, avaliação da qualidade vocal e da função motora da fala17. A avaliação funcional da deglutição será realizada durante a observação da alimentação com alimentos em consistências variadas. Neste momento é realizada uma avaliação minuciosa da deglutição, observando desde os utensílios utilizados, tempo de refeição, textura, volume e velocidade da ingestão dos alimentos, manejo do bolo alimentar, e momento durante e pós-deglutição. Durante a avaliação funcional serão observados todos os eventos relacionados a cada fase da deglutição, bem com a presença de sinais clínicos indicativos da presença de disfagia como: tosse, engasgos, alteração na qualidade vocal e alteração na ausculta cervical3. Em algumas situações os dados encontrados durante a avalição clínica da deglutição não são suficientes para o direcionamento de condutas terapêuticas, sendo necessário a realização de exames objetivos da deglutição para complementação dos dados e melhor diagnóstico. Os exames objetivos da deglutição mais utilizados são a videofluoroscopia da deglutição e a videoendoscopia da deglutição. Estes exames permitem um diagnóstico diferencial dos distúrbios da deglutição, bem como contribuem para verificar quais as manobras e técnicas terão mais eficiência no tratamento fonoaudiológico18. prevenindo complicações e proporcionando melhor qualidade de vida. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. Considerações finais O idoso pode apresentar dificuldades de deglutição devido ao processo natural de envelhecimento, que provoca modificações anatômicas e funcionais, tornandoo mais susceptível ao risco de disfagia. Desta forma, a equipe médica e multidisciplinar deve estar atenta aos sintomas e queixas de deglutição apresentados pelo paciente, encaminhando-o para uma avaliação clínica da deglutição com o fonoaudiólogo. A identificação precoce do quadro de disfagia, possibilita a realização um planejamento terapêutico para garantir a eficiência e segurança da deglutição, Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 15. 16. 17. 18. Logemann JA. Anatomy and physiology of normal deglutition. In: Evaluation and treatment of swallowing disorders. 2nd ed. Texas: Proed, 1998, p. 13-52. Altman K, Gou-Pei Y, Schaefer SD. Consequence of dysphagia in the hospitalized patient. Arch Otolaryngol Head and Neck Surg. 2010; 136: 784-9. Jotz GP, Dornelles S. Fisiologia da deglutição. 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Oropharyngeal dysphagia in older persons – from pathophysiology to adequate intervention: a review and summary of an international expert meeting. Clinical Interventions in Aging. 2016. 11: 189-208 9 O papel da videofluoroscopia e da videoendoscopia na avaliação da deglutição The role of videofluoroscopy and videoendoscopy in swallowing evaluation Giovana Piovesan Dall‘Oglio1; Elisa Gomes Vieira2; Eliézia Helena de Lima Alvarenga3 1 Otorrinolaringologista pela Academia Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial 2 Fonoaudióloga pela PUC-PR, Especialista em Disfagia e Voz pelo CFFa, Mestre em Linguística pela UFSC, Doutora em Ciências Humanas pela UFSC, Pós-doutoranda pelo AC Camargo Cancer Center 3 Otorrinolaringologista e Foniatra pela Academia Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial, Mestre em Otorrinolaringologia pela FMRP-USP, Doutora Otorrinolaringologia e Pós-doutorado em Disfagia pela UNIFESP-EPM, RESUMO Disfagia orofaríngea ( DO ) pode causar complicações severas e frequentemente não é detectada, explorada ou tratada.O uso da avaliação objetiva nos pacientes com disfagia, aumenta a acurácia diagnóstica e terapêutica nestes pacientes, que apresentam séria ameaça à vida e risco de morte por pneumonia aspirativa. Há uma grande confusão de terminologia entre quem solicita a avaliação de deglutição, e tentaremos esclarecer estas diferenças.A videofluoroscopia ( VFD ) e a videoendoscopia da deglutição ( VED ) são considerados os padrões ouro da avaliação de disfagia, havendo uma necessidade de padronização em relação a terminologia e protocolo de avaliação clínica. A VFD é um exame radiológico e a VED um exame endoscópico. Sendo assim, ainda há necessidade de elaboração de trabalhos prospectivos, com rigor metodológico entre diferentes grupos de pacientes com disfagia. Palavras chaves: disfagia/endoscopia/fluoroscopia ABSTRACT Oropharyngeal dysphagia may cause very severe complications, it is often not detected, explored, and treated. The use of objective evaluation in patients with dysphagia, increases diagnostic and therapeutic accuracy in these patients, wich present serious threat to life and risk of death by aspiration pneumonia. There is a great confusion of terminology between who calls for the evaluation of swallowing, and we will try to clarify these differences. The videofluoroscopy swallowing study (VFSS) and the functional endoscopic evaluation of swallowing ( FEES ) are considered the gold standards of the evaluation of dysphagia, there is a need of standardization regarding the terminology and protocol of clinic evaluation. The VFSS is a radiologic exam and the FEES is an endoscopic exam. Therefore, there is still need for elaboration of prospective studies, with methodological rigor between different groups of patients with dysphagia. Keywords: Dysphagia/swallowing disorders/endoscopy/fluoroscopy Introdução Disfagia orofaríngea (DO) pode causar complicações severas e frequentemente não é detectada, explorada ou tratada. As consequências da DO, isto é, pneumonia Eliézia Helena de Lima Alvarenga [email protected] Rua Conselheiro Brotero, 1539, sala 13 Higienópolis, São Paulo/SP CEP: 01232011 10 aspirativa, malnutrição e reduzida qualidade de vida, são devastadoras mas frequentemente não atribuídas à disfagia 1 Uma grande confusão de terminologia destas avaliações de deglutição ocorre entre quem as solicita. E nós otorrinolaringologistas que trabalhamos com disfagia, nos sentimos à vontade para tentar esclarecer as diferenças do videodeglutograma ou videofluoroscopia (VFD) e da videoendoscopia da deglutição (VED) para avaliar pacientes comdisfagia; e nos posicionarmos a favor da elaboração e aperfeiçoamento de testes simples de triagem de disfagia Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 e riscos de broncoaspiração em todo hospital geral, como também o uso desta avaliação objetiva para aumentar a acurácia diagnóstica e intervenção nestes pacientes, que apresentam séria ameaça a vida frente a pneumonia aspirativa e o risco de morte.2,3 Numa breve revisão da literatura, observamos que o interesse por distúrbios da deglutição vem crescendo nas últimas duas décadas, com ampla produção científica. Entretanto, um artigo recente revisando DO e meios de screening e avaliação, reforça que a VFD e a VED são considerados os padrões ouro da avaliação de disfagia, e mostram a necessidade de padronização de terminologia, de elaboração de protocolo de screening e de avaliação, elaboração de manual clínico (guideline) baseado em evidências. 4,5,6 respiratória (apnéia) involuntária que dura de 1 a 1,5 s (variável com a consistência do bolo) que ocorre na fase expiratória, antes e durante a fase faríngea da deglutição, quando músculos respiratórios são centralmente inibidos e a via aérea se fecha.9,10,11,12 O sincronismo entre respiração e deglutição é mecanismo protetor para evitar disfagia e aspiração.8,13,14 O otorrinolaringologista detém habilidades/ conhecimento em via aérea-digestiva alta, em relação a dinâmica entre falar, deglutir e respirar, reflexos protetores da via aérea como tosse e adução de pregas vocais, que facilitam a interpretação dos achados da VED, propiciando a discussão multidisciplinar do paciente disfágico, incluindo estratégias terapêuticas que facilitam a atuação fonoaudiológica. Deglutição X Respiração Videodeglutograma ou Videofluoroscopia da deglutição( VFD ) Deglutição e respiração são reflexos e movimentos orquestrados, independentes e sinérgicos com objetivo de propelir a saliva e/ou bolo alimentar da cavidade oral em direção a via digestiva, com proteção da via aérea, mostrando diferentes funções do trato aerodigestivo de acordo com a fase da deglutição e ciclo respiratório. A coordenação da respiração e deglutição é a base anátomo-fisiológica para entendimento destes dois exames. O sinal aferente para iniciar a deglutição é uma mistura de informações sensoriais periféricas, provenientes das vias aferentes da orofaringe, e do controle dos centros neurais da deglutição e respiração corticais, regulados pelo tronco cerebral demonstrando a multifuncionalidade no controle dos diferentes comportamentos do trato aerodigestivo, que se reconfigura de acordo com a sua função durante o ciclo respiratório de modo coordenado, respeitando a relação temporal.7 Modificações biomecânicas envolvendo os músculos labiais, faciais, lingual, faríngeos, laríngeos e esofágicos, são ativas durante o ciclo respiração-deglutição assegurando o transporte seguro do bolo alimentar, assim como a patência e proteção da via aérea, para que a deglutição ocorra durante a fase expiratória.8,9 Durante a fase faríngea da deglutição ocorre: 1) Fechamento nasofaríngeo - pela retração e elevação do véu palatino e do músculo constrictor faríngeo superior; 2) Fechamento da via aérea superior - pela elevação e anteriorização da laringe, determinados pela: - tração dos músculos supra- hióideos concomitante com a adução reflexa das pregas vocais e vestibulares, - aproximação das aritenóides à base da epiglote, - própria descida da epiglote fechando o vestíbulo supraglótico. Estas alterações estrutural e funcional do trato aerodigestivo são consideradas mecanismos protetores da via aérea, evitando aspiração, configurando a pausa Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 O conhecimento corrente dos mecanismos de deglutição é derivado principalmente de estudos radiológicos, os quais têm sido utilizados desde o início do século XX. A vídeofluoroscopia foi introduzida por volta de 1970, e esta técnica passou a ser utilizada e considerada padrão ouro na avaliação da deglutição (avaliação objetiva morfológica e funcional) permitindo avaliar as fases oral, faríngea e esofágica como também os resultados de manobras terapêuticas nos pacientes com disfagia.15,16 São oferecidos alimentos com contraste de bário nas consistências líquida, pastosa e sólida. Sinais sugestivos da disfunção orofaríngea são avaliados como o atraso na deglutição orofaríngea, a penetração do bolo alimentar dentro da fenda glótica, aspiração traqueobrônquica, e resíduo orofaríngeo. (Fig1) Esta técnica foi originalmente desenvolvida para estudar a região esofágica, e a partir da década de 80, ela foi modificada para avaliar a fase orofaríngea da deglutição. Esta avaliação implementada por Logemann (1983)17, tem como princípio fundamental aliar a visão anatômica e funcional das estruturas orofaríngeas, no trajeto do alimento da cavidade oral ao estômago, e propôs o protocolo de avaliação da VFD , com manobras posturais que modificam o fluxo do alimento com objetivo de intervenção clínica no processo de reabilitação, permitindo o acompanhamento ao longo da evolução de cada caso, e é utilizado até os dias atuais.17,18 A VFD é um exame radiológico dinâmico que permite capturar e registrar em formato digital as imagens videoradiográficas, de forma sequencial e em tempo real do transporte do alimento e líquido impregnados pelo bário das estruturas da cavidade oral, da faringe, e do esôfago. Na sua análise considera-se a coordenação e o tempo dos eventos relacionados à deglutição, portanto uma análise qualitativa, auxiliando no diagnóstico, na 11 Fig 1.VFD: presença de episódios sistemáticos de aspiração laríngea após a deglutição devido as estases em esfíncter esofágico superior. determinação da segurança da alimentação oral, e o uso de estratégias posturais para reabilitação funcional da deglutição, melhorando ou minimizando o risco de aspiracão, auxiliando no acompanhamento da terapia e da progressão da doença. (Fig 2) Fig 2. VFD: tempo de trânsito oral muito aumentado, redução da mobilidade de língua e redução da força de língua para ejetar o bolo para faringe. Na literatura há diferentes denominações para este exame, como videodeglutograma, estudo dinâmico da deglutição, deglutição de bário modificada, avaliação funcional da deglutição, estudo diagnóstico da disfagia, avaliação videofluoroscópica da função orofaríngea e/ ou estudo videofluorográfico. O exame é realizado no setor de imagem, em conjunto com serviço de fonoaudiologia, acompanhado pelo técnico de radiologia e auxiliar de enfermagem. 12 No Brasil o acesso ao exame ainda é restrito para a grande maioria da população devido aos diferentes fatores: custo, acessibilidade, pouco conhecido por parte de profissionais da área da saúde e população em geral, necessidade de um trabalho interdisciplinar, poucos profissionais são habilitados para executar e interpretar cada achado. Uma das dificuldades de padronização deste exame se dá em virtude das diversas apresentações dos distúrbios da deglutição, das diferentes faixas etárias, da necessidade de individualização de cada caso, devendose portanto adaptar o protocolo padrão de investigação às necessidades e às situações que implicam risco de broncoaspiração. Atualmente a VFD mantém-se como um dos recursos tecnológicos mais avançados para avaliação das disfagias, pois garante rapidez e precisão na avaliação objetiva da deglutição, porém precisa ser entendida como um recorte temporal e pontual da ingesta de um indivíduo, e que deve estar correlacionada aos achados da avaliação clínica da deglutição. De acordo com a American Speech-Language-Hearing Association (ASHA ,2004)19 as indicações da VFD podem ser realizadas quando: • Sinais e sintomas do paciente são inconsistentes com achados da avaliação clínica, • Necessidade de confirmação de uma hipótese diagnóstica (médica) e/ou auxiliar na determinação de diagnóstico médico diferencial, • Necessidade de confirmação e/ou diagnóstico diferencial de disfagia, • Comprometimento nutricional ou pulmonar, e o questionamento se a disfagia contribui para este quadro, • Dúvida quanto à segurança e eficiência da deglutição, • Paciente candidato ao programa de reabilitação de deglutição requerendo informações específicas para tratamentos e gerenciamento. Critérios descritos numa pesquisa aplicada a fonoaudiólogos para a indicação de uma VFD incluiram: diagnóstico incerto após exame clínico (99% dos entrevistados), suspeita de aspiração silenciosa (96%), avaliar estratégia de tratamento (76%), ou pneumonia recorrente (7%).20 Durante a realização do exame é imprescindível monitorizar as condições clínicas do paciente em relação a: agitação e estado de alerta, mudanças no padrão de respiração, presença de cianose, náuseas e vômitos, tosse, sudorese, taquicardia, e a distribuição do bolo no trato aerodigestivo. Em termos de segurança, a dose de radiação envolvida na videofluoroscopia moderna não é considerada uma grande preocupação, principalmente para os pacientes idosos. 21 De acordo com o Guideline da ASHA o tempo de exposição a radiação deve estar entre 3 a 8 minutos. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 A VFD é a técnica mais frequentemente usada para avaliar a deglutição. Apresenta índice de confiabilidade inter avaliadores, e o coeficiente Kappa entre 0.01 a 0.56 para parâmetros como fase oral e faríngea, ocorrência temporal de penetração e aspiração, localização do resíduo do bolo. Alta confiabilidade, cujo coeficiente intraclasse de 0,80 para o parâmetro penetração/ aspiração. Salienta-se a necessidade de definirmos melhor os parâmetros avaliados pela VFD, a fim de elevar a confiabildiade inter avaliadores.5 Videoendoscopia da Deglutição (VED) ou FEES Em 1988, Langmore e cols propuseram um novo método para avaliação da deglutição, utilizando um aparelho endoscópico de fibra óptica, denominado nasolaringofibroscópio, descrito como FEES (fiberoptic endoscopic evaluation of swallowing safety) ou videoendoscopia da deglutição (VED).22 Considerado um método eficiente, com possibilidade de ser executado em qualquer ambiente com segurança para o paciente, obtendo informações importantes sobre a anatomia e fisiologia da fase oral e faríngea da deglutição, e é suficiente para programar e acompanhar a evolução da deglutição. (Fig 3) Entre outros autores, Hartnick, Hartley, Miller & Fig3: VED: observam-se as estruturas laríngeas e a presença de estase salivar com penetração e aspiração na fenda glótica. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Willging,200023 e Aviv, Martins, Jones et al24 utilizaram e aperfeiçoaram a técnica com protocolos diferentes de pesquisa da deglutição e a técnica se difundiu mundialmente22,23,24. Trata-se de estudo endoscópico funcional da deglutição, dinâmico,realizado pelo otorrinolaringologista com nasofibroscópio flexível ( em média de 3.2mm diâmetro), acoplado ao sistema de iluminação, captura, e visão de imagem. As imagens são gravadas, e posteriormente podem ser reavaliadas. O indivíduo é orientado quanto ao procedimento, melhor realizá-lo no melhor estado de alerta do paciente, posicionado de preferência sentado, o mais próximo a 90 graus, com a cabeça disposta na direção anterior sem a sua flexão ou rotação, simulando o ato da alimentação. Não utilizamos anestésicos, nem vasoconstrictores tópicos. O endoscópio flexível é passado transnasal pelo assoalho da narina, sentido nasofaringe, neste local angulamos o endoscópio de modo a visualizar a hipofaringe, e ele é movido em duas posições (isto é, posição da deglutição e pós-deglutição) durante a oferta de alimentos (de diferentes consistências corados artificialmente) 25. A videoendoscopia da deglutição permite a avaliação da contenção do alimento na cavidade oral, a presença de escape nasal, o fechamento do palato mole, o tempo da deglutição, presença de penetração e ou aspiração laríngea. (Fig4) Utiliza-se escala de penetração e aspiração laríngea de Rosenbeck et al (1996).26 Esta avaliação apresenta alta sensibilidade, alta especificidade, e alto nível de valor preditivo positivo e negativo para detecção de resíduos na faringe, penetração laríngea e aspiração laringotraqueal, entretanto um fator negativo é não ter sensibilidade para avaliar a fase esofágica da deglutição, às vezes há sinais durante o exame de refluxo esofágico que podemos inferir a possibilidade da presença de disfagia esofágica. Uma característica positiva desta ferramenta de investigação Fig 4: VED: alimento corado artificialmente observando-se estase , penetração e aspiração 13 é a possibilidade de ser realizada na beira do leito do paciente, e sua avaliação seriada.24,27 As avaliações instrumentais de disfagia, VFD e VED embora consideradas padrões ouro na investigação, não são perfeitas, tornando necessário a elaboração de trabalhos prospectivos, com rigor metodológico entre diferentes grupos de pacientes com disfagia, a fim de validálos, e permitir compará-los28. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 14 Wirth R, Dziewas R, Beck AM, Clavé P, Hamdy S, Heppner HJ, Langmore S, Leischker AH, Martino R, Pluschinski P, Rösler A, Shaker R, Warnecke T, Sieber CC, Volkert D. Oropharyngeal dysphagia in older persons – from pathophysiology to adequate intervention: a review and summary of an international expert meeting. 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Eliézia Helena de Lima Alvarenga1; Giovana Piovesan Dall‘Oglio2; Emi Zuiki Murano3 1 Otorrinolaringologista e Foniatra pela Academia Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia CérvicoFacial, Mestre em Otorrinolaringologia pela FMRP-USP, Doutora Otorrinolaringologia e Pós-doutorado em Disfagia pela UNIFESP-EPM, 2 Otorrinolaringologista pela Academia Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial 3 Médica Colaboradora da Disciplina de Otorrinolaringologia e pós-doutorado na Disciplina de Pneumologia da FMUSP, Foniatra pela Academia Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial, Doutora em Ciências Cirúrgicas pela Universidade de Toquio, Japão, Pós-doutorado na Universidade de Maryland, Estados Unidos, Ex-Professora Assistente da Universidade de Johns Hopkins, Estados Unidos RESUMO A reintrodução da alimentação oral pós-extubação deve ser reestabelecida de forma segura para garantir o estado nutricional, porém evitando-se broncoaspiração. O ideal é restringir a alimentação ao mínimo, ponderando-se os riscos deste paciente crítico. Apresentamos um protocolo de avaliação médica especializada precoce de disfagia em pacientes que necessitem de ventilação mecânica por mais de dois dias. O protocolo, integrado à equipe multidisciplinar que cuida do paciente, determina o grau de disfagia através de anamnese, exame objetivos de videoendoscopia e videofluoroscopia da deglutição e provas de triagem nas primeiras 24 horas pós-extubação. Quando o paciente não tem sinais evidentes de risco de aspiração e mantém condições clínicas e cognitivas, a alimentação oral poderá ser instituida. Se o risco de aspiração for evidente, exercícios específicos para deglutição, estimulação neuromuscular, controle de secreções, mudança postural e modificação da consistência da dieta são realizados para minimizar o impacto da IOT na função de deglutição. Preconiza-se uma reavaliação em 48 horas. O momento de reintrodução da dieta oral é, portanto, customizada para cada paciente, pois a identificação e a intervenção precoce neste grupo de alto risco podem reduzir as complicações associadas à aspiração e o tempo de internação. Palavras chaves: Disfagia,Transtornos da Deglutição, Extubação, alimentação, ventilação mecânica ABSTRACT The oral intake introduction after endotracheal intubation should promote nutritional support with safety and avoid aspiration. Feeding restriction length should be balanced out to clinical risks in these critically-ill patients. We present a medical approach to evaluate early signs of dysphagia in patients who are 2 or more days under mechanical ventilation. This approach is based on clinical history, videofluoroscopy and fiberoptic endoscopic evaluation of swallowing, and Yale Protocol and determines swallowing impairment level on patients within 24hours after endotracheal extubation. Oral intake is allowed on patients who are unlikely to aspirate, and have good clinical and cognitive conditions. For those who are likely to aspirate, swallowing exercises, neuromuscular stimulation, secretion control, head and body posture instructions, and food consistency changes are suggested. These measures may minimize the effects of endotracheal intubation on swallowing function. We suggest a follow-up assessment 48 hours later. We believe the oral intake introduction should be customized to each patient, and an early intervention may minimized complications associated to aspiration and decrease in hospital time. Keywords: Deglutition Disorders , Dysphagia, Airway Extubation, Feeding Methods Introdução Eliézia Helena de Lima Alvarenga [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 1 A intubação endotraqueal (IOT) é muitas vezes um procedimento inevitável para viabilizar o suporte 15 ventilatório mecânico de um paciente crítico hospitalizado. Quando as condições clínicas se estabilizam, é comum o médico intensivista se deparar com dois momentos críticos em relação a broncoaspiração. O primeiro durante a extubação e o outro no momento da decisão da reintrodução da alimentação oral. A presença do tubo de IOT, assim como sondas gástricas e nasoenterais são causas mecânicas diretas de lesões estruturais causando inflamação, edema e ulceração das pregas vocais, vestíbulo laríngeo e nas paredes faríngeas ou deslocamento da articulação cricoaritenoídea 1-4. O processo inflamatório pode ser agravado com infecções locais agudas ou cursar com sinéquias e estenoses nos casos mais graves. Há comumente alterações sensoriomotoras que podem atrofiar a musculatura do trato aéreo-digestivo, diminuir a sensibilidade proprioceptiva e tátil local, com consequências deletérias no reflexo de proteção das vias aéreas e incoordenação do mecanismo de deglutição5,6. A IOT por si só é um fator de risco de broncoaspiração agravado pela presença da sonda de alimentação, intervindo no bom funcionamento das estruturas e funções de proteção e deglutição, o tempo de IOT, grau de inflamação, infecção ou complicações locais são importantes fatores diretamente relacionados aos riscos de broncoaspiração. A recuperação da maioria da lesões estruturais por tubo de IOT ocorrem rapidamente seguindo a extubação1. Quanto a aspiração, geralmente é transitória 1,6,7, e mais frequente no momento pós-extubação8, se tornando rara após as 96 horas da extubação6,9. Porém manter um paciente 96 horas em restrição de dieta por via oral não é a melhor conduta, podendo o paciente se beneficiar da reintrodução alimentar oral. A disfagia, é a incapacidade de preparar o bolo alimentar na boca, degluti-lo e de transferir efetivamente este bolo da boca até o estômago sem que haja aspiração de secreções ou conteúdo alimentar nas vias aéreas inferiores, sua incidência entre pacientes internados nas clínicas médica e cirúrgica varia entre 3% a 62%10, porém sua etiologia é desconhecida5. Uma reintrodução da alimentação oral em um paciente já critico e que neste momento não esteja apto a deglutir, pode levar a um evento de broncoaspiração e possivelmente a uma instabilidade do quadro clínico 5,11,12. Neste período crítico, qualquer intercorrência respiratória como uma aspiração, pode piorar prognóstico e retardar sua recuperação. E ao mesmo tempo, a reintrodução oral precoce e evidentemente segura, promove hidratação e aporte calórico, controle das secreções orais e respiratórias, além de reduzir número de internações prolongadas que elevam a morbidade e mortalidade13-17. Por este motivo, determinar a presença de disfagia e a capacidade do paciente deglutir sem risco de aspiração é fundamental. 16 No entanto, não existe uma definição do momento ideal para a reintrodução dos alimentos por via oral pós extubação. Nossa sugestão é a reintrodução da alimentação customizada em cada caso. Em linhas gerais, esta vai depender do: 1. estado clínico geral, 2. estado de alerta, 3. polifarmacia, 4. necessidades de suporte hidríco-calórico, 5. presença de disfagia. O balanço entre a segurança da reintrodução oral e risco de disfagia e da broncoaspiração com os benefícios do reestabelecimento nutricional e hídrico, mobilização ao leito e comunicação, beneficiam e determinam o menor tempo de internação hospitalar. As alterações cognitivas inerentes da doença de base do paciente como traumas crânio-encefálico, demência, acidente vascular cerebral, metabólica, medicamentosa, infecciosa vigentes, podem também levar à incoordenação no mecanismo da deglutição4. O tamanho do tubo e IOT prévias são fatores que aumentam o risco de disfagia. O paciente com idade superior a 55 anos e o tempo de intubação também são considerados fatores agravantes. Acredita-se que há um aumento de 25% na probabilidade de disfagia a cada dia após as primeiras 24 horas do início de ventilação 5,6,11,18,19. Portanto detectar a disfagia, determinar o seu grau e instituir precocemente a fonoterapia são fortemente correlacionados para a resolução da disfagia e reintrodução alimentar oral segura20. Como avaliar a segurança a reintrodução alimentar? Todos os pacientes sob ventilação mecânica por mais de 48horas devem ser submetidos a uma avaliação médica especializada e instrumental da deglutição para diagnosticar disfagia e os riscos de aspiração18. Na impossibilidade desta avaliação, sugere-se que a ingestão oral seja iniciada 24-48 horas pós extubação7. Sabe-se que 96 horas pós-extubação, os processos inflamatórios, sem evidências de infecção local, regridem com retorno da função sensoriomotora local, portanto as chances de disfagia tornam-se pouco relevantes 9. A retirada do tubo de IOT porém com a manutenção da sonda nasoenteral pós-extubação pode continuar sendo um fator mantenedor de agressão local e atrasando o reestabelecimento fisiológico da deglutição. Preconiza-se a identificação precoce desta disfagia e intervenção fonoaudiológica, com modificações da dieta, pois estas podem levar a redução de complicações associadas 20 . Inicia-se com uma avaliação médica especializada que consiste em: Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 1.Anamnese A anamnese inicia-se com a discussão com o parecer dos profissionais envolvidos no caso clínico ou cirúrgico sobre as necessidades hídrico-calóricas, possibilidade do estabelecimento da via oral plena ou não, baseada na doença ou procedimentos que levaram ao estado crítico, medicações em uso. 2.Exame físico Determina-se o grau de alerta e as funções cognitivas do paciente. A alimentação oral necessita de estado de alerta bom, pois é um processo volicional. Enquanto o controle de secreções (saliva) possa estar sendo adequado, somente um estado consciente pode promover uma alimentação segura. Testa-se a seguir a motricidade orofacial e resposta a comandos voluntários durante a oroscopia e faringoscopia. Observa-se a contenção labial, motricidade, higiene oral, presença de salivação, secreções ou lesões, dentição e habilidade de manipular secreção. À rinoscopia observa-se a obstrução nasal, aspecto da mucosa, secreção e lesões. 3.Avaliação Instrumental Há duas formas de avaliação instrumental distintas, que quando usadas em conjunto trazem informações complementares. a. Videoendoscopia da deglutição A videoendoscopia da deglutição (VED) 21 é um procedimento realizado à beira do leito com endoscópio de fibra óptica de pequeno calibre que é introduzido pela fossa nasal e permite a visualização objetiva das estruturas da rino- oro- e hipofaringe e da laringe. Ela é gravada permitindo comparações e reavaliações, pode ser repetida, e permite a visualização direta da deglutição oral e faríngea de alimentos. Este instrumental permite a customização de acordo com a necessidade de cada paciente. Alimentos da dieta hospitalar ou que o paciente está habituado podem ser oferecidos em volumes crescente nas consistências líquida, pastosa e sólida com observação direta da segurança e da eficiência da deglutição. São avaliados a contenção do alimento na boca, preparação do bolo alimentar e adequação do bolo para propulsão pela faringe, início da deglutição faríngea, clareamento faríngeo, presença de estase de saliva e alimentos, penetração e aspiração 22 , (figuras 1 e 2) mobilidade laríngea, fechamento das pregas vocais, como também a sensibilidade da mucosa. Observa-se a presença do reflexo de tosse como proteção após a penetração ou aspiração de saliva e/ou alimento na laringe. A vídeoendoscopia da deglutição também pode detectar aspiração silenciosa, penetração ou aspiração na ausência de tosse, que ocorre em 28% de pacientes 24h após extubação23. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 b. Videofluoroscopia da deglutição (VFD) A videofluoroscopia da deglutição (VF) é um exame radiológico dinâmico, que pode ser gravado para a reavaliação. Neste exame também se administra-se alimentos líquidos, pastosos e sólidos, misturados ao bário para serem contrastados e visualizados nas imagens. Avalia-se as fases oral, faríngea e também esofágica até a entrada no estômago. Pode-se observar a presença ou a ausência de aspiração22. Ambos métodos são dinâmicos e avaliam a função de deglutição orofaringea. A VED tem algumas vantagens sobre a VFD, pois pode ser feita a beira do leito, usa-se alimentos na sua apresentação usual e não há necessidade de uso do bário que pode ser constipante. O exame pode ser repetido, testado durante múltiplas manobras terapêuticas, sem a preocupação do tempo limitado como é na VFD. Geralmente é preconizado no máximo de 5 minutos de radiação ionizante de VFD por exame. Neste método, provas terapêuticas também são viáveis, mas dependerá da experiência do profissional que deve aplicá-las efetivamente no tempo limitado de exposição permitida. A VFD, é considerado padrão ouro para o exame de disfagia, porém tem o inconveniente de ser realizado no setor de imagem e o paciente necessita ser transportado e posicionado adequadamente para obter imagem diagnóstica e terapêutica. 4.Triagem de Disfagia O Protocolo de Yale24 é um teste de triagem usado para determinar o risco de aspiração e recomendar a dieta oral. Pode ser feita por qualquer profissional da equipe multidisciplinar. Este protocolo consiste em deglutir ininterruptamente 90ml de água. Considera-se falha quando o paciente não conseguir beber todo o volume de forma ininterrupta e apresentar tosse, engasgo, dessaturação de Fig.1- Vídeoendoscopia da deglutição - Estase de alimento pastoso corado com corante alimentício em valéculas(*) e seios piriformes(**). 17 infere umidade das vias aéreas, ou pela ausculta da laringe, tosse durante ou após oferta do alimento. Todos os pacientes que falham no Protocolo de Yale ou com maior risco de disfagia pós-extubação, pacientes em ventilação mecânica por longo período, doença neuromuscular, história de disfagia prévia a IOT, lesões ou alterações das vias aéreas, digestivas com cirurgia ou radioterapia devem fazer avaliação e terapia fonoaudiológica. Intervenções após avaliações As intervenções após as avaliações vão depender do grau de disfagia. Pode-se alterar dieta - oferecer alimentos de consistência espessada, mudança postural, treinamento com manobras compensatórias, fonoterapia para deglutição, estimulação neuromuscular18. Nos casos mais graves onde não há boa manipulação de secreções orais, pode-se fazer controle salivar com medicações ou injeção de toxina botulínica em glândulas salivares. Fig.2- Vídeoendoscopia da deglutição - Estase de alimento pastoso corado com corante alimentício em seio piriforme, penetração e aspiração laríngea. O2 ou voz molhada até 1 minuto após o teste. O paciente que passa no teste tem boa habilidade para tolerar líquidos e outros alimentos. Porém quando o paciente falha recomenda-se a complementação com avaliação instrumental. Pois aproximadamente 50% dos pacientes que falham no teste, tem condições de reintrodução de alimentação oral. Uma das razões para estes teste ser amplamente utilizado está na alta correlação entre a detecção de aspiração em videoendoscopia e falha no teste de Yale (96,6%). Em outras palavras, o paciente que tem presença de aspiração em VED ou VFD provavelmente não passará no Protocolo de Yale. Pacientes que passam no teste de 90ml, podem ser considerados aptos a realimentação oral25. Recomenda-se a sua aplicação em pacientes com risco médio de disfagia pós-extubação 25,26. Terapia Fonoaudiológica Geralmente a avaliação fonoaudiológica é realizada em média 24 horas (18-24 horas) pós-extubação IOT como avaliações diagnósticas (60%, IC 95%, 59%-62%) 25 . A avaliação clínica feita para avaliar os sinais de aspiração27 contempla perguntas relacionadas à deglutição, hábitos alimentares e comportamentais sem instrumentos, testes minimamente invasivos, exame oral periférico, avaliação da função da laringe, avaliação das vias aéreas superiores, e oferta de alimentos com diferentes consistências, começando com a consistência mais espessa e progredindo para líquidos finos. A falha é definida pela presença de tosse durante ou após a oferta de alimentos, resíduos na laringe ou faringe, incapacidade de limpar a orofaringe, ou a presença de múltiplas deglutições. Suspeita-se de aspiração silenciosa pela presença de voz molhada que 18 Conclusão A reintrodução plena da alimentação via oral com segurança e sem indícios de broncoaspiração favoreceram a alta com dieta regular. Dependendo da gravidade, uma única avaliação não permite a resolução da disfagia, porém, esta determina a evolução progressiva principalmente durante o período crítico. Nosso protocolo avalia clinicamente os pacientes 24 horas após a extubação, os pacientes que falham na sua primeira tentativa de reintrodução oral, são reavaliados objetivamente em 48 horas. Pesquisas futuras devem avaliar e definir protocolos de avaliação de disfagia e risco de broncoaspiração em pacientes pós-extubação. Por outro lado, condutas individualizadas e cautelares devem ser tomadas no momento de definir a reintrodução da alimentação oral. Estudos epidemiológicos devem determinar a incidência da disfagia pós-extubação entre os diferentes grupos de pacientes, e de forma prospectiva determinar a consequência da disfagia. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. Stauffer JL, Olson DE, Petty TL. Complications and consequences of endotracheal intubation and tracheotomy. Am J Med . 1981;70:65–76. Whited RE. A prospective study of laryngotracheal sequelae in longterm intubation. Laryngoscope. 1984; 94:367–377. Colice GL. 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Bibas3; Messias Fróes Jr.4 1 Médico assistente e Professor Colaborador Grupo de Traqueia e Vias Aéreas do Centro de Via Aérea, Disciplina de Cirurgia Torácica, Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2 Médico assistente e Professor Colaborador Grupo de Traqueia e Vias Aéreas do Centro de Via Aérea, Disciplina de Cirurgia Torácica, Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 3 Médico assistente do Grupo de Traqueia e Vias Aéreas do Centro de Via Aérea, Disciplina de Cirurgia Torácica, Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 4 Fellow do Grupo de Traqueia e Vias Aéreas do Centro de Via Aérea, Disciplina de Cirurgia Torácica, Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. RESUMO A doença do refluxo gastro-esofágico (DRGE) pode ser definida como uma afecção desenvolvida a partir do refluxo do conteúdo gastroduodenal para o esôfago e órgãos adjacentes tais como a boca, laringe e árvore brônquica, acarretando num espectro variável de sinais e sintomas esofágicos e/ou extra-esofágicos, associados ou não a lesões teciduais. A identificação de fatores agravantes da extensão e prevalência de estenoses traqueais em nosso meio inclui hoje uma avaliação sistemática de pacientes com refluxo gastro-esofágico na tentativa de mitigar os seus efeitos potencialmente lesivos sobre a via aérea central préviamente lesada, tornando a estenose mais complexa e de difícil tratamento. Infelizmente, a população mais atingida é a de jovens em idade produtiva, gerando assim um ônus considerável, tanto para o paciente quanto para o sistema de saúde que o assiste. Palavras chave: doença do refluxo gastro-esofágico, aspiração, laringe ABSTRACT The gastro- esophageal reflux disease (GERD ) can be defined as a condition developed from the reflux of gastroduodenal contents into the esophagus and adjacent organs such as the mouth, larynx and bronchial tree , causing a variable spectrum of esophageal signs and symptoms / or extraesophageal , with or without tissue damage . The identification of aggravating factors on the extent and prevalence of tracheal stenosis includes a systematic evaluation of patients with gastro -oesophageal reflux in an attempt to mitigate its potentially harmful effects on the central air previously injured , making more complex stenosis and difficult to treat. Unfortunately, the population most affected is the young working age , thus generating a considerable burden for both the patient and the health system to assist it . Keywords: Gastroesophageal Reflux Disease, aspiration, larynx Introdução A doença do refluxo gastro-esofágico (DRGE) pode ser definida como uma afecção desenvolvida a partir do refluxo do conteúdo gastroduodenal para o esôfago e Paulo Cardoso [email protected] 20 órgãos adjacentes tais como a boca, laringe e árvore brônquica, acarretando num espectro variável de sinais e sintomas esofágicos e/ou extra-esofágicos, associados ou não a lesões teciduais 1,2. A etiopatogenia da DRGE é complexa e inclui a falência da zona de alta pressão no esôfago distal conferida pelo esfíncter esofagiano inferior, seja por hipotonia do esfíncter ou pelo seu relaxamento transitório relacionado à deglutição ou à distensão gástrica. As causas anatômicas e funcionais são representadas principalmente pela perda da competência Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 dos mecanismos de contenção da crura diafragmática que resulta em hérnia hiatal por deslizamento, pelo aumento da pressão intrabdominal, pelo retardo de esvaziamento gástrico e pela deficiência de clareamento ácido no esôfago distal. As manifestações extraesofágicas do RGE são frequentes, diferem da doença do refluxo gastro-esofágico (DRGE) habitual3. Tais manifestações possuem interesse para o pneumologista e cirurgião torácico uma vez que compreendem uma gama de sinais e sintomas, tais como a dor torácica não-cardiogênica, asma, tosse crônica, laringite, disfonia, faringite posterior, sensação de globo faríngeo, sinusite, erosão do esmalte dentário, pneumonias de repetição, entre outros2. Dentre estas manifestações chamadas de atípicas ou extra-esofágicas, as manifestações respiratórias situam-se dentre as mais freqüentes, representando portanto um dilema diagnóstico pois podem ser desacompanhadas de sintomas digestivos de refluxo. A prevalência das manifestações respiratórias relacionadas ao RGE variam na dependência do método de avaliação e do referencial estudado. As manifestações respiratórias do RGE mais encontradas em estudos observacionais incluem a faringite crônica (50%), bronquite crônica (15%), asma (12%), pneumopatias de repetição (3%) e apnéia obstrutiva do sono (2,7%)4. O refinamento da investigação com métodos morfológicos (e.g. radiologia, endoscopia) e fisiológicos (e.g. esofagomanometria, phmetria esofágica de 24 horas, impedâncio-phmetria e cintilografia), resultam em uma avaliação mais adequada destes pacientes posto que a manifestações endoscópicas e sintomas típicos são menos frequentes nesta população. A despeito destes esforços, em mais de 30% destes pacientes a associação entre manifestações respiratórias e RGE passa desapercebida por longos períodos até que a suspeição diagnóstica seja feita observando-se uma cronificação dos sintomas ou mesmo o aparecimento de complicações. A observação clínica sugere que os pacientes de maior risco exibem as seguintes características: • ausência de sintomas típicos de RGE. • estenose subglótica ou laringo-traqueal (figura 1). • estenose em fundo cego (figura 2). • estenose associada a laringite posterior +/- granuloma de prega vocal (figura 3). • recidiva tardia da estenose (≥3 anos) (figura 4). • refratariedade da estenose à despeito das medidas terapêuticas (ressecção, dilatação e/ou colocação de stents). Fig. 1- Estenose subglótica e da laringe com espessamento da comissura posterior em paciente com estridor e redução da mobilidade das pregas vocais. Fig. 2- Estenose subglótica em “fundo cego” associada a hiperemia e irregularidade da comissura posterior em paciente com RGE sintomático e estenose traqueal pós-intubação submetido a traqueostomia. Estudos clínicos e suas implicações Estudos realizados em portadores de RGE e manifestações otorrinolaringológicas revelam sintomas de RGE presentes em 43% dos pacientes5, ao passo que 51% dos asmáticos6 e cerca de 20% dos portadores de estenose subglótica idiopática apresentavam sintomas Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Fig. 3- Granuloma de prega vocal esquerda (seta) e estenose subglótica. 21 Fig. 4- Tomografia computadorizada com reconstrução sagital em paciente portador de recidiva de estenose traqueal (estenose em fundo-cego), 4 anos após típicos de RGE7. O papel do RGE na gênese e evolução das estenoses traqueais e laringo-traqueais ainda permanece pouco estudado. O RGE figura dentre os fatores imputados nas recidivas pós-cirúrgicas das correções de estenoses traqueais altas e na presença de estenose idiopática7. Estudos experimentais demonstram que a associação de sais biliares conjugados e pepsina na presença de ácido são os de maior potencial lesivo para a laringe e traquéia8. Por conseguinte, a supressão ácida pode ser capaz de previnir estenose inflamatória na subglote e minimizar as lesões em pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos na laringe9. Considerando-se portanto que a presença de sintomas típicos de RGE é um mau fator preditor de manifestações respiratórias, faz-se necessária uma avaliação sistemática da função esofágica10 a qual deve incluir uma combinação de métodos morfológicos e fisiológicos, cujo rendimento diagnóstico é variável e depende da natureza e intensidade do distúrbio. O melhor rendimento diagnóstico é obtido pela associação da avaliação clínica fonoaudiológica da deglutição com a avaliação morfológica e funcional, obtida pela combinação de videodeglutografia, estudo fibroendoscópico da deglutição, esofagomanometria e pHmetria esofágica de 24 horas. A esofagomanometria é o método de avaliação funcional capaz de fornecer dados precisos sobre o funcionamento do segmento faringo-esofágico, da motilidade do corpo e do esfíncter inferior do esôfago11, 12. O uso sistemático da esofagomanometria na prática clínica diária de avaliação dos pacientes disfágicos fornece importantes subsídios diagnósticos, principal22 mente quando seus dados são interpretados em conjunto com a avaliação clínica e demais exames morfológicos, tais como a endoscopia e a radiologia. Nos pacientes com RGE, o objetivo centra-se na avaliação dos esfíncteres e da motilidade do corpo esofágico. A pHmetria ambulatorial de 24 horas com 2 eletrodos é o método mais utilizado na detecção e quantificação de RGE ácido em pacientes portadores de manifestações supraesofágicas. Demonstramos anteriormente que o achado de RGE patológico à pHmetria ocorre em cerca de um terço dos pacientes com manifestações respiratórias e sem sintomas digestivos (refluxo silencioso), e que a hipotonia do esfíncter inferior do esôfago ocorre em 30% destes pacientes13. Ao avaliarmos prospectivamente 55 candidatos a transplante pulmonar, encontramos anormalidades à esofagomanometria em 80% e 24% apresentavam pHmetria anormal com RGE patológico. Dos pacientes com DPOC (enfisema) em lista de transplante pulmonar, 94% possuíam anormalidade à esofagomanometria (80% com hipotonia do esfíncer esofágico inferior). Os portadores de bronquiectasias possuíam a maior incidência de pHmetria anormal com RGE patológico (50%) 14 . Este estudo demonstrou que RGE possui prevalência elevada entre estes pacientes candidatos a transplante pulmonar e que a presença de sintomas digestivos não foi preditiva da presença de RGE patológico à pHmetria. Isto é importante uma vez que há correlação entre a presença de RGE e a ocorrência de bronquiolite obliterante pós-transplante pulmonar nestes pacientes15,16,17. Subsequentemente, avaliamos a função esofágica em 28 pacientes com fibrose pulmonar idiopática 18 . A prevalência de RGE patológico à pHmetria foi 35.7%. Dentre os 10 pacientes com pHmetria anormal, 80% possuíam RGE em decúbito e a metade dos pacientes possuíam hipotonia do esfíncter esofágico inferior. O interessante é que foram encontradas diferenças nas características demográficas e de função pulmonar entre os pacientes. Este estudo está em consonância com outros de que demonstram uma prevalência elevada de RGE entre os pacientes com fibrose pulmonar idiopática. Na eventualidade de uma relação causa-efeito real entre RGE e a fibrose pulmonar idiopática, a essência da etiopatogenia da doença será novamente questionada19. Mais recentemente, o advento da impedâncio-pHmetria tornou possível a investigação de refluxo não ácido, cujo potencial lesivo sobre a mucosa aerodigestiva também tem sido considerado20. A coexistência de refluxo faringolaríngeo é um fator importante na gênese das manifestações respiratórias persistentes, em particular das reestenoses após laringofissura destes pacientes, comprometendo assim os resultados pós-operatórios4, 21,22. Uma análise recente de 190 pacientes do InCorHCFMUSP portadores de estenoses traqueais e laringotraqueais refratárias aos tratamentos empreendidos Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 (dilatações e ressecção) avaliados por esofagomanometria e pHmetria de 24 horas com 2 eletrodos revelou que os sintomas típicos de RGE ocorreram em 40% da amostra, sendo a pirose o mais frequente (31%). A esofagomanometria revelou hipotonia do esfíncter esofágico inferior (EEI) em 21,5% dos pacientes, dentre os quais 25% apresentaram refluxo supraesofágico à pHmetria. A pHmetria esofágica de 24 horas demonstrou RGE patológico em 42% dos pacientes, com predominância de RGE durante o decúbito. O refluxo supraesofágico foi detectado em 22% dos pacientes com pHmetria normal e em 44% dos pacientes com pHmetria anormal. Este estudo retrospectivo demonstrou que os pacientes com estenoses traqueais benignas apresentam alta prevalência de RGE patológico onde predominam a exposição ao ácido na posição supina e o refluxo supraesofágico. Tais achados ocorreram em sua maioria na ausência de sintomas típicos de RGE e na presença de motilidade esofágica essencialmente normal23. Subsequentemente analisamos 22 pacientes com pHmetria anormal e estenoses traqueais que foram submetidos a fundoplicatura laparoscópica (Nissen modificado) e sua evolução foi comparada a 42 pacientes com pHmetria anormal, 18 dos quais com sintomas típicos de RGE tratados conservadoramente com inibidores de bomba de prótons (omeprazol 80mg/dia) e procinéticos (domperidona 30mg/dia). No grupo submetido a fundoplicatura, dos 16 pacientes acompanhados por mais de um ano, 15 (94%) tiveram uma evolução satisfatória (11 foram decanulados e 4 puderam ser submetidos a ressecção traqueal com bons resultados). No grupo de tratamento conservador (antiácidos e prócinéticos), apenas 26% puderam ser decanulados e 74% tiveram evolução desfavorável, necessitando de dilatações e próteses para a manutenção da via aérea. O risco relativo para evolução insatisfatória no grupo de tratamento conservador foi 11.8 (CI=6.51-17.09) comparado ao grupo submetido a fundoplicatura. Os dados preliminares deste estudo demonstraram que o controle e resolução da estenose traqueal foi melhor no grupo fundoplicatura se comparado ao grupo de tratamento conservador do RGE. Portanto, o melhor controle do RGE parece estar relacionado a um melhor contrôle clínico das estenoses da via aérea24. Estes estudos possuem como denominadores comuns a prevalência elevada de RGE ácido patológico, a predominância de refluxo supino (decúbito) e supraesofágico na ausência de sintomas típicos de RGE nestas populações com doenças pulmonares e das vias aéreas. A sugestão da possibilidade do RGE atuar como coadjuvante na refratariedade das estenoses da via aérea central deve portanto ser considerada. A questão que permanece diz respeito ao mecanismo pelo qual o RGE atuaria na via aérea. Muitas são as conjecturas, uma vez que não se sabe ao certo qual a quantidade de ácido gástrico suficiente para causar dano Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 à parede da via aérea central e capaz de resultar em estenose, sobretudo na vigência de lesão prévia como ocorre nas estenoses pós-intubação. Se observarmos as demais doenças pulmonares que possuem achados à pHmetria análogos aos dos pacientes com estenoses da via aérea central, a presença de microaspiração de ácido parece uma alternativa sensata, ao mesmo tempo que é algo que permeia a maioria dos estudos25,26,27. Se aplicarmos a hipótese de microaspiração a etiopatogenia da estenose via aérea central, seria razoável admitir-se que a pequena quantidade de ácido no local deva atuar por outros mecanismos na formação das estenoses. Dentre os mecanismos possíveis está a modificação do microbioma local a partir da modificação do pH do meio pelo refluxo, em conjunto com a umidade e temperatura. Microorganismos tais como bactérias, fungos e alguns vírus possuem a notória capacidade de colonizar a via aérea e tornarem-se patogênicos localmente determinando lesões na estrutura da via aérea. O melhor modelo de estudo seria nos pacientes que possuem órteses traqueais as quais são universalmente colonizadas e possuem um microbioma próprio. Ao estudarmos o microbioma dos tubos T de Montgomery de 23 pacientes portadores de estenose traqueal pós-intubação, observamos que as culturas revelam um predomínio de pseudomonas aeruginosa seguida de crescimento pilimicrobiano e de proteus mirabilis. A comparação com uma base de dados metagenômica revelou uma correlação com os resultados das culturas (figura 5). A família pseudomonadales representou 0.3% dos resultados cruzados com a base de dados RDP, também foram detectadas 0,5% de sequencias associadas a Enterobacteriacea mas não foram detectadas sequencias para proteus ou serratia marcescens. Os vírus mais representativos encontrados foram representados na Figura juntamente com bactérias e fungos. Muitas sequencias foram associadas com a família Caudovirales e retrovírus endógenos. Estes resultados indicam que as culturas convencionais subestimam o número de bactérias além de restringirem-se a algumas famílias virais, não levando em consideração outras populações que colonizam o local e podem interferir na evolução da estenose. A avaliação metagenômica pode ser uma alternativa para a avaliação destas outras populações microbianas e será utilizada em estudo prospectivo proposto recentemente28. Sumário Vivemos na atualidade dos grandes centros urbanos como a cidade de São Paulo, uma verdadeira epidemia de estenoses traqueais. Nas últimas duas décadas, observase um claro aumento de estenoses complexas e de difícil manuseio cirúrgico, fato este que, ao somarem-se, resultam em um aumento explosivo do número de pacientes 23 Fig. 5- (ESQUERDA): crescimento multimicrobiano (bactérias e fungos) em culturas convencionais de pacientes com tubo T; (DIREITA): análise metagenômica de banco de dados de traqueia. que vem aos serviços de referência a procura de tratamento. Entre Janeiro/2013 e Junho/2015, o Ambulatório de Traqueia e Vias Aéreas do InCor-HCFMUSP realizou 4228 atendimentos, sendo 3590 (85%) em portadores de estenoses traqueais pós-intubação, em sua maioria adultos jovens e crianças. Dentre as possíveis causas para tal aumento, está o efeito somatório de densidade demográfica, do aumento quantitativo de veículos de transporte individual, particularmente ciclomotores, que resulta em aumento exponencial de vítimas de trauma. Tais fatores, quando adicionados de um cuidado primário precário da via aérea em pacientes submetidos a intubação orotraqueal e traqueostomia, resulta em um incremento exponencial da frequência de estenoses traqueais que hoje vemos em nossos ambulatórios. Apesar de seu caráter benigno, a estenose traqueal possui impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes29 e sua abordagem terapêutica pouco evoluiu desde os primórdios do tratamento da doença há mais de meio século. A presença de fatores agravantes das estenoses como o RGE, outrora minimizados em importância frente ao número reduzido de pacientes com estenoses traqueais, hoje ganham relevância havendo indícios que realmente possam estar ligados à presença de estenoses mais complexas e de evolução desfavorável. O tratamento definitivo da estenose traqueal inclui a ressecção cirúrgica com anastomose para a reconstrução primária da via aérea, sendo que a extensão da ressecção é um fator limitante. Identificamos como preditores de risco maior de complicações pós-operatórias a ressecção acima de 4 centímetros de extensão, a história prévia de ressecção traqueal e a presença de comorbidades associadas 30. A identificação de fatores agravantes da extensão e 24 prevalência de estenoses traqueais em nosso meio inclui hoje uma avaliação sistemática de pacientes com refluxo gastro-esofágico na tentativa de mitigar os seus efeitos potencialmente lesivos sobre a via aérea central préviamente lesada, tornando a estenose mais complexa e de difícil tratamento. Infelizmente, a população mais atingida é a de jovens em idade produtiva, gerando assim um ônus considerável, tanto para o paciente quanto para o sistema de saúde que o assiste. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. Richter JE. Ambulatory esophageal pH monitoring. The American journal of medicine. 1997;103(5A):130S-4S. Katz PO. Gastroesophageal reflux disease—state of the art. Rev Gastroenterol Disord. 2001;1(3):128-38. 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Preventive dental care in aspiration for sick record Walmyr Ribeiro de Mello Cirurgião Dentista Coordenador da Equipe de Odontologia Hospitalar – EqOH no Hospital Samaritano de São Paulo; Presidente do Conselho Diretor do Colégio Brasileiro de Odontologia Hospitalar e Intensiva- CBROHI; Membro da Comissão de Odontologia da Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia – ABHH; Membro da Comissão de Odontologia da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos – ABTO; Mestrando em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. RESUMO A cavidade bucal normalmente aloja uma das mais concentradas e variadas populações microbianas do que qualquer parte do organismo. A precariedade nas condições de saúde bucal, associado a pouca atenção no cuidado com a higiene bucal e ausência de cuidado diário para com o paciente com doenças graves hospitalizadas ou não, fazem do cirurgião dentista um profissional extremamente importante não apenas na intervenção curativa, mas acima de tudo preventiva. O cirurgião dentista no ambiente hospitalar ou ambulatorial atua na concretização do conceito de saúde integral e promoção da saúde. Um dos maiores perigos associados à pratica odontológica inclui o risco de aspiração de corpos estranhos, como instrumentos endodônticos, dentes e fragmentos deste, grampo de isolamento e materiais de impressão, trazendo sério potencial de risco a saúde do paciente O objetivo deste estudo é revisar algumas condições orais no tocante a precariedade na higiene bucal do paciente crítico e salientar a importância do cirurgião dentista seja no tratamento de sequelas ou na prevenção dos fatores que possam levar aos riscos de aspirações. Palavras chaves: Saúde bucal, prevenção, aspiração. ABSTRACT The oral cavity typically accommodates one of the most concentrated and varied microbial population than any part of the body. The precariousness of the oral health conditions associated with little attention in the care of oral hygiene and lack of daily care for patients with serious diseases hospitalized or not, make the surgeon dentist an extremely important professional not only on curative intervention, but above all preventive. The dental surgeon in the hospital or outpatient acts in the implementation of the concept of integral health and health promotion. One of the biggest dangers associated with dental practice includes the risk of aspiration of foreign bodies, such as endodontic instruments, teeth and fragments thereof, insulation clip and print materials, bringing serious potential risk to patient health The aim of this study is to review some oral conditions concerning the precariousness in the oral hygiene of the critical patient and emphasize the importance of the dentist is in the treatment of sequelae or prevention of the factors that could lead to the risk of aspirations. Key words: Oral health, prevention, aspiration. Introdução A aspiração acidental, quer de objetos orgânicos ou materiais e instrumentais, é uma das principais causas Walmyr Ribeiro de Mello Rua Conselheiro Brotero, 1505 - 8 andar - sala 82 Higienópolis/SP - CEP 01232-011 Tel: 11 3887-3694 [email protected] 26 de morbidade e mortalidade infantil e não menos importante em paciente graves, necessitando de rápida identificação e imediata ação para minimizar as chances de consequências mais graves²¹. As publicações médicas relatam que a aspiração de objetos não é um evento raro, principalmente nas faixas etárias mais jovens²². A aspiração de materiais e instrumentais odontológicos é um acidente bastante raro, porém quando ocorre pode se tornar grave¹¹. De acordo com Hill e Rubel, todos os pacientes que aspiraram objetos de origem odontológica necessitaram ser hospitalizados, e o Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 conhecimento do cirurgião dentista sobre o que fazer nessa situação é extremamente importante, tanto no aspecto clínico quanto no legal10. A maioria dos corpos estranhos aspirados são naturalmente eliminados. Milton, Hearing e Ireland afirmam que apenas 10% dos corpos estranhos aspirados necessitam ser removidos por manobras médicas, sendo que 90% destes por meio de endoscopia e 10% por procedimento cirúrgico18 . Condições como pacientes dependentes de cuidados totais ou parciais aumentam o risco de aspiração devido a falta da capacidade de colaboração durante o tratamento odontológico pois possuem reflexo protetores diminuídos9,12,15. Nos pacientes idosos os riscos de aspiração aumentam devido a uma alteração tátil causada por dentes avulcionados, próteses fixas (coroas) e aparelhos ortodônticos 12,15 . A instabilidade de uma prótese, desalojada ou quebrada, pode obstruir as vias aéreas ou ser deglutida. Dependendo do grau de manifestação, pacientes com epilepsia, paralisia cerebral e deficiências motoras estão predispostos a esses acidentes12. Em consequência a esterilizações constantes dos instrumentais. Tais como limas endodônticas e brocas, reduz sua vida útil levando a um maior risco de fratura e, consequentemente, a acidentes de deglutição ou aspiração12. Aspectos clínicos Quando se dá a aspiração acidental de um corpo estranho, a manifestação clássica é a tosse paroxística, mecanismo de defesa natural de eliminação do objeto aspirado. Dependendo da idade do paciente, do tipo de corpo estranho aspirado e de sua localização nas vias aéreas, pode haver obstrução parcial ou total à passagem de ar. Superado o quadro inicial, segue-se um período oligo ou mesmo assintomático, que pode variar de horas a dias ou mesmo semanas, até o reaparecimento dos sintomas². Um corpo estranho alojado na laringe pode ocasionar a obstrução completa do trato respiratório e, consequentemente, a morte em 45% dos casos. Se a obstrução é parcial, pode ocasionar roncos, rouquidão, afonia, odinofagia, hemoptise e dispneia de intensidade variável, sendo que esses corpos estranhos podem permanecer impactados por períodos prolongados2. A variedade de manifestações clínicas também está relacionada à natureza, orgânica ou inorgânica, do corpo estranho aspirado. Como os objetos orgânicos desencadeiam com mais frequência reações inflamatórias, podem elas acelerar o grau de obstrução ao fluxo de ar e, assim, encurtar a duração da fase assintomática16. A aspiração acidental de corpo estranho deve ser igualmente incluída no diagnóstico diferencial das pneumopatias crônicas ou de repetição, mesmo que não se encontre uma história sugestiva de aspiração. Em Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 algumas situações, essa suspeita só é levantada quando se detectam imagens compatíveis com bronquiectasias na tomografia computadorizada de tórax6,13,6,3. Conduta Nas situações de aspiração, o paciente deve ser encaminhado ao hospital para ser avaliado pelo médico e realizar exames radiológicos com o intuito de identificar o corpo estranho e realizar o planejamento da intervenção. Isso se faz necessário mesmo que o paciente não apresente sinais de distúrbios aparentes12. Caso o corpo estranho ainda estiver na orofaringe, o paciente deve ser posicionado com a cabeça para baixo. Essa manobra estimulará o objeto a retornar à cavidade bucal, onde poderá ser removido4. Na aspiração Nos casos de aspiração de um corpo estranho o paciente deve ser encaminhado imediatamente a um especialista 17. Se as vias aéreas do paciente estiverem parcialmente obstruídas com boa troca de ar, deve-se realizar a manobra posicionando a cabeça do paciente no nível abaixo do tórax e induzir uma tosse forçada para tentar expelir o corpo estranho. Esta manobra consiste em posicionar o paciente em posição de Trendelemburg e rotacionando a cabeça do paciente para o lado4,12,15. Lembrando que a obstrução parcial ou completa pode ocorrer espontaneamente ou quando as manobras de intervenção são iniciadas 12. Se a troca gasosa é pobre ou há obstrução completa das vias aéreas, deve-se iniciar imediatamente a oferta de oxigênio 100% em baixa pressão, e o encaminhamento imediato ao pronto-socorrou5,7,12,15. A remoção do corpo estranho deve ser realizada por uma broncoscopia com fibra óptica flexível ou por um procedimento cirúrgico5,8. Pacientes internados nas UTI, na maioria das vezes, não possuem higienização oral adequada, possivelmente pelo desconhecimento de técnicas adequadas pelas equipes de terapia intensiva, e pela ausência do relacionamento interprofissional odontologia/ enfermagem. Esta condição de deficiência de higiene oral em pacientes críticos desencadeia frequentemente periodontites, gengivites, otites, rinofaringite crônicas, xerostomia potencializando focos de infecções propícias à pneumonia nosocomial por aspiração desta flora bacteriana 19,20. Os pacientes de terapia intensiva com frequência permanecem com a boca aberta, devido à intubação traqueal, permitindo a desidratação da mucosa oral. A diminuição do fluxo salivar permite aumento da saburra ou biofilme lingual (matriz orgânica estagnada) no dorso da língua, o que favorece a produção de 27 componentes voláteis de enxofre, tais como mercaptanas (CH SH) e sulfidretos (SH) que têm odor desagradável e colonização bacteriana1,24. Diante dos riscos bacterianos oriundos da boca, preconiza-se a completa limpeza nos tecidos da cavidade bucal, incluindo: dentes, gengivas e língua; removendo restos alimentares e placa bacteriana, tem-se o intuito de promover um ambiente bucal “imune” às afecções orais para evitar a aspiração desta flora bacteriana24. O uso de um protocolo de cuidados de higiene bucal com substância com ação antimicrobiana e bactericida como o gluconato de clorexidine 0,12% ou o dióxido de cloro23. Prevenção Todo e qualquer tipo de ação preventiva inicia-se com princípios básicos. Uma adequada anamnese, exames clínicos minuciosos com o objetivo de coletar dados com potencial risco de aspiração12: · Criança; · Idoso; · Pacientes com necessidades especiais. · Condição de saúde bucal crítica. Nos tratamentos endodônticos o uso do dique de borracha é uma medida de prevenção que deve ser tomada pelo dentista durante todo o procedimento com o objetivo de evitar possível aspiração de limas, brocas, pinos, restaurações, grampos e possíveis materiais orgânicos4,8. O uso de um pedaço de fio dental amarrado ao grampo, lima endodôntica, chaves e pequenos instrumentais em implantes facilitam a recuperação em caso de deslocamento8. Alguns procedimentos clínicos inviabilizam o uso do dique de borracha, como cirurgias e tratamentos periodontais, que também possuem risco de aspiração. Para estes casos uma proteção com gaze devidamente adaptada em região posterior da boca para proteção da orofaringe4,8,9,14,25. Procedimentos clínicos a quatro mãos e o uso de sistema de sucção de alta potência reduzem o risco de aspiração de corpos estranhos12,15. Os fluidos e fragmentos podem ser facilmente removidos com o sistema de sucção de alta potência, quando o dique de borracha ou a proteção com a gaze não puderem ser utilizados12. O dentista deve realizar uma minuciosa avaliação para assegurar que restaurações dentais, coroas estejam estabilizadas e bem cimentadas para evitar o risco de aspiração por parte do paciente 12,15 e antes de usar instrumentais e brocas, deve avaliar as condições de uso desses instrumentais que sofrem desgastes não somente pelo uso como pelo constante processo de assepsia12. Outro cuidado que o dentista deve ter são nos procedimentos de moldagem que também apresenta risco de aspiração8,15. As normas técnicas devem ser tomadas de forma efetiva e o uso dos materiais de moldagem devem conter em sua composição material radiopaco para 28 permitir sua identificação no caso de aspiração de corpos estranhos8,15. Conclusão Após realizarmos esta revisão bibliográfica, observamos que os procedimentos odontológicos possuem uma relação, direta ou indiretamente, com os relatos de muitos dos acidentes de aspiração de corpos estranhos. O domínio que o dentista deve ter quanto aos procedimentos a serem adotados nestes casos. Porém, os procedimentos preventivos e de educação do paciente pelo dentista deve ser a primeira linha a ser tomada. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. Abidia R.F. - Oral care in the intensive care unit: a review. J Contemp Dent Pract, 2007;8:76-82. Andrews TM, Shott S. Aerodigestive foreign bodies. In: Cotton RT, Myer CMIII, Shott SR. The pediatric airway. An interdisciplinary approach. 1st ed. Philadelphia: JB Lippincott Company; 1995. Aytaç A, Yurdakul Y, Ikizler C, Olga R, Saylam A. Inhalation of foreign bodies in children. J Thorac Cardiovasc Surg 1977;74:145-51. Barkmeier, W.W. et al. 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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 29 Aspectos histológicos da doença pulmonar associada à aspiração Histological aspects of aspiration related lung disease Ellen Caroline Toledo do Nascimento1; Marisa Dolhnikoff2 Médica patologista Doutora em Ciências, programa de Patologia, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Médica assistente da Patologia do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo 2 Professora Associada do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 1 RESUMO Doença pulmonar associada à aspiração (DPAA) de conteúdo gástrico pode se manifestar através de diferentes apresentações clínico-patológicas. Os padrões histológicos mais comuns são broncopneumonia aguda, dano alveolar difuso e pneumonia em organização, entretanto, vários outros são descritos como bronquiolite aspirativa, pneumonia lipoídica exógena e pneumonia intersticial fibrosante. A associação dessa variedade de apresentações morfológicas à etiologia aspirativa é um desafio para o patologista na prática diária, principalmente quando o material exógeno aspirado não está presente no tecido pulmonar analisado. Nessa revisão discutimos os diferentes padrões histológicos da DPAA, os diagnósticos diferenciais e as limitações na avaliação histológica. Palavras chaves: pneumonia aspirativa; bronquiolite; doenças pulmonares intersticiais; aspiração ABSTRACT Aspiration associated lung diseases (AALD) may be manifested through different clinicopathological presentations. The most common histologic patterns are acute bronchopneumonia, diffuse alveolar damage and organizing pneumonia, however, several others have been described as aspiration bronchiolitis, exogenous lipoid pneumonia and fibrosing interstitial pneumonia. The association of this variety of morphological presentations to the aspirative etiology is a challenge for the pathologist in daily practice, especially when the aspirated foreign material is not present within the analyzed lung tissue. In this review, we discuss the different histological patterns of AALD, differential diagnoses and limitations in the histological evaluation. Keywords: aspiration pneumonia; bronchiolitis; lung diseases, interstitial; respiratory aspiration Siglas DPAA: doença pulmonar associada à aspiração DRGE: doença do refluxo gastroesofágico FPI: fibrose pulmonar idiopática Introdução Doença pulmonar por aspiração de conteúdo gástrico pode se manifestar através de diferentes apresentações clínico-patológicas (Hu et al, 2015; Franquet et al, 2000). A forma de apresentação morfológica depende do tipo e Ellen Caroline Toledo do Nascimento [email protected] Marisa Dolhnikoff [email protected] 30 quantidade de material aspirado, da duração do estímulo e do tempo de evolução a partir da agressão inicial (Katzenstein, 2006). Broncopneumonia aguda e dano alveolar difuso são as formas mais comuns observadas em casos de morte associada à aspiração (Hu et al, 2014). Pneumonia em organização é a apresentação mais frequente em material de biópsia pulmonar de pacientes sem suspeita clínica de aspiração (Mukhopadhyay e Katzenstein, 2007). Vários outros padrões são descritos, como bronquiolite aspirativa, pneumonia lipoídica exógena e pneumonia intersticial fibrosante (Matsuse et al, 1996; Barnes et al, 2006; Hu et al, 2015; Marchiori et al, 2011; Raghu et al, 2006; Carvalho et al, 2002). O reconhecimento do material exógeno aspirado permite o diagnóstico etiológico definitivo, mas pode estar ausente em grande parte dos casos (Mukhopadhyay e Katzenstein, 2007; Lagstein e Myers, 2009; Yousem e Faber, 2011). Assim, a associação dos diferentes padrões histológicos Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 à DPAA pode ser um desafio na prática diária, tornando fundamental a correlação anátomo-clínico-radiológica. Nessa revisão, discutimos as diferentes apresentações morfológicas da DPAA, possíveis diagnósticos diferenciais e limitações da análise anatomopatológica do tecido pulmonar. Broncopneumonia aguda Um dos padrões histológicos mais comumente observados na DPAA é a broncopneumonia aguda necrosante caracterizada por um exuberante processo inflamatório agudo bronquiolocêntrico, contendo granulomas do tipo corpo estranho (Katzenstein, 2006; Hu et al, 2014). O exsudato neutrofílico compromete bronquíolos e o parênquima alveolar adjacente, com formação de microabscessos, necrose e destruição das vias aéreas; nota-se material exógeno aspirado envolto por células gigantes multinucleadas e em espaços alveolares (Katzenstein, 2006; Lagstein e Myers, 2009; Hu et al, 2015). Estudo recente em autópsias mostrou que 46% de 57 casos com diagnóstico post mortem de DPAA exibiam achados histopatológicos de broncopneumonia aguda, por vezes com microabscessos, associada a reação granulomatosa e/ou presença de material exógeno (Hu et al, 2014). Células vegetais são o material exógeno mais comumente observado em pneumonia aspirativa (Mukhopadhyay e Katzenstein, 2007). O aspecto morfológico dessas células pode ser variável, sendo a apresentação mais comum a de estruturas alongadas com septos eosinofílicos ou basofílicos e cutícula fina hialina. Podem ser observadas células vegetais com pigmentação ou degeneradas (Figura 1). Outra pista para o diagnóstico de aspiração é a presença de granulomas do tipo corpo estranho associados a materiais frequentemente usados pela indústria farmacêutica para a produção de medicamentos orais, caracterizados por partículas polarizáveis, consistentes com talco ou celulose microcristalina (Figura 1), e partículas não-polarizáveis, basofílicas e de aspecto serpentiginoso, compatíveis com crospovidone (Mukhopadhyay e Katzenstein, 2007). Pneumonia em organização Mukhopadhyay e Katzenstein (2007) avaliaram 59 biópsias pulmonares com evidências de material exógeno aspirado; o padrão histológico mais frequente foi a pneumonia em organização. A alteração característica desse padrão histológico é a presença de pólipos de tecido de granulação, rico em mucopolissacárides, envolvendo lúmens de bronquíolos, ductos alveolares e espaços aéreos peribronquiolares. O interstício pulmonar e os pólipos de tecido de granulação exibem um infiltrado inflamatório crônico composto por linfócitos, plasmócitos, macrófagos e neutrófilos. Macrófagos xantomizados intraluminais Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Fig. 1. (A) e (B) Broncopneumonia aspirativa. (A) Exuberante processo inflamatório agudo bronquiolocêntrico (HE 10X). (B) Formação de abscesso com material aspirado (célula vegetal) (HE 250X). (C) e (D) Transplante pulmonar com material exógeno aspirado. (C) Aspiração de fibras musculares (HE 350X). (D) Material particulado birrefringente no interior de célula gigante multinucleada (HE sob luz polarizada 400X). podem ser observados em decorrência da obstrução bronquiolar (Katzenstein, 2006). O principal achado que permite a definição da etiologia aspirativa nesses casos é a presença de material exógeno associado a células gigantes multinucleadas ou granulomas supurativos (Lagstein e Myers, 2009) (Figura 2). Pode haver associação com focos de inflamação aguda ou granulomas supurativos, indicando que a pneumonia em organização pode representar uma fase de organização da bronquiolite aguda ou da broncopneumonia aguda aspirativa. Fig. 2. Paciente feminina, 32 anos, diagnóstico de polimiosite, tomografia com consolidações em segmentos posteriores dos lobos superiores e áreas de vidro fosco. (A) Padrão histológico de pneumonia em organização (HE 50X). (B) Em detalhe pólipo de tecido de granulação e fibrina intra-alveolar (HE 100X). (C) Pólipo de tecido de granulação com material exógeno adjacente à parede bronquiolar (HE 50X). (D) Pólipo de tecido de granulação com material exógeno (resto alimentar) (HE 200X). Pneumonia em organização foi também o padrão histológico mais comum em estudo realizado por Yousem e Faber (2011). Os autores observaram quatro casos de pneumonia em organização em 10 casos de pneumonia aspirativa clinicamente confirmados, cuja análise histopatológica falhou em demonstrar a presença de reação granulomatosa ou de material exógeno. 31 Dano alveolar difuso Bronquiolite aspirativa Aspiração de grandes volumes de conteúdo gástrico pode resultar em lesão pulmonar aguda difusa, também conhecida por pneumonite aspirativa ou Síndrome de Mendelson (Hu et al, 2014; Popper et al, 1986). Modelos experimentais de lesão pulmonar aguda induzida por ácido clorídrico (HCl) foram desenvolvidos a partir da constatação de que aspiração de conteúdo gástrico pode resultar em síndrome do desconforto respiratório agudo. A instilação de substância com baixo PH (ácido clorídrico) produz uma lesão química dependente de neutrófilos, com efeito tóxico nas células alveolares e epitélio bronquiolar, seguida de proliferação de pneumócitos tipo II e organização do processo (Matute-Bello et al, 2008). A lesão pode ser complicada por infecção bacteriana, com alta mortalidade (Hu et al, 2015; Katzenstein, 2006). O padrão histológico é o dano alveolar difuso, caracterizado por necrose de células alveolares e do epitélio bronquiolar, exsudato neutrofílico, edema, hemorragia intra-alveolar e membranas hialinas (Figura 3), podendo estar ou não associado à presença de material exógeno aspirado (Katzenstein, 2006; Hu et al, 2014; Yousem e Faber 2011). O processo pode evoluir para a fase de organização com proliferação fibroblástica intersticial e em espaços aéreos (Popper et al, 1986; Katzenstein, 2006). Estudo em autópsias de 57 pacientes com causa de óbito estabelecida como DPAA mostrou que 44% dos casos exibiam padrão de dano alveolar difuso, com hemorragia e edema combinados com material exógeno e/ou reação gigantocelular. Dos 19 casos de pneumonite aspirativa em que o momento da aspiração pode ser identificado e o tempo de evolução da lesão contabilizado, 74% dos pacientes morreram em 72 horas em contraste com os casos de broncopneumonia aspirativa em que apenas 27% dos pacientes morreram no mesmo intervalo de tempo (Hu et al, 2014). Ocasionalmente, a doença pulmonar aspirativa pode se manifestar como uma alteração bronquiolar crônica devido a microaspiração recorrente (Figura 4) (Matsuse et al, 1996; Hu et al, 2015). Bronquiolite aspirativa difusa foi observada em 0,64% de 4880 autópsias realizadas em hospitais de referência no Japão. Os pacientes eram principalmente idosos, com outras doenças associadas, como demência, alterações neurológicas e cardiovasculares, frequentemente com disfagia orofaríngea e/ou acamados. A avaliação macroscópica dos pulmões mostrou um padrão micronodular amarelado difuso, de aspecto miliar, semelhante ao observado na panbronquiolite difusa. A análise histológica evidenciou um infiltrado inflamatório crônico linfoplasmocitário em paredes bronquiolares, com macrófagos xantomizados esparsos, associado a material exógeno e células gigantes multinucleadas. Alguns bronquíolos estavam obliterados por fibrose de aspecto cicatricial. O curso da lesão foi mais insidioso comparado a pneumonia aspirativa tradicional; em metade dos pacientes a aspiração foi oculta e o diagnóstico só foi estabelecido após avaliação histológica post-mortem (Matsuse et al, 1996). Um padrão de doença bronquiolar difusa associada à aspiração crônica oculta foi relatada por Barnes et al (2006) em quatro pacientes adultos, com média de idade de 50 anos, que exibiam numerosos nódulos centrolobulares na tomografia computadorizada de tórax. A avaliação da biópsia pulmonar cirúrgica mostrou um quadro histológico consistente com pneumonia em organização em arranjo bronquiolocêntrico, associada a células gigantes contendo material exógeno aspirado. Análise retrospectiva de 20 pacientes com diagnóstico de bronquiolite aspirativa difusa apresentou média de idade de 56,5 anos, tomografia de tórax com micronódulos e árvore em brotamento compatíveis com bronquiolite e presença de fatores de risco associados à aspiração como doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), história de abuso de drogas e disfagia. Dezoito pacientes foram submetidos a biópsia pulmonar com padrão morfológico similar ao descrito por Matsuse et al (1996), ou seja, inflamação crônica bronquiolocêntrica associada a material exógeno e/ou reação gigantocelular. Em quinze pacientes (75%), aspiração não era a suspeita clínica e o diagnóstico só foi estabelecido após evidência histológica (Hu et al, 2015). Bronquiolite crônica com fibrose peribronquiolar, porém sem evidência histológica de material exógeno na biópsia pulmonar, foi um dos padrões morfológicos observados por Yousem e Faber (2011) em pacientes com diagnóstico clínico de aspiração. O padrão histológico foi caracterizado por um infiltrado linfocitário ao redor de bronquíolos respiratórios e terminais associados à fibrose da submucosa, impactação mucoide e leve Fig. 3. (A) e (B) Dano alveolar difuso. (A) Membrana hialina, edema e hemorragia intra-aveolares (HE 100X). (B) Em detalhe membrana hialina e pneumócitos hiperplásicos (HE 200X). (C) e (D) Pneumonia intersticial com distribuição bronquiolocêntrica. (C) Infiltrado inflamatório crônico bronquiolar e em interstício alveolar peribronquiolar associado à fibrose (HE 100X). (D) Aspecto da distribuição da lesão centrada na pequena via aérea (HE 40X). 32 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 transplantados por prevenção da aspiração (Fisichella et al, 2011; Davis et al, 2003; Robertson et al, 2010). Pneumonia lipoídica exógena Fig. 4. (A) e (B) Paciente feminina, 2 anos, em investigação de pneumonia intersticial. (A) Bronquiolite aspirativa com granulomas na região peribronquiolar (HE 50X). (B) Granuloma com célula vegetal degenerada (HE 150X). (C) e (D) Retransplante pulmonar devido a síndrome da bronquiolite obliterante. (C) Fibrose bronquiolar associada a restos alimentares (HE 120X). (D) Obliteração do bronquíolo com substituição por fibrose de padrão cicatricial (HE 200X). reatividade epitelial. Notou-se também focos de fibrose centrolobular, por vezes, com remodelamento do parênquima e metaplasia peribronquiolar. Os aspectos histológicos são similares aos descritos em pneumonia de hipersensibilidade e a ausência de material exógeno, compatível com particulado ou restos alimentares, não permite conclusão anatomopatológica definitiva da etiologia do processo como aspiração. Correlação clínica e radiológica, principalmente para descartar a possibilidade de outras exposições é necessária. Mesmo em casos nos quais a biópsia mostra granulomas supurativos com distribuição bronquiolocêntrica, porém sem evidência de material exógeno, outras causas que justifiquem o processo, sobretudo infeciosas, devem ser exaustivamente pesquisadas (Lagstein e Myers, 2009). Em outra situação, DRGE e microaspiração tem sido associadas às alterações bronquiolares crônicas em pacientes submetidos a transplante pulmonar (Fisichella et al, 2013). Nos últimos anos, vários estudos têm demonstrado associação de disfunção crônica do enxerto em transplante pulmonar com a DRGE (Fisichella et al, 2013; Davis et al, 2010; Cantu et al, 2004). Bronquiolite obliterante acomete cerca de metade dos pulmões transplantados em um período de 5 anos (Christie et al, 2008). A lesão caracteriza-se por fibrose na submucosa de bronquíolos respiratórios e terminais, com estreitamento luminal e, por vezes, completa obliteração com substituição por fibrose cicatricial (Figura 4). Infiltrado inflamatório crônico, por vezes com lesão do epitélio bronquiolar, pode estar associado (Katzenstein, 2006). A etiologia do processo não é clara, mas parece estar relacionada a fatores imunológicos e nãoimunológicos como a aspiração relacionada a DRGE (Fisichella et al, 2013). Corroborando com esses dados, estudos sugerem que cirurgia anti-refluxo está associada à estabilização da função pulmonar em pacientes Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Pneumonia lipoídica exógena é uma doença rara, com um padrão histológico característico, que difere das formas mais comuns de pneumonia aspirativa (Yousem e Faber, 2011). A entidade foi descrita pela primeira vez em 1925 por Laughlen, com base em alterações microscópicas não usuais presentes em pulmão de crianças submetidas à autópsia. A lesão pode ocorrer em todas as faixas etárias e é causada pela aspiração ou inalação de substâncias de base oleosa, como por exemplo, óleo mineral, descongestionante nasal, outros laxativos oleosos, brilhos labiais, protetor labial, exposição ocupacional à óleo em indústrias, e outros (Marchiori et al, 2011). A pneumonia lipoídica exógena pode se apresentar nas formas aguda ou crônica (Marchiori et al, 2011; Betancourt et al, 2010). A apresentação aguda é incomum e usualmente secundária à aspiração acidental de grandes quantidades de substância oleosa. Apesar dessa forma ser mais comum em crianças, também é observada em artistas que se dedicam à pirofagia e usam uma substância derivada do petróleo, inflamável, que pode ser acidentalmente aspirada durante a performance. A forma crônica é observada principalmente em idosos, mas também vista em crianças, e resulta da aspiração ou inalação recorrente (Marchiori et al, 2011; Betancourt et al, 2010). Histologicamente, a lesão é caracterizada por numerosos macrófagos contendo vacúolos claros intracitoplasmáticos em espaços alveolares e interstício pulmonar (Figura 5) (Katzenstein, 2006). Em alguns casos, notam-se células gigantes multinucleadas envolvendo grandes vacúolos e infiltrado inflamatório crônico intersticial. A lesão pode evoluir para fibrose sobretudo em casos de aspiração crônica recorrente. A utilização de colorações especiais como “oil red O” e “Sudan black” pode ajudar a demostrar a origem lipídica dos vacúolos, entretanto, em geral, é desnecessária (Katzenstein 2006; Khilnani et al, 2009). O lavado broncoalveolar pode ser um útil instrumento na elucidação diagnóstica (Spatafora et al, 1987; Lauque et al, 1990). O principal diagnóstico diferencial é a pneumonia lipoídica endógena na qual observam-se numerosos macrófagos microvacuolados ou xantomizados intra-alveolares em decorrência a quadro pós-obstrutivo bronquiolar; entretanto, não há grandes vácuolos intracitoplasmáticos ou reação gigantocelular do tipo corpo estranho (Katzenstein 2006). Pneumonia intersticial fibrosante Fibrose pulmonar idiopática (FPI) é uma doença pulmonar intersticial crônica progressiva, que acomete 33 que demonstre a microaspiração é limitada e rara (Bois et al, 2016, Yousem e Faber, 2011). Bois et al (2016) mostraram frequentes focos fibroblásticos centrados em via aérea em pacientes com fibrose pulmonar idiopática e hérnia hiatal, sugerindo que focos fibroblásticos em vias aéreas poderiam estar relacionados à microaspiração. Fibrose centrolobular foi observada em três pacientes com diagnóstico clínico de aspiração. Em dois deles, áreas de remodelamento e metaplasia bronquiolar foram descritas (Yosem e Faber, 2011). Carvalho et al descreveram casos de fibrose pulmonar centrolobular que exibiam áreas de necrose e desnudamento do epitélio bronquiolar, necrose neutrofílica em espaços aéreos e presença de corpos estranhos intraluminais, favorecendo a hipótese de doença intersticial associada à aspiração crônica. Entretanto, outros estudos que relatam padrões de fibrose pulmonar com distribuição bronquiolocêntrica (Figura 3) descritos como “fibrose intersticial centrada em via aérea” (Churg et al, 2004) e “pneumonia intersticial bronquiolocêntrica idiopática” (Yosem et al, 2002) não demonstraram relação com aspiração. Conclusão Fig. 5. Paciente masculino, 76 anos, com história de uso crônico de descongestionante nasal. (A) Macrófagos vacuolizados em espaços alveolares peribronquiolares (HE 40X). (B) Detalhe dos macrófagos com vacúolos intracitoplasmáticos (HE 200X). principalmente pacientes entre 50 e 70 anos, com média de sobrevida de 2 a 3 anos após o diagnóstico (Lee et al, 2010; Johannson et al, 2013). A etiologia permanece desconhecida, apesar de várias associações serem relatadas (Lee et al, 2010; Hu et al, 2015). Estudo recentes tem sugerido que microaspiração crônica pode ser um possível fator relacionado à patogênese da FPI. Uma das principais hipóteses sugere que microaspirações devido a DRGE causa lesão pulmonar progressiva e lenta, resultando em fibrose ou exacerbação aguda (Meyer 2015; Lee et al, 2011). Raghu et al (2006) mostraram alta taxa de prevalência de DRGE (87%) em pacientes com diagnóstico bem estabelecido de FPI. Pacientes com FPI apresentaram maior concentração de bile ácida e pepsina no lavado broncoalveolar comparados a pacientes com doença pulmonar intersticial não-FPI ou controles (Savarino et al, 2013). O uso de medicamentos anti-refluxo em pacientes com FPI foi associado a menor escore radiológico de fibrose e foi um fator preditivo de sobrevida (Lee et al, 2011). Histologicamente, o padrão observado é a pneumonia intersticial usual caracterizada por fibrose intersticial heterogênea, com distorção arquitetural, leve infiltrado inflamatório crônico e focos fibroblásticos (Katzenstein, 2006). Apesar da alta prevalência de DRGE em pacientes com FPI, a presença de subsídios em material histológico 34 O reconhecimento da variedade de padrões morfológicos associados à aspiração é um desafio para o patologista na prática diária. A presença de material exógeno associado à reação gigantocelular ou granulomas é a pista para o diagnóstico etiológico definitivo, podendo estar presente nos diferentes quadros histológicos acima descritos; entretanto, a ausência deste não exclui completamente essa possibilidade e a correlação com informações clínicas, exames radiológicos e laboratoriais são fundamentais para conclusão diagnóstica. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. Barnes TW, Vassallo R, Tazelaar HD, Hartman TE, Rye JH. Diffuse bronchiolar disease due to chronic occult aspiration. Mayo Clin Proc. 2006;81:172-6. Betancourt SL, Martinez-Jimenez S, Rossi SE, Truong MT, Carrillo J, Erasmus JJ. Lipoid pneumonia: spectrum of clinical and radiologic manifestations. AJR. 2010;194:103–9. Bois MC, Hu X, Ryu JH, Yi ES. Could proeminente airway-centered fibroblast foci in lung biopsies predict underlying chronic microaspiration in idiopathic pulmonary fibrosis patients? Hum Pathol. 2016;53:1-7. 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Adicionalmente, refluxo gastroesofágico é frequentemente identificado em pacientes com fibrose pulmonar idiopática e existem evidências de correlação entre aspiração e outras doenças pulmonares intersticiais de acometimento sistêmico, como as colagenoses. A dificuldade em se determinar uma relação causal entre doenças pulmonares intersticiais e aspiração, a eventual ausência de sintomas ou fatores predisponentes, e as apresentações clínicas e radiológicas muitas vezes pouco específicas, constituem os principais desafios no manejo de todas essas condições, exigindo um alto índice de suspeição e a frequente necessidade de biópsia pulmonar. Os objetivos desta revisão são ressaltar os principais achados clínicos, radiológicos, histopatológicos e de tratamento das principais doenças pulmonares intersticiais associadas à aspiração, e destacar as ferramentas disponíveis para investigação de aspiração. Palavras chave: Aspiração respiratória; doença pulmonar intersticial; refluxo gastroesofágico ABSTRACT Chronic aspiration of oral and gastric contents has been associated with several pulmonary disorders, including interstitial lung diseases, such as organizing pneumonia, bronchiolocentric pulmonary fibrosis and diffuse bronchiolar disease. Gastroesophageal reflux disease is often found in patients with idiopathic pulmonary fibrosis, and there is evidence of correlation between aspiration and interstitial lung diseases secondary to systemic disorders, such as connective tissue diseases. The difficulty in establishing a causal relationship between interstitial lung diseases and aspiration, the possible absence of predisposing factors or symptoms, and the clinical and radiological presentations often unspecific, represent the major challenges in the management of these conditions, demanding a high degree of suspicion and frequent need to perform lung biopsy. The aims of this review are to describe the main clinical, radiological, and histopathological findings, and therapeutic interventions of the main interstitial lung diseases associated with aspiration, and to highlight the major tools for diagnostic assessment of aspiration. Keywords: Gastroesophageal reflux; interstitial lung disease; respiratory aspiration Introdução A aspiração consiste na passagem de conteúdo gástrico ou da orofaringe para laringe ou trato respiratório inferior e se relaciona ao aparecimento de diversas doenças respiratórias, como pneumonia, dano alveolar difuso, Bruno Guedes Baldi Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44, 8o andar, Cerqueira César- CEP 05403-900 - São Paulo - SP Email: [email protected] 36 pneumonia lipoídica, abscesso pulmonar, pneumonia necrotizante, bronquiectasias e infecções por micobactérias não tuberculosas. As manifestações respiratórias associadas à aspiração dependem da natureza e volume do material aspirado, da cronicidade e intensidade da aspiração, e da resposta do indivíduo ao conteúdo aspirado1,2. Frequentemente se identifica um fator predisponente à aspiração, como doenças esofágicas, desordens neurológicas ou musculares que determinam distúrbios da deglutição, alcoolismo, uso de drogas, paralisia de pregas vocais, obesidade e doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)1,3. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 A aspiração crônica de conteúdo do trato gastrointestinal (TGI) para o sistema respiratório pode determinar ainda lesão do interstício pulmonar ou das pequenas vias aéreas, relacionando-se ao aparecimento de diversas manifestações como a bronquiolite aspirativa difusa, bronquiolite obliterante em transplantados de pulmão, pneumonia em organização (PO), e fibrose pulmonar bronquiolocêntrica1,3,4. Deve-se enfatizar que sintomas gastrointestinais, como pirose, regurgitação e disfagia, nem sempre estão presentes, sendo o diagnóstico baseado na combinação de manifestações respiratórias, como tosse e dispneia, febre, alterações radiológicas e, muitas vezes, histológicas1,2. Existem ainda evidências demonstrando uma maior prevalência de DRGE em portadores de fibrose pulmonar idiopática (FPI)5,6. O objetivo dessa revisão é destacar os principais aspectos das doenças pulmonares intersticiais (DPIs) relacionadas à aspiração crônica, incluindo a bronquiolite aspirativa difusa e a PO (Tabela 1). Fibrose pulmonar bronquiolocêntrica A fibrose pulmonar bronquiolocêntrica (ou centrada nas vias aéreas) é um tipo peculiar de lesão pulmonar, caracterizando-se por fibrose e graus variados de inflamação com predomínio das alterações ao redor das vias aéreas, podendo haver progressão para o parênquima ao redor. Fatores de risco ambientais e ocupacionais que determinam agressão por via inalatória, incluindo exposição a mofo e outros antígenos orgânicos, agrotóxicos e gases tóxicos, e aspiração crônica de conteúdo gastrointestinal são as principais condições associadas à fibrose pulmonar bronquiolocêntrica. Entretanto, muitas vezes não se identifica qualquer fator predisponente (idiopática)6-11. Evidenciou-se ainda que a presença desse padrão histológico é comum em pacientes com esclerose sistêmica progressiva, relacionando-se possivelmente à aspiração crônica de conteúdo do TGI para os pulmões 12 . Estudo retrospectivo publicado recentemente demonstrou que em 68 pacientes com diagnóstico histológico de fibrose pulmonar bronquiolocêntrica as etiologias mais frequentes foram pneumonite de hipersensibilidade (43%) e aspiração (25%), e em 4,4% não se identificou causa11. Pode-se diagnosticar algum comprometimento neurológico ou disfunção esofágica em pacientes com aspiração crônica, mas essas manifestações podem não ser notadas1. Outras situações que aumentam o risco de aspiração são RGE, obesidade e idade avançada 4. As principais manifestações clínicas em pacientes com fibrose pulmonar bronquiolocêntrica incluem dispneia progressiva aos esforços e tosse seca, de evolução insidiosa. Distúrbio ventilatório restritivo e redução da capacidade de difusão do monóxido de carbono, de gravidade variável, são as alterações funcionais habitualmente identificadas nessa população7-9,11,12. Na tomografia computadorizada de tórax de alta resolução (TCAR), as alterações são frequentemente focais e muitas vezes assimétricas, e podem predominar do mesmo lado do decúbito preferencial que o paciente adota Tabela 1: Caracterização tomográfica e histológica das principais doenças pulmonares intersticiais associadas à aspiração Doença pulmonar intersticial Fibrose pulmonar bronquiolocêntrica Padrão tomográfico Alterações focais, predomínio em regiões inferiores; bronquiolectasias de tração, opacidades reticulares, vidro fosco e consolidações; pode haver aprisionamento aéreo e dilatação esofágica Padrão histológico Deposição de colágeno peribronquiolar, podendo progredir para septos interlobulares; bronquíolos obliterados; infiltrado linfocitário; metaplasia bronquiolar; corpo estranho e células gigantes multinucleadas Fibrose pulmonar idiopática Pneumonia intersticial usual: predomínio basal e periférico; opacidades reticulares, faveolamento, bronquiolectasias de tração, pouco vidro fosco Pneumonia intersticial usual: heterogeneidade (áreas normais e alteradas); fibrose, distorção da arquitetura, faveolamento, focos de fibroblásticos Bronquiolite obliterante com pneumonia em organização Consolidações de predomínio peribroncovascular e em regiões inferiores; pode haver halo invertido Plugs intraluminais (bronquíolos e espaços alveolares); corpo estranho, células gigantes multinucleadas Doença bronquiolar difusa Micronódulos centrolobulares de distribuição difusa e opacidades do tipo árvore-em-brotamento; pode haver bronquiectasias e consolidações focais Inflamação linfoplasmocitária peribronquiolar, com macrófagos xantomizados, granulomas e corpo estranho; pode haver áreas de pneumonia em organização e broncopneumonia aguda Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 37 durante o sono, e em regiões inferiores, especialmente quando relacionadas à aspiração crônica. Os principais achados estão centrados nas vias aéreas e incluem bronquiectasias e bronquiolectasias de tração, espessamento das vias aéreas, opacidades reticulares, áreas em vidro fosco e consolidações. Pode haver aprisionamento aéreo e dilatação esofágica (Figura 1) 7,9,11,12. Para a confirmação diagnóstica da fibrose pulmonar bronquiolocêntrica é necessária biópsia pulmonar preferencialmente cirúrgica. Do ponto de vista histológico, evidenciam-se deposição de colágeno na região dos bronquíolos membranosos e respiratórios, que podem estar obliterados, com possibilidade de progressão para os septos interlobulares, associada à inflamação linfocitária em grau variado, bronquiolectasias e necrose com metaplasia do epitélio bronquiolar. Material basofílico com origem no TGI e corpos estranhos, como vegetais, cristais de colesterol e células gigantes multinucleadas podem ser identificados quando associados à aspiração (Figura 2). Pode haver áreas de PO e focos fibroblásticos7-12. A presença de padrão tomográfico e histológico compatível com fibrose pulmonar bronquiolocêntrica, na ausência de outras causas potencialmente determinantes, deve levar à investigação da presença de microaspiração e DRGE com exames adicionais. Ainda faltam estudos prospectivos para se estabelecer a relação causal entre os fatores de risco potencialmente relacionados e a fibrose pulmonar bronquiolocêntrica. Adicionalmente, a evolução dos pacientes que apresentam esse padrão histológico também não está completamente estabelecida. Estudo recente demonstrou que a mediana de sobrevida é de 10 anos, porém alguns pacientes apresentam progressão mais rápida da doença, especialmente se houver focos fibroblásticos na biópsia11. Fig. 2: Avaliação histopatológica de amostra de pulmão obtida por biópsia cirúrgica, compatível com fibrose pulmonar bronquiolocêntrica A) e B) Processo inflamatório linfocitário mais intenso ao redor de bronquíolos associado à deposição de colágeno a partir da região peribronquiolar, que se prolonga pelos septos interlobulares, que estão espessados por inflamação e colágeno; C) Além do processo inflamatório linfocitário e da deposição de colágeno peribronquiolar, evidencia-se material amorfo basofílico e células descamadas no interior da via aérea; D) Além do material amorfo e das células descamadas, observam-se cristais de colesterol no interior da via aérea. Fibrose pulmonar idiopática A FPI é uma forma de pneumonia intersticial idiopática crônica, fibrosante e de caráter progressivo, que ocorre primariamente em adultos idosos, predominantemente nas sexta e sétima décadas, além de ser restrita aos pulmões13. A relação de FPI com o DRGE foi inicialmente descrita há mais de 50 anos e somente em 1998 foi publicado o primeiro trabalho que investigou a prevalência de DRGE nessa população, identificado em 94% dos casos14. Em 2006 foi conduzido o maior trabalho prospectivo de DRGE em FPI, com 100 pacientes, observando-se uma prevalência de DRGE em 87% dos pacientes com FPI, ainda que somente 47% apresentavam sintomas típicos como queimação e regurgitação5,14. Estudo brasileiro identificou prevalência de DRGE em 33% de pacientes com FPI sintomáticos e assintomáticos, com manometria esofágica e/ou pHmetria alteradas15. Nessa população com DRGE e FPI, muitas vezes não há sintomas gastrointestinais clássicos, como pirose e regurgitação. Apesar da associação frequente, ainda não está completamente estabelecido se a DRGE aumenta o risco do desenvolvimento de FPI. Pneumonia em organização Fig. 1: Tomografia computadorizada de tórax de alta resolução de paciente com fibrose pulmonar bronquiolocêntrica A), B) e C) Bronquiectasias e bronquiolectasias de tração, além de áreas em vidro fosco esparsas, bilaterais, predominando no feixe peribroncovascular e à direita; regiões periféricas do parênquima pulmonar relativamente poupadas; D) Dilatação esofágica. 38 A PO é um padrão histológico que também pode ocorrer relacionado à aspiração, habitualmente com evolução subaguda ou crônica. As manifestações são inespecíficas e incluem dispneia e tosse, podendo haver febre3,16. Na TCAR, a PO associada à aspiração se manifesta com Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 múltiplas consolidações em regiões inferiores, de predomínio peribroncovascular, podendo haver ainda a ocorrência da imagem em halo invertido (Figura 3) 16. Histologicamente, a PO se caracteriza por plugs intraluminais, envolvendo bronquíolos e espaços alveolares, frequentemente com linfócitos associados3. Apesar da PO ser inespecífica e de haver certa dificuldade para associá-la à aspiração em virtude das múltiplas possíveis etiologias determinantes desse padrão, achados adicionais à histologia, como a presença de corpo estranho com células gigantes multinucleadas e granulomas favorecem aspiração como possível fator causal 3,16. Fig. 3: Tomografia computadorizada de tórax de alta resolução de paciente com megaesôfago chagásico e pneumonia em organização secundária à aspiração A) Dilatação esofágica com nível hidroaéreo representando estase alimentar, secundária à acalasia por megaesôfago chagásico na janela de mediastino; B) Áreas de consolidação bilaterais em bases, com sinal do broncograma aéreo à direita, além de pequenos focos de vidro-fosco e consolidações de distribuição centrolobular, representativas de pneumonia em organização. Doença bronquiolar difusa A doença bronquiolar difusa (DBD), também chamada de bronquiolite aspirativa difusa, é outra forma de apresentação pulmonar das doenças aspirativas, caracterizada pelo acometimento das pequenas vias aéreas. Ela foi originalmente descrita em pacientes idosos, com fatores de risco para aspiração crônica, incluindo disfagia orofaríngea e distúrbios neurológicos17, mas vem sendo caracterizada em pacientes jovens portadores de DRGE1,4,18, usuários de drogas18, obesos com diagnóstico de Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono1, além de portadores de doenças primárias do esôfago, como acalasia19,20. O sintoma mais prevalente é a tosse, geralmente produtiva,17,18 e febre é um achado comum 4,18. Padrão obstrutivo é a alteração mais encontrada na avaliação funcional pulmonar, que também pode ser normal18. O aspecto radiológico é semelhante ao encontrado nas bronquiolites infecciosas – com o achado característico de micronódulos e opacidades do tipo “árvore-embrotamento”, excetuando-se por sua distribuição difusa, que remete ao mesmo padrão encontrado na panbronquiolite difusa 17,18,21. Os achados patológicos incluem inflamação linfoplasmocitária peribronquiolar com macrófagos xantomizados e pode haver granulomas e restos alimentares 1,4,17,18. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Diagnóstico de aspiração O diagnóstico de aspiração e DRGE é baseado na combinação de sintomas sugestivos e testes objetivos, como endoscopia digestiva alta e exames para detecção de refluxo gastroesofágico, assim como na resposta ao tratamento instituído. Os sintomas de pirose e regurgitação são os mais importantes no diagnóstico presuntivo de DRGE, porém, sua sensibilidade é baixa (30-76%), levando à necessidade de alta suspeição e posterior investigação por métodos complementares nos portadores de doenças respiratórias 22. Os exames que auxiliam na investigação de aspiração e DRGE incluem: • Endoscopia digestiva alta A endoscopia digestiva alta (EDA) permite visualização direta da mucosa orofaríngea, sendo a técnica de escolha para o diagnóstico de complicações esofágicas da DRGE, como esôfago de Barrett, e está indicada quando o paciente tem sinais de alarme como disfagia, vômitos ou sangramento. É crítico o entendimento que a identificação de esôfago de Barrett ou esofagite na EDA confirma o diagnóstico de DRGE, porém, o exame normal não o exclui, devendo ser prosseguida a investigação se houver necessidade23,24 • pHmetria / ImpedanciopHmetria Exame que permite a avaliação e confirmação de DRGE em pacientes que possuem EDA normal com persistência de sintomas, assim como monitorização da eficácia de tratamento em pacientes sintomáticos a despeito de terapia. Possui boa sensibilidade e especificidade (~96%). O exame tem a desvantagem do desconforto e aparência do cateter nasal, que deve ser usado por cerca de 24h. Pode ser combinado com impedanciometria (impedanciopHmetria), avaliando-se assim, o refluxo ácido e não ácido23. •Videodeglutograma/Esôfago-Estômago-Duodenografia Exames indicados para avaliação de disfagia e aspiração, assim como a presença de hérnia de hiato e lesões esofágicas, e não são usados para o diagnóstico de DRGE. O paciente ingere sulfato de bário, e é avaliado por fluoroscopia, no caso do videodeglutograma, ou por radiografias seriadas, no caso do Esôfago-EstômagoDuodenografia22. • Manometria esofágica Exame utilizado na avaliação da peristalse esofágica e indicado na avaliação pré operatória de pacientes candidatos à fundoplicatura. Em pacientes com peristalse ineficaz, o procedimento deve ser evitado. Pode ser usado na avaliação de acalasia e aperistalse, muitas vezes presente na esclerose sistêmica progressiva23. Tratamento O tratamento da fibrose pulmonar bronquiolocêntrica ainda não está estabelecido. Recomenda-se controle do 39 potencial fator desencadeante, geralmente associado ao uso de medicações. Corticosteroide (0,5 a 1 mg/kg/dia de prednisona, com redução progressiva da dose e duração variável) e imunossupressores (azatioprina ou ciclofosfamida, por exemplo) podem ser utilizados, com resposta variável. Bloqueadores de bomba de prótons na dose plena (omeprazol ou pantoprazol, 80 mg/dia, por exemplo) e pró-cinéticos (bromoprida ou domperidone) devem ser utilizados especialmente quando o fator desencadeante é a aspiração crônica7,8,11,12. Relato recente demonstrou estabilização da doença após a utilização de claritromicina, justificado pela ação imunomodulatória dos macrolídeos25. Em casos mais avançados, transplante pulmonar pode ser realizado. Ainda que não existam trabalhos clínicos prospectivos e randomizados sobre o tratamento da DRGE na FPI, uma reanálise de dados de grupos placebo de três ensaios clínicos em FPI demonstrou que o tratamento de DRGE com inibidores de bomba de prótons ou antagonistas de receptor H2 mostrou uma menor progressão de doença e menor taxa de exacerbação aguda que o grupo não tratado 26. Entretanto, outra análise de tratamento de DRGE em grupos placebo de outros estudos não mostrou benefício nessa população 27 . Portanto, até que ensaios clínicos randomizados, placebo controlados sejam publicados, recomenda-se tratar a DRGE em pacientes com FPI com mudanças comportamentais, medicações e eventualmente fundoplicatura somente nos que apresentarem sintomas de DRGE. O tratamento da PO associada à aspiração consiste na utilização de medidas comportamentais e farmacológicas para controle do fator desencadeante, podendo-se combinar corticosteroide (0,5 a 1 mg/kg/dia de prednisona, com redução progressiva da dose). Raramente há necessidade da utilização de imunossupressores. O emprego de corticosteroides sistêmicos não parece ter espaço no tratamento da DBD4,18. A melhor estratégia de abordagem desses pacientes ainda não foi definida, sendo sugerida a atuação nos fatores de risco predisponentes, embora o tratamento farmacológico de DRGE e até intervenções cirúrgicas para prevenção de aspiração recorrente sejam empregados com frequência18. O uso de macrolídeos (claritromicina) foi descrito na prevenção de exacerbações com bons resultados28. Conclusão Diversos estudos determinaram a associação entre aspiração e DPI, porém há dificuldade em se determinar a presença de relação causal. Frequentemente se identifica alguma condição predisponente à aspiração, como doenças esofágicas e neurológicas, mas nem sempre esse fator é identificado. O padrão tomográfico pode sugerir o acometimento intersticial presente, porém frequentemente é necessária biópsia pulmonar para confirmação 40 diagnóstica. Adicionalmente, ainda não está estabelecido se o controle da aspiração, com medidas farmacológicas, comportamentais e cirúrgicas, determina regressão ou controle da DPI. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. Cardasis JJ, MacMahon H, Husain AN. The spectrum of lung disease due to chronic occult aspiration. Ann Am Thorac Soc 2014;11(6):865-73. 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Chefe de equipe de Pneumologia do Hospital Samaritano de São Paulo. 2 Especialista em Pneumologia pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Médica pósgraduanda de Pneumologia da Universidade Federal de São Paulo. Médica pneumologista do Hospital Samaritano de São Paulo. RESUMO Aspiração pode ser definida como a inalação de conteúdo orofaríngeo ou gástrico para a laringe e o trato respiratório inferior. Os principais materiais aspirados que podem causar doença pulmonar são bactérias da orofaringe, ácido gástrico, partículas alimentares e corpos estranhos. A síndrome aspirativa que se seguirá vai depender basicamente de três fatores: da natureza e do volume do material aspirado; da frequência da aspiração e da resposta do hospedeiro. A aspiração para o pulmão é uma condição comum, embora nem sempre percebida pelo paciente e diagnosticada pelo médico. Essa aspiração pode ser de conteúdo gástrico estéril e levar à Síndrome de Mendelson, uma pneumonite química, ou conter material da orofaringe contaminado e causar pneumonia. Nos casos de pneumonia, a etiologia microbiológica é diferente se a aspiração ocorreu na comunidade, instituição ou no hospital, assim como se há ou não necrose pulmonar. De maneira geral, a cobertura antibiótica nos casos onde ocorreu infecção deve visar os Gram-negativos, além do pneumococo. A cobertura para anaeróbios em aspiração deve ocorrer somente quando há doença periodontal grave, escarro pútrido, pneumonia necrotizante ou abscesso pulmonar. Palavras-chave: aspiração, pneumonia aspirativa, pneumonite química ABSTRACT Aspiration may be defined as the oropharyngeal inhalation or stomach contents into the larynx and lower respiratory tract. The main aspirated materials that can cause lung disease are bacteria of the oropharynx, stomach, food particles and foreign bodies. The aspiration syndrome that will follow will depend basically on three factors: the nature and volume of aspirate; the frequency of the vacuum and the host response. Aspiration into the lung is a common condition, though not always perceived by the patient and physician-diagnosed. This aspiration can be sterile gastric contents and lead to Mendelson’s syndrome, a chemical pneumonitis, or contain contaminated oropharyngeal material and cause pneumonia. In cases of pneumonia, the microbiological etiology is different if the aspiration occurred in the community, institution or hospital, as well as whether or not lung necrosis. In general, antibiotic coverage in cases where infection occurred should target Gram-negative, in addition to pneumococcus. Coverage for anaerobes in aspiration should occur only when there is severe periodontal disease, putrid sputum, necrotizing pneumonia or lung abscess. Keywords: aspiration, aspirative pneumonia, chemichal pneumonitis Introdução Mauro Gomes [email protected] 42 Aspiração pode ser definida como a inalação de conteúdo orofaríngeo ou gástrico para a laringe e o trato respiratório inferior. Os principais materiais aspirados Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 que podem causar doença pulmonar são bactérias da orofaringe, ácido gástrico, partículas alimentares e corpos estranhos. A síndrome aspirativa que se seguirá vai depender basicamente de três fatores: da natureza e do volume do material aspirado; da frequência da aspiração e da resposta do hospedeiro. A aspiração oculta, também chamada por silenciosa, é aquela que ocorre antes, durante ou após a deglutição e na ausência de tosse. Na maioria das vezes ela não é percebida pelo paciente e geralmente é um processo indolente, progressivo onde podem ocorrer episódios de dispneia, febre e a formação de opacidades pulmonares radiológicas. 1,2 As doenças pulmonares decorrentes da aspiração didaticamente podem ser agrupadas em aguda, subaguda ou crônica, dependendo do tipo e do volume do material aspirado3,4,5 (Figura 1). A pneumonite por aspiração e a pneumonia por aspiração são lesões agudas do parênquima pulmonar de naturezas diversas. A pneumonite aspirativa é decorrente da lesão química causada pela inalação de conteúdo gástrico estéril, enquanto a pneumonia aspirativa é uma infecção causada pela inalação de inóculos orofaríngeos colonizados por bactérias patogênicas.6,7 Fatores de risco para a aspiração Geralmente as doenças por aspiração são relacionadas aos idosos, pois o envelhecimento retarda a fase oral da deglutição, reduz o clearence faríngeo e o peristaltismo secundário do esôfago.2 No entanto, a aspiração é uma condição que pode ocorrer mesmo em indivíduos normais. Estudo realizado com voluntários sadios observou que metade deles aspirou durante o sono um volume de LESÕES AGUDAS Pneumonite aspirativa • Síndrome de Mendelson • Lesão química causada pela inalação de conteúdo gástrico estéril secreção das vias aéreas superiores contendo uma estimativa de bactérias suficiente para causar infecção pulmonar, embora tal complicação não ocorresse.8 Os principais fatores de risco para disfagia e aspiração são a presença de doenças neurológicas (acidente vascular cerebral, Doença de Parkinson, demências, doenças neuromusculares, rebaixamento da consciência, etc.), DPOC, Doença do Refluxo Gastroesofágico ou doenças esofagianas estruturais (acalasia, doença de esfíncter, neoplasia esofágica, esclerodermia), presença de dispositivos como sondas para alimentação, intubação orotraqueal e traqueostomia 9,10 . O uso de drogas, incluindo o álcool, e sedativos também são fatores que favorecem a aspiração. Pneumonite por aspiração Pneumonite aspirativa (ou Síndrome de Mendelson) é uma síndrome descrita primeiramente por Curtis L. Mendelson, em 1946, em uma série de 61 pacientes obstétricas submetidas à anestesia geral e que aspiraram suco gástrico. Após 36 horas do relato da aspiração, houve recuperação completa da radiografia de tórax sem sequelas clínicas11. A pneumonite aspirativa é caracterizada pela aspiração maciça de conteúdo gástrico regurgitado, frequentemente testemunhada, e que leva a uma lesão pulmonar aguda com repercussões como hipoxemia, febre, taquicardia e radiografia de tórax com opacidades bilaterais. 12,13 Ocorrem em 10% dos pacientes admitidos por abuso de drogas e em 1/3000 anestesias. O conteúdo gástrico provoca maior dano quanto menor for seu pH (<2,5) e maior seu volume aspirado (25 ml).6,14 Na pneumonite aspirativa a lesão por queimadura da LESÕES SUBAGUDAS LESÕES CRÔNICAS Bronquiolite aspirativa difusa Abcesso BOOP Bronquiectasias Pneumonia aspirativa • Infecção causada pela inalação de inóculos orofaríngeos colonizados por bactérias patogênicas Granulomatose miliar Pneumonia Lipoídica Fibrose Pulmonar Fig. 1: Principais lesões pulmonares causadas por aspiração. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 43 árvore brônquica e o comprometimento do parênquima pulmonar possui duas fases: em uma a duas horas ocorre uma lesão cáustica direta, seguida em quatro a seis horas por uma reação inflamatória celular, mediada principalmente por neutrófilos e com a liberação de potentes citocinas, particularmente o Fator de Necrose Tumoral alfa (TNF-alfa) e a interleucina-8, e que pode evoluir para SARA. Os pacientes costumam apresentar um quadro agudo ou abrupto de tosse, dispneia, sibilância, expectoração rósea, taquicardia, febre e até mesmo cianose. Clinicamente pode ser difícil diferenciar pneumonia por aspiração de pneumonite aspirativa. Habitualmente, o conteúdo gástrico é estéril e a incidência de infecção tardia na Síndrome de Mendelson é desconhecida. Em casos de risco de colonização gástrica (obstrução do intestino delgado, uso de inibidores de bomba de prótons, ou uso de sondas gástricas ou enterais), pode haver infecção associada e indicação para uso de antibiótico.6,14 Os achados radiográficos são caracterizados pela presença de opacidades predominantemente alveolares nos lobos inferiores, ou lesões difusas compatíveis com edema pulmonar (Figura 2). O quadro habitualmente se resolve em 48h. Perda de volume lobar sugere obstrução brônquica por partículas de comida ou corpo estranho. Nebulização com broncodilatadores pode ser utilizada em casos de broncoespasmo. Broncoscopia é indicada nos casos de colapso lobar e atelectasia para a avaliação de obstrução intrabrônquica. A broncoscopia é importante também para a coleta de lavado broncoalveolar para a definição de tratamento com antimicrobianos. Como é difícil diferenciar pneumonite de pneumonia aspirativa, o antibiótico deve ser descontinuado se as culturas não apresentarem crescimento bacteriano. O uso de corticoide é controverso, poucos estudos mostram benefício em seu uso, além de haver o relato de aumento da incidência de pneumonia por Gram-negativos em doentes que receberam corticoide sistêmico.12 Fig.2: Corte tomográfico de paciente com Síndrome de Mendelson demonstrando a presença opacidades difusas em vidro fosco predominantemente na região medular dos pulmões. Papel dos anaeróbios O tratamento baseia-se na sintomatologia e na progressão da doença. Na pneumonite aspirativa, o uso de antibióticos, mesmo profiláticos, não é recomendado. Essa prática pode, inclusive, levar à seleção de patógenos resistentes. 15 Antibióticos podem ser considerados em pacientes com obstrução intestinal, em uso de antiácidos ou nos quadros sem resolução em 48h. Se a aspiração foi testemunhada, o doente deve ser posicionado para que sejam evitados novos episódios e realizada, quando possível, a aspiração da cavidade oral. A decisão da intubação orotraqueal dependerá da condição clínica, mas vale lembrar que a ventilação não invasiva pode levar a novas ocorrências de aspiração. 44 Pneumonia por aspiração Pneumonia aspirativa é a lesão pulmonar aguda após aspiração de conteúdo orofaríngeo ou gastroesofágico contendo grande quantidade de bactérias. É Importante causa de morbidade e mortalidade em pacientes institucionalizados e hospitalizados e frequentemente é subdiagnosticada. Não existem marcadores sensíveis e específicos para o diagnóstico da pneumonia por aspiração, o que dificulta a realização de estudos epidemiológicos. Os poucos estudos existentes sugerem que 5-15% dos casos de PAC são por aspiração, e a mortalidade em 30 dias é de 21% e ainda um pouco superior nos casos de Pneumonia Relacionada à Assistência (29,7%). 6,16 A apresentação clínica da pneumonia por aspiração é similar à da PAC e os sintomas não são específicos. A aspiração, nesses casos, quase nunca é testemunhada. Muitas vezes, o quadro é subagudo e indolente e pode levar até semanas para se manifestar. Quando há a presença de anaeróbios, é comum a secreção purulenta em grande quantidade e com odor fétido. Nesses casos, há destruição pulmonar e a formação de cavidades, o que pode também envolver a pleura e ocasionar o empiema. É costume se relacionar as pneumonias por aspiração com os patógenos anaeróbios. Foi Smith, em 1927, quem definiu a importância dos anaeróbios na pneumonia por aspiração que leva ao abscesso pulmonar. Ele observou que as bactérias em pacientes que morreram com abscesso se assemelhavam às bactérias do sulco gengival. Testes em ratos estabeleceram um modelo de sinergia bacteriana entre quatro patógenos para que isso ocorresse: uma espiroqueta não claramente identificada, cocos Gram+ (possivelmente Peptostreptococcus e Peptococcus) e um Gram-negativo (possivelmente Bacteroides melaninogenicus). 17 Posteriormente, na década de 1970, estudos com aspirado transtraqueal demonstraram a presença de flora Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 polimicrobiana com anaeróbios em 60% a 80% dos casos de pneumonia por aspiração, abscesso pulmonar ou empiema, com predomínio de Peptostreptococcus, Bacteróides (Prevotella melaninogenica) e Fusobacterium.18 Após 1980, os poucos estudos sobre o tema passaram a questionar o papel dos anaeróbios nas pneumonias por aspiração, sendo documentada nesses casos a presença de S. pneumoniae, S. aureus, H. influenzae e Enterobacteriaceae. Nas pneumonias aspirativas adquiridas em hospital predominaram os germes Gramnegativos, incluindo Pseudomonas aeruginosa. 3,19 Já em idosos institucionalizados com pneumonia grave por aspiração, a flora polimicrobiana foi presente e a predominância foi de bacilos Gram-negativos (49%), anaeróbios (16%) e S. aureus (12%).20 O fato é que há uma escassez de novos dados sobre o tema, os anaeróbios são de difícil isolamento e geralmente se necessitam procedimentos invasivos para a coleta do material para seu isolamento. Portanto, considera-se hoje que, quando há PAC aspirativa, há o predomínio de S. pneumoniae, H. influenzae, S. aureus e Enterobacteriaceae. Quando a pneumonia aspirativa é hospitalar, o predomínio é de bacilos Gram-negativos (incluindo Pseudomonas aeruginosa). Devem-se considerar os anaeróbios como principais patógenos apenas quando houver doença periodontal grave, escarro pútrido, pneumonia necrotizante ou abscesso pulmonar.6, 19, 21, 22 Tratamento É importante que o antibiótico seja iniciado rapidamente, empiricamente e com cobertura para bactérias Gram-negativas, além do pneumococo. A utilização de uma quinolona antipneumocóccica pode ser indicada para os casos de PAC aspirativa. Para os casos de Pneumonia Relacionada à Assistência, quinolona antipneumocóccica, piperacilina-tazobactam ou ceftazidime podem ser utilizados.6 A cobertura antimicrobiana para agentes anaeróbios somente se justifica nos casos de pneumonia por aspiração em indivíduos com doença periodontal, pneumonia necrotizante ou abscesso pulmonar. A penicilina foi considerada a droga padrão para o tratamento das pneumonias por aspiração até os anos 1980. Estudos posteriores que compararam a penicilina com a clindamicina estabeleceram esta última como agente preferido para o tratamento do abscesso pulmonar e para a pneumonia por aspiração.23,24 O metronizadol, apesar de ser uma droga ativa contra praticamente todos os anaeróbios clinicamente importantes, não atua bem em infecções pulmonares anaeróbicas, pois possui atividade mínima contra a maioria microaerofílica e estreptococos aeróbios que são encontrados na maioria dessas infecções pulmonares. Esses estreptococos são resistentes ao metronidazol e sensíveis à clindamicina. 22 Portanto, Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 pode-se recomendar, na evidência de infecção pulmonar por anaeróbios, o uso da clindamicina ou de um betalactâmico com inibidor de betalactamase. O metronidazol nunca deve ser utilizado em monoterapia para aspiração e sim associado a um betalactâmico. Conclusões A aspiração para o pulmão é uma condição comum, embora nem sempre percebida pelo paciente e diagnosticada pelo médico. Essa aspiração pode ser de conteúdo gástrico estéril e levar à Síndrome de Mendelson, uma pneumonite química, ou conter material da orofaringe contaminado e causar pneumonia. Nos casos de pneumonia, a etiologia microbiológica é diferente se a aspiração ocorreu na comunidade, instituição ou no hospital, assim como se há ou não necrose pulmonar. De maneira geral, a cobertura antibiótica nos casos onde ocorreu infecção deve visar os Gram-negativos, além do pneumococo. A cobertura para anaeróbios em aspiração deve ocorrer somente quando há doença periodontal grave, escarro pútrido, pneumonia necrotizante ou abscesso pulmonar. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. Raghavendran, K, Nemzek J, Napolitano LM, Knight PR. AspirationInduced lung injury. Crit Care Med 2011, 39(4): 818–826. Hammond S, Goldstein LB. 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Arch Intern Med 1990;150:2525–9. 46 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Importância do controle do refluxo gastroesofágico no transplante de pulmão Importance of gastroesophagic reflux control in lung transplantation Rafael Medeiros Carraro1,2, José Eduardo Afonso Junior1,2 1 Grupo de Transplante Pulmonar, Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 2 Programa de Transplante Pulmonar – Hospital Israelita Albert Einstein RESUMO A doença do refluxo gastroesofágico é muito prevalente em pacientes portadores de doenças respiratórias crônicas e muitas vezes interfere em sua evolução. Na população de pacientes transplantados de pulmão sua prevalência é ainda maior, dada a própria abordagem cirúrgica agressiva quantos às medicações imunossupressoras utilizadas. O refluxo gastroesofágico pode, em alguns pacientes, estar envolvido na patogênese da disfunção crônica do enxerto pulmonar, que é o principal limitante à sobrevida desses pacientes em longo prazo. A sensibilidade e especificidade dos sintomas clássicos de refluxo são baixas em pacientes transplantados que habitualmente utilizam inibidores de bomba de prótons. Estudos recomendam a investigação ativa para o problema e, quando identificado, tratamento agressivo, habitualmente cirúrgico. Séries de casos e estudos prospectivos mostram benefício funcional neste grupo de pacientes, tanto estabilizando os valores espirométricos, quanto melhorando tais valores em alguns pacientes com disfunção crônica do enxerto já instalada. Dessa forma, o tratamento cirúrgico do refluxo gastroesofágico tem importante papel no manejo de pacientes transplantados, tanto para prevenção quanto para estabilização da queda da função pulmonar, que oferece limitação significativa à sobrevida. Palavras chaves: Transplante pulmonar, refluxo gastroesofágico, função pulmonar, disfunção crônica do enxerto ABSTRACT Gastroesophageal reflux is very prevalent in patients with chronic respiratory diseases and often interfere in its evolution. In the lung transplant patients, the prevalence is even higher, given the very aggressive surgical approach and the immunosuppressants drugs used. Gastroesophageal reflux can, in some patients, be involved in the pathogenesis of chronic lung allograft dysfunction, that is the main limiting long term survival issue. The sensitivity and specificity of the classic reflux symptoms are low in transplant patients who regularly use proton pump inhibitors. Studies recommend the active investigation to the problem and, when identified, aggressive treatment, usually surgery. Case series and prospective studies have shown functional benefit in this group of patients, stabilizing spirometric values, and enhancing values in some patients with chronic allograft dysfunction already installed. Thus, the surgical treatment of gastroesophageal reflux plays an important role in the management of lung transplant patients, both for prevention and for stabilization of the decline in lung function, which offers significant limitation to survival. Keywords: Lung transplant, gastroesophageal reflux, pulmonar function, chronic allograft dysfunction Introdução O transplante pulmonar (TXP) é um tratamento bem estabelecido para diversas pneumopatias terminais, José Eduardo Afonso Júnior [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 conferindo a pacientes rigorosamente selecionados melhores chances de sobrevida e qualidade de vida. Desde o primeiro transplante pulmonar realizado com sucesso em 1983, cerca de 60000 transplantes foram realizados em todo mundo e o número absoluto de transplantes é crescente a cada ano que passa1. Nos últimos vinte anos, houve melhora progressiva na sobrevida destes pacientes. No entanto, esse ganho de sobrevida se deu basicamente à melhor sobrevida no 47 período perioperatório, conseqüência do entendimento da seleção de pacientes mais adequados ao procedimento, melhoras na técnica cirúrgica e preservação do enxerto, melhor manejo anestésico e, principalmente melhor manejo das complicações clínicas perioperatórias, como disfunção primária do enxerto, infecções e rejeição. A principal causa de mortalidade a partir de um ano de transplante é a disfunção crônica do enxerto (DCE). Nesse contexto, as medidas de prevenção do desenvolvimento da DCE são extremamente valorizadas, uma vez que o arsenal terapêutico para essa entidade é escasso e de efetividade questionável. Um fator de risco bem estudado na literatura para desenvolvimento da disfunção crônica do enxerto é, justamente, o refluxo gastroesofágico (RGE). Refluxo Gastroesofágico e Transplante Pulmonar A importância da avaliação do Refluxo Gastroesofágico (RGE) como causa, ou fator contribuinte do agravamento das doenças respiratórias, tem sido estudada nas últimas décadas, sendo bem estabelecida atualmente esta associação.2 Estudos em pacientes em lista de espera para transplante pulmonar,3,4 assim como em pacientes com Fibrose Cística 5 e doenças pulmonares intersticiais, 6 comprovam este fato. Quando nos voltamos para o RGE no contexto do transplante pulmonar, nos deparamos com uma elevada associação de prevalência, tanto em pacientes em lista de espera para o procedimento, quanto após a realização da cirurgia.7 Comprovadamente o enxerto pulmonar apresenta uma deterioração de seus principais mecanismos de defesa, sobretudo a redução da efetividade do clearance mucociliar, e condições inerentes à técnica cirúrgica, destacando-se a lesão do nervo vago durante a pneumonectomia, estão relacionados ao retardo do esvaziamento gástrico, e consequente maior propensão a episódios silenciosos de broncoaspiração, numa população de pacientes que não apresentam sintomas clássicos da DRGE, pelo uso frequente de inibidores de bomba de prótons.2 O interesse neste tópico vem de encontro ao melhor entendimento do principal fator limitante de sobrevida após o transplante pulmonar, a disfunção crônica do enxerto pulmonar, sobretudo na sua principal variante fenotípica – a Síndrome de Bronquiolite Obliterante.8 Segundo os últimos consensos publicados em 2014 pela International Society for heart and Lung Transplantation,9,10 define-se como disfunção crônica do enxerto pulmonar, o declínio persistente (período maior que 3 semanas) dos volumes pulmonares aferidos pela espirometria (Capacidade Vital Forçada – CVF; e/ou Volume Expiratório Forçado no primeiro segundo – VEF1),maior que 20% em relação aos maiores valores alcançados pelo paciente após o transplante, e afastadas outras causas reversíveis desta perda, como rejeição aguda celular, infecções ou 48 estenose de anastomose brônquica. Apesar dos avanços das estratégias de imunossupressão nas últimas décadas, a incidência da disfunção crônica do enxerto e consequente morbimortalidade relacionada, permanecem inalteradas, o que motivou a pesquisa de fatores não imunológicos como contribuintes aos imunológicos, no desenvolvimento desta condição clínica. Desde o primeiro relato de caso em publicado em 2000,11 em que foi documentada a melhora de função pulmonar em paciente com síndrome de bronquiolite obliterante, após realização de fundoplicatura gástrica, diversos estudos vêm demonstrando o papel da DRGE como fator de risco para disfunção crônica do enxerto pulmonar, e mais importante, a cirurgia antirefluxo (CAR) como potencial terapia para prevenção ou reversão deste agravo. Os principais pontos de interesse no controle do RGE serão representados a seguir: 1. A sensibilidade e especificidade dos sintomas clássicos de RGE como disfagia, pirose e regurgitação é muito baixa para a determinação de pacientes de risco para microaspirações pulmonares ou refluxo faríngeo12,13. Tal fato se deve ao uso muito frequente de inibidores de bomba de prótons e medicações pró cinéticas nesta população, portanto não deverá ser este o fator motivador para investigação diagnóstica. 2. A detecção de RGE por impedância esofágica, seja proximal ou distal, e sobretudo quando associado a lentificação do esvaziamento esofágico, na avaliação pré operatória de pacientes em lista para transplante pulmonar, está correlacionada à maior ocorrência de disfunção do enxerto pulmonar e episódios de rejeição aguda celular durante o primeiro ano, apesar de os mecanismos envolvidos ainda sejam incertos14, e aqueles pacientes tratados com fundoplicatura gástrica antes ou precocemente (até 3 meses) após o transplante pulmonar, apresentam redução destes desfechos15. 3. A cirurgia antirefluxo (CAR), sendo mais extensivamente estudada a fundoplicatura gástrica a Nissen, apresenta baixas taxas de complicações e resultados muito encorajadores de melhora de função pulmonar, desde as primeiras séries retrospectivas descritas na década de 2000. Davis descreveu em 200316 a experiência da Universidade de Duke, aonde dentre 76 pacientes com diagnóstico de RGE por exame de pHmetria esofágica, 26 apresentavam diagnóstico de síndrome de bronquiolite obliterante e foram submetidos a CAR; 16 pacientes apresentaram melhora dos valores de função pulmonar e 13 saíram dos critérios de bronquiolite obliterante. Desde então vários autores vêm descrevendo os benefícios em ganho de função pulmonar e menor incidência de disfunção crônica do enxerto pulmonar, sobretudo relacionados à realização precoce do procedimento após o transplante pulmonar (nos primeiros 3 a 6 meses).17,18 Em resumo, o RGE constitui um importante fator de Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 agravo para a função do enxerto pulmonar, apresentando uma elevada prevalência tanto em pacientes em lista de espera como após a cirurgia. Uma avaliação funcional completa deve ser realizada, a despeito da existência de sintomas gastrintestinais da doença, em todos os pacientes inseridos no programa, considerando-se o tratamento cirúrgico como principal alternativa de controle, mesmo naqueles pacientes que não apresentem alterações funcionais compatíveis com disfunção do enxerto pulmonar. Referências bibliográficas 1. Yusen RD, Edwards LB, Kucheryavaya AY, Benden C, Dipchand AI, Goldfarb SB, et al. 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Deve-se ainda destacar que diferentemente de algumas comorbidades, uma parcela de pacientes apresenta “refluxo silencioso”, sendo necessário lançar mão de exames complementares para confirmar ou afastar essa condição. Estudos avaliando o efeito do tratamento da doença do refluxo nos desfechos da asma são controversos. Alguns subgrupos de asmáticos podem ter benefício com o tratamento da doença do refluxo gastroesofágico, mas parece difícil prever aqueles que vão apresentar uma resposta satisfatória. Portanto, a decisão de tratar essa comorbidade deve ser individualizada e a que se levar em consideração a sua possível influência sobre o controle da asma, além de avaliar cuidadosamente os efeitos do tratamento. Palavras chaves: asma, controle, refluxo gastroesofágico ABSTRACT Comorbidities prevalence is high in difficult to control asthma patients including gastroesophageal reflux disease. Studies investigating the relationship between asthma and gastroesophageal reflux disease and vice-versa are still conflicting. However, it should be noted, unlike some comorbidities, a proportion of patients’ experience “silent reflux”, being necessary to use additional tests to confirm or rule out this condition. Studies evaluating the effect of reflux disease treatment on asthma outcomes are controversial. Some asthmatics subgroups may benefit from treatment of gastroesophageal reflux disease, but it seems difficult to predict who will present a satisfactory answer. Therefore, the decision to treat this comorbidity should be individualized and must take into account possible influence on asthma control and the effects of treatment should be carefully evaluated. Keywords: asthma, control, gastroesophageal reflux Introdução Diversas comorbidades podem estar associadas a asma e são cada vez mais reconhecidas como fatores relevantes, especialmente em pacientes com controle inadequado da asma. Entre as comorbidades mais frequentemente relatadas em asmáticos está a doença do refluxo gastroesofágico Regina Maria de Carvalho Pinto Avenida Enéas de Carvalho Aguiar, 44 Cerqueira César - CEP 05403-900 Fone: 26615191 [email protected] 50 (DRGE),1 cuja associação com a asma é descrita desde 1892 pelo canadense Sir Willian Osler. A prevalência de DRGE na população geral é de 10-20%, na dependência dos critérios utilizados para diagnóstico. Em asmáticos, os estudos mostram prevalência de 15 a 82%, quando avaliados por pHmetria.2 Essa disparidade na prevalência pode ser explicada pelo fato de que a asma é uma doença de amplo espectro e esses estudos avaliaram populações heterogêneas, com diferentes gravidades. Sintomas de DRGE são reportados em 50% a 80% dos asmáticos, enquanto a prevalência de alterações na pH metria é de 12% a 85%.3 Outro ponto importante a ser considerado é de que uma porcentagem significativa dos pacientes apresenta “refluxo silencioso” e não relatam os sintomas clássico de refluxo.4 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Asma de difícil controle e DRGE A Asma de Difícil Controle (ADC) inclui pacientes com asma não controlada apesar de terapêutica apropriada e ajustada ao nível de gravidade. Os dados de literatura, em conjunto, indicam que diversos fatores estão associados à resposta insatisfatória ao tratamento, contribuindo para a dificuldade de controle e nesse contexto estão incluídas as comorbidades. A prevalência de comorbidades é particularmente alta nesse grupo e entre elas está a DRGE. 5,6 A prevalência de DRGE é maior nesse grupo de asmáticos, variando entre 60 a 80%.5 Na coorte do National Heart, Lung, and Blood Institute (NHLBI), uma das maiores coortes de asma grave que avaliou a prevalência de comorbidades, reportou porcentagem significativamente maior de pacientes com DRGE entre os asmáticos graves (41%), quando comparados aos leves-moderados (12–16%), respectivamente.7 Esses achados vão de encontro aos registros da British Thoracic Society (BTS) 8 e do registro Belga de asma grave, com 41,4% e 36% de pacientes com DRGE, respectivamente.9 Um painel de experts discutiu a caracterização de asma grave e apresentou uma proposta interessante para classificá-la, destacando um grupo denominado de Asma de Difícil Tratamento, no qual a dificuldade de controle está relacionada a questões como falta de aderência ao tratamento e de comorbidades, e nesse cenário está a DRGE.10 Um estudo11 da década de 90, apesar de ter alguns problemas metodológicos, nos traz dados interessantes uma vez que demostra que após aplicação de uma avaliação sistemática para identificar as causas de ADC, somente 26% dos pacientes permaneceram com dificuldade de controle da asma, indicando que, com a aplicação de uma avaliação sistemática foi possível a identificação de pelo menos um fator que, quando resolvido, permitiu o controle da asma. Neste estudo, entre os pacientes definidos como asma grave refratária, que permaneceram de difícil controle, a DRGE, diagnosticada por parâmetros clínicos (sintomas), foi identificada como o fator mais comum de exacerbação. Um estudo de coorte que investigou os riscos específicos para múltiplas exacerbações de asma apontou diversos fatores, entre eles a DRGE, chamando a atenção de que pacientes com exacerbações frequentes são um grupo de particular preocupação para identificação dessa comorbidade.12 Outro estudo no Reino Unido, mostrou que 14,6% dos asmáticos apresentavam DRGE e que entre outros fatores, a DRGE foi um dos relacionados ao aumento da probabilidade de ocorrência de duas ou mais exacerbações de asma (OR 1,12 (1,05 – 1,20): p= 0,001).13 Em condições especiais, mas comumente encontradas na prática clínica, como por exemplo, pacientes idosos com asma, é comum a presença de diversas comorbidades que podem estar associadas à dificuldade de controle da Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 asma, como doenças cardiovasculares, obesidade, tabagismo associado a DPOC e a DRGE.14 Em outra coorte, a DRGE foi mais comum entre os asmáticos graves, sendo que a maior incidência foi observada no grupo de asma grave tabagista/ex-tabagista vs. asma grave não tabagista (63,6% vs. 46,7%); p=0,004).15 Uma análise de custo-efetividade das estratégias diagnósticas disponíveis para DRGE concluiu que a melhor abordagem custo-efetiva é a terapia empírica com inibidores da bomba de prótons (IBP), seguida por pHmetria-24h apenas para os pacientes que não responderam ao tratamento.16 Portanto, o passo inicial para pacientes com suspeita de DRGE como fator de dificuldade de controle da asma pode ser a realização de um tratamento empírico de supressão ácida, preferencialmente com IBP. Havendo persistência dos sintomas, pode-se realizar a pHmetria-24h com o objetivo de se identificar uma falha na supressão ácida ou considerar outro diagnóstico. Vale ressaltar que a presença de sintomas de alarme como disfagia, odinofagia, anemia, emagrecimento ou hemorragia digestiva indica como abordagem inicial a realização de endoscopia digestiva alta.17 Um estudo prospectivo18 realizado no ambulatório de asma do Hospital das Clinicas-FMUSP avaliou pacientes com asma grave não controlada, quanto à presença de comorbidades e fatores agravantes. Os pacientes incluídos foram seguidos em acompanhamento sistematizado, com tratamento padronizado e otimizado da asma. Um grupo atingiu controle (GC) e outro não (GNC), sendo que 57% dos pacientes do GNC e 53% do GC, apresentavam sintomas sugestivos de refluxo gastroesofágico, sendo que não houve diferença significativa entre os grupos (p = 0,978) (tabela 1). Tabela 1: Asma grave de difícil controle e Comorbidades Rinossinussite DRGE Diabetes mellitus DPV HAS Osteoporose Piora período menstrual Piora com anti-inflamatório Roncos noturnos Sonolência diurna GNC (n=36/66,7%) 31 (97) (n=32) 17 (57) (n=30) 5 (14) 2 (6) (n=34) 16 (44) 5 (14) 10 (36) (n=28) 6 (17) 25 (69) 19 (53) GC (n=18/33,3%) 13 (100) (n=13) 8 (53) (n=15) 5 (28) 1 (6) (n=16) 6 (33) 5 (28) 0 (0) * 1 (6) 12 (67) 7 (39) GNC: grupo não controlado; GC: grupo controlado; DRGE: doença do refluxo gastroesofágico; DPV: disfunção de prega vocal; HAS: hipertensão arterial sistêmica; n (%); * p<0,05 Nesse mesmo estudo foi avaliada a relação entre sintomas informados pelos pacientes, referentes às principais comorbidades da asma e ferramentas diagnósticas. Utilizando a tomografia de seios paranasais 51 para avaliar rinossinusite, 83% dos pacientes que informaram sintomas apresentavam alterações na tomografia de seios paranasais e somente 17% dos pacientes sem sintomas apresentavam alguma alteração na tomografia. (p=0,013) (Figura 1). Entretanto, quando avaliamos os sintomas referidos de refluxo gastroesofágico e os dados da pHmetria, não houve diferença significativa na porcentagem de pacientes com e sem sintomas referidos de refluxo e pHmetria positiva ou negativa (p = 0,794) (Figura 2).19 Esses achados em conjunto permitiram concluir que nesses pacientes com ADC, a presença de sintomas foi suficiente para o diagnóstico de rinossinusite, mas para DRGE, não. Portanto, para esses pacientes com asma grave de difícil controle, sintomas de rinossinusite, foram suficientes para permitir a introdução de tratamento especifico, já a DRGE deve ser investigada de acordo com protocolos específicos como causa da dificuldade de controle. Fig. 1: Porcentagem de pacientes com e sem sintomas de rinossinusite e tomografia computadorizada de seios da face alterada ou normal. Fig. 2: Porcentagem de pacientes com e sem sintomas de DRGE e pHmetria esofágica de 24 horas positiva ou negativa. Devido particularmente à grande prevalência de “DRGE silenciosa” , o diagnóstico pode ser subestimado. Exames tradicionais, como endoscopia digestiva alta (EDA) e radiografia contrastada de esôfago, estômago e duodeno (EED), podem ser úteis no diagnóstico e permanecem sendo importantes ferramentas para detecção de complicações esofágicas. Contudo, podem não confirmar a DRGE, e 52 mesmo quando o fazem, não estabelecem o efeito causal entre a DRGE e os sintomas extra-esofágicos. A pHmetria24h é o exame mais sensível para detectar a DRGE e desempenha um importante papel na avaliação desses pacientes, mas pode não confirmar a relação causal. Desta forma, para se estabelecer o diagnóstico, o teste empírico com medidas anti-refluxo (comportamentais e farmacológicas) pode ter bom rendimento, devendo-se considerar que por vezes requerem uma terapia mais agressiva e por um período mais prolongado em relação ao preconizado para DRGE com sintomas típicos e vale ressaltar que as medidas comportamentais estão indicadas a todos os pacientes com suspeita de DRGE. Deve-se levar em consideração, ainda, a possibilidade de ocorrência de refluxo não ácido, que não é detectado por estes métodos diagnósticos. 20 Nesses casos é necessário lançar mão de um outro método, a monitorização da impedância intra-esofágica. É um exame que realiza o registro do conteúdo refluído independentemente de seu pH. Ele é capaz de identificar com precisão os episódios de refluxo e, principalmente quando realizado juntamente com a pHmetria-24h, pode diferenciar entre refluxo ácido e alcalino. Permite ainda determinar a associação temporal entre os episódios de refluxo e o sintoma respiratório, além de identificar os pacientes que vão ou não ser beneficiados com a inibição da secreção ácida. A monitorização da impedância intraesofágica é a ferreamente de referência para detectar o refluxo não ácido.21,22 Tratamento Alguns estudos clínicos demonstram que a terapia anti refluxo geralmente tem pouco ou nenhum efeito no controle da asma. 23,24 Entretanto, esses achados podem ser decorrência da falta de consenso sobre a dose utilizada e duração do tratamento, bem como em relação à falta de medidas objetivas de avaliação da resposta. Por outro lado, alguns ensaios clínicos randomizados (RCT) utilizando inibidores de bomba de prótons (IBP) e comparando-os com placebo, em asmáticos, com sintomas de DRGE, demostraram redução nas exacerbações e melhora de QV.25,26 Em pacientes com ADC que receberam tratamento com IBP, ocorreu melhora significativa no escore global de sintomas de asma somente nos pacientes com diagnóstico de DRGE confirmado pela pHmetria.27 Em relação aos parâmetros funcionais, não observaram diferenças no PEF e no VEF1. Ainda em pacientes com ADC, um estudo comparou o tratamento com IBP vs. placebo. O grupo tratado não apresentou melhora dos sintomas de asma, função pulmonar e uso de medicação de resgate, entretanto, ocorreu redução significativa das exacerbações e melhora da qualidade de vida.25 Diferentemente dos anteriores, um outro estudo avaliou Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 diversas características de pacientes com ADC e comparouos aos que responderam ao tratamento para a asma. Dos pacientes que realizaram pHmetria esofágica de 24 horas para investigação de DRGE, 31 (57%) pacientes apresentaram alterações compatíveis com DRGE. Comparando o grupo com ADC ao que respondeu ao tratamento da asma, observou-se refluxo em 58% e 56%, respectivamente, não havendo diferença significativa na prevalência de DRGE entre os que responderam e os que não responderam ao tratamento da asma.28 No Reino Unido, um grupo de pesquisadores realizou pHmetria de 24 horas em asmáticos, sendo que 75% apresentaram pHmetria positiva para DRGE. Comparando o grupo que respondeu adequadamente à terapia para asma com os que não responderam, não encontrou diferença na prevalência de DRGE entre os grupos.2 Esses dois estudos, utilizando pHmetria esofágica de 24 horas, mostraram prevalência semelhante de DGRE em asmáticos responsivos ou não à terapia para asma. Esses achados aumentam a possibilidade de que sejam duas condições comuns coincidindo no mesmo paciente e levantaram o questionamento sobre a importância que é dada a terapia de refluxo no manejo de pacientes com ADC. Uma meta-análise que avaliou a eficácia do uso empírico de IBP no tratamento de asmáticos demonstrou melhora discreta, mas significativa, a favor do uso de IBP. Entretanto, existem críticas em relação à metodologia de alguns estudos incluídos nessa análise. 29 Em uma sub análise, separando estudos com confirmação e sem confirmação de refluxo, os dois grupos mostraram melhora discreta, mas significativa, do Pico Expiratório de Fluxo (PEF) matutino, por outro lado, o melhor benefício ocorreu no grupo com diagnóstico confirmado de refluxo. Não houve benefício em relação ao escore de sintomas, Volume Expiratório Forçado no primeiro segundo (VEF1) e qualidade de vida (QV). 29 Frente a esses achados, os autores concluíram que as evidências são insuficientes para recomendar o uso empírico de IBP na rotina do tratamento de asmáticos. Conclusão Existem diversos estudos abordando asma e DRGE, entretanto, ainda são escassos aqueles que abordam a ADC e nesse cenário os resultados são ainda mais controversos. Vários fatores dificultam a comparação dos resultados, especialmente as diferenças nos critérios utilizados para diagnóstico de asma e de DRGE, muitos com diagnóstico de ambas a partir de critérios clínicos; a diferença nos critérios utilizados para o diagnóstico de ADC; as diferenças no manejo terapêutico tanto da asma quanto da DRGE, incluindo em ambos a instituição de mudanças no estilo do vida, seja na asma pelo controle ambiental, seja na DRGE pelas medidas comportamentais anti refluxo; além de grande variabilidade nos desfechos Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 avaliados nesses estudos. Desta forma podemos concluir que a prevalência de DRGE na ADC é alta. Existem evidências que sugerem que a DRGE pode contribuir como fator de dificuldade de controle da asma em um subgrupo de ADC. Esses fatores podem ter implicações na prática clínica e, portanto, a DRGE deve ser investigada nestes pacientes, especialmente ressaltando a possibilidade de DRGE “silencioso”. O impacto do tratamento ainda não está bem estabelecido, existindo pontos controversos e evidências insuficientes para definir a melhor conduta. De qualquer forma, a recomendação da ATS/ERS 5 é de se tratar adequadamente a DRGE e reavaliar a resposta à terapêutica. Referencias Bibliográficas 1. Boulet LP, Boulay MÈ. Asthma-related comorbidities. Expert Rev Resp Med 2011; 5(3): 377–393. 2. Leggett JJ, Johnston BT, Mills M, Gamble J, Heaney LG. Prevalence of gastroesophageal reflux in difficult asthma: relationship to asthma outcome. Chest 2005;127(4):1227-31. 3. Havemann BD, Henderson CA, El-Serag HB. The association between gastrooesophageal reflux disease and asthma: a systematic review. Gut 2007; 56, 1654–1664. 4. Harding SM, Guzzo MR, Richter JE. The prevalence of gastroesophageal reflux in asthma patients without reflux symptoms. Am. J. Respir. Crit. Care Med. 2000;162, 34–39. 5. 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Pulmonary aspiration and nontuberculous mycobacteria: Is it a real risk factor? Maria Cecília Nieves Maiorano de Nucci1; Jorge Barros Afiune2 Médica Pneumologista e Tisiologista do Instituto Clemente Ferreira. Pós graduanda da Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2 Médico Pneumologista e Tisiologista do Instituto Clemente Ferreira Membro da Comissão de Tuberculose da SBPT 1 RESUMO Distúrbios esofágicos estão envolvidos na fisiopatologia de diversas doenças respiratórias como Asma e Fibrose Pulmonar Idiopática. Doença pulmonar por Micobactérias não tuberculosas (MNT) é uma condição grave e sua incidência vem aumentando nos últimos anos. Muitos pacientes com MNT não têm um fator de risco conhecido para a doença e por isso faz-se necessário entender melhor os mecanismos fisiopatológicos que levam ao desenvolvimento dessa doença. A associação entre doença pulmonar por MNT e distúrbios esofágicos como doença do refluxo esofágico (DRGE), acalasia e aspiração tem sido descrita na literatura há alguns anos, porém não está bem estabelecida a causalidade nessa associação e o papel das doenças esofágicas no desenvolvimento e progressão da doença pulmonar por MNT. Considerando-se a possibilidade de associação entre essas condições, pacientes com infecção pulmonar por MNT devem ser investigados em relação a patologias do esôfago, já que muitos deles podem ser assintomáticos. Estudos prospectivos maiores são necessários para avaliar o real papel das doenças esofágicas no desenvolvimento e progressão de doença pulmonar por MNT. Palavras Chaves: Infecções por Micobactéria não tuberculosa, pneumonia aspirativa, refluxo gastroesofágico ABSTRACT Esophageal Disorders have been implicated in the pathophysiology of various respiratory diseases such as asthma and idiopathic pulmonary fibrosis. Lung disease due to nontuberculous mycobacteria (NTM) is a serious disease and its incidence has been increasing in recent years. Many patients with NTM does not have a known risk factor for the disease and therefore it is necessary to better understand the pathophysiological mechanisms that lead to the development of this condition. The association between NTM disease and esophageal disorders such as gastroesophageal reflux disease (GERD), achalasia and aspiration have been described in the literature, but is not well established the nature of this association and the real role of esophageal diseases in the development and progression of NTM disease. Whereas there is evidence of an association between these conditions, patients with pulmonary NTM infection should be investigated for esophageal disorders, since many of them may be asymptomatic. Larger prospective studies are needed to evaluate the real role of esophageal diseases in the development and progression of pulmonary disease. Keywords: Nontuberculous mycobacteria, aspiration, gastroesophageal reflux Diversos distúrbios de motilidade esofageana como aspiração, acalasia, DRGE e hérnia de hiato estão relacionados com doenças pulmonares. Maria Cecília Nieves Maiorano de Nucci Rua Croata, 702, Lapa, CEP 05056-020, São Paulo-SP Tel: +55 11 976638676 [email protected] Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Microaspirações acontecem em muitas pessoas, principalmente durante o sono, porém geralmente sem repercussão clínica. A depender de condições individuais e do inóculo de microorganismos a aspiração pode ter consequências relevantes. Sintomas de DRGEsão muito frequentesna população geral e a DRGE tem sido implicada na fisiopatologia de diversas doenças respiratóriascomo asma, fibrose pulmonar idiopática, disfunção laríngea e também da tosse crônica. 1,2 Existe documentação na 55 literatura da relação entre doença pulmonar por MNT e aspiração, acalasia e DRGE.1 Em indivíduos HIV negativos, fatores associados ao desenvolvimento de doença pulmonar por MNT e sua progressão são desconhecidos. Sabe-se que a exposição é enorme, vez que, além do solo, até a água tratada pode ser ambiente de crescimento para as MNT. É possível que algum grau de imunodepressão, local ou sistêmica, relacionada a redução do desempenho da imunidade de base celular, facilite o crescimento desses microorganismos. Pacientes com a doença tipicamente são homens de meia idade com doença crônica pulmonar prévia, como DPOC e sequelas de tuberculose, que desenvolvem cavidades e nódulos. Outra forma da doença costuma acometer mulheres, não tabagistas, sem doenças pulmonares prévias e o envolvimento pulmonar se dá sob a forma de nódulos, bronquiolite e bronquiectasias envolvendo lobo médio e língula.2Principalmente nessa segunda forma da doença existem dúvidas em relação aos mecanismos de desenvolvimento e fatores de risco. Ao longo dos anos percebeu-se que alguns pacientes com infecção pulmonar por MNT, principalmente as de crescimento rápido, possuíam alterações esofágicas. A associação entre MNT e acalasia foi reportada pela primeira vez em 19333e o M.fortuitum foi identificado como o patógeno mais comum nessa situação.4 M. fortuitum, M. chelonae e M.abscessus são classificados como micobactérias de crescimento rápido. São agentes ambientais saprófitas, presentes na água e no solo. Doença Pulmonar pelo M. fortuitum é semelhante à doença causada pelo M. abscessus. 5 Embora o M. abscessus seja responsável pela maioria das doenças pulmonares causadas por micobactérias de crescimento rápido, uma exceção importante é o grupo de pacientes que possuem doenças esofageanas, no qual o M. abscessuse o M. fortuitumtêm uma incidência semelhante5. Fora desse contexto a doença pulmonar por M.fortuitum é rara6. Existem vários relatos de infecção pulmonar por micobactérias em pacientes com acalasia, sugerindo uma associação causal. O aspecto radiológico mais comum em pacientes com acalasia e MNT são áreas extensas de opacidades confluentes, bilaterais, semelhante ao achado radiológico de pneumonia aspirativa. 7 Pneumonia lipoídica também foi descritaem pacientes com infecção pulmonar por MNT de crescimento rápido.5 As figuras 1 e 2 mostram o aspecto radiológico de acometimento pulmonar por M.fortuitum. Hadjiliadis et al descreveram um caso de uma paciente de 63 anos com acalasia e infecção pulmonar por M. chelonae e um homem de 47 anos que fazia ingestão crônica de óleo mineral e desenvolveu pneumonia lipoidica e infecção pulmonar por M. fortuitum. Levantamento da literatura de 1966 a 1997 encontrou 18 casos de infecção pulmonar causada por MNT de crescimento rápido em pacientes com distúrbios esofágicos, acalasia e pneumonia lipoidica. Acalásia e pneumonia lipoidica parecem estar associados com o desenvolvimento de doença pulmonar por MNT e o tratamento da doença esofágica pode prevenir a ocorrência e facilitar o tratamento dessas infecções.4 Koh et al 8, publicaram um estudo envolvendo 58 pacientes com MNT (forma bronquiectásica nodular) que identificou uma prevalência de 26% de DRGE, sendo que uma porcentagem significativa desses pacientes não tinha Fig. 1: Infiltrado bilateral extenso em paciente com diagnóstico de infecção pulmonar por M. fortuitum e acalasia (complicação de pós operatório tardio de fundoplicatura por DRGE grave). Fig. 2: Aspecto tomográfico das lesões e dilatação esofágica importante no primeiro corte. 56 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 sintomas típicos de DRGE. A população em estudo constituíase de 27 pacientes com infecção por Mycobacterium aviumcomplex(MAC), uma micobactéria de crescimento lento, e 31 pacientes com M. abscessus. Mostraram também que pacientes com DRGE tinham maior probabilidade de ter escarro positivo e que o acometimento pulmonar por bronquiolite ou bronquiectasia era mais extenso nos pacientes com DRGE quando comparado aos pacientes sem DRGE, o que sugere que a DRGE possa ter um papel importante no desenvolvimento e na progressão da doença pulmonar por MNT. Hadjiliadis et al4também descreveram a presença de distúrbios esofageanos em pacientes com infecção pulmonar por micobactérias de crescimento rápido, como M. fortuitum e M. abscessus. Griffith et al6 mostraram que 10 de 154 pacientes (6%) com diagnóstico de infecção pulmonar por MNT de crescimento rápido tinham algum tipo de distúrbio gastroesofágico. A associação de infecção por MNT de crescimento rápido com distúrbios esofágicos sempre foi descrita com maior frequência, até que em 2007 Thomson et al2publicaram outro estudo mostrando que DRGE, uso de antiácidos e aspiração clinicamente suspeita são mais comuns em indivíduos com doença pulmonar por MAC do que em indivíduos sem a doença. A incidência de DRGE foi de 44,2% no grupo dos pacientes com infecção pulmonar por MAC e 27,6% nos pacientes não infectados. A incidência de refluxo em pacientes com MAC também foi maior do que a reportada previamente em estudos populacionais. Apesar desses achados, o estudo possui limitaçõese a principal foi a não utilização do teste padrão ouro para o diagnóstico de DRGE (o diagnóstico era feito clinicamente). Essa é uma evidência de que as micobactérias de crescimento lento também podem estar associadas a doenças esofágicas. Conforme descrito anteriormente, as publicações envolvendo o tema restringem-se a relatos e séries de casos e estudos transversais. Portanto, não há evidências suficientes para entender os mecanismos envolvidos e não se pode, ainda, estabelecer uma relação definitiva de causalidade entre doenças esofágicas e infecção por MNT. Existem evidências de que existe associação de MNT com distúrbios da motilidade esofágica, incluindo aspiração, porém a natureza dessa associação permanece incerta. A fisiopatologia não está bem definida, porém especula-se que os bacilos podem ser ingeridos, resultando em colonização do trato gastrointestinal de indivíduos imunocompetentes. Regurgitação e aspiração de conteúdo gástrico causariam contaminação da árvore brônquica o que poderia levar à infecção pulmonar. Acredita-se que distúrbios gastroesofágicos podem contribuir para o desenvolvimento e progressão de doença pulmonar por MNT pela exposição crônica do parênquima pulmonar à conteúdo gástrico ácido. Uma hipótese Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 alternativa é que pacientes com doença por MNT tenham um aumento do risco de desenvolver DRGE por um aumento do gradiente de pressão através do diafragma por tosse crônica e alterações na mecânica do diafragma.9 Apesar de pouca evidência, parece que realmente existe uma associação entre distúrbios esofágicos e doença pulmonar por MNT. Como muitos pacientes portadores de DRGE podem ter sintomas atípicos ou até mesmo serem assintomáticos e episódios de aspiração podem ser silenciosos, é necessário investigar ativamente MNT em pacientes com DRGE, aspiração crônica e outros distúrbios da motilidade esofágica, principalmente em pacientes com pneumonia aspirativa que não melhoram com antibioticoterapia convencional. Notavelmente são necessários estudos prospectivos maiores para elucidar as questões relacionadas ao papel das doenças esofágicas como um fator de risco para o desenvolvimento e progressão da infecção pulmonar por MNT. 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Samia Zahi Rached1, Rodrigo Abensur Athanazio2 Médica Pneumologista da Disciplina de Pneumologia do Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 2 Médico Pneumologista da Disciplina de Pneumologia do Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 1 RESUMO Bronquiectasias apresentam-se como tosse produtiva e infecções de repetição e apresentam diversas causas. A aspiração de conteúdo gástrico nas vias aéreas é considerada uma possível etiologia e nosso objetivo é a revisão das evidências de associação entre estas duas patologias. A literatura traz pacientes portadores de aspiração crônica com doença bronquiectásica associada, muitas vezes assintomáticos respiratórios. Além disso, há evidências também de uma maior prevalência de refluxo gastro-esofágico em pacientes com bronquiectasias, com alguns estudos demonstrando pior função pulmonar, maior extensão radiológica e mais exacerbações quando as duas patologias estão associadas. Existe relação entre bronquiectasias e aspiração, podendo ser uma etiologia ou um fator de piora. No entanto, os estudos ainda são em pequeno número e deixam muitas dúvidas. Há necessidade de investigação sempre que suspeita e tratamento sempre que confirmado, além de estudos futuros para melhor compreensão desta associação e suas implicações. Palavras chaves: aspiração, bronquiectasia, doença de via aérea ABSTRACT Bronchiectasis patients present themselves as productive cough and recurrent infections. Aspiration of gastric contents into the airways is considered a possible etiology and our goal is to review the association between these two pathologies. Literature reveals patients with chronic aspiration associated with bronchiectasis, often without respiratory symptoms. In addition, there is also evidence of a higher prevalence of gastroesophageal reflux in patients with bronchiectasis, with some studies demonstrating impaired pulmonary function, greater radiological extent and more exacerbations when the two conditions are associated. There is an association between bronchiectasis and aspiration and the first may be an etiology or an worsening factor. However, studies are still few and many open questions. Patient investigation should be performed whenever suspicion of aspiration or gastroesophageal reflux, and treatment whenever it has been confirmed. Moreover, future studies should me done to better understand this association and its implications. Keywords: aspiration, bronchiectasis, airway disease Introdução Samia Zahi Rached Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44, CEP 05403-900, São Paulo/SP Tel. 11-2661-5695 [email protected] 58 Bronquiectasias caracterizam-se clinicamente por tosse produtiva e infecções de repetição, associadas a dilatações bronquicas irreversíveis na avaliação radiologica1. Inúmeras causas estão relacionadas a esta fisiopatologia, sendo consensos2 e especialistas sugerem Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 que a aspiração gastro-esofágica deve ser considerada como uma possível etiologia de bronquiectasias. A aspiração é definida como a inalação de conteúdo gástrico ou de orofaringe para laringe ou vias aéreas inferiores. Está relacionada a fatores de risco como rebaixamento de nível de consciência, alteração de motilidade orofaríngea, falha de reflexo de tosse e presença de refluxo gastroesofágico3. A maioria dos eventos são não patológicos, como pessoas saudáveis que podem aspirar durante o sono. No entanto, dependendo da interação hospedeiro-inócuo, pode haver lesão na árvore brônquica e conseqüente doença respiratória. Um dos primeiros estudos publicados relacionando as duas patologias, em 1960, avaliou 736 pacientes com hérnia de hiato procurando ativamente por patologias pulmonares 4. Foram encontrados 5% de pessoas com bronquiectasias, questionando-se assim se existia uma relação casual. A revisão da literatura apresentada a seguir tem por objetivo responder a pergunta: existe relação entre bronquiectasias e aspiração? Refluxo gastroesofágico e aspiração: Há doença bronquiectásica nestes pacientes? Diversos estudos avaliaram pacientes com doenças crônicas gastroesofágicas, procurando ativamente se eles apresentavam sinais de doença respiratória bronquiectásica. Em um estudo publicado em 20095, 34 pacientes com aspiração crônica e infecções respiratórias de repetição por disautonomia familiar foram avaliados, sendo que 26% deles apresentavam bronquiectasias em suas tomografias, sugerindo uma relação entre estas duas patologias. Em 2012, um estudo retrospectivo6 avaliou 100 crianças com etiologias diversas de aspiração crônica, diagnosticadas por deglutograma, presença de fissura laríngea ou de fistula traqueoesofágica. Na avaliação tomográfica, 66% dos casos apresentavam bronquiectasias, sendo 48% bilaterais e 14% em apenas um lobo. Em muitos casos, no entanto, os pacientes eram assintomáticos respiratórios. Há, entretanto, uma relação causal entre estas patologias? Seria possível que o achado de bronquiectasias e aspiração nestes estudos fosse apenas coincidência? Uma comparação entre 25 adultos com e 25 sem diagnóstico de aspiração durante a deglutição não encontrou diferenças nas alterações encontradas em suas tomografias (bronquiectasias grupo aspiração 1 em 25, grupo não aspiração 4 em 25)7, mantendo ainda esta dúvida. Prevalência de doença de refluxo gastroesofágico em pacientes com bronquiectasias Uma outra abordagem em diversos estudos foi a avaliação de presença de refluxo em pacientes com o Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 diagnóstico de bronquiectasias. Em 2007, um estudo publicado no Chest 8 avaliou 58 pacientes com micobacteriose não tuberculose e bronquiectasias, realizando pHmetria de 24h. Foi encontrado refluxo patológico em 15 casos (26%), sendo 11 desses sem sintomas típicos de refluxo gastroesofágico (73%), sugerindo que talvez pesquisa clínica através de sintomas possa não ser suficiente para todos os pacientes. Em um estudo publicado em 2014 9 com 27 bronquiectásicos adultos e 17 controles, a prevalência de refluxo foi encontrada como 2 vezes maior que na população normal, sendo semelhante a prevalência encontrada em pacientes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica. Quando avaliados função pulmonar e radiologia em relação a presença ou não de refluxo, não se encontrou relação. Um ponto negativo importante do estudo, como em muitos envolvendo este tema, é a amostra pequena de casos avaliados. Um recente estudo 10 avaliou retrospectivamente a prevalência de hérnia hiatal (HH) em bronquiectásicos, encontrando 36% entre 81 pacientes (na população geral este número varia entre 10 a 20%). Comparando aqueles com HH e os controles, observou-se que a presença de HH estava relacionada a pior função pulmonar: volume expiratório forçado no primeiro segundo com média (DP) 75,4% (24,5) no grupo com HH versus 90,4% (25,5) no grupo sem HH. Além disso, houve maior prevalência de bronquiectasias císticas com mais brônquios acometidos no grupo HH, apesar de não haver um padrão de acometimento lobar ou diferenças em relação a etiologia das bronquiectasias. Quando avaliados por escores de severidade, pacientes com HH apresentavam piores escores. No entanto, considerando-se que esperamos mais tosse de pacientes mais graves, será que a presença de HH não é decorrente deste processo? O estudo, apesar de retrospectivo, demonstra uma importante relação entre bronquiectasias e HH, porém gera perguntas sobre causa e efeito. Em outro estudo11, foi avaliado a relação entre sintomas de refluxo e exacerbações e qualidade de vida, prospectivamente. Entre 163 paciente avaliados, 73,6% apresentavam sintomas de refluxo gastroesofágico, sendo que estes apresentavam também mais exacerbações e maior gravidade de doença. Apesar do pequeno número de estudos e das possíveis críticas metodológicas, há aparentemente uma relação entre bronquiectasias e aspiração, com seus determinantes e extensão ainda não bem esclarecidos. Discutiremos a seguir as hipóteses fisiopatológicas para esse envolvimento. Fisiopatologia A fisiopatologia descrita é simples e apresenta-se na Figura 112 . 59 • Microaspiração de ácido na árvore traqueobrônquica • Erosão • Inflamação • Dilatação brônquica • Remodelamento • Bronquiectasia Fig.1. Fisiopatologia do desenvolvimento de bronquiectasias a partir do refluxo gastroesofágico e aspiração. Entretanto, consideremos os seguintes mecanismos de desenvolvimento de refluxo gastroesofágico: • Alteração em relaxamento de esfíncter esofagiano inferior; • Clearance esofágico não efetivo de material de refluxo; • Aumento de pressão intra abdominal; A hiperinsuflação relacionada a doença bronquiectásica, que leva a distensão diafragma com diminuição de efetividade de barreira anti-refluxo, poderia ser responsável então pelo próprio surgimento do refluxo gastroesofágico (ou ao menos pela sua piora). Desta forma, quando encontramos uma alta prevalência e associação entre as duas patologias, ainda resta a dúvida em que casos uma é causa ou conseqüência da outra13. Discussão Os estudos são escassos, mas há evidências de que há relação entre bronquiectasias e aspiração. Acredita-se que aspiração e refluxo gastroesofágico possa ser uma possível etiologia de bronquiectasias. Além disso, há uma maior prevalência de refluxo em pacientes com bronquiectasias, seja como fator de piora ou por aumento de refluxo por mecanismo de hiperinsuflação. No entanto, ainda restam dúvidas: • Quando suspeitar investigar? Apenas sintomas não parecem se suficientes em alguns casos, porém sempre investigar se houver sintomas. • Há uma radiologia típica? Nenhum estudo foi definitivo nesta determinação. • Quando confirmado, sempre está indicado o tratamento, mas como determinar se o refluxo gastroesofágico é causa ou consequência? • Quais as melhores opções terapêuticas para estes pacientes? São necessários mais estudos para determinar estar respostas. Na tabela 1, alguns consensos e práticas clínicas como opiniões de especialistas. 60 Tabela 1: Consenso e práticas clínicas na abordagem ao paciente bronquiectásico com aspiração gastroesofágica. CONSENSOS E PRÁTICA CLÍNICA • Considerar causa ou possível fator contribuinte quando sintomas compatíveis. • Ter baixo limiar para exames complementares. • Se não for causa, pode ser um fator agravante. Sempre tratar quando sintomático ou documentado. • Para tratamento, associar medicamentoso e medidas não farmacológicas. - Em caso de não melhora ou hérnia hiatal significativa, discutir opções Gastro cirurgia. Conclusão Existe relação entre bronquiectasias e aspiração, podendo ser uma etiologia ou um fator de piora. Além disso, a própria doença bronquiectásica pode aumentar o refluxo gastroesofágico. Pacientes com refluxo ou hérnia de hiato são mais graves, aparentemente apresentando pior função pulmonar, maior extensão radiológica e mais exacerbações. São necessários mais estudos para melhor compreender a relação entre estas patologias e determinar implicações de tratamento. Referências Bibliográficas 1. Chalmers JD, Aliberti S, Blasi F. Management of bronchiectasis in adults. 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Computed tomography pulmonary findings in healthy older adult aspirators versus nonaspirators. Laryngoscope. 2014 Feb;124(2):494-7. 8. Koh WJ, Lee JH, Kwon YS, Lee KS, Suh GY, Chung MP, et al. Prevalence of gastroesophageal reflux disease in patients with nontuberculous mycobacterial lung disease. Chest. 2007 Jun;131(6):1825-30. 9. Lee AL, Button BM, Denehy L, Roberts SJ, Bamford TL, Ellis SJ, et al. Proximal and distal gastro-oesophageal reflux in chronic obstructive pulmonary disease and bronchiectasis. Respirology. 2014 Feb;19(2):211-7. 10. McDonnell MJ, Ahmed M, Das J, Ward C, Mokoka M, Breen DP, et al. Hiatal hernias are correlated with increased severity of non-cystic fibrosis bronchiectasis. Respirology. 2015 Jul;20(5):749-57. 11. Mandal P, Morice AH, Chalmers JD, Hill AT. Symptoms of airway reflux predict exacerbations and quality of life in bronchiectasis. Respir Med. 2013 Jul;107(7):1008-13. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 12. Tsang KW, Tipoe GL. Bronchiectasis: not an orphan disease in the East. Int J Tuberc Lung Dis. 2004 13. Lee AL, Denehy L, Wilson JW, Roberts S, Stirling RG, Heine RG, et al. Upright positive expiratory pressure therapy and exercise: effects on gastroesophageal reflux in COPD and bronchiectasis. Respir Care. 2012 Sep;57(9):1460-7. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 61 DPOC: pode a aspiração ser relacionada às exacerbações frequentes? COPD: can aspiration be related to frequent exacerbations? Amilcar Bigatão1; José Roberto Jardim1; Oliver A. Nascimento1 1 Unidade de Reabilitação Pulmonar, Disciplina de Pneumologia, Escola Paulista de Medicina/ Universidade Federal de São Paulo. RESUMO A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é muito prevalente no Brasil e está associada a muitas comorbidades, entre elas doenças cardiovasculares, osteoporose, doenças musculares e doença do refluxo gastroesofágico (DRGE). A (DRGE) também tem grande associação com outras doenças respiratórias como asma e fibrose pulmonar. Baseado em sintomas, a DRGE parece ter uma alta prevalência em indivíduos com DPOC e está associada com exacerbações desta doença. Este artigo tem por finalidade revisar e avaliar criticamente a prevalência, o diagnóstico e as evidências sobre a associação entre DRGE e exacerbações da DPOC. Palavras chaves: doença pulmonar obstrutiva crônica, doença do refluxo gastroesofágico, pHmetria esofágica, exacerbação da DPOC. ABSTRACT Chronic obstructive pulmonary disease (COPD) is very common in Brazil and is associated with many comorbidities, including cardiovascular disease, osteoporosis, muscle disease and gastroesophageal reflux disease (GERD). GERD has also strong association with other respiratory diseases such as asthma and pulmonary fibrosis. Based on symptoms, GERD appears to have a high prevalence in patients with COPD and is associated with exacerbations of the disease. This article aims to review and critically assess the prevalence, diagnosis, and evidence on the association between GERD and COPD exacerbations. Key words: Chronic obstructive pulmonary disease; Gastroesophageal reflux; Esophageal pH monitoring; COPD exacerbation Definição e fisiopatologia da DPOC A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é uma enfermidade pulmonar com acometimento sistêmico que se caracteriza por uma obstrução ao fluxo de ar que é progressiva e irreversível, porém tratável 1. A fumaça inalada, do cigarro ou de outras partículas, como a queima de biomassa, provoca uma resposta inflamatória, caracterizada pela liberação de mediadores inflamatórios que irão atrair a presença de várias células, em especial de linfócitos CD8. A reação inflamatória, o stress oxidativo Oliver A. Nascimento Rua Botucatu, 740. 3º Andar - CEP: 04023-062 Disciplina de Pneumologia Tel. 11 5576 4238 [email protected] 62 e o desequilíbrio entre proteases e antiproteases são os responsáveis pela fisiopatologia da doença, que irá se manifestar com obstrução do fluxo de ar, redução na capacidade de difusão pulmonar e hipersecreção. Devido às alterações acima descritas, ocorrem os sintomas principais da doença, que são tosse, expectoração e dispneia, que podem surgir em qualquer ordem, e preceder a DPOC em muitos anos. Nem sempre estes três sintomas estão presentes em conjunto, sendo que de acordo com sua presença há diferentes perfis de pacientes com DPOC. Classicamente há dois fenótipos opostos da doença baseados em sintomas: o enfisematoso, onde predomina a dispneia; e o bronquítico crônico, onde predomina a tosse e a expectoração. Deve ser ressaltado, entretanto, que nem todos os indivíduos fumantes que tem bronquite crônica são portadores de DPOC, e com o decorrer do tempo alguns irão e outros não desenvolver a doença. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Para o diagnóstico da DPOC, primeiro deve haver a suspeição. Indivíduos fumantes ou com fatores de risco para DPOC devem ser ativamente questionados quanto aos sintomas. Muitas vezes a tosse pode passar despercebida, pois o fumante está acostumado a ela, considerando-a consequência do tabagismo. Do mesmo modo, a dispneia pode não ser notada por um indivíduo que fica restrito ao domicílio, ou por um idoso, que a atribui somente à idade. Um questionário de cinco perguntas publicado por Martinez et al2, de fácil aplicação, é capaz de detectar indivíduos com risco de ter DPOC. Entretanto para o diagnóstico da DPOC, é necessária a realização do exame de espirometria pré e pósbroncodilatador. Além de ser uma doença de alta prevalência, a DPOC tem alta morbidade e mortalidade. A incapacidade, pior qualidade de vida e alta prevalência de comorbidades fazem a doença ser uma das principais causas de mortalidade no mundo. Era a sexta causa de morte em 1990 e está projetada para ser a terceira causa de mortalidade em 20203. DPOC e comorbidades Pacientes com DPOC têm múltiplas comorbidades. A última atualização do documento GOLD 1 enfoca um capítulo sobre este tema. Pacientes com DPOC estão mais sujeitos à doença cardiovascular como hipertensão arterial sistêmica, fibrilação atrial, infarto agudo do miocárdio e insuficiência cardíaca. Também estão mais sujeitos a infecções, em especial respiratórias, a diabetes mellitus, depressão e osteoporose, sendo as duas últimas, quando presentes, associadas a pior prognóstico. Os indivíduos com DPOC são também mais idosos, e este é outro fato que favorece a maior ocorrência de comorbidades. Um estudo com dados do PLATINO mostrou que o número de doenças na população aumenta conforme a idade, de 1,6 doenças por pessoa em indivíduos de 40 a 49 anos para 2,3 doenças por indivíduo em pessoas com 70 anos de idade (p<0,001)4. Em outro estudo5 com dados do PLATINO, os pacientes com DPOC tinham maior escore de comorbidades e maior prevalência de câncer de pulmão e asma, e tendência a apresentar hipertensão e doença cerebrovascular. Fatores associados com comorbidades foram idade, maior índice de massa corpórea e sexo feminino. O número de comorbidades aumentava conforme piorava o estado de saúde. Exacerbações da DPOC A principal causa de internação relacionada à DPOC são as exacerbações da doença. Diversas são as definições para exacerbações da DPOC. A mais tradicional é a de Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Anthonisen6 et al, que leva em conta sintomas – aumento da tosse, da expectoração e da dispneia. Segundo o documento GOLD1, as exacerbações são eventos agudos caracterizados por aumento dos sintomas além de variações normais do dia a dia e que requerem uma mudança nas medicações habituais dos pacientes. Sua ocorrência proporciona piora da qualidade de vida, da função pulmonar, aumento do custo com o tratamento e tem alta morbimortalidade. Uma revisão 7 mostra que há tendência dos estudos sobre a DPOC de usar as exacerbações como desfecho primário, juntamente com variáveis mais tradicionais, como VEF1, mortalidade e qualidade de vida. Nem todos os trabalhos revistos neste estudo, entretanto, mostravam uma definição clara de exacerbações. A revisão cita também que as diferentes definições de exacerbação levam a efeitos diversos nos resultados dos estudos e que há necessidade de uma definição uniforme das exacerbações. Também é citado que estudos mais recentes tendem a seguir definições semelhantes a do GOLD, que inclui o uso de medicamentos, não somente sintomas, ou seja, uma definição mais funcional. O estudo de Hurst et al 8, destaque no tema, descreve exacerbação como um episódio que requereu prescrição de antibiótico e/ou corticoide via oral. Diversas são as causas de exacerbação da DPOC. A principal delas é a infecção, seja bacteriana ou viral. Outras causas incluem pneumotórax, derrame pleural, arritmias, insuficiência cardíaca, tromboembolismo pulmonar. O tratamento inclui combater o fator causador, uso de broncodilatadores ou aumento na dose e frequência destes, uso de corticoide sistêmico, oxigenoterapia, suporte ventilatório não invasivo ou ventilação mecânica invasiva quando necessário. Tendo em vista o enfoque recente que se tem dado às exacerbações na DPOC, como acima discutido, há preocupação em identificar quais fatores poderiam predispor os pacientes a exacerbações. Os estudos TORCH 9, UPLIFT 10 e ECLIPSE 8, todos prospectivos com duração de três anos (UPLIFT quatro anos) e significativos pelo número de pacientes envolvidos (TORCH 6112 pacientes, UPLIFT 5992 pacientes, ECLIPSE 2138 pacientes) mostram que conforme aumenta o grau de obstrução da doença, ou seja, nos pacientes mais graves, há maior ocorrência de exacerbações. Hurst et al8 em seu estudo com dados do ECLIPSE, com mais de dois mil pacientes acompanhados durante três anos, mostraram que a ocorrência de exacerbações prévias era o melhor fator preditor de novas exacerbações. Identificou também que pior função pulmonar (perda de VEF1 maior que 100ml ao ano), pior qualidade de vida (aumento de quatro pontos no Saint George Respiratory Questionnaire), maior contagem de leucócitos e história prévia de sintomas de refluxo gastroesofágico também eram preditores de novas exacerbações. 63 Doença do refluxo gastroesofágico A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) é uma condição na qual ocorre refluxo de conteúdo gástrico causando sintomas, lesões em órgãos alvo e complicações relacionadas ao refluxo, no esôfago, cavidade oral, laringe e pulmões, segundo a Associação Americana de Gastroenterologia11. Pode ou não causar erosões visíveis num exame de endoscopia digestiva alta. Assim, um exame de endoscopia digestiva alta sem esofagite não exclui o diagnóstico de DRGE. Estima-se que a prevalência mundial de DRGE seja de 10 a 20% no mundo ocidental e que seja um pouco menor na Ásia12. Os sintomas são diversos, podendo incluir pirose e regurgitação como sintomas clássicos. Entretanto, também pode se apresentar como dor torácica, de difícil diagnóstico diferencial com a dor torácica isquêmica. A tosse também pode ser o único sintoma da DRGE, assim como a laringite em alguns casos. Outros sintomas atípicos incluem dor epigástrica, náuseas, eructações e distensão abdominal, em geral em sobreposição com outras condições relacionadas. Do mesmo modo que a DPOC, a DRGE também é relacionada ao cigarro. Outros fatores que influenciam a DRGE são comportamentais (ingestão de café, álcool, gorduras, ansiedade), fatores genéticos (história familiar) e ambientais (gravidez, obesidade e sobrepeso). Portanto, o estilo de vida moderno, onde as pessoas vivem sob forte pressão, consomem muito café e fast food, predispõe os indivíduos a ter refluxo gastroesofágico. O diagnóstico da DRGE pode ser feito com história clínica, endoscopia digestiva alta (útil quando há esofagite erosiva ou hérnia de hiato que pode pressupor a existência de refluxo). A pHmetria esofágica. é um teste que determina ocorrência de exposição ácida do esôfago, frequência de refluxo e sintomas associados com os episódios de refluxo. A pHmetria deve ser precedida sempre da manometria esofágica que, embora não seja útil no diagnóstico de DRGE, auxilia no posicionamento correto do cateter transnasal de pHmetria, que deve permanecer 5cm acima da borda superior do esfíncter esofágico inferior, durante 24 horas. Apresenta excelente sensibilidade e especificidade em pacientes com esofagite erosiva (sensibilidade de 77-100% e especificidade de 85-100%), que é um pouco menor em pacientes com endoscopia digestiva alta normal e com sintomas de refluxo (menor que 71%)13. Algumas comorbidades também são mais frequentes em indivíduos com DRGE, como ansiedade e depressão, cálculo biliar, otite e sinusite, dor abdominal e doenças respiratórias 12. DRGE e DPOC Com relação à doença pulmonar obstrutiva crônica, os pacientes podem estar mais sujeitos à presença de refluxo 64 gastroesofágico, seja pelos sintomas (mais tosse, com menor pressão intratorácica e aumento da pressão intraabdominal), pela retificação diafragmática (que reduz a pressão intratorácica e também favorece o refluxo), ou pelo uso maior de broncodilatadores, como os beta 2 agonistas já previamente descritos. Estudos baseados em sintomas mostram alta prevalência de DRGE em pacientes com DPOC, que chega a ser duas vezes maior em relação à prevalência da população normal14,15. Uma metanálise recente estimou em 13 vezes a prevalência de DRGE em pacientes com DPOC16. Indivíduos com DPOC também tem mais risco de desenvolver DRGE17. A DRGE pode levar à pior qualidade de vida em pacientes com DPOC15 e queda na saturação de pulso do oxigênio18; mas notadamente, o enforque da relação da DPOC e da DRGE tem sido nas exacerbações, em especial devido aos resultados do estudo ECLIPSE 8, como já previamente descrito. Liang et al19 mostraram que pacientes com maior risco de refluxo gastroesofágico, definido pelo escore maior ou igual a 12 do questionário diagnóstico de refluxo (Reflux Diagnostic Questionnaire - RDQ), tinham este como fator independente de risco para predizer exacerbações da DPOC. Outro estudo20 mostra que pacientes com reflexo anormal de deglutição eram também mais predispostos a exacerbações da DPOC, o que pode mostrar que a aspiração também pode estar relacionada ao mecanismo da exacerbação. O reflexo anormal da deglutição neste mesmo estudo esteve relacionado com a doença do refluxo gastroesofágico. Outros estudos tem relacionado a DRGE com exacerbações da DPOC21,22. Em todos, o diagnóstico de DRGE foi exclusivamente clínico, por anamnese ou questionários específicos. Diferentes publicações mostram que questionários de sintomas e sintomas auto reportados não são confiáveis em predizer o diagnóstico de DRGE23,24. Em pacientes com DPOC estudos mostraram não haver correlação entre os sintomas de DRGE e a ocorrência de refluxo gastroesofágico18,25. Mostram também que muitos pacientes com DRGE são assintomáticos em relação a esta doença26. Diversos estudos têm avaliado a prevalência da DRGE em pacientes com DPOC. Estes encontraram uma prevalência com ampla variação, entre 17 a 53%14,15,27-30. A diferença de valores entre estes estudos pode ser justificada porque o diagnóstico da DRGE foi realizado somente considerando os sintomas de DRGE. Além disso, o método diagnóstico dos estudos variou: Areias et al 14 e Lindberg et al27 levaram em conta somente a história prévia de DRGE; Rascon-Aguilar et al 15 e Rogha et al 30 diagnosticaram DRGE utilizando o questionário específico de refluxo da Mayo Clinic (e consideraram como clinicamente significante os sintomas ao menos semanais); Liang e et al29 utilizaram o Reflux Diagnostic Questionnaire e Takada et al28 utilizaram o FSSG (Frequency Scale for Symptoms of GERD). A falta de estudos Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 correlacionando estes métodos / questionários dificulta a interpretação dos dados e justifica a variação de mais de 30% na prevalência de DRGE em pacientes com DPOC, quando considerados apenas os sintomas. Quando somente estudos com diagnóstico objetivo de DRGE por pHmetria são considerados, a prevalência é mais consistente, de 41 a 62%18,26,31,32. Nestes estudos os grupos de pacientes também eram mais homogêneos; os de Casanova et al 18 e Kempainen et al26, em média, foram classificados como estádio GOLD IV, e os de Sweet et al31 e Seccombe et al32 aguardavam transplante pulmonar. O raciocínio leva a deduzir que na DPOC avançada poderia haver maior prevalência de DRGE, pois são indivíduos em geral mais sintomáticos e com mais exacerbações que os com doença mais leve. Entretanto, um estudo recente de Kamble et al33, e com uma amostra com DPOC leve e moderada, mostrou uma prevalência maior, de 78%. No estudo de Kamble et al33, entretanto, 76% dos seus participantes tinham sintomas de DRGE, número bem acima dos outros trabalhos, o que pode explicar a maior prevalência. Ele também não deixa claro se os pacientes se encontravam clinicamente estáveis na data da realização da pHmetria, e tendo em vista que nas exacerbações pode ocorrer mais tosse e esta predispor a ocorrência de refluxo, isto poderia ser uma outra explicação para esta maior prevalência. O método do diagnóstico de DRGE também varia entre os trabalhos. Em relação ao tempo de exposição a pH abaixo de 4 para diagnóstico de DRGE há divergência, pois Casanova et al18 consideraram refluxo quando o tempo exposto ao pH menor que 4 era maior que 4,5% do tempo total, Kempainem et al26 4,9% e Kamble et al33 5,45%. O pH abaixo de 4 é considerado como ponto de corte, pois é o limite subjetivo para sensação de pirose34, além de que 20% da ativação da pepsina ocorre no pH 4 e praticamente não ocorre no pH 534. Entretanto, se considerarmos refluxo proximal positivo quando o tempo de exposição a pH menor que 4 for maior que 1% do tempo total, 57% dos pacientes com DRGE apresentariam refluxo proximal patológico e apenas 4% dos pacientes sem DRGE apresentariam refluxo proximal patológico. Kempainem et al 26, considerando refluxo proximal patológico quando o pH menor que 4 ocorria em mais do que 1,2% do tempo total, encontraram 43% dos pacientes com refluxo proximal, e nestes, 1/3 não apresentavam refluxo distal associado. Kamble et al33, ao considerarem refluxo proximal patológico o pH menor que 4 por mais que 1,1% do tempo total, mostraram também que o refluxo proximal era mais prevalente em pacientes com sintomas de DRGE, embora sem significância estatística. É questionável se a grande associação entre DPOC e DRGE é primária ou secundária. A DRGE pode participar da gênese dos sintomas e das exacerbações da DPOC por microaspiração de conteúdo gástrico e pelo reflexo Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 esôfago-brônquico. Por outro lado, a DRGE pode ser secundária a vários fatores: elevada pressão transdiafragmática causada pela tosse frequente, diafragma retificado e aumento de esforço respiratório, e ao uso de broncodilatadores, como os beta 2 agonistas, que podem relaxar o esfíncter esofagiano inferior26,35. Em nosso estudo, entretanto, não encontramos diferença no uso de medicamentos entre pacientes com e sem DRGE29. Um estudo mostrou que pacientes com DPOC e DRGE utilizam mais medicações que pacientes sem DRGE 36, achado que leva a mesma pergunta, se estes fazem mais uso de medicações porque tem mais sintomas como a tosse, e esta causa mais refluxo, ou se estes pacientes tem mais refluxo e por isto necessitam fazer uso de mais medicamentos. Estudos que utilizam definição de sintomas como pirose ou regurgitação ao menos semanalmente para considerar o sintoma positivo, encontraram prevalência de pirose ou regurgitação entre os pacientes com DPOC (Mokhlesi et al35 obtiveram 19%), ou prevalência semelhante (RasconAguilar et al15 encontrou de 37%). A regurgitação foi o sintoma que atingiu a maior especificidade37. Considerações finais Apesar da ênfase na relação entre doenças respiratórias e DRGE, poucas vezes são solicitados exames para investigar a DRGE em indivíduos com DPOC. Em alguns casos a endoscopia digestiva alta é solicitada. Os testes de função esofágica ainda não fazem parte dos exames habitualmente solicitados para estes pacientes e não tem uma disponibilidade habitual. Além disso, há dificuldade em conseguir indivíduos com DPOC voluntários para realização dos exames, pois muitos são assintomáticos do ponto de vista gastrointestinal. Diferentes publicações mostram que sintomas não são confiáveis para o diagnóstico de DRGE23,24, mesmo em pacientes com DPOC18,26,33. Mesmo assim, rotular os pacientes como portadores de DRGE baseado somente em questionários ainda é uma prática comum, até mesmo em importantes publicações8. Muitos destes questionários 38 não foram validados em comparação com pHmetria ambulatorial. Além disso, são utilizados muitos questionários diferentes e sem comparação adequada entre eles. Os sintomas de DRGE podem ser causados por exposição ácida, dismotilidade ou hipersensibilidade esofágica. Pacientes com DPOC muitas vezes sentem um desconforto torácico que pode ser confundido com pirose e superestimar o diagnóstico de refluxo. Por outro lado, refluxo silencioso pode ser observado em uma grande proporção de pacientes26,33 , o que leva ao subdiagnóstico da DRGE e minimiza sua associação com a DPOC. Além do mais, alguns sintomas respiratórios como tosse e chiado podem ser manifestações extraesofágicas da DRGE, sendo em alguns casos os únicos sintomas presentes para auxílio 65 no diagnóstico desta doença, porém, alguns questionários utilizados no diagnóstico da DRGE lhes consideram pouco. Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 66 Global Strategy for the Diagnosis, Management and Prevention of COPD, Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD) 2014. Available from: http://www.goldcopd.org/. Accessed 24/1/2014. Martinez FJ, Raczek AE, Seifer FD, et al. Development and initial validation of a self-scored COPD Population Screener Questionnaire (COPD-PS). Copd. 2008;5(2):85-95. Mathers CD, Loncar D. Projections of global mortality and burden of disease from 2002 to 2030. PLoS medicine. 2006;3(11):e442. Carvalho AK, Menezes AM, Camelier A, et al. 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Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 ESTATÍSTICA Classificação e árvores de regressão (CART) Carolina Bonfanti Mesquita1; Robson Aparecido Prudente2; Sergio Alberto Rupp Paiva3; Suzana Erico Tanni4 1 Mestre em Fisiopatologia em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP 2 Mestre em Fisiopatologia em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP 3 Professor Titular em Clínica Médica, Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP 4 Doutora em Pneumologia, Médica da Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Medicina de Botucatu-UNESP A medicina avançada e personalizada necessita de tomadas de decisões diagnósticas frente a vários exames disponíveis no mercado. Para que ocorram decisões corretas e precisas, a estatística médica é uma ferramenta valiosa para ser aplicada e desenvolvida. Assim, estudos que incluem vários marcadores clínicos e laboratoriais concomitantes, utilizam análises estatísticas que possam estratificar os possíveis riscos relacionados aos desfechos1. Entre esses modelos estatísticos, incluem-se a análise de regressão logística, o risco relativo e a árvore de classificação e regressão (CART). Os modelos de regressão logística são considerados formas “padrão ouro” para avaliar variáveis associadas diretamente com o desfecho, entretanto, a possível presença de multicolinearidade e interações nos modelos multivariados adicionam uma complexidade intrínseca que dificultam a sua aplicação clínica2. A multicolinearidade é definida pela associação de dois ou mais fatores entre si e também estão associadas com o desfecho. Assim, na maioria dos modelos de regressão logística, as variáveis colineares não conseguem distinguir adequadamente os seus efeitos reais e geralmente são adicionadas isoladamente no modelo como variáveis confundidoras3. Além disso, pode existir a interação entre as variáveis. A interação é definida pela combinação de duas ou mais variáveis no desfecho com aumento ou anulamento no resultado. Desta maneira, modelagens nos modelos de regressão logística são necessárias para que ocorram interpretações adequadas. Neste contexto, os modelos de regressão logística focam na significância relativa e não no efeito absoluto no desfecho. Os modelos de CART constituem alternativa viável para os modelos de regressão. São modelos definidos pela presença de observações diretas com existência de grupos de riscos. Estes modelos podem ser utilizados em qualquer tipo de estudo e com a maior parte de desfechos. Ainda, existem modelos com abordagens adicionais como modelos de árvore de regressão aditiva múltipla (MART), regressão múltipla adaptativa (MARS), uso aperfeiçoado de atributos contínuos (C4.5) e análise do componente categórico principal (CAPTCA) 2,4,5,6,7. Neste texto serão discutidos aspectos relacionados ao CART. O CART apresenta três passos: primeiro, o grupo todo é dividido em dois subgrupos com a utilização da variável Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 de maior poder preditivo (na maioria das vezes é utilizado o maior valor de c 2 das variáveis analisadas). Este procedimento irá sempre se repetir até que não se identifique mais diferenças significativas entre os subgrupos ou quando estes subgrupos apresentem número de casos muito pequeno (nenhum subgrupo deve se tornar substancialmente menor do que a raiz quadrada do grupo total do estudo) 8. E por último, os resultados são apresentados em estrutura de árvores binárias com o passo final podado. Assim, o CART utiliza regras de algoritmos de indução de forma implícita, a qual é construída por sucessivas divisões de acordo com os valores de seus atributos preditivos9. Estes atributos podem ser nominal (classificação) ou contínua (regressão) e a nomenclatura dada para cada subgrupo gerado é chamada de “nó” e os ramos ou arestas são os que unem os nós. Estruturalmente o CART é formado por nós de três tipos: nó raiz (não possui nenhuma aresta de entrada e zero ou mais arestas de saída), nó interno (possuem uma aresta de entrada e duas arestas de saída) e nó folha ou terminal (possuem uma única aresta de entrada e nenhuma de saída). Cada nó interno possui um rótulo com o nome de um dos atributos preditivo e as arestas são rotuladas com valores do atributo do nó que parte e, por fim, os nós terminais são rotulados com uma classe a qual o exemplo pertence2,10. Assim, é possível estabelecer o processo de classificação e de regressão num modelo estatístico que inclua várias variáveis e que este “caminhe” pela árvore, e percorra pelo nó raiz para as arestas que unem os nós internos até o nó terminal. A Figura 1 é exemplo de modelo estatístico de CART em estudo que incluiu várias variáveis laboratoriais para predizer a probabilidade de reinternação em pacientes com insuficiência cardíaca (IC). Para os valores laboratoriais serem avaliados individualmente para a predição de IC os atributos foram dicotomizados através de valores menores ou iguais a 5% do percentil de sua distribuição. Foram incluídos os seguintes atributos laboratoriais: NT-BNP, ureia, proteína C-reativa e hemoglobina. Incidência de terapia intensiva Modelos estatísticos que necessitem de utilização de tempo dependente, como os modelos de Cox, também 67 Fig. 1: Exemplo de modelo estatístico de CART. Adaptado de Muller e Möckel (2008). podem ser adaptados na construção de CART. Existem dificuldades na construção do CART. Estudo recente mostra a dificuldade de incluir os participantes no caminho para percorrer na árvore a cada momento de sua avaliação, pois fatores que variam com o tempo e que influenciam na sobrevida necessitam de métodos estatísticos de ajuste nos modelos de CART. Assim, cada participante possa estar em um nó durante um período de tempo e estar em outro nó em outro diferente intervalo de tempo3. Além disso, a estrutura dicotomizada pode gerar julgamento equivocado na interpretação dos pontos de amostragem que se localizam na região sobreposta de dois nós, o que poderia gerar problemas na acurácia do CART. Assim, modelos com a construção de mais de dois nós estão sendo utilizados para a resolução desses problemas. Desta maneira o uso de modelos de CART são estratégias válidas para a predição de desfechos médicos no lugar de técnicas estatísticas sofisticadas e de difícil compreensão. 5. Jin H, Lu Y. 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CRITÉRIOS DE AUTORIA A inclusão de um autor em um manuscrito encaminhado para publicação só é justificada se ele contribuiu significativamente, do ponto de vista intelectual, para a sua realização. Fica implícito que o autor participou de todas as fases na elaboração do artigo. A revista considera quatro o número máximo aceitável de autores para redação do artigo. O convite para publicação de um artigo será encaminhado pelo corpo editorial da revista a um autor com experiência no assunto em questão, que terá liberdade de convidar outros autores para redação do seu artigo. APRESENTAÇÃO E SUBMISSÃO DOS MANUSCRITOS Os manuscritos deverão ser obrigatoriamente encaminhados por e-mail ao Editor Rodrigo Athanazio ([email protected]). Pede-se aos autores que sigam rigorosamente as normas editoriais da revista, particularmente no tocante ao número máximo de palavras, tabelas e figuras permitidas, bem como às regras para confecção das referências bibliográficas. A não observância dessas instruções implicará na devolução do manuscrito pela Secretaria da revista para que os autores façam as correções pertinentes antes de submetê-lo aos revisores. A revista reserva o direito de efetuar nos artigos aceitos adaptações de estilo, gramaticais e outras. Com exceção das unidades de medidas, siglas e abreviaturas devem ser evitadas ao máximo, devendo ser utilizadas apenas para termos consagrados. Estes termos estão definidos na Lista de Abreviaturas e Acrônimos aceitos sem definição. Quanto a outras abreviaturas, sempre as definir na primeira vez em que forem citadas, por exemplo: lavado broncoalveolar (LBA). Após a definição da abreviatura, o termo completo não deverá ser mais utilizado. Com exceção das abreviaturas aceitas, não as utilizar em títulos ou em resumo dos manuscritos. Quando os autores mencionarem qualquer substância ou equipamento incomum, deverão incluir o modelo, o nome da fabricante, a cidade e o país. 70 PREPARO DO MANUSCRITO A página de identificação deve conter o título do trabalho, em português e inglês, nome completo e titulação dos autores, instituições a que pertencem, endereço completo, inclusive telefone, fax e e-mail do autor principal, e nome do órgão financiador da pesquisa, se houver. Resumo: Deve ser estruturado consistindo de três parágrafos, não excedendo 200 palavras. O primeiro parágrafo deve descrever o objetivo da revisão, isto é por que a revisão é relevante. O segundo parágrafo descreverá os achados mais recentes e o terceiro será um resumo descrevendo as principais implicações dos achados na pesquisa ou prática clínica. Abstract: Uma versão em língua inglesa, correspondente ao conteúdo do resumo deve ser fornecida. Descritores e Keywords: Deve ser fornecido de três a cinco termos em português e inglês, que definam o assunto do trabalho. Devem ser, obrigatoriamente, baseados nos DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), publicados pela Bireme e disponíveis no endereço eletrônico: http:// decs.bvs.br, enquanto os keywords em inglês devem ser baseados nos MeSH (Medical Subject Headings) da National Library of Medicine, disponíveis no endereço eletrônico www.nlm.nih.gov/mesh/MBrowser.html. Texto: A introdução deve discutir os principais aspectos da revisão. O texto deve ter no máximo 2000 palavras, excluindo referências e tabelas. Deve conter no máximo 5 tabelas e/ou figuras. O número de referências bibliográficas não deve exceder a 30. Tabelas e Figuras: Tabelas e gráficos devem ser apresentados em preto e branco, com legendas e respectivas numerações impressas ao pé de cada ilustração. As tabelas e figuras devem ser enviadas no seu arquivo digital original, as tabelas preferencialmente em arquivos Microsoft Word ou Microsoft Excel e as figuras em arquivos Tiff ou JPG. Fotografias de exames, procedimentos cirúrgicos e biópsias onde foram utilizadas colorações e técnicas especiais serão consideradas para publicação colorida. As grandezas, unidades e símbolos devem obedecer ao sistema métrico internacional e às normas nacionais correspondentes (ABNT: http:// www.abnt.org.br). As figuras que necessitem de permissão deverão ser comunicadas ao editor. Se for necessária permissão solicita-se que seja encaminhada cópia da ilustração original da figura, endereço de contato, email, fax e número de telefone. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 Legendas: Deverão acompanhar as respectivas figuras (gráficos, fotografias e ilustrações) e tabelas. Cada legenda deve ser numerada em algarismos arábicos, correspondendo a suas citações no texto. Além disso, todas as abreviaturas e siglas empregadas nas figuras e tabelas devem ser definidas por extenso abaixo das mesmas. Referências: Devem ser indicadas apenas as referências utilizadas no texto, numeradas com algarismos arábicos e na ordem em que foram citadas. A apresentação deve estar baseada no formato Vancouver Style, atualizado em outubro de 2004, conforme os exemplos abaixo e disponíveis em h t t p : / / w w w. n c b i . n l m . n i h . g o v / b o o k s h e l f / br.fcgi?book=citmed. Os títulos dos periódicos citados devem ser abreviados de acordo com o estilo apresentado pela List of Journal Indexed in Index Medicus, da National Library of Medicine disponibilizados no endereço: htt p : / / w w w. n c b i . n l m . n i h . g o v/ e nt r e z / j o u r n a l s / loftext.noprov.html. Para todas as referências, cite todos os autores até seis. Acima desse número, cite os seis primeiros autores seguidos da expressão et al. Homepages/Endereços Eletrônicos 7. Cancer-Pain.org [homepage on the Internet]. New York: Association of Cancer Online Resources, Inc.; c2000-01 [updated 2002 May 16; cited 2002 Jul 9]. Available from: http://www.cancer-pain.org/ Toda correspondência para a revista deve ser encaminhada para: Dr Rodrigo Athanazio ([email protected]) Editor-Chefe do Pneumologia Paulista Exemplos: Artigos Originais 1. Xisto DG, Farias LL, Ferreira HC, Picanço MR, Amitrano D, Lapa E Silva JR, et al. Lung parenchyma remodeling in a murine model of chronic allergic inflammation. Am J Respir Crit Care Med. 2005; 171(8):829-37. Resumos 2. Saddy F, Oliveira G, Rzezinski AF, Ornellas DS, Garcia CSN, Nardelli L, et al. Partial Ventilatory Support improves oxygenation and reduces the expression of inflammatory mediatoras in a model of acute lung injury. Am J Respir Crit Care Med. 2008; 177:A766. Capítulos de Livros 3. Barbas CS, Rocco PR. Monitorização Da Mecânica Respiratória em Indivíduos respirando espontaneamente e ventilados mecanicamente. In: Rocco PR; Zin WA, editores. Fisiologia Respiratória Aplicada. 1 Edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2009, p. 193-206. Publicações Oficiais 4. World Health Organization. Guidelines for surveillance of drug resistance in tuberculosis. WHO/Tb, 1994;178:1-24. Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016 71 72 Pneumologia Paulista Vol. 29, No.2/2016