TÍTULO: AVALIAÇÃO BACTERIOLÓGICA DE ÁGUAS MINERAIS CONSUMIDAS NA CIDADE DO RECIFE-PE. AUTORES: Joás Lucas da Silva & Glícia Maria Torres Calazans . INSTITUIÇÃO: UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO E-mail:[email protected]; [email protected] ÁREA: SAÚDE 1.0 INTRODUÇÃO: A água pode ser um importante veículo de infecção de inúmeras doenças, seja em decorrência de excretas humanos e de outros animais ou pela presença de substâncias químicas nocivas a saúde. Tais doenças podem ser divididas em: de transmissão hídrica e de origem hídrica. As primeiras são caracterizadas pela presença de microrganismos patógenos veiculados pela água como: vírus, fungos, protozoários e bactérias, afetando, geralmente, o trato gatrointestinal. Historicamente, as salmonellas e shigellas foram as primeiras a serem identificadas e atualmente microorganismos como rotavírus são também qualificados como responsáveis por essas doenças causando um grande impacto na população (PELCZAR, 1996; OPAS, 1999). As de origem hídrica são causadas por substâncias químicas em concentrações acima do limite permitido (CETESB, 1992; SANCHEZ, 1999 ) dentre as quais podemos citar: a fluorose, responsável pelo desfiguramento dos dentes (MENAKER, 1984; NEWBURN, 1988) e a intoxicação crônica pelo chumbo devido a tendência deste em ser um elemento cumulativo no organismo (MACÊDO, 2001). FOSTER (1987) afirmou que as atividades que têm maior impacto na qualidade de águas subterrâneas na América Latina são: densa urbanização e inadequada disposição de efluentes líquidos industriais e de cultivo agrícola. Os Estados com maior produção de água mineral no Brasil são: São Paulo, Minas Gerais e Pernambuco, sendo a Região Nordeste a segunda maior produtora de água mineral do país (25,01%). O aumento do consumo registrado em Pernambuco deve-se ao fato de nem sempre ser satisfatória a qualidade de água de torneira na Região, obrigando a população local a adquirir água mineral para utilização nos mais variados fins (SOSAGUAS, 2002). Sabendo-se da importância das águas minerais para consumo humano, o controle e qualidade desses mananciais e condições sanitárias relativas a todo o processo de industrialização é relevante, a fim de possibilitar medidas corretivas e preventivas. 2.0 OBJETIVO: Avaliação, sob o ponto de vista bacteriológico, da qualidade de águas minerais naturais, comercializadas em Recife e região metropolitana com verificação do cumprimento das normas em vigor. 3.0 MATERIAIS E MÉTODOS: Para todos os microrganismos pesquisados aplicou-se a técnica convencional dos tubos múltiplos a qual subdivide-se no ensaio presuntivo, confirmativo e completo expressando-se os resultados em número mais provável de colônias por 100 mL (NMP). 1) Ensaio presuntivo: Consiste na inoculação de volumes de 10.0; 1.0 e 0.1 mL de água a ser analisada numa série de nove tubos. Os tubos que recebem inóculos de 10 mL têm meio de cultura com concentração dupla a fim de compensar a diluição. Os volumes de 1 e 0,1 mL da amostra são inoculados em meio de concentração simples. O ensaio visa ao enriquecimento da amostra e um resultado positivo, dentro de 24-48h, é apenas sugestivo de água contaminada, pois pode haver interferência de outros microrganismos devendo-se, portanto, dar seguimento a análise. 2) Ensaio confirmativo: Todos os tubos positivos no ensaio presuntivo devem ser submetidos ao ensaio confirmativo o qual consiste na inoculação dos ensaios presuntivos positivos em meio de cultura seletivo para a bactéria ou grupo de bactérias pesquisadas, reduzindo-se a possibilidade de ocorrência de resultados falso-positivos. Um resultado positivo confirma a presença de bactérias indicadoras de contaminação (COSTA, 1980; SANCHES, 1999). 3) Ensaio completo: Este ensaio é caracterizado pela realização de provas adicionais, não sendo obrigatório. Consiste na utilização de provas bioquímicas adicionais para identificação da espécie ou quando se suspeita da interferência de microrganismos nos ensaios anteriores (STANDARD METHODS, 1998). 4) Expressão dos resultados em número mais provável de bactérias por 100mL (NMP): 2 A combinação de resultados positivos e negativos no ensaio confirmativo permite a obtenção de uma estimativa da densidade original das bactérias (NMP) através da aplicação de cálculos de probabilidade (COSTA, 1980; STANDARD METHODS, 1998) predeterminados na tabela de Hoskins. Os resultados são, então, expressos em número mais provável de bactérias por 100mL. 3.2.1 Microrganismos pesquisados As amostras foram avaliadas quanto a presença de coliformes totais e Termotolerantes, Estreptococos fecais, Pseudomonas aeruginosa e Clostridium perfringens, e quando positivas no ensaio presuntivo e confirmativo submetidas a testes adicionais para descartar possíveis interferências de outros microrganismos que não os pesquisados. Para a pesquisa de coliformes totais foi utilizado o meio de caldo lactosado, concentração dupla e simples (CLD e CLS), no ensaio presuntivo e caldo lactosado verde brilhante bile a 2% (CLVBB 2%) para a confirmação do ensaio presuntivo. Em ambos a incubação é feita durante 24-48h a 35oC. Uma alçada, de cada tubo confirmativo positivo, foi semeada em eosina azul de metileno (EMB), colônias típicas e atípicas foram transferidas para caldo E.C e incubadas por 24h a 44,5oC ± 0,02 para verificação da presença de coliforme termotolerante. Na pesquisa de Pseudomonas aeruginosa, a formação de pigmento esverdeado ou turvação do meio de caldo asparagina, em 24-48h a 35oC, significa resultado presuntivo positivo. Inóculos destes tubos positivos foram transferidos para o meio caldo acetamida a fim de serem confirmados. Das amostras confirmadas, fez-se semeio em ágar leite e ágar cetrimida para descartar possíveis microrganismos que não o pesquisado. O caldo dextrose azida (CDA), um ótimo inibidor de Gram negativos e o ágar seletivo para enterococos (PSE) foram utilizados para identificação presuntiva e confirmativa de estreptococos fecais, respectivamente. Para isolamento prévio de Clostridium perfringens, foi utilizado o caldo diferencial para clostrídios (DRCM). Os inóculos foram incubados em jarra de anaerobiose por 48h a 350C e possíveis amostras positivas inoculadas em caldo de leite tornassolado para confirmação. Embora não utilizada, rotineiramente, na avaliação microbiológica de água mineral, mas apenas de águas potáveis, foi feita também a contagem de bactérias heterotróficas em placas (número de colônias desenvolvidas em aerobiose a 35oC por 48h em placas de Petri, contendo o meio PCA). Utilizou-se a técnica de incorporação, inoculando-se volumes em triplicatas de 1 e 0,1 mL. Esse dado informa sobre as condições higiênicas das fontes e possíveis causas de 3 deterioração da qualidade de água, uma vez que um elevado número dessas bactérias causa odor e sabor desagradáveis. O pH e a temperatura da amostra foram aferidos, após a retirada da água do garrafão para um recipiente diferente do utilizado para a análise microbiológica. 3.2.2 Amostragem: Foram avaliadas 10 marcas de água mineral, por amostragem indicativa, a partir do produto envasado em garrafões de 20 litros obtidos aleatoriamente no comércio durante o período de 15 de agosto a 25 de outubro de 2001. 3.2.3 Procedimento para a coleta da água mineral diretamente do garrafão: 1) Homogeneizou-se a água, invertendo-se o garrafão por diversas vezes, 2) O bocal do garrafão foi desinfetado com álcool a 70%, 3) Retirou-se o lacre com objeto desinfetado e desprezou-se um volume inicial, 4) Fez-se a coleta, próximo ao bico de Bunsen, para recipiente estéril e as amostras coletadas (1000mL) foram, imediatamente, inoculadas, sendo o restante colocado sob refrigeração. 4.0 RESULTADOS E DISCUSSÃO: Os resultados foram confrontados com critérios bacteriológicos de acordo com a Resolução no 54, de 15 de junho de 2000 (Tabela 1), que dispõe sobre o regulamento técnico para fixação de identidade e qualidade de água mineral natural e água natural. O pH das amostras analisadas encontra-se discriminado na Tabela 2. Quanto à contagem padrão feita, em meio PCA, para verificação do controle higiênico na industrialização da água (Tabela 3), todas as marcas analisadas apresentaram valores satisfatórios, considerando-se a legislação para água potável que fixa um valor máximo de 500 unidades formadoras de colônias por mL de água, uma vez que a legislação para água mineral não traz nenhum índice reprovatório para o número de bactérias heterotróficas em placas. Quanto à presença de coliformes totais, Clostridium perfringens, Pseudomonas. aeruginosa, enterococos e Escherichia coli, oito marcas foram aprovadas (80%), pois não foi encontrada nenhuma bactéria indicadora de contaminação, estando as amostras em conformidade com a legislação (Tabela 1). Duas marcas: A6 e A3 foram reprovadas (Tabela 4). A marca A6 apresentou coliforme total em tubo presuntivo (CLD) de 10 mL e confirmativo (CLVBB 2%), 4 NMP de 4/100 mL. A diferenciação para coliforme termotolerante foi feita em caldo E.C, a partir de uma colônia pura e típica isolada previamente em ágar eosina azul de metileno. A presença de coliforme termotolerante demonstra que ocorreu contaminação de origem fecal e a água contaminada por fezes humanas pode ser um veículo de transmissão de doenças, como hepatite e cólera. Segundo a resolução, a água será condenada quando houver a presença de coliformes fecais em qualquer quantidade. A marca A3 apresentou Pseudomonas. aeruginosa num tubo presuntivo de 10mL e confirmado em caldo acetamida (NMP de 4/100mL). Para melhor afirmação do resultado foi feito um semeio em ágar cetrimida (específico para P. aeruginosa) a partir do caldo acetamida com visualização de crescimento abundante. Uma colônia foi transferida para caldo BHI, a partir do ágar cetrimida, e após 24h /35oC, transferiuse um inóculo para confirmação bioquímica (BAC-TRAY-Difco). De acordo com a resolução, o número (NMP) de coliformes totais e/ou P. aeruginosa e/ou Esteptococos fecais e/ou clostridio sulfito redutor, em amostra indicativa, não pode ser maior que 1,1/ 100mL. Tabela 1: Características microbiológicas para água mineral. Amostra indicativa Microrganismo n Limites ausência E.coli ou coliforme termotolerantes em 100 mL Coliformes totais em 100ML <1UFC;<1,1NMP ausência Enterococos, em 100ML <1UFC:<1,1NMP ou ausência Pseudomonas aeruginosa, em 100 mL <1UFC;<1,1NMP ausência Clostrídio sulfito redutor em 100 mL <1UFC;<1,1 NMP ou ausência ou ou Amostra c 5 0 5 1 5 1 5 1 5 1 representativa m <1 UFC; <1,1NMP ausencia <1 UFC; <1,1NMP ausencia <1 UFC; <1,1NMP ausencia <1 UFC; <1,1NMP ausencia M ausência 2 UFC ou 2,2NMP ou 2 UFC ou 2,2NMP ou 2 UFC ou 2,2NMP ou 2 UFC ou 2,2NMP ou Onde: 5 n = é o número de unidades de amostra representativa a serem coletadas e analisadas individualmente, c = é o número de unidades da amostra representativa que pode apresentar resultado entre os valores "m" e "M", m = é o limite inferior mínimo aceitável. É o valor que separa uma qualidade satisfatória de uma qualidade marginal. Valores abaixo do limite "m" são desejáveis, M = é o limite superior (máximo) aceitável. Valores acima de "M" não são aceitos. Tabela 2: pH (a 25oC) das amostras de águas minerais analisadas, aferidos, imediatamente, após retirada das amostras do garrafão. pH A1 5,5 A2 5,0 A3 6,5 A4 5,0 A5 6,0 A6 6,2 A7 5,4 A8 4,61 A9 5,1 A10 5,0 Tabela 3: Número de bactérias heterotróficas expresso em unidades formadoras de colônias por mL (UFC/mL) de água. node bactérias heterotróficas A1 415 A2 150 A3 180 A4 295 A5 412 A6 450 A7 358 A8 300 A9 270 A10 260 Tabela 4: Resultados das análises bacteriológicas efetuadas nas amostras das 10 marcas de água mineral pequisadas . Onde; N= negativo, P= positivo, NMP = número mais provável. Microrganismo/ marca A1 A2 A3 A4 A5 A6 A7 A8 A9 A10 Pseudomonas aeruginosa N N P NMP=(4/100ml) N N N N N N N Estreptococos fecais N N N N N N N N N N Clostridium perfringens N N N N N N N N N N Coliforme total N N N N N P NMP=(4/100ml) N N N N Coliforme fecal N N N N N P NMP=(4/100ml) N N N N . 7.0 CONCLUSÃO: 6 A legislação brasileira relativa a águas minerais tem melhorado bastante nos últimos anos, entretanto, sugere-se uma melhoria na fiscalização em todo processo de industrialização e no ponto de venda da água mineral comercializada O número de marcas reprovadas foi relativamente alto (20%), representando riscos para o consumo e, demonstra negligência em algum processo da fiscalização e também em alguma etapa da industrialização ,seja ela, na retirada da água da fonte, lavagem dos garrafões, envase, higiene da maquinaria do processo ou má acondicionamento do produto no ponto de venda. A Pseudomonas aeruginosa é um microrganismo oportunista podendo provocar sérios problemas em pessoas imunodeficientes, logo, o critério de reprovação da água quanto a presença desse patógeno deveria ser revisto. Apenas a presença dessa bactéria na água mineral, assim como ocorre com a E. coli, já deveria justificar a reprovação. REFERÊNCIAS: BRASIL. Resolução no 54, de 15 de junho de 2000. Regulamento técnico para fixação de padrões de identidade e qualidade de água mineral natural e água natural. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2000/54-00rdc.htm> acesso em 31 fev. 2002. COSTA, L. J. P. Análise bacteriológica da água. ed. 1. João Pessoa: universitária/UFPB, 1980. FOSTER, S. S. D. et al. Contaminación de las aguas subterrâneas: un enfoque ejecutivo de la situacion en America Latina y Caribe en relacion con el suministro de agua potável. Lima, [Peru]. CEPIS. 38 p. 1987. Disponível em:< http://bireme.br/cgibin/wsislind.exe/iah/online/>. Acesso em: 20 fev. 2002 MACÊDO, J. A. B. Águas e Aguas. ed.1. São Paulo: Varela, 2001. MENAKER, L.; MORHART, R.E. ; NAVIA, J.M. Cáries dentárias: Bases biológicas. ed. 1. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1984. NEWBRUN, E. Cariologia. ed. 1. São Paulo: Santos, 1988. 7 ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DA SAÚDE. Água: A desinfecção de água. Washington: OPAS/ OMS, 1999. ORGANIZAÇÃO NÃO GOVERNAMENTAL SOS ÁGUA. A evolução do consumo de água mineral no Brasil. Disponível em: < sosaguas.org.br/notas/aguamineral.htm>. acesso em: 25 fev. 2002. PELCZAR, M. J. et al. Microbiologia: Conceitos e aplicações. ed. 2, v.1. São Paulo: Makron books, 1996. STANDARD METHODS FOR THE EXAMINATION OF WATER AND WASTEWATER. ed.13th .Washington: APHA, 1971. STANDARD METHODS FOR THE EXAMINATION OF WATER AND WASTEWATER. ed. 20th. Washington: APHA, 1998. SÃO PAULO (Estado).Companhia de tecnologia de saneamento ambiental (CETESB). Exame microbiológico da água: Processos simplificados. São Paulo, 1992. SANCHES, P. S. Atualização em técnicas para o controle microbiológico de águas minerais. São Paulo: Universidade Mackenzie, 1999. 8 9 10